Democracia e Educação - John Dewey

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democracia e educação

editora nacional

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ii.uuLiiaaaes pedagrógricas -volume21

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CIP-Brasil. Catologação-na-Fonte Câmara Brasileira do Livro, SP Dewey, John, 1859-1952. . Democracia e educação : introdução à filosofia da educação / John Dewey ; tradução de Godofredo Rangel e Anísio Teixeira. — 4. ed. — São Paulo : Ed. Nacional, 1979. (Atualidades Pedagógicas ; v. 21) í. Educação 2. Educação — Filosofia I. Título. II. Série. CDD-370 78-1392 -370.1

D513d 4.ed.

índices para catálogo sistemático: 1. Educação 370 2. Educação : Filosofia 370.1 3. Filosofia da educação 370.1

/l JOHN DEWEY

ATUALIDADES PEDAGÓGICAS Volume 21

Direçáo de J. B. DAMASCO PENNA

DEMOCRACIA E EDUCAÇÃO INTRODUÇÃO À FILOSOFIA DA EDUCAÇÃO Tradução de GODOFREDO RANGEL e ANÍSIO TEIXEIRA O

Estudo preliminar de LEONARDO V AN ACKER

4.a edição

A relação completa dos livros publicados em ATUALIDADES PEDAGÓGICAS está no fim deste volume.

Título do original em língua inglesa:

01291/82

Democracy and education

íN

publicado por The Macmillan Company, New York.

De JOHN DEWEY, nestas "Atualidades Pedagógicas": Vol. 2 — Como pensamos, tradução e notas de Haydée Camargo Campos Vol. 21 — Democracia e educação, tradução de Godofredo Rangel e Anísio Teixeira Vol. 76 — Vida e educação, tradução e estudo preliminar de Anísio Teixeira e na "Biblioteca Universitária": Série 1.*, vol. l — A filosofia em reconstrução, nova tradução de António Pinto de Carvalho, revista por Anísio Teixeira

Apresentação da 4." edição XI "Dewey e dois de seus livros" (Estudo preliminar, de Leonardo Van Acker)XIII Apresentação da í." edição XXIII Prefácio da 7.° edição XXVII Cap. l — A educação como necessidade da vida 1. A renovação da vida pela transmissão 2. Educação e comunicação 3. O papel da educação formal Resumo

I 4 6 10

Cap. 2 -r- A educação como função social 1. 2. 3. 4.

Natureza e significação do meio O ambiente social O meio social como fator educativo A escola como ambiente especial Resumo

II 13 17 20 24

Cap. 3 — A educação como direçào

Proibida a reprodução, embora parcial, e por qualquer processo, sem autorização expressa dos Editores.

1. O meio como o fator de dircção 2. Modalidades de dircção social 3. A imitação e a psicologia SOCÍA! 4. Aígumas aplicações à educação Rcsiuna Cap. 4 — A educação como crescimento 1. 2. 3.

Direitos para a língua portuguesa adquiridos pela COMPANHIA EDITORA NACIONAL Rua dos Gusmões, 639 01212, São Paulo, SP

25 28 36 39 42

Condições do crescimento Os hábitos como manifestações de crescimento A significação educacional do conceito do desenvolvimento Resumo

44 49 53 56

Cap, 5 — Preparação, desdobramento e disciplina formal 1. 2. 3.

a propriedade desta tradução.

A educação como preparação A educação como desdobramento A educação como o adestramento das faculdades . . . . Resumo

58 60 65 73

Cap. 6 •— A educação conservadora e a progressiva 1979 Impresso no Brasil

1. 2.

A educação como formação A educação como recapítulação e retrospecção

75 78

3. Cap. 7 1. 2. 3. 4. 5. Cap. 8 1. 2. 3.

A educação como reconstrução Resumo

82

— A concepção democrática da educação O que subentende a associação humana O ideal democrático A filosofia educacional platónica O ideal "individualista" do século XVIII A educação sob o ponto de vista nacional e social Resumo

87 93 94 98

— Objetivos da educação A natureza de um objetivo O critério para o conhecimento dos bons objetivos Aplicação à educação Resumo

Cap. 9 — O desenvolvimento natural e a eficiência social como objetivos 1. O objetivo fornecido pela natureza 2. A eficiência social como o objetivo da educação 3. A cultura como o objetivo da educação Resumo

100

106

108 112 115 119

121 129 132 134

Cap. 10 — Interesse e disciplina Significação das palavras interesse t e disciplina A importância da ideia do interesse da educação Alguns aspectos sociais da questão Resumo

136 142 148 150

Cap. 11 — Experiência e pensamento 1. A natureza da experiência 2. A reflexão na experiência Resumo

Cap. 12 — O ato de pensar e a educação 1. A essência do método Resumo

Cap. 13 — A natureza do método 1. A unidade da matéria e do método .. .. 2. Método geral e método individual .... 3. Os característicos do método individual Reswnw ,

152 158 165 167 179

181 187 190 198

Cap. 14 — A natureza da matéria de estudo 1. A matéria para o educador e para o educando . 2. O desenvolvimento da matéria para o educando

199 203

Cap. 15 — O brinquedo ou o jogo e o trabalho no currículo 1. O papel das ocupações ativas na educação 2. Ocupações proveitosas 3. Trabalho e jogos Resumo

214 216 223 226

Cap. 16 — A significação da geografia e da história 1. Extensão da significação das ntividades primárias .. 2. A natureza complementar da História e da Geografia 3. A Histór ía e a presente vida social Resumo

228 231 235 239

Cap. 17 — As ciências no currículo 1. O lógico e o psicológico 2. A ciência e o progresso social 3. O naturalismo e o humanismo na educação Resumo

241 245 251 253

Cap. 18 — Valores educacionais l. A natureza do senso do real ou da apreciação direta 2. Os valores dos estudos 3. A segregação e a organização dos valores Resumo

254 261 267 273

Cap. 19 — Trabalho e lazer 1. A origem do antagonismo 2. A situação atual l\csnmo

275 280 286

Cap. 20 — Estudos intelectuais e estudos práticos 1. O antagonismo entre a experiência e o verdadeiro conhecimento 2. A teoria .moderna sobre a experiência e o -conhecimento 3. A experiência como experimentação Resumo

292 298 303

Cap. 21 — Estudos físicos e estudos sociais. Naturalismo e humanismo 1. Os antecedentes históricos do estudo de humanidades 2. Moderno interesse científico pela natureza 3. O atual problema educacional Resumo

305 309 314 319

288

Cap. 22 — O indivíduo e o mundo 1, O espírito, como puramente individual 2, O espírito individual como agente de reorganização .. 3, Equivalentes educacionais Resumo ,..,

321 324 332 336

Cap. 23 — Aspectos vocacionais da educação 1. A significação da vocação 2. O papel dos objetivos -vocacionais na educação 3. Oportunidades e perigos atuais Resumo

338 340 344 352

Cap. 24 — Filosofia da educação 1. Revisão crítica 2. A natureza da filosofia ... f Resumo

354 356 365

Cap. 25 — Teorias do conhecimento 1. Continuidade vcrsus dualismo 2. Escolas de método Resumo

366 372 378

Cap, 26 •— Teorias de moral 1. 2. 3r 4,

O interior e o exterior O antagonismo entre o dever e o interesse Inteligência e caráter O social e o moral Resumo índice Analítico

380 385 389 392 469 397

APRESENTAÇÃO DA 4,a EDIÇÃO Dois dos livros de John Dewey, dados à estampa nesta coleção de "Atualidades Pedagógicas", Como pensamos (vol. 2) e Democracia e educação (vol, 21), um e outro clássicos do pensamento filosófico e pedagógico de nossos dias, e esgotados, um e outro, há já algum tempo, voltam agora, com esta reedição, às estantes de livrarias e bibliotecas. E voltam enriquecidos do excelente estudo preliminar "Dewey e dois de seus livros", de autoria do Professor Leonardo Van Acker. O Professor Van Acker é belga de nascimento, e já em 1922 começou a lecionar na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de São Bento, em São Paulo. É, aliás, cidadão brasileiro desde 1940 Doutor em filosofia e letras pela Universidade Católica de Lovaina, também se doutorou em filosofia tomísta, no Instituto Superior de Filosofia da mesma universidade. Entre nós, a larga influência que seus aturados estudos filosóficos e seu eminente professorado exerceram foi consagrada com o prémio "Moinho Santista" em filosofia, a ele conferido em 1963._É membro do Instituto Brasileiro de Filosofia (São Paulo) e da Société Philosophique (Lovaina). Do muito que tem escrito, destacam-se penetrante estudo sobre as ideias de Bergson, A filosofia bergsoniana: génese, evolução e estrutura gnosiológíca do bergsonismo (1959) e numerosos trabalhos referentes à lógica clássica, assim formal como material; a respeito de Dewey, pensador que sempre lhe mereceu particular atenção, um estudo sobre "A religião na evolução do pensamento de Dewey", composto em sua língua natal (1938) e, publicados em português, "Ciência e democracia em John Dewey" (1943), "O naturalismo de John Dewey" (1957), "Os valores na filosofia de John Dewey" (1961). Os Editores

DEWEY E DOIS DE SEUS LIVROS 1. Nasceu John Dewey aos 20 de outubro de 1859 em Burlington e faleceu a l de junho de 1952 em Nova York. Depois de cursar os três graus do ensino na cidade natal, fez o doutorado em filosofia na Universidade Johns Hopkins, em Baltimore. Em 1884 começou a carreira de professor universitário no Michígan, continuando-a em 1894 na Universidade de Chicago, onde fundou uma escola primária experimental, e acabando-a no Teachers College da Universidade Columbia, em Nova York (1905-1930). Viagens prolongadas na Inglaterra, Rússia, Turquia, no Japão e no México entrecortaram-lhe a docência nos Estados Unidos, mas lhe proporcionaram experiência direta da situação mundial. Em filosofia, Dewey a princípio adotou o hegelianismo do seu mestre, George Sylvester Morris; mas a influência do evolucionismo de Charíes Darwin e a da psicologia biológica de William James levaram-no a elaborar uma filosofia pragmatista, que fez escola na América do Norte — a chamada "Escola de Chicago" — além de ganhar no Brasil um fervoroso discípulo na pessoa de Anísio Teixeira, aluno de Dewey no ano letivo de 1928-29 e um dos grandes pioneiros da reforma pedagógica nacional no espírito do pragmatismo experimentalista e democrático-socialista. 2, Embora locutor de grande efeito soporífero (cf. John Dewey, por Sidney Hook, N. Y., 1939, p. 21), Dewey foi escritor de extraordinária fecundidade, chegando a produzir, de 1898 a 1940, na razão de quase um livro por ano, como prova esta lista, aliás incompleta, das obras publicadas: My pedagogic creed (1898); The school and society (1899); The chila and the curriculum (1902); Studíes in logical theory (com ou-

XIV

tros, 1903); The school and the chila (1907); Ethics (com J. H. Tufts, 1908, 1932); Moral principies in education (1909); The influence of Darwin on philosophy and other essays (1910); How we think (1910, 1933); Interest and efjort'in education (1913); German philosophy and politics (1915); Democracy and education (1916); Essays in experimental logic (1916); Creative intelligence (com outros, 1917); Reconstruction in philosophy (1920); Human nature and conduct (1922); Lê dévelappement du pragmatisme amérícain (1922); Experience and nature (1925); The public and its problerns (1927); The quest for certainty (1929); An and education (1929); Soviet education (1929); Impressions of Soviet Rússia and the revolutionary world, México, China, Turkey (1929); Characters and events (2 vols. de artigos coligidos por J. Ratner, 1929); The sources of a science of education (1929); Individualism, old and new (1930); Philosophy and civilization (1931, 1939); An as experience (1934); A common jaith (1934); Liberalism and social action (1935); Experience and education (1938); Logic, the theory of inquiry (1938); Theory of evaluation (1939); Freedom and culture (1940); Education today (estudos coligidos por J. Ratner, 1940); Problems of men (1946); Knawing and the known (com A. Bentley, 1949) 3. Não cabe aqui aprofundarmo-nos na análise da filosofia geral de Dewey, mas, antes, delinear-lhe a doutrina em Democracia e educação (1916) e Como pensamos (1933), sem preterir, naturalmente, os pressupostos filosóficos. São, esses pressupostos, em resumo, os seguintes: I. O pragmatismo (do grego: pragma — objeto de ação ou práxis): a realidade é toda composta, não de seres estáticos e isolados por diferenças hierárquicas de essência ou natureza, mas, sim, de acontecimentos relacionados pelo dinamismo da ação recíproca transformadora, intrinsecamente iguais e só diferentes pelo grau de eficiência ou capacidade de reconstrução progressiva. II. O experimentalismo: a tal dinamismo reativo universal pode-se chamar "Experiência" no sentido genérico, do qual as "experiências" humanas, como a vivência consciente e a "experimentação" científica, física, ou sociológica, não passam de aspectos particulares.

XV

III. O princípio de continuidade: o pragmatismo e o experimentalismo implicam a "continuidade" ou identidade intrínseca e essencial entre a natureza cósmica e a experiência humana, entre pessoa e sociedade, entre os vários grupos e classes sociais, entre o moral e o social, entre a atividade material ou corpórea e a atividade espiritual, intelectual ou moral; pois estas últimas não passam das funções mais altamente evoluídas e eficientes da atividade material, controlando experimentalmente a matéria cósmica para a progressiva realização de uma convivência humana plenamente participada ou democráticosocialista. IV. Verdade como práxis: nesses termos, as ideias ou significados intelectuais (ideas, meanings) já não são entidades imateriais e supra-sensíveis, mas hipóteses de solução de problemas e, portanto, instrumentos de ação material experimental para resolvê-los (instrumentalismo}. Donde, a verdade da ideia não passa da sua eficiência experimental ou cognitiva e., em última análise, da sua provada utilidade social ou moral. V. Escola nova: donde resulta, enfim, a necessidade de reformar a fundo a escola tradicional, predominantemente passiva, dogmática, conservadora e elitista, em escola nova, radicalmente ativa ou crítico-experimental, progressiva e socialdemocrática. 4. Democracia e educação pretende fornecer as ideias pedagógicas e filosóficas adequadas a uma sociedade técnico-industrial que queira ser democrática de verdade, e não apenas de nome. Parte do pressuposto de a sociedade só ser deveras democrática se todos os membros lhe participam do bem comum em termos de igualdade, de modo a permitir a flexibilidade no reajuste das instituições e proporcionar uma educação, tornando os indivíduos pessoalmente interessados na participação e no reajustamento da vida social, e mentalmente habilitados a realizar mudanças sociais, sem provocar confusão e desordem (cap. VII, resumo). Assim sendo, na autêntica educação democrática, as atitudes e disposições necessárias à continuação sempre renovada e progressiva da vida social não devem resuJtar de mera transmissão direta de conhecimentos e emoções, dos educadores aos educandos; mas hão de ser o fruto implícito ou indireto da participação de educadores e educandos

XVI nas experiências do mesmo ambiente social. Quer dizer que a escola não deve ser isolada da vida comum, mas tem de simplificá-la, purificá-la e melhorá-la. Nela, a direçao dada pelos educadores não deve ser baseada no prestígio ou na ascendência pessoal ou subjetiva destes, mas, sim, nos resultados objetivos ou universalmente válidos da experiência comum, física, ou sociológica. Destarte, a educação será vida ou crescimento contínuo, e não apenas preparação para a vida adulta; nem mero desenvolvimento ou formação mental subjetiva; nem simples exercitação ou treino de faculdades ou capacidades especiais e isoladas e já adrede preparadas. Como processo contínuo de crescimento ou reconstrução da experiência socialmente participada, a educação terá o seu fim em si mesma, não sendo meio para fins diferentes e ulteriores. Será progressiva como a própria vida e não regressão mental ao passado, nem recapitulação das fases culturais-históricas do mesmo. Será democrática, enfim, não reservada a classes privilegiadas; mas nem por isso estreitamente individualista, e sim comunitária, no sentido da participação enquanto possível extensa dos interesses do grupo por todos os respectivos membros e da interação enquanto possível plena e livre entre os vários grupos (caps. I-VII). 5. Quais, agora, os objetivos (aims) concretos e peculiarmente acentuados em que se traduz esse fim (end) global de educação social-democrática? Em primeiro lugar, tais objetivos devem ser projetos inteligentemente concebidos e executados; portanto, não rigidamente impostos de fora, de modo a tornar impossível a livre escolha e experimentação de meios e resultados adequados e desejáveis Além disso, não devem ser objetivos unilaterais e conflitantes, mas organicamente coordenados. Assim, por exemplo, o desenvolvimento das apti/ does naturais ou a cultura intelectual devem ser objetivos coordenados com o da eficiência social; e, reciprocamente, esta última não pode deixar de ser vazia se não implica cultura intelectual e desenvolvimento das aptidões naturais. Do mes( mo modo, a experiência, ou experimentação, deve ser metodicamente guiada pelo pensamento lógico; do contrário, é feita à toa, sem reflexão inteligente, sem coerência, nem validade cognitiva, nem utilidade social. (Por isso Dewey escreveu o livro: Como pensamos.}

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XVII Entre matérias e métodos de estudo e ensino deve haver correlação tão natural e profunda como entre a inteligência e o mundo real. Há, por certo, necessidade lógica e pedagógica de dividir as várias disciplinas; mas não devem ser aprendidas ou ensinadas em isolamento da sua base social comum que é a experiência da humanidade. Tampouco deve haver separação completa entre o trabalho do estudo e o divertimento do jogo, porque, aplicado ao jogo, o trabalho se torna interessante e artístico; ao £>asso que, absolutamente isolado do jogo, o trabalho torna-se tarefa imposta, prejudicada pela tendência natural à livre atividade lúdica, que não é mera excitação física, mas atividade ou ocupação inteligente, visando a fins juntamente técnicos, estéticos e sociais. Donde a necessidade pedagógica de combinar o trabalho com o jogo e vice-versa. Enfim, o princípio geral de não-isolamento das matérias ou disciplinas da sua base social comum na experiência humana é válido especialmente para a geografia e a história, que resumem a experiência da humanidade no espaço e no tempo; bem como para as ciências físicas ou naturais, que são o resultado lógico e cognitivo da luta dos homens para controlar o ambiente cósmico e assim fazer progredir a sociedade (caps.

vm-xvii).

6. Com respeito ao valor educativo das várias matérias de ensino ou disciplinas, existe também a distinção pedagógica em valores estéticos e utilitários, intelectuais e práticos, naturalísticos e humanísticos, culturais e profissionais. Entretanto, como as disciplinas são correlativas, assim também não podem ser mutuamente exclusivos os sobreditos valores pedagógicos. As belas letras e artes, por exemplo, têm incontestável valor estético; mas este não lhes é exclusivamente próprio. Para quem a estuda ou ensina com admiração e apreço, qualquer matéria pode revestir-se de valor estético. Do mesmo modo, não há conhecimentos teóricos ou "intelectuais" sem nenhum valor prático, nem disciplinas científico-naturais sem valor humanista ou social, nem matérias culturais sem valor profissional, e reciprocamente. A distinção dos valores educativos, segundo Dewey, não é de modo nenhum absoluta ou intrínseca, mas relativa e extrínseca, devida a situações e fatores históricos e sociais (cap. XIX, resumo). O primeiro de tais fatores é a organização da antiga sociedade helénica, em que havia a classe dos senhores, donos

XVIII exclusivos do lazer, além da classe dos escravos, adstritos unicamente aos trabalhos corporais. Por certo, aos senhores incumbiam as atividades políticas e militares, que em vez de lazer lhes davam muito que fazer no serviço da pátria. Mas essas ocupações ou profissões eram consideradas "liberais", ou próprias de cidadãos ou.homens livres; por oposição às ocupações ou profissões chamadas "servis", por serem geralmente relegadas aos escravos. Donde já se vê que entre o valor estético e o utilitário, entre o cultural e o profissional, não há qualquer distinção absoluta ou intrínseca, mas só relativa a circunstâncias históricas extrínsecas. Em sociedade genuinamente democrática, aliás, todas as profissões são consideradas igualmente valiosas ou dignas, por serem todas serviços sociais competentes, necessários e úteis à comunidade humana. Nenhuma profissão dispensa por completo o trabalho corpóreo, e todas merecem a recompensa estética do lazer. Daí ser aceitável a chamada profissionalização do ensino, contanto que não seja puramente tecnicista, mecanizadora, desumanizante ou dissocializadora (cap. XXIII, resumo). Outro fator histórico, explicativo da separação entre o valor naturalístico e o humanístico, é devido, em parte, ao conceito de "experiência" na antiga Grécia, onde a experiência significava "empeiria" rotineira1 e desprovida de ciência técnica; e, em parte, ao humanismo esteticista do Renascimento, considerando as letras e artes antigas mais refinadas e humanas do que as letras e-artes medievais e modernas. Donde resultou a discriminação axiológica entre os estudos científico-naturais e os estudos humanístícos, literários, filosóficos e histórico-sociais. Mas essa discriminação axiológica foi superada pelo conceito moderno e contemporâneo de "experiência" como experimentação científica, levando a conhecimentos metodicamente comprovados. Nesses termos, a manipulação do mundo físico já não permite simples rotina empírica, mas adquire a dignidade de ciência voltada para o controle da natureza, não para servir interesses de classe, mas para promover o progressivo bem-estar de toda a comunidade humana. O último fator histórico da discriminação dos valores educativos é a própria filosofia, mormente a moderna, marcada pelo individualismo estreito, isolando o espírito do sujeito humano, não só do próprio corpo, mas até da natureza física, bem como da convivência humana. Donde surgiram os pseudo-

XIX problemas da oposição entre espírito e matéria, conhecimento e realidade, experiência consciente e natureza física, liberdade individual e obrigação social, etc. O que reforçou, em pedagogia, a oposição entre os valores educativos. Esse falso individualismo, com as suas péssimas consequências pedagógicas, deve ser superado pelo verdadeiro individualismo, que sabe1 conciliar matéria e espírito, homem e natureza, liberdade individual e progresso social. Mas isso exige uma filosofia adequada, que seja, ao mesmo tempo, teoria geral da genuína educação social democrática (caps. XVIII-XXIII). 7. Como todo pensamento, a filosofia visa a resolver situações perplexas oferecidas pela experiência, por definição do problema, formação, discussão e experimentação das hipóteses de solução. Objeto próprio do pensamento filosófico são as situações perplexas e problemáticas da experiência social, como sejam as oposições ou conflitos entre interesses e aspirações de grupos. E, como o único meio de resolver tais oposições é a modificação das disposições emocionais e intelectuais por meio de educação apropriada, segue-se que a filosofia é a teoria orientadora da prática educativa deliberada em vista da realização de uma sociedade deveras democrática. Como vimos, a sociedade democrática genuína é caracterizada pela maior participação possível dos indivíduos na experiência do grupo e pela maior interação possível entre os vários grupos. Por definição, tal sociedade rejeita todas as divisões ou oposições tendentes a isolar pessoas ou grupos, de modo a tornar-lhes o conhecimento unilateral, e a conduta moral discriminatória e injusta. Daí vern que a sociedade integralmente democrática deve abandonar todas as filosofias que, inspiradas em divisões sociais isolantes, propõem teorias gnosiológicas e éticas tecnicamente chamadas "dualistas", por causa das dicotomias separatistas que estabelecem entre matéria e espírito, espírito e mundo exterior, experiência consciente e natureza física, indivíduo e sociedade, etc. A filosofia deveras democrática deve ser a da continuidade intrínseca ou absoluta entre esses vários elementos separados ou isolados pelo dualismo filosófico. Para ela, tanto o conhecimento como a conduta moral são intrinsecamente experimentais, pois é pela experimentação, corno atividade participada, que a sociedade progride na aquisição de conhecimentos objetivameníe válidos e

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XXI

que os indivíduos se vão socializando ou tornando universalmente humanos. Tal é, em resumo, a doutrina exposta em Democracia e educação (cf. caps. XXIV-XXVI).

claro, em Fr. De Hovre, Ensaio de filosofia pedagógica., tradução de Luiz e J. B. Damasco Penna (Ed. Nacional, São Paulo, vol. 95 destas "Atualidades Pedagógicas", 1969).

8. Enquanto esse livro é uma sociologia filosófica da educação, Como pensamos oferece uma lógica pedagógica. Assunto básico desta última é a análise do processo real, e não puramente formal, do pensamento "reflexivo" ou correio, levando a conhecimentos metódica e criticamente verificados, por oposição ao pensamento irrefletido e incorreto, levando a posições precipitadas, dogmáticas, acríticas. No processo do pensamento reflexivo, Dewey distingue cinco fases, cuja sequência, por sinal, não é rígida: 1) situação difícil ou perplexa; 2) definição da natureza do problema; 3) sugestão de ideias como hipóteses de solução; 4) verificação lógica ou raciocinativa (isto é, por ação interior de pensamento ou imaginação) da consistência ou coerência das ideias ou hipóteses com os dados do problema, de modo a eliminar as incompatíveis e selecionar a única coerente; 5) verificação experimental (ou seja por ação exterior) da única hipótese compatível. Tal é a ordem intelectual que deveriam seguir as aulas escolares, com participação dos alunos e do professor, este último não como ditador, nem como simples aprendiz, mas como orientador intelectual da experiência partilhada por todo o grupo. Com isso, a preleção expositiva não seria completamente suprimida, mas conservada para/fornecer aos alunos as informações, aliás nunca dogmáticas, que eles por si mesmos não podem conseguir, mas que são/necessárias à sugestão das ideias ou hipóteses de solução. Estas últimas deveriam ser logicamente discutidas, bem como de fato experimentadas em comum, mormente para educar os alunos para o diálogo e o convívio em sociedade genuinamente democrática.

De Democracia e educação, existe um comentário seguido, expositivo e crítico, de autoria do filósofo norte-americano, idealista e hegeliano, Herman Harrel Horne, com o título de A filosofia da educação sob o ponto de vista democrático,, traduzido por Adolpho Packer (Ed. Saraiva, São Paulo, 1938). Em O poder da educação, de Theodore Brameld, traduzido por Deny Félix Fonseca, encontra-se também uma crítica ao progressismo antifinafista e antropocêntrico de Dewey (Zahar Ed., Rio, 1967, p. 95-96). De toda a filosofia pedagógica deweyana, incluindo-lhe as raízes biográfico-existenciais e os postulados filosóficos gerais, apresenta exposição e crítica minuciosa, precisa e concisa, o livro de Maria Isabel Moraes Pitombo, Conhecimento, valores e educação em John Dewey (Ed. Pioneira, São Paulo, 1974). Da lógica e gnosíologia empirista de Dewey, lêem-se crítica e apreciação interessantes em Miguel Reale, Experiência e cultura (Ed. Grijalbo-Edusp, 1977, cap. III, § 2). Da ideia de verdade, pragmatista e experimentalista, há exposição e crítica sucinta e cerrada em Ruy Afonso da Costa Nunes, A ideia de verdade e a educação (Ed. Convívio, São Paulo, 1978, cap. VI). Finalmente, há uma crítica interessante e implícita ao indutivismo empirista na lógica e na teoria da aprendizagem deweyanas, bem como ao antidogmatismo radical e progressista de Dewey, em Karl Popper, Lógica da pesquisa científica (Ed. Cultrix-Edusp, 1975) e Autobiografia intelectual (Ed. Cultrix-Edusp, 1977, §§ 10-20), ambas traduções de Leônidas Hegenberg e Octanny Silveira da Motta.

9. Até aqui, a exposição da doutrina de Dewey nas duas obras sobreditas. È o que nos cabia nesta sucinta introdução, sem entrarmos na crítica do pensamento deweyano. Entretanto, ao leitor desejoso de estudar essas obras com ponderação crítica, achamos conveniente indicar as seguintes fontes, todas elas publicadas em português. Sobre Dewey como filósofo e pedagogista reformador, há um estudo breve e vivo, bem documentado e extremamente

10. Por último, gostaríamos de salientar a oportunidade da reedição destas duas obras de John Dewey, sempre muito influente nos meios pedagógicos. Por certo, atualmente, já não tem o eminente pensador norte-americano o cartaz que tinha no Brasil, nas décadas de 1930 a 1950. Para os marxistas militantes, o socialismo dele não passa de pragmatismo burguês, cientificista, individualista e utilitário Para os cristãos, mormente os católicos, a sociedade democrática por ele concebida não é integralmente humana, porque repudia no homem a tendência natural para o Ser, o Viver e o Valor Infinito, sem o qual a contínua reconstrução da experiência humana fica defí-

XXII nitivamente sem sentido adequado às aspirações do homem. Apesar de todas essas censuras, é inegável em Dewey o intuito de promover entre os homens a grande comunidade fraternal, para além do individualismo egoísta e libertário, bem como do comunismo coativo e totalitário. Foi esse intuito sincero que lhe inspirou muitas ideias e recomendações intrinsecamente valiosas e duradouramente atuais, como sejam estas duas: 1) não há democracia autêntica sem indivíduos mentalmente capazes de colaborar para o bem comum e cfe mudar as estruturas sociais, não introduzindo confusão ou desordem; 2) nem há democracia genuína sem educação do pensamento reflexivo, capaz de discussão objetiva e prova experimental, avesso ao debate emocional, à precipitação confusionista e à mania de improvisação. São essas duas ideias que encarecidamente propomos à benevolente reflexão de todos os patriotas brasileiros, mormente os jovens, sinceramente empenhados em instaurar neste Brasil uma comunidade realmente democrática, fraternal e integralmente humana. São Paulo, maio de 1979.

Leonardo Van Acker

APRESENTAÇÃO DA l.a EDIÇÃO Reputo a versão em língua portuguesa deste grande livro de JOHN DEWEY — o seu melhor livro sobre educação, na opinião do próprio autor — como uma inestimável contribuição à cultura popular brasileira. Na justificada e explicável confusão de pensamento, em que se encontra o país, confusão que é aumentada pela arrcgitnenlação que se vem ultimamente realizando de quanto dogmatismo serôdio se encontra para lutar, por esse meio inoperante, contra, a própria perplexidade ambiente — «5o sei de livro mais salutar e mais promissor. Com efeito, o leitor encontrará nas suas páginas a revelação — e nada menos é preciso para o Brasil, hoje — do que é a democracia e dos meios de realisá-la. A teoria simplista e tão largamente utilizada e explorada pelos seus inimigos, de que a democracia é mera- forma de governo e forma de governo que falhou ou vem falhando, fica inteiramente destruída com a- compreensão ampla e profunda qiíe nos transmite DEWEY da verdadeira democracia. Mas, não é só. A obra de DEWEY é a mais sólida e a. mais convincente das reivindicações do pensamento moderno, no sentido de demonstrar a sua inalterável continuidade com todo o pensamento da humanid-ade e a sua vigorosa capacidade de restaurar e revitalizar todos os valores morais e espirituais indispensáveis à vida do homem. Tanto vale dizer que a sua obra é obra de conciliação e de síntese e não de divisão ou combate. A confusão de pensamento a que aludimos é sobretudo originária de uma inacreditável fragmentação da cultura. Essa fragmentação é, por sua vês, proveniente da penetração, cada vês mais impetuosa, de fórmulas novas de pensamento nas velhas fórmulas herdadas de outras idades. Enquanto foi possível conservarem-se isoladas e limitadas essas novas contribuições e, por esse meio, guardar e acautelar os moldes amados e admirados da velha cultura moral e espiritual, o equilíbrio foi mantido. Tempo chegou, porém, em que não era mais possível persistir tal regime de transigência e pás condicional. Sobreveio, então, a confusão moderna e, para curá-la, os

XXIV remédios violentos e antagónicos. Restauração do velho pensamento, harmonioso e adequado nas idades a que serviu, mas ineficaz, insuficiente e contraditório nos dias de hoje; ou imposição imediata de uma nova ordem, totalmente nova, com valores novos e novas instituições. O diagnóstico do erro de ambas as soluções é fácil de faser: só a golpes de espada pode qualquer delas ser, não digo cumprida, mas simplesmente tentada. Ao invés disso, o que urge é um estudo das condições atuais e dos desajustamentos atuais, para traçar o programa da reconstrução indispensável à integração do presente estado de coisas. Nem restauração do passado nem imposição de íím futuro ainda inexistente. Mas, revigoraçâo de tudo do passado que ainda for útil e operante e readaptação de tudo que for novo e eficaz, em uma- contextura que não será integralmente nova senão porque será integralmente viva e orgânica. Ê essa obra de análise, de balanço e de equilíbrio que DEWEY realiza magistralmente. Na superfície acidentada do pensamento contemporâneo, ele ó um restaurador de unidade. O vigor e a. frescura de seu- pensamento têm a atração e o Ímpeto que caracterizam as reais contribuições da inteligência. Nem especiosidade, nem simplificações excessivas. Nada dessa aparência miraculosa de certas mistificações doutrinárias contemporâneas. Poucos pensamentos estão alicerçados em um tão sólido bom senso e tão inalterável equilíbrio. DEWEY se filia, por esse modo, à grande linhagem de pensadores que não vem acrescentar aos conflitos e às divisões entre os homens, mas revelar a possível conciliação de suas querelas, desde que desejem elevar-se um pouco i-nais adiante dos seus interesses imediatos. Não é demais insistir no caráter conciliante e reintegrador do pensamento deweyano, sobretudo em momento, como o nosso, em que a maior necessidade nacional é a de uma- nova síntese para 'pacificar e dirigir os espíritos em perturbação. Se assim é em relação à cultura geral, o que não dizer em relação à cultura pedagógica, em particularf Se, por um lado, a educação nada mais é que um campo de aplicação dos princípios e fórmulas da cultura geral, por outro lado não é menos verdade que se essa cultura geral se f as confusa, perplexa e contraditória, em nenhum outro lugar se torna mais indispensável, por isso mesmo, a ne-

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cessidade de claresa e coerência, tão aumentada fica a responsabilidade da educação nesses períodos de crise intelectual. Dai provém a mair importância deste livro para os educadores nacionais. Muitas das ideias aí expostas são familiares ao meio pedagógico brasileiro, mas creio poder diser que nenhum outro livro em português, presentemente, poderá, como este, contribuir para explicar a origem e o alcance dessas ideias, os seus corolários e consequências, bem como o seu lugar no contexto geral do pensamento humano. É um tratado de educação que, sob diversos aspectos, representa uma suma moderna dos conhecimentos pedagógicos. Nem outra ê mesmo a sua intenção profunda, compreendendo como compreende DEWEY a filosofia como a investigação e a descoberta das soluções dos conflitos, antíteses, antagonismos e perplexidades que atormentam o espírito em cada 'momento da história. DEWEY é, hoje, considerado no mundo como o filósofo da democracia. Coube a ele desenvolver em todas as suas possibilidades e consequências o ideal democrático, em face das condições modernas da ciência e do mundo. Não se trata de uma exposição acidental e provisória, mas da análise das suas premissas definitivas e da descoberta do método adequado de lidar com os seus problemas e as suas dificuldades. O Capítulo de Educação, que não faltou a nenhuma das grandes filosofias operantes que já teve a humanidade, e que também não faltou à filosofia de JOHN DEWEY, é o que é dado hoje, ao público brasileiro, neste livro fundamental. Resta, tão-sornente, acentuar que, nascido no solo americano, filiado às mais legítimas fontes de seu pensamento e adstrito às condições de vida do continente, temos o direito de considerar nossa essa vigorosa e sadia formiifação dos novos ideais humanos. O legítimo e largo humanismo que se plantou nas terras novas e no novo clima social deste continente não tem maior intérprete nem maior professor do que o autor deste livro. Possa o trabalho*aqui traduzido contribuir para dar sentido e direção às nossas próprias perplexidades, como está contribuindo e tem contribuído, nos demais países americanos e em quase todo o mundo ocidental, para orientar o pensamento e a ação dos seus educadores.

ANÍSIO TEIXEIRA São Paulo, 15 de janeiro de 1936.

PREFACIO DA l. a EDIÇÃO Este livro é um esforço para penetrar e definir as ideias implícitas em uma sociedade democrática e para aplicá-las aos problemas da educação. A exposição inclui a indicação dos fins e métodos construtivos da educação pública, encarados desse ponto de vista, e ainda uma crítica das teorias do conhecimento e da moral, formuladas em condições sociais primitivas e que continuam a atuar nas sociedades nominalmente democráticas, obstando a realização adequada do ideal democrático. Como se verá, a filosofia exposta nas páginas deste livro mostra o desenvolvimento democrático em suas relações com o desenvolvimento do método experimental nas ciências, das ideias de evolução nas ciências biológicas e com a reorganização industrial — e analisa as mudanças de matéria e método na educação que esses desenvolvimentos determinam. Testemunho o meu profundo reconhecimento ao DR. GOODSELL do Teachers College pelas críticas que fez ao livro, ainda em original; ao Professor KILPATRICK, do mesmo instituto, por críticas e sugestões em relação à ordem dos tópicos, de que largamente me utilizei; e a Miss ELSIE RIPLEY CLAPP por muitas críticas e sugestões. Aos dois primeiros indicados, também pelo trabalho de revisão das provas. Além desses, sinto-me grandemente em dívida para corn uma série extensa de estudantes, cujas sucessivas turmas se distribuíram por mais anos do que os que desejo enumerar.

J. DUniversidade de Colúttibia, Nova Iorque

CAPÍTULO l A educação como necessidade da vida l. A renovação da vida pela transmissão. — A mais notável distinção entre seres vivos e inanimados é que os primeiros se conservam pela renovação. Ao receber uma pancada, a pedra opõe resistência. Se a resistência for maior do que a força da pancada, ela exteriormente não apresentará mudança; no caso contrário se partirá em fragmentos menores que ela. A pedra nunca procura reagir de modo a defender-se contra a pancada e muito menos a tornar a dita pancada um fator que contribua para a própria continuidade de sua açao. Quanto à coisa viva, pode ser facilmente esmagada por uma força superior, mas jamais deixa de tentar converter as energias, que sobre ela atuam, em elementos favoráveis a sua existência ulterior. Se não o consegue, não se fragmenta em pedaços menores (pelo menos nas mais elevadas formas da vida), mas perde sua identidade como coisa viva. Durante toda a sua duração, ela esforça-se por tirar proveito das energias que a cercam. Utiliza-se da luz, do ar, da umidade e das matérias do solo. Dizer que as utiliza, importa em reconhecer que as transforma em meios para sua própria conservação. Enquanto se acha a crescer, a energia que despende para tirar vantagens do ambiente é mais que compensada pelo que obtém: ela cresce. Poderemos dizer que um ser vivo é aquele que domina e regula em benefício de sua atividade incessante as energias que de outro modo o destruiriam. A vida é um processo que se renova a si mesmo por intermédio da ação sobre o meio ambiente. Em todas as formas elevadas de vida este processo não pode continuar-se indefinidamente. Após algum tempo elas sucumbem: morrem. A criatura não é apta para o trabalho de uma indefinida auto-renovação. Mas a continuidade do processo da vida não depende da promulgação da existência de nenhum indivíduo. Prossegue, em incessante sequência,

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a reprodução de outras formas vivas. E apesar de morrerem não só os indivíduos, como também as espécies, consoante nos mostra a geologia, a vida persevera em formas cada vez mais complexas. Ao passo que se extinguem algumas espécies, surgem outras mais aptas a se utilizarem dos obstáculos contra os quais as extintas lutaram em vão. A continuidade da vida significa uma contínua readaptação do ambiente às necessidades dos organismos vivos. Falamos sobre a vida em sua significação menos elevada — como uma coisa física. Mas empregamos a mesma palavra para indicar toda a extensão da experiência do indivíduo e da espécie. Ao deparar-nos o livro Vida de Lincoln sabemos não se tratar de uma obra sobre fisiologia e sim de uma exposição dos antecedentes sociais de seu tempo, de uma descrição do meio de seus primeiros anos de vida, da condição e ocupações ct)e sua família; dos principais episódios do desenvolvimento de seu caráter; de lutas e realizações notáveis; e de suas esperanças, gostos, venturas e sofrimentos individuais. De modo exatamente semelhante reíerjmo-nos à vida de uma tribo selvagem, do povo ateniense, da nação americana. "Vida" subentende costumes, instituições, crenças, vitórias e derrotas, divertimentos e ocupações. Empregamos a palavra "experiência" com a mesma riqueza de sentido. E, a isto, assim como à vida em sua mera significação fisiológica, se aplica o princípio da continuidade por obra da renovação. Com o renovar da existência física, também se renovam, no caso de seres humanos, as crenças, ideais, esperanças, venturas, sofrimentos e hábitos. Assim se explica, com efeito, a continuidade de toda a experiência, por efeito da renovação do agrupamento social. A educação, em seu sentido mais lato, é o instrumento dessa continuidade social da vida. Todos os elementos constitutivos de um grupo social, tanto em uma cidade moderna como em uma tribo selvagem, nascem imaturos, inexperientes, sem saber falar, sem crenças, ideias ou ideais sociais. Passam com o tempo os indivíduos, passam, com eles, os depositários da experiência da vida de seu grupo, mas a vida do grupo continua. Os fatos primários e inelutáveis do nascimento e da morte de cada um dos componentes de um grupo social determinam a necessidade da educação. Por um lado, existe o contraste entre a imaturidade dos recém-nascidos membros do grupo — seus únicos futuros representantes — e a maturidade dos

membros adultos, que possuem os conhecimentos e seguem os costumes do referido grupo. Existe, por outro lado, a necessidade de que não somente sejam fisicamente conservados em número conveniente esses membros imaturos, como também de que se iniciem nos interesses, intuitos, conhecimentos, habilidades e costumes dos componentes adultos; e se assim não fosse, findaria a vida característica dá comunidade. Mesmo em uma tribo selvagem estão os seus membros imaturos muito longe de poder praticar os trabalhos dos adultos, se forem abandonados a si mesmos. Com o progresso da civilização aumenta a distância entre a capacidade originária do imaturo e os ideais e costumes dos mais velhos. Para reproduzir-se a vida do grupo já não bastam o simples crescimento físico e a consecução dos meios de subsistência. Requer-se esforço deliberado e árdua reflexão. Os seres que nasceram não só inscientes dos objetivos de seu grupo, como também completamente indiferentes a esse respeito, precisam conhecê-los e interessar-se ativamente pelos mesmos. A educação, e só a educação, suprime essa distância. A sociedade subsiste, tanto quanto a vida biológica, por um processo de transmissão. A transmissão efetua-se por meio da comunicação — dos mais velhos para os mais novos — dos hábitos de proceder, pensar e sentir. Sem esta comunicação de ideais, esperanças, expectativas, objetivos, opiniões, entre os membros da sociedade que estão a sair da vida do grupo, e os que na mesma estão a entrar, a vida social não persistiria. Se os membros adultos de uma sociedade vivessem indefinidamente, poderiam educar os novos membros mas seria uma tarefa inspirada mais pelo interesse pessoal do que pelas necessidades sociais. Como as coisas são, educar é uma questão de necessidade. Se uma epidemia suprimisse de uma vez todos os membros de uma sociedade, é claro que esta desapareceria para sempre. No entanto, sendo certa a morte de cada um de seus membros, é como se uma epidemia os matasse a todos; mas as diferenças de idade dos sobreviventes, o fato de alguns nascerem enquanto morrem outros, torna possível a constante reconstituição do organismo social por meio da transmissão das ideias e dos costumes. Tal renovação não é, contudo, automática. Se não nos esforçássemos para a efetuação completa da transmissão mais necessária, a maioria dos indivíduos da comunhão civilizada soçobraria na barbárie e em

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seguida no estado selvagem. De fato, os seres humanos novos são tão incapazes que, abandonados a si mesmos, sem a direção e o amparo dos mais velhos, nem mesmo adquiririam as habilidades rudimentares necessárias à existência material. Comparados com os filhos de muitos animais inferiores, os seres humanos têm tão minguadas aptidões, que a própria habilidade requerida para a alimentação física precisa ser adquirida por meio de ensino. Quanto mais no que diz respeito à aquisição das capacidades técnica, artística, científica e moral da humanidade!

Não é por viverem em proximidade material que as pessoas constituem uma sociedade — e, semelhantemente, homem algum deixa de ser socialmente influenciado por estar muitos palmos ou quilómetros distanciado dos outros. Um livro ou uma carta podem estabelecer, entre seres humanos afastados milhares de quilómetros um do outro, um elo mais estreito do que o existente entre pessoas sob o mesmo teto. Os indivíduos, também, não constituem, por outro lado, um agrupamento social por trabalharem todos para um fim comum. As partes de uma máquina funcionam em conjunto para a obtenção de um resultado comum, mas não formam por isso uma comunidade. Se, entretanto, todas essas partes tivessem conhecimento do fim comum e se interessassem na sua consecução, regulando, cada qual, com esse fito, sua atividade especial, constituiriam então uma comunidade. Isto, porém, envolveria comunicação. Cada qual precisaria saber o que as outras tinham em vista; e precisaria também ter meios de conservá-las informadas de seu próprio intento e do andamento de seus trabalhos. Para tal consenso se requer comunicação. Somos assim forçados a reconhecer que, mesmo dentro do grupo humano mais social, existem relações que não são ainda sociais. Grande número de relações em todos os grupos sociais ainda se encontram no plano das peças das máquinas. Os indivíduos utilizam-se uns dos outros para obter resultados desejados, sem atender às disposições emocionais e intelectuais e ao consentimento' daqueles de quem se servem. Este uso subentende a superioridade física, ou de posição, habilidade, aptidão técnica e o domínio mecânico ou financeiro da aparelhagem ou dos instrumentos de trabalho. Enquanto estiverem neste pé as relações entre pais e filhos, professores e alunos, patrões e empregados, governantes e governados, não formarão eles verdadeiro grupo social, por mais estreitamente que se toquem suas respectivas atividades. Dar e receber ordens modifica a atividade e seus efeitos, mas por si mesmo não constitui uma co-participação de escopos e comunicação de interesses. Não só a vida social se identifica com a comunicação de interesses, como também toda a comunicação (e, por conseguinte, toda a genuína vida social) é educativa. Receber a comunicação é adquirir experiência mais ampla e mais variada. Participa-se assim do que outrem pensou ou sentiu

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2. Educação e comunicação. — É em verdade tão óbvia a necessidade de ensinar a aprender para a continuação da existência social, que há de parecer estarmos a repisar desnecessariamente um lugar-comum. Justificamo-nos, porém, com a circunstância de que, com essa insistência, nos libertaremos de uma noção imprópria escolástica e formal da educação. As escolas são, com efeito, um meio importante de transmissão para formar a mentalidade dos imaturos; mas não passam de um meio •— e, comparadas a outros agentes, são um meio relativamente superficial. Somente quando nos capacitamos da necessidade de modos de ensinar mais fundamentais e eficazes é que podemos ficar certos de dar ao ensino escolar seu verdadeiro lugar. A sociedade não só continua a existir pela transmissão, pela comunicação, como também se pode perfeitamente dizer que ela é transmissão e ê comunicação. Há mais do que um nexo verbal entre os termos comum, comunidade e comunicação. Os homens vivem em comunidade em virtude das coisas que têm em comum; e a comunicação é o meio por que chegam a possuir coisas comuns. O que eles devem ter em comum para formar uma comunidade ou sociedade são os objetivos, as crenças, as aspirações, os conhecimentos — um modo comum de compreender — mentalidade similar, conforme dizem os sociólogos. Não se podem transmitir fisicamente tais coisas de uma a outra pessoa, do modo como se passam tijolos de mão em mão; não se podem dividir, como se parte um bolo em pedaços materiais. Para a comunicação assegurar a participação em uma compreensão comum, necessitará assegurar análogas disposições emotivas e intelectuais — isto é, modos análogos de reagir em face de uma atividade em perspectiva e dos meios de realizá-la.

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e, como resultado, se modificará um pouco ou muito a própria atitude. E deste efeito não fica também imune aquele que comunica. Tentai comunicar plena e cuidadosamente a outra pessoa vossa experiência pessoal, principalmente em se tratando de algo complicado, que notareis mudar-se vossa própria atitude para com a referida experiência: a não ser que tenhais recorrido a mera verbiagem bombástica. É mister, com efeito, que se formule a experiência para que seja comunicada. Esta formulação requer colocarmo-nos fora da mesma, vê-la como outra pessoa a veria, observarem-se os pontos de contacto que ela tenha com a experiência pessoal da pessoa a quem vai ser comunicada, a fim de ser apresentada em tal forma, que a dita pessoa lhe apreenda a significação. A não ser que se trate de lugares-comuns, precisamos conhecer, imaginando-a, a experiência de outras pessoas, para compreensivelmente lhe falarmos sobre nossa própria experiência. Toda a comunicação é semelhante à arte. Por consequência, pode-se perfeitamente dizer que, para aqueles que dela participam, toda a prática social que seja vitalmente social ou vitalmente compartilhada é por sua natureza educativa. Só quando lançada em um molde e tornada rotineira é que perde seu valor educativo. Em resumo •— não somente a vida social exige o ensino e o aprendizado para sua própria continuação, como também por si mesma é ela educativa. Amplia e ilumina a experiência ; estimula e enriquece a imaginação ; gera o sentimento da responsabilidade. obrigando-nos a falar e a pensar com cuidado e exatidão. Um homem que realmente vivesse só (mental ou fisicamente) poucas ou nenhumas ocasiões teria oara refletir sobre sua experiência passada ou para extrair-lhe a clara significação. A desigualdade de eficiência dos adultos e dos novos HPO só exige que se ensine a estes, como também a necessidade deste ensino ê um poderoso estímulo para dar à experiência ordem e forma que a torne mais facilmente transmissível e, conseguintemente, mais utilizável.

mas não é o motivo expresso da associação. Pode-se, entretanto, dizer, sem exagero, que a medida do valor de qualquer instituição social, económica, doméstica, política, legal e religiosa está em sua capacidade -de amplificar e ' aperfeiçoar a experiência, embora essa capacidade não faça parte de seu motivo originário, que era mais restrito' e mais imediatamente prático. As associações religiosas começaram, por exemplo, pelo desejo de garantir-se -o favor das potestades superiores e de preservar-se dos maus influxos; a vida familiar, pelo desejo de saciar apetites-e assegurar a perpetuidade da família; o trabalho sistemático, em sua maior parte, pela escravização a Doutras pessoas, etc. Só •lentamente foi notado o subproduto da instituição, seu efeito sobre a qualidade e a extensão da vida consciente e mais lentamente ainda este efeito foi considerado como elemento orientador do funcionamento da instituição. Mesmo hoje, em nossa vida industrial, exceto quanto a algum merecimento na formação de hábitos de diligência e de economia, pouca atenção é dada em todo o mundo às reações intelectuais e emocionais provocadas pelas fornias de associação por que se conduz o trabalho moderno, comparadas com a atenção merecida pela produção material. Mas, lidando-se com os mais novos, o fato associativo aumenta de importância como fato humano. Se é fácil ignorarmos, em nosso contacto com eles, o efeito de nossos atos sobre seu espírito, ou subordinar esse efeito educativo a algum resultado externo e tangível, já não o é tanto quanto ao se tratar com os adultos. É evidente a necessidade de educar; demasiado urgente a necessidade de efetuar uma mudança em sua atitude e seus hábitos para que se possa deixar de levar em conta as consequências. Desde que, em relação a eles, nosso fim primacial é habilitá-los a participar da vida em comum, não podemos deixar de examinar se estamos ou não criando as aptidões que garantirão esse resultado. Se a humanidade progrediu alguma coisa compreendendo que o verdadeiro valor de toda a instituição é seu efeito caracteristicamente humano — seu efeito sobre a experiência consciente — podemos acreditar que esta lição foi, em grande parte, aprendida ao contacto com os jovens. Somos assim levados a distinguir, dentro do vasto processo educacional que vimos considerando, uma espécie mais formal de educação — a do ensino direto ou escolar. Nos

3. O papel da educação formal. — Existe, portanto. diferença bem acentuada entre a educação que se granjeia a conviver com outras pessoas — enquanto verdadeiramente se convive, em vez de continuar-se apenas a viver juntos — e a educação intencional dos mais novos. No • primeiro caso a educação é casual; é natural e importante,

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grupos sociais não evoluídos encontramos muito pouco ensino e adestramento formais. Para incutir nos mais novos as disposições necessárias, os povos selvagens contam principalmente com os mesmos tipos de associação capazes de manter os adultos fiéis à sua agremiação. Não usam artifícios especiais, ou materiais, ou institutos de ensino, a não ser os que se prendem às cerimónias de iniciação por meio das quais os jovens se tornam plenamente membros da comunidade. Em quase tudo eles contam com que os pequenos aprendam os costumes dos adultos, adquirindo seu potencial de emoções e seu lastro de idéras, participando daquilo que os mais velhos fazem. Esta participação é, em parte, direta, associando-se às ocupações dos adultos, o que lhes serve de aprendizado, e é, em parte, indireta, por meio dos brinquedos — dramatizações em que os meninos imitam os atos dos mais velhos, aprendendo assim a saber o que significam. Pareceria absurdo aos selvagens reservarem algum lugar onde se cuidasse unicamente de ensinar e aprender. Mas, à medida que a civilização progride, aumenta a diferença entre a capacidade dos mais novos e os interesses dos adultos. Torna-se cada vez mais difícil aprender tomando parte direta na atividade dos mais velhos, salvo no caso de ocupações muito elementares. Muito daquilo que os adultos fazem torna-se-lhes tão remoto em significação, que os brinquedos-dramatízações se mostram cada vez mais inadequados para reproduzir-lhes o sentido. A aptidão para participar eficazmente .da atividade dos adultos dependerá, por isso, de uma preparação anterior, na qual se tenha em vista esse fim. Surgem então os fatores especiais — as escolas — e a matéria determinada — os estudos. A tarefa de ensinar certas coisas é cometida a um número especial de pessoas. Sem essa educação formal é impossível a transmissão de todos os recursos e conquistas de uma sociedade complexa. Ela abre, além disso, caminho a uma espécie de experiência que não seria acessível aos mais novos? se estes tivessem de aprender associando-se livremente com outras pessoas, desde que livros e símbolos do conhecimento têm que ser aprendidos. Mas há grandes perigos nesta transição da educação indireta à formal. Tomar parte em atos reais, quer diretamente, quer simuladamente nos jogos, é coisa, pelo menos, pessoal e interessante. Estas qualidades compensam, até certo ponto, a escassez de oportunidades aproveitáveis. A educação

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formal, ao contrário, se torna facilmente coisa distante e morta —• abstrata e livresca, para empregarmos as palavras pejorativas habituais. Os conhecimentos acumulados das sociedades inferiores são, pelo menos, postos em prática; tornaramse-lhes feições características; existem com a profundidade de significação que se prende a seu emprego nas urgentes necessidades de cada dia. Mas, em uma cultura adiantada, muito do que se tem, de aprender se encontra armazenado em símbolos. Achamonos longe, então, de sua aplicação a atos e objetos. Esse material é relativamente técnico e superficial. Tomando como craveira o tipo ordinário da realidade, é artificial também. Pois a verdadeira craveira de valor é a conexão com os interesses práticos. Existem em um mundo à parte, não assimilado aos modos ordinários de reflexão e realização. O perigo permanente, portanto, é que o cabedal da instrução formal se torne exclusivamente a matéria do ensino nas escolas, isolado das coisas de nossa experiência, na vida prática. Podem, assim, perder-se de vista os interesses permanentes da sociedade. A preeminência é dada, nas escolas, exatamente a conhecimentos que não são aplicados à estrutura da vida social e ficam em grande parte como matéria de informação técnica expressa em símbolos. Por esta forma chegamos à noção ordinária de educação: a noção que ignora sua necessidade social e sua identificação com toda a associação humana que influa na vida consciente e que a identifica, ao contrário, com a aquisição de conhecimentos sobre matérias de interesse remoto e com a transmissão do saber por meio de sinais verbais: a aquisição de letras. Por essa razão, um dos mais ponderosos problemas com que a filosofia da educação tem de arcar é o modo de conservar conveniente equilíbrio entre os métodos de educação não formais e os formais, e entre os casuais e os intencionais. Quando a aquisição de conhecimentos e a aptidão intelectual técnica não influem para criar uma atitude mental social, a experiência vital ordinária deixa de ganhar maior significação, ao passo que, na mesma proporção, o ensino escolar cria homens meramente "eruditos", isto é, especialistas egoístas. Evitar uma separação entre aquilo que os homens sabem conscientemente por tê-lo aprendido por meio de uma educação especial, e aquilo que inconscientemente sabem por tê-lo absorvido na formação de seu caráter mediante suas ré-

Democracia e educação lações com outros homens, torna-se tarefa cada vez mais melindrosa à proporção que se desenvolve, especializadamente, o ensino. Resumo. — É da própria essência da vida a luta para se continuar a viver. Uma vez que esta continuação só pode ser assegurada por meio de constante renovação, é a vida um processo de auto r e novação. A educação é para a vida social aquilo que a nutrição e a reprodução são para a vida fisiológica. A educação consiste primariamente na .transmissão por meio da comunicação. A comunicação é o processo da participação da .experiência para que se torne património comum. Ela modifica a disposição mental das duas partes associadas. Fato que mais facilmente se reconhece em se tratando com os imaturos, é que a importância de todos os modos de agremiação humana está na proporção com que ela contribui para a melhoria da qualidade da experiência. É o mesmo que dizer-se qxie, embora toda a organização social produza efeito educativo, esse efeito começa a tornar-se parte importante dos fins sociais, quando se tem em vista a associação dos elementos mais velhos com os mais novos. À proporção que a sociedade se torna mais complexa em estrutura e recursos, aumenta a necessidade do ensino e aprendizado formais ou intencionais. E quando progridem o ensino e aprendizado formais, surge o perigo de criar-se indesejável separação entre a experiência adquirida em associações mais diretas e a adquirida nas escolas. Este perigo nunca foi maior do que nos tempos atuais, em vista do rápido desenvolvimento, nos últimos poucos séculos, dos conhecimentos e espécies de aptidões técnicas.

CAPITULO 2

A educação como função social 1. Natureza e significação do meio. — Já vimos que uma comunidade ou grupo social se mantém por uma contínua auto-renovação e que esta renovação se eíetua por meio do crescimento educativo dos componentes imaturos do grupo. Mediante vários fatores não intencionais ou voluntários, uma sociedade transforma seus elementos não iniciados e aparentemente estranhos em ativos depositários de seus recursos e ideais. A educação é, portanto, uma incentivação, um alimento, um cultivo. Todas essas palavras subentendem atenção a condições de crescimento. Como sinónimas de educar, costumamos empregar em inglês palavras que significam elevar, exprimindo-se assim a diferença de nível a que a educação visa suprimir. Etimologicamente, a palavra educação significa exatamente processo de dirigir, de conduzir ou de elevar. Se tivermos em mente o resultado desse processo, diremos que a educação é uma atividade formadora ou modeladora •— isto é, modela os seres na forma desejada de atividade social. Neste capitulo trataremos em linhas gerais do modo pelo qual um grupo social conduz os imaturos à sua própria forma social. Uma vez que o que se requer para isso é a transformação da qualidade da experiência, para que nesta entrem os interesses, intuitos e ideias correntes no grupo social, o problema não é,evidentemente, o da mera formação física. As coisas podem ser materialmente transportadas no espaço; podem ser materialmente carregadas. Mas as crenças e as aspirações não podem ser fisicamente extraídas e, depois, inseridas. De que modo, então, se comunicam? Dada a impossibilidade do contágio direto ou da inserção material, nosso problema está em descobrir o método pelo qual os seres humanos mais jovens assimilam os pontos de vista dos mais velhos, ou pelo qual os mais velhos tornam os jovens mentalmente semelhantes a eles.

Democracia e educação

A educação como função social

Em termos gerais o método consiste em provocar, pela ação do meio, que as impõe, determinadas reações ou respostas. As crenças necessárias não podem ser embutidas a força e as atitudes requeridas não podem ser plasmadas materialmente. Mas o meio, o ambiente particular em que o indivíduo vive, leva-o a ver e a sentir mais uma coisa do que outra; leva-o a seguir certos planos com o fito de ter bom êxito em suas relações com os outros; reforça-lhe algumas convicções e enfraquece-lhe outras, como condição para obter a aprovação de outras pessoas. Deste modo, põe-se a adotar gradati vãmente certo modo de proceder, certas disposições mentais para a ação. As palavras "ambiente" e "meio" denotam alguma coisa mais do que o lugar em que o indivíduo se encontra. Indicam a particular continuidade entre o meio e as próprias tendências ativas do indivíduo. Um ser inanimado acha-se naturalmente em estado de continuidade com o seu meio; mas as coisas que o cercam, a não ser metaforicamente, não lhe constituem um ambiente, por isso que aos seres inorgânicos não importam as influências que os afetani. Ao contrário, certas coisas afastadas, no espaço e no tempo, de uma criatura viva, especialmente de uma criatura humana, podem constitui r-lhe com mais verdade o meio, do que as que estão contíguas. As coisas pelas quais um homem varia é que constituem seu verdadeiro ambiente. A atividade de um astrónomo varia em relação com as estrelas que observa ou a cujo respeito faz cálculos. De tudo aquilo que o cerca, pois, é o seu telescópio o seu meio mais chegado. O ambiente de um antiquário, em sua qualidade de antiquário, consiste nas remotas épocas da vida humana que o interessam e nos vestígios, inscrições, etc., por meio dos quais ele estabelece conexões com aquela época. Em suma — o meio ambiente consiste naquelas condições que desenvolvem ou embaraçam, estimulam ou inibem, a atividade característica de um ser vivo. A água é o ambiente do peíxe, por ser necessária à sua atividade — à sua vida. O pólo norte é um elemento importante do meio de um explorador ártico, quer consiga ou não consiga atingi-lo, porque determina seus atos, torna-os aquilo que distintamente são. Exalamente porque vida não significa mera existência passiva (a supor-se possível tal coisa) e sim um modo de proceder e agir, — o ambiente ou o meio significa aquilo que influi nessa atividade como condição para que se realize ou se iniba.

2. O ambiente social. — Um ser cuja atividade se acha associada à de outros tem um ambiente social. O que ele faz e pode fazer depende dos desejos, exigências, aprovação e reprovação dos outros. Um ser ligado a outros seres não pode desenvolver a própria atividade sem tomar em linha de conta a atividade dos outros. Esta constitui a condição indispensável para a realização de suas tendências. Quando se move, ele movimenta essa atividade alheia e vice-versa. Conceber a possibilidade da atividade de um indivíduo como consistindo em atos isolados seria o mesmo que tentar fazer ideia de um comerciante a comprar e a vender, isolado dos demais homens. É tão social o procedimento do industrial quando se encontra só, em seu escritório, a traçar planos de ação, como quando compra matérias-primas ou vende seus artigos fabricados. Pensar e sentir desde que tenham qualquer coisa a ver com ação associada à ação de outros é modo de proceder tão social quanto á cooperação mais manifesta ou o ato mais hostil. • O que precisamos mais detidamente patentear é o modo pelo qual o meio social desenvolve seus membros imaturos. Não há grande dificuldade em ver-se como ele modela os hábitos exteriores de ação. Até os cães e os cavalos têm seus atos modificados pelo contacto com os seres humanos; eles adquirem hábitos diferentes porque aos seres humanos interessa a referida mudança. Os seres humanos regulam os atos dos animais, regulando os estímulos naturais que os influenciam; por outras palavras — criando-lhes determinado meio. Usam-se o alimento, o freio e as rédeas, os sons e os veículos, para regular o modo por que se manifestam as reações naturais ou instintivas dos cavalgs. Agindo-se com firmeza para se provocarem certos atos, geram-se hábitos que se manifestam com uniformidade igual ã dos estímulos que os originam. Se pusermos um rato em um labirinto, de sorte a só encontrar alimento se der certo número de voltas em determinado sentido, seus atos se modificam gradualmente até que, pelo hábito, em se achando com fome, procede daquela forma, de preferência a qualquer outra. A atividade humana modifica-se de análoga maneira. Uma criança que se queimou teme o fogo; se um pai preparasse as coisas de modo que a criança se queimasse cada vez que tocasse em determinado brinquedo, essa criança aprenderia a evitar esse brinquedo tão automaticamente como evitaria o

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fogo. Estamos, todavia, a tratar do que se pode chamar adestramento, treino, para se distinguir do ensino educativo. As mudanças consideradas o são mais de atos exteriores do que de disposição mental ou emocional. A distinção não é, contudo, muito grande. No espírito da criança pode gerar-se violenta aversão não só por aquele brinquedo, senão também pelas espécies de brinquedos que se lhe assemelhem. A aversão poderá persistir mesmo depois de esquecidas as primitivas queimaduras; ulteriormente poderá chegar mesmo a inventar alguma razão para explicar essa aversão aparentemente desrazoável. Em alguns casos, pois, a modificação dos hábitos exteriores do proceder, por meio de mudança do ambiente, que altere^ os estímulos da ação, também modifica a atitude mental correspondente a essa ação. Isto, entretanto, não acontece sempre; uma pessoa exercitada a desviar-se de um golpe, desvia-se automaticamente sem qualquer correspondente pensamento ou emoção. Precisamos, por isso, descobrir alguma diterença essencial entre o adestramento e a educação. Podemos encontrar um fio condutor na circunstância de que o cavalo não participa verdadeiramente da utilidade social a que a sua atividade é destinada. Algumas pessoas podem habituar o cavalo a praticar atos que são vantajosos a elas, tornando vantajosa, também para o cavalo, a prática dos referidos atos fazendo-o ganhar o alimento, etc. Mas para o cavalo, presumivelmente, não há outro interesse além deste. Aquilo que o interessa é apenas o alimento e não o serviço que está prestando. Não é % um companheiro em. uma atividade associada. Se o fosse, ele.se empenharia na ação comum com os mesmos interesses dos homens. Compartiria, também, das suas ideias e emoções. Ora, em muitos casos — muitíssimos — a atividade do ser humano imaturo é simplesmente provocada para a aquisição de hábitos úteis. É mais adestrado como um animal do que educado como um ser humano. Seus instintos ficam presos aos objetos que lhe originaram a dor ou o prazer. Mas, para ser feliz ou evitar o desgosto do malogro, ele deve proceder de modo agradável aos outros. Em outros casos, porém, participa realmente da atividade comum. Modifica-se então seu impulso originário. Não somente procede de um modo que se harmoniza com a ação dos companheiros, como também, procedendo assim, se despertam nele as mesmas ideias e emoções que animam aqueles. Suponhamos que seja guerreira uma tribo. Os fins a que ela visa com seus esforços, as

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realizações a que dá maior importância, são os que se relacionam com a luta e com a vitória. A existência neste meio incentiva as manifestações belicosas do menino, a princípio nos jogos e, mais tarde, sendo bastante forte, em façanhas verdadeiras. Quando luta, recebe aplausos e sobe no conceito geral; caso se abstenha, é detestado, ridicularizado, cai no desfavor de todos. Não admira, portanto, que suas originárias tendências e emoções belicosas se fortifiquem à custa das outras e que suas ideias se voltem para coisas relacionadas com a guerra. Só assim ele é perfeitamente reconhecido como um membro de seu grupo. Desta maneira seus hábitos mentais se tornaram gr a dati vãmente semelhantes aos de seu grupo. Se formularmos o princípio envolvido neste exemplo, notaremos que o meio social não implanta diretamente certos desejos e ideias, nem se limita a .estabelecer meros hábitos musculares de ação, como o ato "instintivo" de desviar-se de um golpe. O primeiro passo consiste em estabelecer condições que estimulem certos modos patentes e tangíveis de proceder; e o passo complementar é tornar de tal modo o indivíduo participante ou companheiro na atividade comum que ele sinta, como seus próprios, os triunfos e os maus êxitos da mesma. Desde que esteja possuído da atitude emociona-l do grupo, terá sempre o cuidado de procurar conhecer os fins especiais a que o referido grupo aspira e os meios necessários para garantir o triunfo. Por outras palavras — suas crenças e ideais assumirão natureza análoga à dos demais de sua agremiação. E ele assimilará o cabedal de conhecimentos desta, uma vez que conhecê-los contribui para o exercício da sua atividade habitual. A importância da linguagem para a aquisição de conhecimentos é, sem dúvida alguma, a causa principal da noção comum de que b conhecimento se pode transmitir diretamente de uma a outra pessoa. Figura-se-nos quase que, introduzir uma ideia no espírito de alguém, seja como fazer um som ferir os seus ouvidos. Desta maneira, a comunicação do pensamento se assemelharia a um processo puramente físico. Mas se analisarmos o modo de aprender a linguagem, veremos que ele confirma o princípio já estabelecido. Provavelmente se admitiria, com pouca hesitação, que uma criança aprende, por exemplo, a ideia de chapéu, usando-o da forma por que as outras pessoas o fazem: cobrindo com ele a cabeça, dando-o a outras pessoas para o porem, vendo que, quando vai

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sair, outros o põem na sua própria cabeça, etc. Todavia, poder-se-á perguntar de que maneira esse princípio da atividade partilhada se pode aplicar à apreensão, por exemplo, por meio da palavra falada ou escrita, da ideia de um capacete grego, caso em que não se verifica nenhum uso direto. Que atividade compartida existirá no aprender-se em livros a história da descoberta da América? Uma vez que a linguagem tende a tornar-se o principal meio de aprenderem-se muitas coisas, vejamos o modo por que ela atinge este resultado. A criança, naturalmente, começa ouvindo simples sons, ruídos e modulações sem qualquer significação, isto é, sem exprimir para ela ideia alguma. Os sons são precisamente uma espécie de estímulo para produzir-se reação imediata; alguns têm efeito tranquilizador, outros tendem a fazer ficar alerta, e assim por diante. Os sons da .palavra chapéu ficariam completamente sem sentido, pareceriam ruídos inarticulados, se não fossem proferidos quando associados a um ato de que se participa com alguma outra pessoa. Quando a mãe vai levar a criança a passeio, fala "chapéu" enquanto põe alguma coisa na cabeça do pequeno. Ser levado a passeio torna-se um interesse para este; não só a mãe e o filho saem materialmente a passeio, como se interessam ambos por esta saída, deleitam-se juntamente com ela. Por essa associação com outros fatores em açãot os sons de "chapéu" tomam logo para a criança a mesma significação que têm para os pais; tornam-se um símbolo da atividade em que ela toma parte. O simples fato de, que a linguagem consiste em sons mutuamente inteligíveis basta para mostrar que sua significação exige que haja uma experiência compartilhada. Em suma — os sons do vocábulo '"chapéu" adquirem sentido do mesmo modo que o adquire o objeto "chapéu", por serem usados em determinadas situações. E tomam a mesma significação para a criança e para o adulto por, serem usados por ambos em um ato comum. A garantia para a igualdade de uso está na circunstância de que a coisa e os sons foram primeiro empregados em uma atividade conjunta, como um meio de estabelecer conexão operante entre a criança e o adulto. As ideias ou significações se tornam semelhantes por se acharem os dois associados em uma ação na qual o que um faz depende do que o outro faz e influi na ação deste. Se dois selvagens estivessem a caçar juntos e certo aviso significasse para o que o fizesse: ''Fique do lado

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direito" e para o que o ouvisse: "Fique do lado esquerdo", é claro que não lhes seria possível a caçada em comum. Compreenderem-se duas pessoas significa que as coisas, inclusive os sons, têm para ambas o mesmo valor, ao se dedicarem a uma empresa comum. Depois que os sons adquiriram significação pela sua conexão com outras coisas empregadas em uma atividade comum, podem ser utilizados em combinação com outros sons similares para produzirem novas significações, exatamente como se associam as coisas que eles representam. Desta fornia, por exemplo, as palavras que fizeram a criança saber o que é um capacete grego adquiriram originariamente uma significação (ou foram compreendidas) pelo uso em um ato de interesse e finalidade comuns. Elas agora assumem novo sentido incitando, àqueles que as ouvem ou lêem, a evocar mentalmente a espécie de atividade em que se usa o capacete. Quem compreende as palavras "capacete grego" torna-se, nesse momento, em imaginação, partícipe da ação daqueles que usaram o capacete. Mentalmente se associa a uma ação comum. Não é fácil, por isso mesmo, apreender a plena significação das palavras. A maioria das pessoas provavelmente se satisfaz com a ideia de que "capacete" indica uma espécie esquisita de ornato que os gregos usavam na cabeça. Pode-se, pois, concluir pelo exposto que o uso da linguagem para transmitir e adquirir ideias é uma extensão e aperfeiçoamento do princípio de que as coisas adquirem significação quando usadas em uma experiência partilhada ou em uma ação conjunta; de modo algum a aplicação da linguagem contravém àquele princípio. Quando as palavras não ^nti^m como fatores em uma ação compartilhada •— quer real, quer imaginariamente •— elas obram como puros estímulos físicos, não tendo significação ou valor intelectuais. Fazem a atividade correr em um dado leito, mas desacompanhada de intenção ou significação consciente. Por exemplo, o sinal aritmético "mais" pode ser um estímulo para o ato de escrever um número debaixo de outro e de somá-los, mas a pessoa que pratica este ato procederá como um autómato se não perceber o sentido daquilo que se acha a fazer. 3. O meio social como fator educativo, — O que resulta, em suma, de tudo isto, é que o meio social cria as atitudes mental e emocional do procedimento dos indivíduos,

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fazendo-os entregar-se a atividades que despertam e vigorizam determinados impulsos, que têm determinados óbjetivos e acarretam determinadas consequências. Uma criança vivendo no seio de uma família de músicos terá inevitavelmente estimuladas, por menores que elas sejam, as suas aptidões musicais, e as terá mais estimuladas, relativamente, do que outros impulsos que poderiam despertar em diverso ambiente. Com efeito, se não tomar interesse pela música e não adquirir nessa arte alguma competência, será como um elemento estranho, inábil para participar da vida do grupo a que pertence. É, realmente, inevitável alguma participação na vida daqueles com quem o indivíduo se acha em contacto; por essa participação o ambiente social exerce um influxo educativo ou formativo, independentemente de qualquer propósito intencional. Nas sociedades selvagens e bárbaras essa participação direta (que constitui a educação indireta ou casual a que nos referimos) é, quase que só ela, a influência que inicia os pequenos nos costumes e nas crenças de seu grupo. E mesmo nas sociedades atuais é ela que fornece o alimento fundamental ainda aos jovens que mais longamente recebem educação escolar. De acordo com os interesses e as ocupações do grupo, algumas coisas tornam-se objeto de grande estima; outras, de aversão. A associação não cria os impulsos de predileção e desagrado mas proporciona os objetos a que eles se aplicam. O modo por que nosso grupo ou classe faz as coisas tende a determinar quais os objetos que necessitam de atenção e a traçar assim as direções e limites da observação e da memória. Aquilo que é estranho ou exótico (isto é, alheio à atividade do grupo) propende a ser moralmente proibido e intelectualmente suspeito. Parece-nos, por exemplo, quase incrível que as coisas que hoje conhecemos perfeitamente tenham sido ignoradas nos séculos passados. Inclinamo-nos a explicar isto atribuindo estupidez inata a nossos precursores e presumindo, quanto a nós, termos inteligência inata superior. Mas a explicação real é que seu modo de vida não lhes reclamava a atenção para tais fatos, conservando-lhes os espíritos acorrentados a outras coisas. Exatamente como os sentidos requerem objetos sensíveis para estimulá-los, nossas faculdades de observar, recordar e imaginar não funcionam espontaneamente, mas são movidas pelas exigências impostas pelas ocupações sociais habituais, A urdidura essencial de

nossa disposição de espírito é formada, independentemente dos cursos escolares, pelas referidas influências. O que o ensino consciente e deliberado pode fazer é, no máximo, libertar as aptidões assim formadas para um mais amplo desenvolvimento, purgá-las de algumas de suas rudezas e fornecer objetos que tornem sua atividade mais rica de significação. Uma vez que este "inconsciente influxo do ambiente" .é tão sutil e penetrante que impregna todas as fibras do caráter e do espírito, pode valer a pena especificar algumas direções em que mais se lhe acentua o efeito. Primeiramente, os hábitos da linguagem. Os modos essenciais de falar, a abundância do vocabulário, formam-se nas relações ordinárias da vida e se desenvolvem — não como um meio de instrução mas como uma necessidade social. O infante aprende, como bem o dizemos, a língua m&terna. Os hábitos de linguagem assim contraídos podem ser corrigidos, ou mesmo suprimidos pelo ensino consciente; mesmo assim, em momentos de exaltação desaparecem muita vez os modos de falar intencionalmente aprendidos e as pessoas retomam sua verdadeira linguagem primitiva. Em segundo lugar, as maneiras. Os exemplos valem evidentemente mais que as regras. Adquirimos boas maneiras, segundo dizemos, com a boa criação, ou antes, são elas a boa criação; e esta é adquirida pelos atos habituais, como reaçoes a estímulos habituais, e não como conhecimentos transmitidos. Apesar do processo indefinido da correção e instrução conscientes, o meio e a mentalidade ambientes são, afinal de contas, o principal agente para a aquisição de boas maneiras. E as maneiras não passam de uma moral de menor importância. E mesmo na verdadeira moral, a instrução consciente só- terá possibilidade de eficácia na medida em que se harmonizar com o procedimento daqueles que constituem o ambiente social da criança. Em terceiro lugar, o bom gosto e a apreciação estética. Se o olhar for constantemente alegrado por objetos harmoniosos, graciosos de forma e cor, desenvolve-se naturalmente o sentimento do bom gosto. O efeito de um meio tosco, de quinquilharias, desordenado e superenfeitado, produz a depravação do gosto, bem como o viver-se em meios pobres e estéreis aniquila o amor ao belo. Nessas circunstâncias desfavoráveis o ensino consciente mal pode fazer qualquer coisa além de ministrar conhecimentos por assim dizer de segunda mão, que constituem o modo de pensar de outras pessoas. O bom gosto não se gera esponta-

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neo como um predicado pessoal, mas é uma lembrança elaborada das coisas que ensinamos alguém a ter em mais apreço. Dizer que as mais fundamentais craveiras da apreciação dos valores são forjadas pelas situações em que uma pessoa habitualmente se encontra, será menos um quarto ponto a mencionar do que a fusão dos três anteriormente referidos. Raras vezes reconhecemos em que extensão as ideias conscientes que temos do valor de algumas coisas e do desvalor de outras são devidas a padrões mentais de cuja existência absolutamente não temos consciência. Mas pode-se generalizar dizendo-se que as coisas que aceitamos como certas sem exame ou reflexão são precisamente as que determinam nosso pensamento consciente e nossas conclusões. E estes hábitos que assim jazem abaixo do plano da reflexão são justamente os que se formaram no incessante dar e receber de nossas relações com outras pessoas.

ordinária. Conservam-se assim as -realizações' conseguidas pelas gerações anteriores, mesmo que algumas delas estejam desde algum tempo em desuso. Por conseguinte, uma vez que urna comunidade depende em considerável extensão de coisas jacentes além de seu próprio território e de sua geração atual, precisa contar com a ação definida das escolas para assegurar uma conveniente transmissão de todos os seus recursos. Num claro exemplo: A vida dos antigos gregos e romanos influencia profundamente a nossa e, apesar disso, o modo por que nos influencia não se patenteia na superfície de nossos atos habituais. Analogamente, povos ainda existentes, mas afastados no espaço, os ingleses, os alemães, os italianos, interessam diretamente nossa atividade social, mas a natureza do mútuo influxo não pode ser compreendida sem exposição e atenção particulares. Semelhantemente, não podemos confiar em nosso trato diário para patentear aos mais novos o papel desempenhado em nossas espécies de atividade pelas remotas energias físicas e pelas subestruturas invisíveis. Daí o fato de instituir-se um modo particular de intercâmbio social — a escola — para tratar dessas matérias. Comparada com as associações ordinárias da vida, notam-se nesta espécie de associação três funções suficientemente especiais. Primeira —• uma civilização complexa não pode ser assimilada in totó. Cumpre, por assim dizer, fragmentá-la em vários pedaços e fazê-la assimilar aos poucos, de modo gradativo. Tão numerosas e entrelaçadas são as funções de nossa presente vida social, que uma criança, colocada na posição mais favorável, não poderia prontamente participar de muitas das mais importantes dentre elas. Não co-participando das mesmas, não lhes apreenderia a significação e elas não se tornariam parte de sua estrutura mental. Não se veriam as árvores por causa da floresta. Os negócios, a política, a arte, a ciência, a religião lhe reclamariam, a um tempo, a atenção em alarida tal, que, como resultado, só se teria a confusão. A primeira função do órgão social que denominamos escola é proporcionar um ambiente simplificado, Selecionando os aspectos mais fundamentais, e que sejam capazes de despertar reações da parte dos jovens, estabelece a escola, em seguida, uma progressão, utiíizando-se dos elementos adquiridos em primeiro lugar como meio de conduzi-los ao sentido e compreensão real das coisas mais complexas.

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4. A escola como ambiente especial. — A principal importância da exposição precedente sobre o processo educativo que prossegue involuntariamente, é levar-nos a notar que o único processo de influírem os adultos sobre a espécie de educação que o imaturo recebe é o de influírem sobre o meio em que eles agem e, portanto, pensam e sentem. Jamais educamos diretamente e, sim, indiretamente, por intermédio do ambiente. Grande diferença existirá em permitirmos a ação casual do meio e em escolhermos intencionalmente o meio para o mesmo fim. E será casual a influência educativa de qualquer meio, a menos que de caso pensado não o regulemos para a obtenção de um efeito educativo. A diferença entre um lar inteligente e outro ininteligente está principalmente em que os hábitos de vida e a convivência daquele são escolhidos, ou, pelo menos, impregnados da ideia de seu influxo sobre o desenvolvimento das crianças. As escolas, todavia, continuam sendo o exemplo típico do meio especialmente preparado para influir na direção mental e moral dos que as frequentam. De modo geral, elas começam a existir quando as tradições sociais são tão complexas que parte considerável do acervo social é confiada à escrita e transmitida por meio de símbolos escritos. Ora, os símbolos escritos são ainda mais artificiais ou convencionais do que os falados; não podem ser aprendidos nas relações casuais com outras pessoas. Demais disto, a linguagem escrita tende a selecionar e registrar matérias que são relativamente estranhas à nossa existência

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Em segundo lugar, é tarefa do meio escolar eliminar o mais possível os aspectos desvantajosos do ambiente comum, que exercem influência sobre os hábitos mentais. Cria um ambiente purificado para a ação, A seleção, aqui, não só aspira a simplificá-lo, como também a depurá-lo dos fatores indesejáveis. Toda a sociedade vive atravancada, comumente, com a galharia seca do passado e com outras coisas verdadeiramente perniciosas. É dever da escola omitjr tais coisas no ambiente que proporciona, e deste modo fazer com que se neutralize sua influência no âmbito social comum. Escolhendo o melhor para usá-lo, exclusivamente, ela se empenha em reforçar o poder deste melhor. À proporção que uma sociedade se torna mais esclarecida, ela compreende que importa não transmitir e conservar todas as suas realizações, e sim unicamente as que importam para uma sociedade futura mais perfeita. A escola é seu principal fátor para a consecução deste fim. Em terceiro lugar, compete ao meio escolar contrabalançar os vários elementos do ambiente social e ter em vista dar a cada indivíduo oportunidade para fugir às limitações do grupo social em que nasceu, entrando em contacto vital com um ambiente mais amplo. Palavras como "sociedade" e "comunidade" são próprias a falsear-nos os juízos, pois tendem a fazer-nos pensar que existe uma coisa única, correspondente a uma palavra única. O ° fato é que a sociedade moderna se compõe de muitas sociedades mais ou menos frouxamente entrosadas entre si. Cada lar com seus amigos mais íntimos constitui uma sociedade; a aldeia ou o grupo de meninos que joga, em comum, numa rua é uma comunidade; cada grupo do mundo dos negócios e cada clube são outras. Além destes grupos de natureza mais privada, há em um país como o nosso várias raças, seitas religiosas e «divisões económicas. No interior de uma cidade moderna, malgrado sua nominal unidade política, existem provavelmente mais comunidades e diversidades de costumes, tradições, aspirações e espécies de governo ou de influência do que existiram em todo um continente em uma era remota. Cada um desses grupos exerce influxo formador nas disposições ativas de seus componentes. Um corrilho, um clube, uma quadrilha de ladrões, os presos de um cárcere, fornecem meios educativos para aqueles que participam de sua atividade coletiva ou conjunta, com força igual à de uma

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igreja, de uma cooperativa de trabalhadores, de uma sociedade industrial ou comercial, ou de um partido político. Cada um deles é tão verdadeiramente uma espécie de vida associada ou em comum como uma família, uma cidade ou um país. Existem também comunhões cujos membros têm pouco ou nenhum contacto uns com'os outros, como o mundo dos' artistas, a república das letras, os membros de uma douta classe profissional espalhados pelo mundo inteiro. Mas eles têm objetivos comuns, e a atividade de cada um dos membros é diretamente modificada pelo conhecimento daquilo que os outros fazem. Nos antigos tempos a diversidade de grupos era questão principalmente geográfica. Existiam muitas sociedades mas, cada qual, em seu próprio território, era relativamente homogénea. Mas com o incremento do comércio, dos meios de transporte, da intercomunicação e da emigração, países como os Estados Unidos são compostos de uma combinação de diferentes grupos com diferentes costumes tradicionais. Foi esta situação, talvez, mais do que qualquer outra causa, que acarretou a exigência de institutos educativos que fornecessem uma coisa semelhante a um ambiente homogéneo e bem equilibrado para as pessoas mais jovens. Só por este meio poderiam ser contrabalançadas as forças centrífugas geradas pela justaposição de diferentes grupos dentro de uma mesma . unidade política. A convivência, na escola, de j ovens de diversas raças e religiões, e de costumes dessemelhantes, proporciona a todos um meio novo e mais vasto. Os estudos comuns acostumam a todos, por igual, a um descortino de horizontes mais amplos do que os visíveis aos membros de qualquer grupo, quando este se encontra isolado. A força assimilado r a das escolas públicas americanas é eloquente testemunho da eficácia de um interesse comum e bem dosado. Á escola tem igualmente a função de coordenar, na vida mental de cada indivíduo, as diversas influências dos vários meios sociais em que ele vive. Um código prevalece na família; outro, nas ruas; um terceiro, nas oficinas ou nas lojas; um quarto, nos meios religiosos. Quando uma pessoa passa de um desses ambientes para outro, fica sujeita a impulsos contraditórios e acha-se em risco de desdobrar-se em personalidades com diversos padrões de julgar e sentir, conforme as várias ocasiões. Este risco impõe à escola uma função fortalecedora e integradora.

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Resumo. — Não se pode efetuar pela transmissão díreta de convicções, emoções e conhecimentos, o desenvolvimento, nos seres mais novos, das atitudes e estados mentais necessários à contínua e progressiva vida de uma sociedade. Ela efetua-se por intermédio do meio. O meio consiste na soma total das condições necessárias para a realização das atívidades características de um ser vivo. O meio social consiste em todas as atividades de seres semelhantes intimamente associados para a realização de seus fins comuns. Ele é. verdadeiramente educativo em seus efeitos, na medida em que o indivíduo participa de alguma atividade conjunta. Contribuindo com sua parte na atividade associada, o indivíduo adota os fins que a estimulam, familiariza-se com seus métodos e materiais, adquire a necessária habilidade e impregna-se de seu modo de sentir. A formação espiritual mais profunda e mais sólida se origina, sem intuito consciente, da co-participação, por parte dos elementos sociais mais novos, da atividadfe dos vários grupos a que possa pertencer. Todavia, ao tornar-se a sociedade mais complexa, cumpre proporcionar um ambiente social especial ^ que se dedique especialmente a desenvolver as. aptidões dos imaturos. Três das mais importantes funções deste meio especial são as seguintes: simplificar e coordenar os fatores da mentalidade que se pretenda desenvolver; purificar e idealizar os costumes sociais existentes; criar um meio mais vasto e melhor equilibrado do que aquele pelo qual os imaturos, abandonados a si mesmos, seriam provavelmente influenciados.

CAPÍTULO 3 A educação como direção 1. O meio como fator de direção. — Passaremos agora a tratar de uma das formas especiais assumidas pela função da educação: isto é, de servir de direção, controle ou guia. A última destas ,três palavras — direção, controle e guia — é a que melhor exprime a ideia de auxiliar, por meio da cooperação, as aptidões naturais dos indivíduos guiados; controle lembra, antes, a noção de uma energia a atuar exteriormente e a encontrar alguma resistência por parte do objeto dominado; direção é um termo de significação mais neutra e sugere o fato de que as tendências cativas dos dirigidos são orientadas uniformemente para certo sentido, em vez de se dispersarem sem objetivo. Direção exprime a função fundamental que, em um dos extremos, tende a tornar-se em um auxilio condutor e, no outro, em regulação ou regra. Mas em todos os casos deveremos cuidadosamente evitar uma significação às vezes implícita no vocábulo controle ou governo. Já se presumiu, muitas vezes, explícita ou inconscientemente, que as tendências do indivíduo são, por seu natural, puramente individualistas ou egoístas, e, portanto, anti-sociais. Regulação ou controle denota então o processo pelo qual ele é levado a subordinar seus impulsos naturais aos fins públicos ou comuns. Desde que por esta concepção sua natureza é completamente alheia a este processo e mais se lhe opõe do que o auxilia, a função educativa tem neste ponto de vista um cunho de coação ou compulsão sobre o indivíduo. De acordo com esta noção que seriamente influiu nas ideias e na prática educacionais têm sido arquitetados sistemas de governo e teorias políticas. Mas tal opinião não tem fundamento algum. Não há dúvida de que, às vezes, aos indivíduos é vantajoso cuidar de seus próprios interesses e que estes podem achar-se em conflito com os interesses dos demais. Mas para eles há igualmente vantagem, em conjunto maior do que qualquer

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outra, em participar da atividade dos demais, em agir conjuntamente, cooperando nas realizações comuns. De outra forma, impossível seria a existência da coisa a que chamamos comunidade. E nem teria qualquer sentido a própria polícia que conservaria apenas uma aparência de ordem, a menos que achasse alguém que por esse meio poderia conseguir pessoalmente qualquer vantagem. Controle, em verdade, significa apenas um encarecimento da direção de forças ou capacidades e compreende não só a regulação e domínio conseguidos por algum indivíduo por meio de seus próprios esforços como também a que se produz quando outros assumem a direção. Em geral, todo o estímulo dirige a atividade. Não somente a suscita ou excita, como também a dirige para um objeto. A "resposta" ao estímulo, por sua vez, não é precisamente uma reação, um protesto, por assim dizer, motivado por uma perturbação; é, como a palavra o indica, uma correspondência. Ela vai ao encontro do estímulo e entra em correspondência com ele. Há uma recíproca adaptação do estímulo e da resposta. A luz é o estímulo para os olhos verem alguma coisa e o trabalho dos olhos é ver. Estando os olhos abertos e havendo luz, ocorre o ato da visão; o estímulo é unicamente uma condição para o exercício conveniente da função do órgão e, não, uma perturbação exterior. Por isso, toda a direção ou regulação ou controle é, em certa medida, o próprio ato de guiar a atividade para o seu próprio fim; é um auxílio para ef etuar-se plenamente aquilo que algum órgão já tende a fazer. Esta exposição geral necessita, porém, ser examinada sob dois pontos de vista. Em primeiro lugar, tirante o caso de um número pequeno de instintos, os estímulos a que um ser humano imaturo está sujeito não são suficientemente definidos para provocarem, de começo, respostas específicas. A energia é despertada sempre em profusão. Pode ela perder-se, sem atingir o ponto em mira; como pode, também, ser contrária ao bom êxito completo do ato. Prejudica por atravancar o caminho. Compare-se o procedimento de um novato em ciclismo com um ciclista experiente. Pouco elemento de direção existe nas energias despendidas; são elas grandemente dispersivas e centrífugas. Direção subentende, com efeito, o focalizar e fixar a ação, de modo a ser ela verdadeiramente uma resposta e isto requer a eliminação dos movimentos des-

necessários e desordenados. Em segundo lugar, embora não se produza atividade alguma sem que, em certa extensão, a pessoa coopere, pode a resposta ser de espécie inadequada à sequência e continuidade da ação. Um pugilista pode evitar receber certo golpe, mas de tal forma, que no instante imediato se exponha a um golpe mais violento. Um controle e domínio adequados significam a prática dos atos sucessivos em urna ordem contínua. Cada ato não só corresponde a seu imediato estímulo, como também prepara os atos que se seguem. Em suma, a direção tanto é simultânea como sucessiva. Em dado momento ela requer que, de todas as tendências cuja manifestação parcialmente se provoca, sejam escolhidas as que encentrarem a energia no ponto necessário. Sucessivamente, ela requer que cada ato se relacione devidamente com o que precedeu e com o que o seguirá, de modo a conseguir-se a ordem da atividade. Focalizar e coordenar sãof portanto, os dois aspectos da direção — wm, espadai e o outro temporal. O primeiro assegura o atingir-se o alvo; o segundo mantém o equilíbrio para a ação ulterior. É óbvio que não se podem separar na prática como se distinguem idealmente. A atividade deve ser focalizada em dado momento de tal modo, que esteja preparada para o que vem depois. O problema da reação imediata complica-se com o de ter-se de atender às ocorrências futuras. Duas conclusões ressaltam desta exposição geral. Por um lado, é impossível uma direção puramente exterior. O ambiente, no máximo, pôde fornecer estímulos para provocacar respostas. Estas respostas procedem das tendências já possuídas pelo indivíduo. Mesmo quando se intimida uma pessoa com ameaças para fazer alguma coisa, essas ameaças produzem efeito unicamente porque a dita pessoa já tem o instinto do medo. Se não o tiver, ou se, caso o tenha, souber dominá-lo, a ameaça não produzirá maior efeito do que a luz para fazer que uma pessoa sem olhos veja alguma coisa. Ao mesmo tempo em que os costumes e as normas dos adultos proporcionam estímulos que tanto dirigem como provocam a atividade dos mais novos, estes, afinal de contas, contribuem para a direção que os seus atos tomam. Pode-se estritamente dizer que intimamente eles não podem ser coagidos em coisa alguma. Desprezar esta circunstância equivale a deformar e perverter a natureza humana. Tomar em conside-

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ração a contribuição dos instintos e hábitos dos dirigidos importa em dirigi-los económica e sabiamente. Para falar mais precisamente — toda a direção é apenas redireção; ela modifica o rumo da atividade que já fluía, por outra álveo. A não ser que se conheçam as energias que já se acham a operar, toda a tentativa para dirigir se tornará quase infalivelmente inútil. Por outro lado, a regulação ou controle proporcionado .pelos costumes e normas dos outros indivíduos pode carecer de visão, ser estreita e parcial. Pode efetuar um efeito imediato, mas à custa de desordenar os subsequentes atos da pessoa. Uma ameaça, por exemplo, pode impedir que um indivíduo faça alguma coisa a que é naturalmente inclinado, despertando-lhe, caso persista em seu procedimento, o temor de desagradáveis consequências. Mas pode fazer que ele fique em condições que o exporão mais tarde a influências que o levarão a praticar até atos piores. Podem despertar seus instintos de astúcia e dissimulação, de modo que, de então por diante, na prática de seus atos, propenderá a usar estratagemas e a recorrer a embustes, mais do que isso sucederia se outras tivessem sido as condições de influência. As pessoas encarregadas de dirigir as ações alheias correm sempre o perigo de esquecer o desenvolvimento ulterior dos seus dirigidos.

cavalo até a água, não poderemos obrigá-lo a beber e que poderemos trancar um homem em uma penitenciária, mas não torná-lo arrependido. Nesses casos de ação direta sobre os outros, precisamos distinguir os resultados físicos dos resultados espirituais. Pode uma pessoa achar-se em tal situação que convenha, em seu próprio benefício, forçá-la a alimentar-se ou conservá-la presa. Podemos afastar rudemente do fogo uma criança, para que não se queime — mas não se seguirá com isto um aperfeiçoamento mental ou efeito educativo. Um tom de voz áspero e autoritário pode ser eficaz para mante-la arredada do fogo, produzindo-se o mesmo desejável efeito material de um empuxão violento. Mas no segundo caso não há mais obediência mental do que no primeiro. Poderemos tolher que um larápio penetre em casas alheias, conservando-o preso; mas com isto não modificamos sua inclinação para a prática de roubos. Quando confundimos resultado físico com resultado educativo, perdemos sempre as probabilidades de fazer a própria pessoa contribuir, com sua participação, para o efeito visado e de, por esse meio, desenvolver-lhe no espírito uma direção intrínseca e perseverante no sentido conveniente. A ocasião da prática de atos mais conscientes para se influir em outrem deveria limitar-se, em geral, aos atos tão instintivos ou impulsivos, que o agente não tenha meios de prever os resultados. Se uma pessoa não pode prever as consequências de um seu ato, e é incapaz de compreender o que dizem as mais experientes sobre o resultado do mesmo, é-lhe impossível guiá-lo inteligentemente. Nessas condições, todos os atos lhe teriam significação igual. Aquilo que a faz mover-se limita-se a fazê-la mover-se, e eis tudo. Em alguns casos conviria que lhe permitissem fazer experiências para descobrir as consequências que os atos terão para sí própria, de modo que no seguinte ensejo, em similitude de condições, possa proceder com inteligência. Mas certas espécies de atos são muito incómodos ou prejudiciais aos outros para que se consinta nessas experiências. Recorre-se então à reprovação direta. Usa-se o vexame, o ridículo, o desfavor, a censura e a punição. Ou se apela para as tendências contrárias do educando a fim de afastá-lo de seu impróprio modo de proceder. Utilizam-se sua sensibilidade ao elogio, sua esperança de cair nas boas graças de alguém por algum ato agradável, para fazer-se a sua atividade mudar ae direção.

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2- Modalidades de direção social. — Os adultos têm naturalmente mais consciência de seu influxo na conduta dos outros quando deliberadamente visam a essa influência. Em regra, têm conscientemente tal objetivo quando encontram resistência, quando outros estão a fazer coisas que eles, adultos, não desejam. Os modos, entretanto, mais permanentes e influencíadores de direção são aqueles que atuam continuamente, a cada instante, sem propósito intencional de nossa parte. Senão, vejamos. l — Quando outras pessoas não fazem o que desejaríamos que fizessem ou ameaçam desobedecer-nos, sobrevém-nos maior consciência da necessidade de influir em seu procedimento e dos meios por que elas podem ser influenciadas. Em tais casos, nosso influxo é mais direto e há mais probabilidades de incidirmos nos equívocos que acabamos de mencionar. É mesmo verossímil que acreditemos ter influência reguladora ou controladora a ação de uma força superior, esquecidos de que, embora possamos levar um

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2 — Estes meios de influir no educando são tão patentes (porque assim os empregamos intencionalmente) que mal seriam dignos de menção, se não fosse o podermos agora tratar, pelo contraste, do outro método de influir, bem mais importante e permanente. Este outro método reside no modo por que utilizam as coisas as pessoas com quem o imaturo convive; nos instrumentos e nos modos por que realizam seus próprios fins. O meio social em que o indivíduo vive, move-se e manifesta sua atividade, esse é o agente constante e eficaz para orientar-lhe a atividade. Esta circunstância nos força a um exame mais particularizado daquilo que se entende por ambiente social. Somos avezados a separar um do outro os ambientes físico e social em que vivemos. A esta separação, por um lado, se deve o exagero da importância moral dos modos mais diretos ou pessoais de direção de que estivemos falando; e por outra parte, o exagero, na psicologia e filosofia correntes, das possibilidades intelectuais do contacto com um meio puramente físico. O fato é que não existe a influência direta de um ser humano sobre outro, independentemente do uso do ambiente físico como intermediário. Um sorriso, uma carranca, uma censura, uma palavra de advertência ou de encorajamento, tudo isso envolve alguma mudança fisica. Se assim não fosse, a atitude de uma pessoa não modificaria a atitude de outra. De um modo relativo esses meios de influir podem ser considerados pessoais. O meio físico reduz-se a um simples instrumento de contacto pessoal. Contrastando com estes modos diretos de mútua influência, encontram-se as associações para objetivos comuns que implicam o uso das coisas como meios e como medidas dos resultados. Mesmo que a mãe nunca dissesse à filha que a ajudasse, nem a repreendesse pelo fato de não a ajudar, a filha seria dirigida tm sua atividade pela simples circunstância de estar empenhada na vida em comum do lar. A imitação, a emulação, a necessidade de trabalhar juntos, reforçam a regulação ou o controle educativos. Se a mãe precisa dar à filha alguma coisa, a última deve estender as mãos para recebê-la. Onde há o dar, deve haver o tomar. O modo por que a filha se comporta com o objeto depois de recebê-lo, a maneira pela qual o utiliza, são certamente influenciados pelo fato de ter observado os atos de sua mãe. Quando a criança vê a mãe procurar alguma coisa, é tão natural pára ela o procurá-la igualmente

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e entregá-la, se a encontrou, como o seria, em outras circunstâncias, o recebê-la. Multiplique-se este exemplo de acordo com os mil pequenos incidentes do trato quotidiano e ter-se-á o quadro do meio mais constante e duradouro de dirigir a atividade dos mais novos. Dizendo isto, estamos somente a repetir o já exposto sobre a participação em atividade conjunta como o meio principal da formação do espírito. Entretanto, acrescentamos a isso o reconhecimento do papel desempenhado na atividade conjunta pelo uso das coisas. A filosofia do ensino tem sido indevidamente dominada por uma falsa psicologia. Declara-se com frequência que uma pessoa aprende simplesmente porque as qualidades das coisas se lhe gravam no espírito, entrando pelas portas dos sentidos. Tendo recebido certo número de impressões sensoriaís, supõe-se que a associação ou alguma faculdade de formar sínteses mentais as combina em ideias — em coisas com uma significação. Supõe-se que um objeto, uma pedra, uma laranja, uma árvore, uma cadeira, produzam diferentes impressões de cor, forma, tamanho, dureza, cheiro, gosto, etc., as quais, reunindo-se, constituem a significação característica de cada coisa. Mas o fato é que o uso característico que damos às coisas, devido a suas qualidades particulares, é que fornece a significação com que ela é identificada. Uma cadeira é coisa para certo uso; uma mesa, é para outro uso; uma laranja é coisa que custa certa quantia, só dá nos climas quentes, serve para comer-se, e, quando comida, tem cheiro e sabor agradáveis, etc. A diferença entre a adaptação a um estímulo físico e um ato mental corresponde a que o último importa na resposta a uma coisa em sua significação — o que não se dá no primeiro caso. Um ruído pode fazer-me dar um pulo, sem que o espírito participe desse ato. Se um ruído me faz correr e procurar água e apagar um fogo, estou a reagir inteligentemente; os sons significavam fogo, e fogo significava a necessidade de ser apagado. Tropeço em uma pedra, e com um pontapé a faço ir parar a um lado — procedo de modo meramente físico. Se a arredo para um lado do caminho, de receio de que alguém nela tropece — procedo inteligentemente; reajo a uma significação que a coisa tem. Assusto-me com um trovão, sabendo ou não sabendo que é um trovão — mais provavelmente não o sabendo. Mas se disser, alto ou comigo mesmo, que é um trovão, reajo uo fato perturbador em sua

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significação. Meu procedimento tem um valor mental. Quando as coisas possuem para nós uma significação, temos consciência do que fazemos; se não a possuem, procedemos cega, inconsciente, ininteligentemente. Nessas duas espécies de adaptação pela reação, nossa atividade está dirigida ou regulada. Mas na resposta puramente cega, a direção é também cega. Pode ser adestramento, mas não educação. As respostas repetidas a estímulos também repetidos, podem de certo modo fixar um hábito de ação. Todos nós temos muitos hábitos de cuja importância não temos absolutamente consciência, porquanto se formaram sem sabermos que isso estava a suceder. Em consequência, eles nos possuem mais do que nós os possuímos. Eles nos movem e dominam. E se não tivermos consciência de sua ação e não pudermos formar juízos sobre o valor dos resultados, não os dominaremos. Uma criança pode inclinar-se cada .vez que encontra certa pessoa, por lhe fazer pressão nos músculos do pescoço, e essas inclinações nos referidos encontros podem tornar-se, afinal, automáticas; não serão, contudo, sinal de reconhecimento ou de deferência, enquanto não o fizer com algum fim em vista — como tendo certa significação. E enquanto a criança não souber do que se trata e não praticar'o ato por sua significação, não se poderá dizer que a ensinaram a proceder de tal modo. Ter uma ideia da coisa não é, portanto, ter determinadas sensações com a sua presença. É ser capaz de reagir à coisa tendo em vista seu lugar em um plano de ação, em que ela é incluída; é prever as flutuações e a provável consequência da açãc da coisa sobre nós e de nossa ação sobre ela. Ter sobre. as coisas as mesmas ideias que os outros, assemelhar-se espiritualmente a eles e ser, assim, verdadeiramente, membro de um grupo social, consiste, por conseguinte, em dar às coisas e aos atos as mesmas significações que os outros dão. De outro modo não haveria compreensão comum nem vida social. Mas, de fato, em uma atividade partilhada cada pessoa relaciona o que está fazendo com aquilo que as outras fazem e vice-versa. Isto é, a atividade de cada um está incluída em uma mesma situação. Puxar uma corda que outros estejam também a puxar não é atividade partilhada ou conjunta., a menos que quem puxa o faça com o conhecimento de que outros também estão puxando e com um intuito de auxiliar ou embaraçar o que eles fazem. Du-

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rante seu fabrico, pode um alfinete passar pelas mãos de muitos, operários. Mas cada um destes pode fazer sua parte do trabalho, inconsciente do que os outros fazem, ou sem qualquer relação com a parte feita por estes; cada qual trabalha tendo apenas em vista dado resultado •— sua própria paga. Neste exemplo não há uma consequência comum a que se refiram os vários atos e, portanto, inexiste verdadeira cooperação ou associação, malgrado a justaposição de pessoas e a circunstância de que seus respectivos atos contribuem para um único resultado. Mas se cada um vir as consequências de seus atos em relação aos atos dos outros e tomar em linha de conta as consequências dos atos dos outros sobre os seus próprios, haverá então uma mentalidade comum, uma intenção comum no procedimento de todos. Há mútuo entendimento entre os vários cooperadores e este entendimento comum dirige e controla a ação de cada um. Suponhamos que se disponham as condições de forma que uma pessoa automaticamente pegue uma bola, e a atire em direção a outra pessoa que a apanha e automaticamente a devolve; cada uma assim procedeu ignorando de onde a bola vinha e para onde ia. É claro que esses atos seriam sem objetivo ou significação. Poderiam ser fisicamente regulados ou controlados, mas não seriam socialmente dirigidos. Mas admitamos que cada um tenha acordo daquilo que o outro faz e se interesse pelos atos dessa outra pessoa e, desta maneira, por aquilo que ele próprio faz, como relacionado com os atos dessa pessoa. O procedimento dos dois seria então inteligente, e inteligente e orientado socialmente. Vejamos mais um exemplo de natureza menos fictícia. Uma criança sente fome e chora enquanto lhe preparam o alimento em sua presença. Se ela não relacionar seu próprio estado com aquilo que os outros estão a fazer, nem o que os outros fazem com a satisfação de sua fome, reagirá simplesmente com crescente impaciência ao seu próprio crescente mal-estar. Sente-se fisicamente dominada pelo seu próprio estado orgânico. Mas se estabelecer referências com atos anteriores e ulteriores, muda completamente de atitude. Adquire um interesse, conforme dizemos; nota e observa o que os outros fazem. Já não reage mais tendo em vista a própria fome, e sim procede tendo em vista o que os outros estão a fazer para sua futura satisfação. Desse modo a criança já não reage à fome sem a conhecer, mas nota, ou

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reconhece, ou identifica seu próprio estado. Este se torna um objeto de atenção para ela. Sua atitude para com o mesmo é em certo grau inteligente. E observando, assim, a significação dos atos alheios e de seu próprio estado, acha-se socialmente orientada e dirigida. Lembraremos agora que nossa proposição principal tem dois aspectos. De um deles já tratamos, isto é — de que as coisas materiais não influenciam o espírito (ou formam ideias e convicções) exceto quando se associam à ação tendo em mira consequências previstas. O outro ponto é que uma pessoa só modifica o estado de espírito de outras por meio do emprego especial das condições físicas. Consídere-se primeiro o caso dos chamados "movimentos expressivos" a que os outros são sensíveis; o corar, o sorrir, o franzir o cenho, o cerrar os punhos, e outros gestos naturais de toda 'as espécies. Em si mesmos eles não são expressivos. São elementos orgânicos da atitude de uma pessoa. Ninguém enrubesce para mostrar modéstia ou acanhamento aos outros, e sim porque a circulação capilar se modifica reagindo a estímulos. Mas os outros vêem no corar, ou na ligeiramente perceptível contração dos músculos da pessoa com quem estão tratando, a indicação do estado mental em que aquela pessoa se encontra e da linha de ação que deverá seguir. O cerrar o cenho significa iminente repreensão para a qual devemos estar de sobreaviso, ou incerteza e hesitação que alguém deverá, se possível, dissipar dizendo ou fazendo algo que restabeleça a confiança. A certa distância está um homem a brandir desesperadamente os braços. Se nos conservarmos indiferentes, esses movimentos equivalem a uma remota mudança física que casualmente notamos. Se não nos despertar interesse, aquele brandir de braços nos será tão sem significação como os giros das asas de um moinho. Mas se nos despertar o interesse, começaremos a participar da ação. Atribuímos esta a alguma coisa que estamos fazendo ou deveríamos fazer. Procuramos julgar a significação daquele procedimento tendo em vista resolvermos o que deveremos fazer. Com a sua gesticulação estará aquele homem a pedir socorro? Estará a avisar-nos de uma explosão, contra a qual nos deveremos precaver com a fuga ? No primeiro caso, seu ato significaria correr para o lado dele; e, no segundo, afastarmo-nos do lugar onde estivéssemos. Em qualquer dos casos é a mudança efetuada por

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ele no meio físico que nos indica o modo por que deveremos proceder. Nossos ates são orientados socialmente porque nos esforçamos a relacionar o que estamos a fazer com a mesma situação em que ele está a agir. É a linguagem, segundo já vimos, um caso desta relação de nossos atos com os de outras pessoas tendo em vista uma situação comum. Daí a sua inigualável significação como meio de direção sócia]. Mas a linguagem não seria esse instrumento eficaz se não se sobrelevasse a usos mais grosseiros e tangíveis de meios materiais para a consecução de resultados que constituem as suas bases. Uma criança vê as pessoas com quem mora usar de determinados modos cadeiras, chapéus, mesas, pás, serras, arados, cavalos e dinheiro. Se tomar alguma parte no que elas estão fazendo, será levada por esse meio a usar aquelas coisas do mesmo modo ou usar outras de modo que se harmonizem com elas. Se levam uma cadeira para perto da mesa, é sinal de que se deverá sentar na mesma; se alguém lhe estende a mão direita, a criança também estende a sua — e assim por diante, em um nunca acabar de pequeninas coisas. Os hábitos dominantes de utilizarem-se os produtos da arte humana e as coisas da natureza têm todas as probabilidades de constituir o mais profundo e penetrante modo de regulação ou controle social. Quando as crianças vão para a escola já possuem juízo —- têm conhecimentos e aptidões para julgar, aos quais se pode recorrer por meio do uso da linguagem. Mas estes juízos nada mais são que os hábitos coordenados de reações inteligentes que anteriormente foram necessárias para o uso das coisas em relação com o modo por que as outras pessoas as usavam. Essa influência é inevitável; dela se impregnam as atitudes mentais. O nítido resultado dessas considerações é que .o instrumento fundamental de direção não é pessoal e, sim, intelectual. Não é "moral" no seníido de que uma pessoa procede por apelo pessoal e direto de outra pessoa, por mais importante que seja esse método em conjunturas críticas. A direção social consiste, realmente, nos hábitos àe compreensão que se estabelecem usando-se os objetos em correlação com outras pessoas, quer pela cooperação e auxílio, quer pela rivalidade e concorrência, O espírito ou a mente como coisa concreta, é precisamente a faculdade de compreender as coisas tendo em vista o uso feito das mesmas; um espírito socializado é a faculdade de compreendê-las tendo em mira o uso que lhes

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é dado em situações conjuntas ou compartilhadas. E mente ou espírito neste sentido é o método de direção social. 3. A imitação e a psicologia social. — Já notamos a deficiência de certa psicologia da educação, que coloca nua, por assim dizer, a mente ou inteligência do indivíduo, em contacto com os objetos materiais, acreditando que os conhecimentos, as ideias e as convicções se lhe acrescentem por essa interação. Só em tempos relativamente recentes se notou o predomínio da influência da associação com outros seres humanos para a formação mental e moral dos educandos. Mesmo agora este método é tratado como uma espécie de apêndice do pretenso método de aprender pelo contacto direto com as coisas, e com o fim exclusivo de completar o conhecimento das coisas com o conhecimento das pessoas. Nosso intuito na discussão deste tema é mostrar que semelhante opinião faz uma dissociação absurda e impossível entre pessoas e coisas. A interação com as coisas pode criar hábitos de adaptação externa. Mas só conduz a uma atividade que tenha significação e propósito consciente quando se utilizam as coisas para a obtenção de algum resultado. E o único meio por que uma pessoa pode modificar o espírito de outra é usar as condições físicas, naturais ou artificiais, de modo a provocar como resposta algum ato. Tais são as nossas conclusões principais. É de bom alvitre ampliá-las e robustecê-las, pondo-as em contraste com a teoria que adota a psicologia das supostas relações díretas dos seres humanos entre si como uma adição à psicologia das supostas relações diretas de um indivíduo com os objetos materiais. Em sua essência esta psicologia denominada social foi erigida sobre a noção da imitação. Em consequência, passaremos a apreciar a natureza e o papel da imitação na formação do espírito. De acordo com esta teoria, a direção social dos indivíduos repousa em sua tendência instintiva a imitar ou reproduzir os atos alheios. Estes atos lhes servem de modelo. Tão forte é o instinto imitativo, que as pessoas mais novas se esforçam a aceitar os moldes de ação criados pelas mais velhas e a reproduzi-los em seu próprio modo de proceder. Conforme nossa teoria, chamar-se a isto imitação é dar nome erróneo à co-participação com outras pessoas do uso de coisas conducentes a consequências de interesse comum.

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O erro básico desta noção corrente da imitação é colocar o carro adiante dos bois. Toma tun efeito pela causa. Não resta dúvida que os indivíduos que formam um grupo social têm mentalidade semelhante; eles se compreendem uns aos outros. Dadas circunstâncias similares, propendem a proceder orientados pelas mesmas ideias, convicções e intenções. Encarados externamente, pode-se dizer que procuram "imitar-se" uns aos outros. Seria isto uma verdade, no sentido de que estão a fazer, do mesmo modo, as mesmas espécies de coisas. Mas a "imitação" não projeta luz sobre o porquê de assim procederem; para explicar um fato, ela se limita a reproduzir esse fato. É explicação da natureza daquela, célebre, de que o ópio faz dormir por ter poder dormitivo. A semelhança objetiva dos atos e a satisfação mental sentida por proceder-se em harmonia com os outros são batizadas com o nome de imitação. Este fato social é então tomado por uma força psicológica que produz a similitude. Parte considerável daquilo que se chama imitação é simplesmente o fato de que pessoas de estrutura semelhante reagem do mesmo modo a estímulos semelhantes. Independentemente de qualquer imitação, o indivíduo insultado se encoleriza e se atira contra o insultador. Pode-se refutar este exemplo alegando-se o fato indubitável de que a reação a um insulto se opera de modos vários em grupos humanos de diferentes costumes. Em um, pode-se investir aos socos, em outro desafiar-se para um duelo e em um terceiro manifestar-se o desprezo. Assim sucede — já o disseram — por ser diverso o modelo a se imitar. O simples fato de serem diferentes os costumes significa serem também diferentes os estímulos que atuam no procedimento. A instrução consciente desempenha nisso o seu papeí; grande influência tem a prévia aprovação ou reprovação. Ainda mais eficaz é o fato de que, se o indivíduo não proceder do modo usado no seu grupo, se achará literalmente excluído dele. Só poderá associar-se a outro intimamente e em igualdade de condições procedendo cie modo idêntico ao deles. É incessante a pressão social decorrente do fato de apenas se admitir ao grupo quem participa de sua atividade e de se excluir do mesmo quem procede diferentemente. O que se chama efeito da imitação é precipuamente o resultado da instrução consciente e do influxo selecionador exercido pelas confirmações e ratificações inconscientes, dos atos de alguém, por parte daqueles com quem se associou.

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Suponhamos que uma pessoa joga uma bola para o lado de uma criança; esta a apanha e a joga em sentido contrário, e o brinquedo continua. Neste caso o estímulo não é a vista da bola, nem do companheiro de brinquedo. É a situação — o jogo da bola. A "resposta" não é apenas rolar a bola para trás; é fazê-lo de modo que o companheiro possa pegá-la e devolvê-la, a fim de que o brinquedo continue. O "padrão" ou modelo não é o ato da outra pessoa. Toda a situação requer que cada qual adapte seus atos tendo em vista o que a outra pessoa fez e vai fazer. Pode surgir a imitação, mas seu papel é subalterno. A criança tem interesse próprio; deseja conservá-lo desperto. Ela pode então observar o modo por que a outra pessoa apanha e segura a bola, com o fim de aperfeiçoar seus próprios atos. Ela imita os meios de fazer e não o fim ou a coisa a ser feita. E imita os. meios porque o deseja, e em benefício próprio, como parte de sua própria iniciativa: conseguir jogar bem. Basta considerar como de todo em todo a criança precisa, em seus primeiros tempos de vida, para realizar com bom êxito o que pretenda, adaptar seus atos aos dos outros, para ver-se como lhe importa proceder como .os outros e desenvolver sua compreensão dos seus modos de proceder para que o possa fazer igualmente. A compulsão daí decorrente para a similitude de ação é tão grande, que se torna completam ente supérfluo recorrer à imitação. Realmente, a imitação dos fins, tão diversa da imitação dos meios que auxiliam a atingir os fins, é coisa superficial e transitória que pouco efeito produz na formação mental. Os imbecis são particularmente aptos para esta espécie de imitação que adota os atos exteriores, mas não a significação de sua prática. Quando vemos crianças empenhadas nesta espécie de mímica, em vez de encorajá-las (o que faríamos se ela fosse um meio importante de direção social) somos mais inclinados a repreendê-las, chamando-lhes macacos, papagaios ou bichos ensinados. Contrariamente a isso, a imitação dos meios de realizar é ato inteligente, que subentende observação acurada e seleção judiciosa daquilo que nos habilita a fazer melhor alguma coisa que já tenhamos tentado fazer. Utilizado para certos fins, pode o instinto imitativo, como qualquer outro, tornar-se um fator para o desenvolvimento da ação eficiente. Esta digressão, conseguintemente, produzirá o efeito de reforçar a conclusão de que a verdadeira direção social significa a formação de certa mentalidade — um modo de

compreender coisas, eventos e atos que habilitem alguém a tomar parte eficaz em atividades associadas. Só o atrito gerado pela resistência encontrada da parte de outras pessoas leva à opinião de que isso se efetua forçando-se alguém a seguir um método de ação contrário às propensÕes naturais. Apenas o fato de não se tomarem em conta as situações em que há pessoas mutuamente interessadas em proceder em correspondência aos atos de outras conduz a considerar-se a imitação o principal agente promotor da direção ou controle social.

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4. Algumas aplicações à educação. — Por que razão em um grupo selvagem se perpetua a selvageria e num civilizado a civilização? Indubitavelmente a primeira resposta que ocorre é que os selvagens são selvagens — seres de grau inferior de inteligência e, talvez, faltos de senso moral. Mas estudos cuidadosos tornaram duvidoso que suas faculdades inatas sejam apreciavelmente inferiores às do homem civilizado. Eles deram-nos a certeza de que as diferenças inatas não são bastantes para explicar a diferença de cultura. De certo modo o espírito dos povos selvagens é mais efeito, do que causa, de suas atrasadas instituições. São de tal sorte suas atividades sociais, que lhes restringem os objetos da atenção e interesse e, por isso, limitam-lhes os estímulos para o desenvolvimento mental. Mesmo em relação aos objetos que caem no campo de sua atenção, os primitivos costumes sociais tendem a fazer a observação e a imaginação fixar-se em qualidades que não podem frutificar em seu espírito. A falta do domínio das forças naturais significa que escasso número de coisas figura em sua atívídade conjunta. Somente é utilizado um número pequeno de recursos naturais e estes não são tão aproveitados como o mereceriam. O progresso da civilização significa que maior número de forças e coisas naturais foi transformado em instrumentos de ação, em meios para se atingirem fins. Não é tanto pelo começarmos com capacidades superiores, mas, sim, devido aos estímulos superiores para provocar e dirigir a manifestação de nossas capacidades, que somos civilizados. Os selvagens têm ern grande escala estímulos brutos; e, nós, estímulos apurados. Os esforços anteriores dos homens modificaram as condições naturais. Estas, originariamente, não favoreciam os empreendimentos humanos. Cada planta cultivada, cada ani-

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mal domesticado, cada utensílio, artifício ou objeto fabricado, cada ornamentação estética ou trabalho de arte, significa a transformação de condições a-princípio hostis ou indiferentes à atividade caracteristicamente humana, em condições seguras e favoráveis. Como a atividade das crianças é hoje dirigida por esses estímulos selecionados e ricos, elas podem atravessar em breve tempo o trajeto que a espécie humana levou lentos e torturados séculos para vencer. Todos os sucessos precedentes "deram mais peso aos dados". Por si mesmos, ou em seu conjunto, não constituem uma civilização os estímulos geradores de "respostas" econômlcas e eficazes, tais como o nosso sistema de estradas e meios de transporte, a faculdade de dispormos prontamente do calor, da luz e da eletricídade, e nossas máquinas e aparelhos fabricados para qualquer fim. Mas o uso que lhes damos é civilização e, sem aquelas coisas, seria impossível esse uso. Dispomos agora do tempo que no estado selvagem nos seria necessário para obter penosamente, em um ambiente hostil, os meios de subsistência, e para nos assegurarmos uma precária defesa contra a inclemência do referido ambiente. Transmite-se um acervo de conhecimentos cuja eficácia é garantida pelo fato de que a base natural em, que se apoiam conduz a resultados que se harmonizam com os outros fatos naturais. Por esta causa, essas aplicações da arte proporcionam protecão, talvez a principal proteção contra a revivescência daquelas crenças supersticiosas, mitos fantasistas e imaginações estéreis sobre a natureza, devido às quais se perdeu, no passado, o melhor da capacidade intelectual humana. Se acrescentarmos, a esse, outro fator, isto é, que tais aplicações não somente foram usadas, senão também usadas de acordo com os interesses de uma vida verdadeiramente compartida otí associada, tornam-se, então, esses recursos, o cabedal positivo da civilização. Se a Grécia, com um restrito acervo de nossos recursos materiais, perfez uma digna e nobre carreira intelectual e artística, foi porque trabalhou, para fins sociais, com os recursos de que dispunha. Mas seja qual for a situação, quer de barbaria, quer de civilização, seja de domínio limitado sobre as forças físicas, ou de escravização parcial a uma mecanização que ainda não se incorporou à experiência compartida, as coisas, do inodo como entram na ação, fornecem as condições educativas da vida quotidiana e dirigem a formação mental e moral.

A educação como direção

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A educação intencional significa, segundo já vimos, um ambiente especialmente escolhido tendo-se em vista, para essa escolha, materiais e métodos apropriados a incentivar o crescimento na direção desejada. Desde que a linguagem representa as condições físicas que sofreram a máxima transformação no interesse da vida social — coisas físicas que perderam sua qualidade originária tornando-se instrumentos sociais — é natural que a linguagem represente grande papel, comparado ao dos outros recursos. Por meio dela, em caráter de substitutos, conseguimos participar largamente da passada experiência humana, dilatando e enriquecendo assim a experiência do presente. Achamo-nos habilitados, simbólica e imaginativamente, a antecipar situações. Por infinitos meios a linguagem condensa significações que registram resultados sociais e pressagiam perspectivas sociais. De tal arte ela importa em uma liberal participação em tudo o que é de valor na vida, que iletrados e não educados passaram quase a ser duas expressões sinónimas. Apresenta, porém, os seus perigos insistir-se nas escolas neste instrumento particular educativo — perigos não apenas teóricos, mas que também se manifestam na prática. Qual a razão por que, apesar de geralmente condenado, o método de ensino de verter conhecimentos — o mestre — e absorvê-los passivamente — o aluno — ainda persiste tão arraigadamente na prática? Que a educação não consiste unicamente em "falar" e "ouvir", e sim em um processo ativo e construtor, é princípio quase tão geralmente violado na prática, como admitido em teoria. Não é essa deplorável situação devida ao fato de ser a matéria meramente exposta por meio da palavra? Prega-se; leciona-se; escreve-se. Mas para se por a matéria ou a teoria em ato ou em prática exige-se que o meio escolar esteja preparado, em extensão raramente atingida, como locais e condições para agir e fazer com utensílios e materiais de natureza física. Exige-se, ainda, que se modifiquem os métodos de instrução e administração de modo a permitir e assegurar o contacto direto e contínuo com as coisas. Não que se deva restringir o uso da linguagem como recurso educativo ; e sim que esse uso será mais vital e fecundo normalmente articulado com a atividade exercitada em comum. "Deveis fazer estas coisas, sem todavia desfazer as outras". E para a

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escola "estas coisas" significam o aparelhamento^cow os instrumentos para a atividade cooperadora ou conjunta. Pois quando as escolas se afastam das condições educacionais eficazes do meio extra-escolar, elas necessariamente substituem um espírito livresco e pseudo-intelectual a um espírito social. As crianças vão, sem dúvida, à escola para aprender, mas resta ainda provar-se que o aprender ocorra mais adequadamente quando se torna uma ocupação conscientemente isolada. Quando, tratado assim, tende a excluir o senso social derivado da participação em uma atividade de interesse e valor comuns, o esforço para o aprendizado intelectual isolado contraria seu próprio escopo. Conservando um indivíduo isolado, conseguiremos garantír-lhe a atividade motora e a excitação sensorial: mas não poderemos desse modo fazê-lo compreender a significação das coisas na vida de que faz parte. Conseguiremos dar-lhe especial aptidão técnica em álgebra, latim ou botânica, mas não a espécie.de compreensibilidade que orienta as aptidões para fins úteis. Só se consegue mentalidade social dedicando-se os homens à atividade conjunta, na qual o uso de materiais e utensílios, por parte de uma pessoa, se relaciona conscientemente com o uso que outras pessoas fazem de suas aptidões e recursos. Resumo. — Os impulsos naturais ou inatos das pessoas não adultas não se harmonizam com os hábitos de vida da sociedade onde nasceram. Por consequência, deverão ser dirigidas ou guiadas. Esta direção não se confunde com a coação física; ela consiste em fazer convergir os impulsos que se manifestam em dado tempo para algum fim especial, e em introduzir continuidade na sucessão dos atos. Os atos dos outros são sempre influenciados se escolhermos os estímulos que lhes provoquem "respostas". Mas em certos casos, como ordens, proibições, aprovações e desaprovações, os estímulos partem de pessoas que têm a intenção de influenciar diretamente a atividade alheia. Como em tais casos é mais conscientemente que influímos nas ações de outrem, é provável exagerarmos a importância deste modo de influir ou educar, em prejuízo de um método mais eficaz e de mais duradouros efeitos. Esta direção básica reside na natureza da situação em que o imaturo toma parte. Nas situações sociais, o jovem põe seu modo de proceder em relação com o dos outros, adaptando-o ao mesmo. Isto lhe orienta a ação para um re-

A educação como direção

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sultado comum e dá uma compreensão comum da atividade aos seus co-particípantes. A significação c a mesma^ para todos, malgrado executem atos diferentes. A essência ^ da direção social é esta compreensão comum dos meios e dos fins. Ela é indireta, ou sentimental e intelectual, e não direta ou pessoal. Além disso, é disposição intrínseca da pessoa e, não, externa e coercitiva. O fim da educação é conseguir esta direção interna por meio de identidade de interesse e compreensão. Os livros e a conversação podem fazer muito, mas o mal é contarmos excessivamente com esses _fatores. Para sua plena eficiência, as escolas precisam de mais oportunidades para atividades em conjunto, nas quais os educandos tomem parte, a fim de compreenderem o sentido^ social de suas próprias aptidões e dos materiais e recursos utilizados.

A educação como crescimento

CAPÍTULO 4 A educação como crescimento l. Condições do crescimento. — Dirigindo a ativividade de seus membros mais novos, e determinando-lhes, por esse modo, o futuro, a sociedade determina o seu próprio. Uma vez que em dada época, mais tarde, esses jovens constituirão a sociedade de seu tempo, a natureza desta última dependerá em grande escala da direção dada anteriormente à atividade infantil. Esta marcha cumulativa de ação para um resultado ulterior é o que se chama crescimento (growth). A primeira condição para haver crescimento é que haja imaturidade. Parecerá tautologia dizer que um ser só se pode desenvolver em algum ponto ainda não desenvolvido. Mas o prefixo "im" de "imaturidade" significa algo de positivo e, não, simples carência ou vacuidade. É .conveniente assinalar que os termos "capacidade" e "potencialidade" têm duplo sentido — um negativo e outro positivo. Capacidade pode denotar mera receptividade, como a capacidade de um litro. Como se pode significar por potencialidade um mero estado de adormecimento ou quietude — a capacidade de tornar-se coisa diferente pelo influxo de condições exteriores. Mas também indicamos, com a palavra capacidade, uma aptidão, um poder; e com a de potencialidade, energia, força. Ora, quando dizemos que imaturidade significa a possibilidade de crescimento, não nos referimos à ausência de aptidões que poderão surgir mais tarde; referimo-nos a uma força positivamente atual — a capacidade e aptidão para de senvolver-s e. Nossa tendência a considerar a imaturidade como mera falta, ou ausência e crescimento, como alguma coisa que preenche o vazio entre o adulto e o imaturo, é devida a encararmos a criança relativamente, e não intrinsecamente. Consideramo-la unia falta ou privação, por estarmos a medir a idade adulta, considerada como uma craveira fixa ou está-

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tica. Prende-se a atenção naquilo que a criança não tem, e que não terá enquanto não se tornar um homem. Esta aferição relativa é legítima para alguns intuitos; mas se a tornarmos última e final será o caso de perguntarmo-nos se não seremos culpados de excessiva presunção. Se as crianças se pudessem exprimir clara e sinceramente contar-nos-iam coisas mui diversas; e entre os adultos acha-se bastante autorizada a convicção de que, para certos fins morais e intelectuais, devem eles, os adultos, tornar-se verdadeiras crianças. Manifesta-se a gravidade da suposição de que são puramente negativas as possibilidades do imaturo, ao refletirmos que tal suposição prefixa como ideal e padrão um fim estático. Conseguir-se o desenvolvimento, crescer, é considerado como terminar o mesmo, isto é, tomar-se ele um não desenvolvimento, uma coisa que não se desenvolve e não cresce mais. Patenteia-se a futilidade dessa presunção corri a circunstância de os adultos protestarem contra a afirmativa de não mais terem eles a possibilidade de desenvolver-se; e, caso o aceitem, lastimarem o fato, considerando verdadeira perda, e, não, sinal de superioridade, o estar finda a sua educação. Por que usar medidas desiguais com a criança e com o adulto? Considerada absoluta e não relativamente, a imaturidade significa uma força ou aptidão positiva — a aptidão para desenvolver-se. Não teremos que extrair atividades positivas de uma criança, ou fazê-las surgir, consoante o entendem algumas teorias educacionais. Onde existe a vida, existem já atividades ardentes, afervoradas. Desenvolvimento, crescimento, não é alguma coisa que fazemos a estas atividades: é alguma coisa que as referidas atividades fazem. O aspecto positivo e construtor dessas possibilidades proporciona a chave para se compreenderem os dois traços principais da imaturidade : a dependência e a plasticidade. Parecerá absurdo ouvir falar-se de dependência como de uma qualidade positiva e, ainda mais absurdo, como uma força, um poder. Entretanto, se incapacidade fosse tudo que existisse em dependência, nenhum desenvolvimento se poderia efetuar. Um ser simplesmente impotente teria de ficar eternamente a cargo de outros. O fato de que a dependência é acompanhada pelo desenvolvimento de aptidões, e não por uma sempre crescente tendência ao parasitismo, sugere ser ela, já, uma força construtora. Se fosse unicamente protegida, carregada e amparada pelos outros não se manifestaria o desenvolvimento.

Democracia e educação

A educação como crescimento

Pois essa proteção equivaleria unicamente a uma muralha construída em torno da impotência. Em relação ao mundo material, é certo, a criança nada pode por si. Falta-lhe ao nascer, e depois, durante muito tempo, a capacidade de se conservar fisicamente, de procurar a própria subsistência. Se tivesse de fazer isso por si mesma, dificilmente teria uma hora de vida. A esta luz, sua impotência é quase completa. Os filhotes dos animais são-lhe infinitamente superiores a tal respeito. Fisicamente fraca, a criança é incapaz de empregar as outras forças que possui para lutar com o meio material.

seus instintos sociais são empregados em seu próprio interesse e não que esses instintos não existam. Mas semelhante afirmação não corresponde à verdade. Os fatos geralmente citados em apoio do pretenso egoísmo infantil mostram em verdade a intensidade e retidão com que as crianças se dirigem a seu alvo. Se este alvo ou fim parece acanhado e egoísta para os adultos, é unicamente porque estes (por meio de idêntico procedimento na puerícia) já realizaram os tais fins, que por essa razão deixaram de interessá-los. A maioria dos outros pretensos atos egoísticos da criança denotam apenas um egoísmo em conflito com o egoísmo dos adultos. A estes adultos, que se acham mui absorvidos com suas próprias preocupações para se interessarem pelas preocupações das crianças, estas parecerão, com certeza, desrazoav^elmente dominadas pelos seus próprios desejos. .

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I — Não obstante, a natureza desta impotência completa sugere a existência de alguma força compensadora. A relativa habilidade dos filhos dos irracionais para adaptarem-se perfeitamente às condições físicas de seus primeiros tempos de vida, entremostra o fato de que a "vida dos mesmos não se acha intimamente ligada à dos seres entre os quais eles vivem. São forçados, por assim dizer, a ter aptidões físicas, por lhes faltarem aptidões sociais. Por outro lado, os infantes humanos podem viver, apesar de sua incapacidade física, exatamente por causa de sua capacidade social. Falamos e pensamos, às vezes, como se simplesmente sucedesse acharem-se eles fisicamente em um ambiente social; como se as forças sociais existissem exclusivamente nos adultos que lhes dão seus cuidados, sendo os infantes meros seres de receptividade passiva. -Se disséssemos que as crianças são por si mesmas maravilhosamente dotadas da faculdade de atrair a atenção cooperadora das outras pessoas, pensar-se-ia ser isto um modo indireto de afirmar que as outras pessoas são maravilhosamente atentas às necessidades das crianças. Mas a observação nos mostra serem estas dotadas de um equipamento de primeira ordem para as relações sociais. Poucos adultos conservam toda a plástica e sensível aptidão das crianças para vibrarem em harmonia com as atitudes e atos das pessoas entre as quais vivem. A desatenção para com as coisas materiais (associada à sua incapacidade para dominá-las) é acompanhada de uma proporcional intensificação de interesse e de atenção pelos atos das outras pessoas. O mecanismo vital e inato da criança, e seus impulsos, tudo contribui para facilitar a correspondência de natureza social. Mesmo que fosse verdade o que se afirma, de serem as crianças egoístas antes da adolescência, isso não invalidaria a verdade do que expusemos. Indicaria, simplesmente, que

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Sob o ponto de vista social, a dependência denota, portanto, mais uma potencialidade do que uma fraqueza; ela subentende interdependência. Existe sempre o perigo de que a crescente independência pessoal faça decrescer a capacidade social de um indivíduo. O tornar-se mais confiante em si pode fazê-lo bastar-se mais a si mesmo; pode levá-lo ao insulamento e à indiferença. Isto torna muitas vezes o indivíduo tão insensível em suas relações com os outros, que lhe faz nascer a ilusão de ser realmente capaz de manter-se e agir isolado — forma esta, ainda sem nome, de insanidade mental que é responsável por grande parte dos sofrimentos remediáveis deste mundo. II — A aptidão especial de um imaturo para crescer constitui sua plasticidade. Esta é coisa mui diversa da plasticidade do mástique ou da cera. Não é a propriedade de mudar de forma de acordo com a pressão exterior. Parece-se mais com a elasticidade com que algumas pessoas assumem a cor de seu ambiente, conservando, ao mesmo tempo, as próprias inclinações. Mas é algo mais profundo do que isto. Em sua essência, é a aptidão de aprender com a experiência, o poder de reter dos fatos alguma coisa aproveitável para solver as dificuldades de uma situação ulterior. Isto significa — poder modificar seus atos tendo em vista os resultados de fatos anteriores, o poder de desenvolver atitudes mentais. Sem isto seria impossível contraírem-se hábitos.

Democracia e educação

A educação como crescimento

É familiar o fato de que os filhos dos animais superiores, e especialmente os dos humanos, precisam aprender a utilizar-se de suas reações instintivas. O ser humano nasce com maior número de tendências instintivas do que os outros animais. Mas os instintos destes se aperfeiçoam por si mesmos, para a ação conveniente, pouco tempo depois do nascimento, ao passo que a maioria dos do infante humano pouco lhe valem do modo como eles existem. Uma aptidão inata especializada para determinada adaptação assegura uma eficiência imediata — mas, como um bilhete de via férrea, só' serve para dado percurso. O ser que, com o fim de se utilizar dos olhos, dos ouvidos, das mãos e das pernas, tem que experimentar fazer variadas combinações de suas reações, consegue maleável e variado domínio dos mesmos. Um pinto, por exemplo, aprende a bicar com perfeição o alimento poucas horas depois de sair do ovo. Isto significa que, com poucas tentativas, ele consegue perfeita coordenação das funções dos olhos, para ver, e do corpo e da cabeça para dar as bicadas. Já unia criança necessita de seis meses para calcular com alguma perfeição os movimentos coordenados com sua atividade visual, para alcançar alguma coisa — isto é, de ser capaz de saber se pode atingir o objeto visto e como executar este ato com justeza. O resultado é que a atividade do pinto se restringe devido à relativa perfeição de seu equipamento inato, ao passo que a criança tem a vantagem da multidão de reações instintivas feitas em tentativas sem-fim e da experiência obtida com isto, sem embargo da temporária desvantagem de se prejudicarem aquelas mutuamente. O aprender a prática de um ato, quando não se nasce sabendo-o, obriga a aprender-se a variar seus fatores, a fazer-se combinações sem conta destes, de acordo com a variação das circunstâncias. E isso traz a possibilidade de um contínuo progresso, porque, aprendendo-se um ato, desenvolvem-s e métodos bons para outras situações. Mais importante ainda é que o ser humano adquire o hábito de aprendçr. Aprende a aprender. A significação, para a vida humana, das duas circunstâncias — dependência e modo variável de resolver e controlar situações — foi posta em destaque na teoria da importância da infância prolongada (1). Este prolongamento é impor-

tante, não só do ponto de vista dos membros adultos da comunidade, como também no das crianças. A presença de seres dependentes de nós e a aprenderem as coisas é um estímulo à criação e à afeição. A necessidade de cuidados incessantes com a prole foi provavelmente o principal fator, para transformar as coabitações temporárias em uniões permanentes. Primacial foi também sua influência para fazer surgir os hábitos de vigilância afetuosa e simpática — esse interesse real e ativo pelo bem-estar alheio, interesse essencial à vida em comum. Intelectualmente, tal desenvolvimento moral significa o aparecimento de novos objetos de atenção -— significa estimular-nos a ser previdentes e a formar planos para o futuro. E, daí, por conseguinte, uma influência recíproca, A crescente complexidade da vida social requer cada vez mais prolongado período de infância para se adquirirem as necessárias aptidões; e prolongamento da dependência corresponde a prolongamento da plasticidade ou faculdade de se adquirirem novos e vários modos de direção. E, em consequência, maior impulso ao progresso social.

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I j Encontram-se em vários escritores referências, à sua importância, mas John Fiske, em seu livro " Excursões de um Evolucionista", apresenta a primeira, exposição sistemática da matéria. N. do A.

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2. Os hábitos como manifestações de crescimento. — Já observamos que a plasticidade é a faculdade de reter e extrair da experiência anterior elementos que modificarão os atos subsequentes. Isto significa a capacidade de contrair hábitos ou desenvolver determinadas atitudes. Consideremos agora as características essenciais dos hábitos. Em primeiro lugar, um hábito é uma habilitação, uma aptidão executiva, uma capacidade de fazer. Um hábito significa a capacidade de utilizar as condições naturais como meios para a realização de objetivos. É um domínio ativo sobre o ambiente, por meio do comando dos nossos órgãos de ação. Somos, talvez, inclinados a dar maior importância a esse domínio e comando do corpo, do que ao comando e domínio do ambiente. Encaramos os atos de andar, falar, tocar piano, as aptidões especiais características do gravador, do cirurgião, do engenheiro, conio se fossem simplesmente habilidade, perícia e perfeição da parte do organismo. São-no, sem dúvida, mas a medida do valor destas qualidades reside no domínio eficaz e económico sobre o ambiente, que elas asseguram. Ser capaz de caminhar é ter ao nosso dispor certas propriedades da natureza — e o mesmo sucede em relação aos demais hábitos.

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Democracia e educação

A educação como crescimento

Não raro define-se a educação como a aquisição dos hábitos indispensáveis à adaptação do indivíduo a seu ambiente. Esta definição se aplica a um aspecto fundamental do crescimento. Mas é essencial que se entenda tal ajustamento ou adaptação no sentido ativo de assenhoreamento de meios para a realização de fins em vista. Se julgarmos seja um hábito mera modificação realizada no organismo, abstraindo da circunstância de que esta modificação consiste na aptidão para efetuar subsequentes modificações do ambiente, seremos levados a considerar que "adaptação" é uma conformidade com o meio, igual à da cera em relação ao sinete que se grava nela. Subentender-se-ia que o ambiente fosse algo de fixo, que proporcionasse, em sua fixidez, o fim e o modelo das mudanças que se efetuam tio organismo; e a adaptação seria o nos ajustarmos exatamente a esta fixidez das condições externas (1). Hábito, em certo sentido, é em verdade algo relativamente passivo; habituam-nos às coisas entre as quais vivemos, às nossas roupas, ao nosso calçado e às nossas luvas; ao clima, quando mantém certa uniformidade; aos companheiros de cada dia, etc. Conformidade com o meio, mudança no organismo sem se criar a aptidão para modificar aquele meio, é o traço saliente de tais hábitos. Além do fato de que não somos capazes de converter os resultados desses ajustamentos (que bem se poderiam chamar acomodações, para diferençarem:se da adaptação ativa) em hábitos operantes e ativos sobre o nosso meio, são dignos de registro dois aspectos de tais hábitos passivos. Em primeiro lugar, nós nos acostumamos às coisas, usando-as antes. Consideremos o fato de nos habituarmos a uma cidade desconhecida. A princípio, excessivos estímulos e respostas excessivas e mal adaptadas. Gradativamente certos estímulos se selecionam por sua relevância, ao passo que outros se enfraquecem. Poderíamos então dizer — que não correspondemos mais aos mesmos, ou, mais verdadeiramente, que estabelecemos uma correspondência permanente com eles — um equilíbrio de adaptação. Em segundo lugar, é essa adaptação definitiva que fornece o fundamento sobre o qual ocorrerão outras adaptações especiais, quando surgir o ensejo. Nunca nos in-

teressamos, de fato, em transformar todo o ambiente; consideramos definitiva grande parte dele e a aceitamos tal qual é. Com esta base, passam as nossas atividades a se focalizarem sobre certos pontos, esforçando-se por implantar mudanças necessárias. A acomodação ou hábito passivo é, assim, nossa adaptação a uma parte do meio que, no momento, não nos interessa modificar, adaptação que serve de ponto de apoio para a formação dos nossos hábitos ativos. A adaptação, finalmente, é tanto a adaptação do meio à nossa atividade, como a de nossa atítuidade ao meio. Uma tribo selvagem procura viver em uma planície deserta. Ela adapta-se. Mas a sua adaptação se faz com o máximo de conformidade, de tolerância, de utilização .das coisas tal qual existem, o máximo de aquiescência passiva e o mínimo de influxo ativo, de domínio das coisas a serem usadas. Entra em cena um povo civilizado. Ele também se adapta. Introduz a irrigação, pesquisa em todo o mundo plantas e animais que resistam àquelas condições; aperfeiçoa, por uma cuidadosa stleção, os já existentes no lugar. A consequência é que o deserto floresce como uma roseira. O selvagem apenas se habituou; o civilizado tem hábitos que transformam o ambiente. A significação de hábito não se esgota, porém, com os seus aspectos executivo e motriz. Importa na formação de uma disposição intelectual e emocional tanto quanto um acréscimo de facilidade, economia e eficácia de ação. Todo o hábito indica uma inclinação — uma preferência e escolha positivas das condições necessárias à sua manifestação. Um hábito não espera, como o personagem MICAWBER, de DICKENS, que algum estímulo apareça para se dar a alguma tarefa; ele procura ativamente ocasiões para se exercer. Se esse exercício for indevidamente tolhido, a tendência e inclinação para ele manifestam-se por um mal-estar e intenso anseio de agir. Um hábito significa, por outro lado, uma atitude de inteligência. Onde existe um hábito, existe o conhecimento dos materiais e do aparelhafnento a que se aplica a atividade. Há uma compreensão certa das situações em que o hábito atua. Modos de pensar, de observar e de refletir constituem formas de habilidade e de desejo inerentes aos hábitos que fazem um homem ser engenheiro, arquiteto, médico ou negociante. Nas modalidades de trabalho que exigem menos aptidões, os fatôres intelectuais se reduzem ao mínimo porque não são de tipo elevado os hábitos que elas subentendem. Mas tanto existem

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1) Esta concepção está, naturalmente, em correlação lógica com as concepções das relações exteriores entre estímulo e resposta, ^considerados no último capítulo, e com as concepções negativas de imaturidade e de plasticidade, de que tratamos no presente capítulo.

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Democracia e educação

hábitos de julgar e de raciocinar, como de manejar um utensílio, pintar um quadro ou conduzir uma experiência. Essas considerações estão, entretanto, aquém da realidade. O que, em verdade, dá importância aos hábitos dos olhos e das mãos, são os hábitos intelectuais que eles subentendem. Mais do que tudo, é o elemento intelectual de um hábito que lhe garante o uso variado e elástico e, por conseguinte, o seu contínuo crescimento. Falamos, muitas vezes, de hábitos -fixos, Tal expressão pode significar forças e capacidades tão bem implantadas que delas podemos sempre dispor em caso de necessidade. Mas a frase é também usada para exprimir exatamente processos rotineiros, sem frescura, sem largueza de vistas e sem originalidade. Fixidez de hábitos significa, então, que alguma coisa nos mantém sob o seu domínio em vez de sermos nós que podemos livremente lançar mão das coisas. Este fato explica dois pontos da noção comum relativa aos hábitos: sua identificação com as modalidades da ação mecânica e externa, em detrimento das atitudes morais e mentais, e a tendência a dar-lhes significação pejorativa equivalente a "maus hábitos". Muitas pessoas se surpreenderiam ao ouvir chamar "hábitos" sua aptidão na profissão escolhida, e pensariam naturalmente no seu hábito de fumar, de beber ou em outras coisas da linguagem profana com a típica significação de hábitos. Um hábito, para elas, é alguma coisa que as tem sob seu domínio e de que não se libertam facilmente mesmo que, pela razão, a condenem. Os hábitos se reduzem a rotineiros modos de proceder, ou degeneram em modos de proceder a que nos escravizamos na medida em que a inteligência se dissocia dos mesmos. Hábitos rotineiros são hábitos irreflexivos; "maus" hábitos são hábitos tão apartados da razão que se acham em conflito com as conclusões da deliberação e decisão conscientes. Segundo já vimos, a aquisição de hábitos é devida à plasticidade de nossa natureza: à nossa aptidão para variar as reações ou respostas, até encontrarmos um apropriado e eficiente modo •de proceder, uma conduta adequada. Hábitos rotineiros ou hábitos que nos possuem em vez de serem possuídos por nós, são hábitos que põem termo a tal plasticidade. Eles assinalam o fim da aptidão para variar. Não pode ser posta em dúvida a tendência da plasticidade orgânica, de base fisiológica, em diminuir com o decurso do tempo. A ativídade instintivamente móvel e inquieta ou ansiosa cie variedade, da idade infantil, o

A educação como crescimento

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gosto pelos novos estímulos e novas experiências resvala depressa para uma estabilidade que significa aversão às mudanças e o contentar-se com as realizações e conquistas passadas. Só pode contrastar e deter esta tendência um ambiente que assegure o pleno funcionamento da inteligência no processo de contrair hábitos. Por certo, o emperramento das estruturas orgânicas afeta as funções fisiológicas que intervêm no ato de pensar. Mas esta circunstância patenteia exatamente a necessidade de perseverantes cuidados para que a função da inteligência seja levada a seu máximo de possibilidades. O método de vistas curtas que recorre à rotina e repetição maquinais para garantir a eficácia exterior do hábito e a habilidade motora, sem correspondente esforço mental, significa uma voluntária supressão de horizontes ao crescimento. 3. A significação educacional do conceito do desenvolvimento, — Até aqui, pouco temos tido que dizer, neste capítulo-, acerca de educação. Ocupamo-nos com as .condições de crescimento e com o que este subentende. Se nossas conclusões são justas, elas acarretam consigo determinadas consequências educacionais. Quando se diz que educação é desenvolvimento, tudo depende do como se concebe este desenvolvimento. Nossa conclusão essencial é que vida é desenvolvimento e que o desenvolver-se, o crescer é a vida. Traduzido em termos educacionais equivalentes, isto significa: 1.°) que o processo educativo não tem outro fim além de si mesmo: ele é seu próprio fim; e que, 2.°) o processo educativo é um contínuo reorganizar, reconstruir, transformar, 1.° — Considerado comparativamente, isto é, com referência às características especiais da vida infantil e da vida adulta, o desenvolvimento significa a orientação da energia e das forças latentes para canais especiais: a formação de hábitos implicando capacidade prática executiva, interesses definidos e certos e objetivos específicos para a observação e a reflexão. Mas essa apreciação relativa não diz tudo. A criança é possuidora, por certo, de aptidões especiais: desprezar esta circunstância é mutilar ou deformar os órgãos de que depende seu desenvolvimento. Mas, por seu lado, o adulto utiliza-se de suas aptidões para transformar o ambiente em que vive, ocasionando com isso o aparecimento de novos estímulos que reorientam suas energias e as mantêm em desenvolvimento. A

A educação como crescimento ignorância deste fato significa parada de crescimento ou simples acomodação passiva ao ambiente. Logo, por outras palavras — tanto as crianças normais como os adultos normais se estão a desenvolver. A diferença entre eles não é a que existe entre desenvolver-se e não se desenvolver, e sim a que existe entre modos de desenvolvimento adequados a condições diferentes. Com relação ao desenvolvimento de aptidões destinadas a lidar e resolver problemas especiais científicos e económicos, poderemos dizer que a criança se desenvolve para tornar-se cada vez mais adulta. E com referência à curiosidade simpatizante, às reações francas e à receptividade mental poderemos dizer que o adulto se desenvolve à medida que se reaproxima da infância. Tão verdadeira é uma afirmativa quanto a outra. Três ideias que já criticamos — o considerar-se a imaturidade uma simples deficiência, a adaptação um ajustamento estático a um ambiente fixo e o hábito como coisa rígida e mecânica — se ligam e se prendem, todas elas, a uma falsa ideia de crescimento ou desenvolvimento, isto é, ser este uma evolução, uma marcha para um alvo fixo. Considera-se que o desenvolvimento tem um fim, em vez de ser ele próprio um fim. Os equivalentes educacionais daquelas três falsas ideias são: primeiro, não se tomarem em conta as forças ou capacidades instintivas ou inatas dos educandos; segundo, não se desenvolver o espírito de iniciativa para com as situações novas; terceiro, um injustificável exagero dos métodos mecânicos de ensino (drill) ou de outros artifícios que asseguram a habilidade automática, em prejuízo da percepção pessoal. Em todos os três casos toma-se o ambiente do adulto como modelo e alvo para o imaturo. Este deve ser levado até ao adulto. Os instintos naturais não são tomados em conta ou são tratados como coisas nocivas — como traços prejudiciais a serem suprimidos, ou, pelo menos, a serem postos em conformidade com os padrões externos adotados. Uma vez que essa conformidade é o objetivo, tudo o que é caracteristicamente individual em uma pessoa nova deve ser posto à margem, ou considerado como fonte de mal e de anarquia. Torna-se a conformidade uma coisa equivalente à uniformidade. Em consequência disto, origina-se falta de interesse pelo novo, aversão ao progresso e temor do incerto e do desconhecido. Uma vez que a finalidade do desenvolvimento se acha fora e além do processo do desenvolvimento, recorre-se a agentes

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exteriores para provocar a marcha para aquela finalidade. Sempre que for estigmatizado como mecânico algum método educativo, podemos ter a certeza da existência da compulsão externa para fazer atingir um fim externo. 2.° — Desde que em realidade o desenvolvimento ou crescimento é apenas relativo a um maior desenvolvimento ou crescimento, a nada se subordina a educação, a não ser a mais educação. É lugar-comum dizer-se que a educação não cessa ao sair-se da escola. O sentido deste lugar-comum é ser o intuito da educação escolar assegurar a continuação da educação coordenando as energias e organizando as capacidades que asseguram o permanente desenvolvimento. A tendência a aprender-se com a própria vida e a tornar tais as condições da vida que todos aprendam com o processo de viver, é o mais belo produto da eficiência escolar. Quando desistimos de tentar definir a imaturidade por uma comparação rígida com as realizações dos adultos, somos forçados a desistir de considerá-la como denotando a falta de característicos desejados. Abandonando esta noção, somos também forçados a desistir de nosso hábito de considerar a instrução como um meio de suprir essa falta, despejando os conhecimentos em um vazio mental e moral que aguardava a ocasião de ser preenchido. Se a significação da vida é desenvolvimento, tão verdadeira e positivamente vive uma criatura em uma fase como noutra, com a mesma plenitude intrínseca e as mesmas exigências absolutas. Daqui se infere que educação significa a empresa de suprir as condições que asseguram o crescimento ou desenvolvimento, — a adequação da vida — independentemente da idade. Com efeito, se encaramos com impaciência a imaturidade, considerando-a uma coisa que deve findar o mais cedo possível, logo depois, quando adultos, por isso que fomos formados por esses métodos educativos, volvemos o olhar com viva saudade para a infância e adolescência passadas, como se contemplássemos um cenário de oportunidades perdidas e energias esperdiçadas. Veremos ironicamente esta situação perdurar até reconhecermos que a vida em qualquer tempo tem suas próprias qualidades intrínsecas e que a tarefa da educação é aplicar-se a essas qualidades. A compreensão de que vida é crescimento, é desenvolvimento, protege-nos contra essa "idealização" da infância, que em verdade não passa de uma ociosa fantasia. Não se pode identificar a vida com qualquer ato e interesse superficiais.

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A educação como crescimento

Embora não seja sempre fácil saber se o que parece mera peraltice sem significação não será um indício do surgir de alguma energia ainda indisciplinada, deveremos lembrar-nos de que essas manifestações não devem ser tomadas como fins em si mesmas. São sinais de possível crescimento. Devem ser convertidas em meios de crescimento, de transmissão de energia para a frente, e não toleradas ou cultivadas por si mesmas. A atenção excessiva aos fenómenos superficiais (não só por meio da censura como também pelo do incitamento) pode causar a sua fixação e, portanto, a parada do desenvolvimento. O importante para o pai ou para o mestre é saber para onde esses impulsos se dirigem e não aquilo que eles são. O verdadeiro princípio do respeito à imaturidade não pode ser melhor expresso do que com as palavras de EMERSON : "Respeitai a criança. Não sejais em excesso pais dela. Não a perturbeis em sua solidão. Mas ouço a grita dos que me replicam: — Isso é abandonar as rédeas da disciplina pública e particular; desejais que a criança se entregue loucamente a suas paixões e caprichos e dais a esta anarquia o nome de respeito pela natureza infantil? — Responderei: — Respeitai a criança, respeitai-a até o fim, mas também respeitai-vos a vós mesmos,.. Os dois pontos essenciais na educação de um adolescente são: conservar o que lhe é natural e desprezar tudo o mais; conservar seu natural, .mas reprimir suas algazarras, travessuras e brinquedos abrutados; resguardar seu natural e arma-lo de conhecimentos em todas as direções para onde esse natural se incline". E prosseguindo EMERSON a mostrar seu respeito pela puerícia e pela adolescência, em vez de rasgar para os professores uma senda fácil de trilhar, diz sobre a educação que "ela muito exige do tempo, e muito da reflexão do mestre. É coisa que requer tempo, hábito, clarividência, oportunidade e todas as grandes lições e auxílios de Deus; e só o pensar em aplicá-la subentende caráter e profundeza de vistas".

fins humanos. Os hábitos tomam uma forma passiva ou de equilíbrio geral e persistente da atividade orgânica com p meio — e uma forma ativa de aptidões para readaptar a atividade a condições novas. A primeira fornece a base para o crescimento, o desenvolvimento; a segunda constitui o desenvolvimento. Os hábitos ativos subentendem reflexão, invenção e iniciativa para dirigir as aptidões a novos fins. Eles são o contrário da rotina, que assinala uma parada do desenvolvimento. Uma vez que este é a característica da vida, educação e desenvolvimento constituem uma só coisa. O desenvolvimento não tem outro fim a não ser ele próprio. O critério do valor da educação escolar está na extensão em que ela suscita o desejo de desenvolvimento contínuo e proporciona meios para esse desejo.

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Resumo. — Capacidade de crescer decorre do estado de dependência de outras pessoas, e de plasticidade. Estas duas condições encontram-se em sua plenitude na infância e na adolescência. Plasticidade ou capacidade de aprender com a experiência significa formação de hábitos. Os hábitos dãonos o domínio sobre o meio e a capacidade de utilizá-lo para

Preparação e disciplina formal

CAPITULO 5

Preparação, desdobramento e disciplina formal l. A educação como preparação. — Já deixamos exposto que o processo educativo é um processo de contínuo desenvolvimento, tendo como objetivo, em cada fase, uma capacidade aumentada de desenvolvimento. Esta concepção contrasta vivamente com outras ideias que têm influenciado a prática do ensino. Tornando-se bem patente o contraste, ver-se-á mais claro a significação deste conceito. O primeiro contraste é com a ideia de que a educação é um processo de preparação ou de ficar-se preparado. Preparado, naturalmente, para as responsabilidades e regalias da idade adulta. As crianças não são encaradas como membros sociais em situação definida e regular. Encaram-nas como candidatos; colocam-nas na lista dos que esperam. Esta mesma ideia é levada um pouco mais longe quando se considera não ter, a vida do adulto, significação por si mesma e ser apenas provação preparatória para a "outra vida". Trata-se, no fundo, de outro aspecto da noção já criticada do caráter negativo do desenvolvimento, ísto é, de consistir em preencher um vazio, por isso não repetiremos a argumentação e passaremos a tratar das más consequências que advêm do assentar-se a educação sobre" tais cimentes. Em primeiro lugar, subentende perda de impulso. Não é utilizada a energia motriz. Como é proverbial, as crianças vivem no presente; não só é circunstância a não ser omitida, como também é uma excelência. O futuro, em sua qualidade de futuro, não tem para elas estímulos nem realidade. Preparar-se para alguma coisa, não se sabe qual, nem porque, é desprezar a energia motora existente para confiar-se na de uma vaga probabilidade. Em tais circunstâncias, favorece tal concepção a vacilação e a procrastinação. E essa é a segunda

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má consequência da ideia da educação como preparação. Muito remoto é o futuro para que se prepara o educando; levará muito tempo para tornar-se presente. Para que pressas no aprontarmo-nos para ele? a tentação de protelar cresce ainda mais em face das muitas maravilhosas oportunidades de aventuras, para que o presente convida irresistivelmente. É natural que a atenção c a energia se dirijam para elas; a educação se enriquece em resultado disso, mas esta educação é inferior à que se conseguiria caso se houvesse empregado todo o esforço para tornarem-se as condições do presente o mais educativas possível. Um terceiro resultado indesejável é a substituição de um padrão relativo às aptidões especiais do educando, pelo padrão médio convencional de requisitos e exigências. O rigoroso e nítido julgamento baseado nos pontos fortes e fracos do indivíduo é substituído por uma vaga e hesitante opinião relativa ao que se pode, em geral, esperar que o jovem se torne em um futuro mais ou menos remoto — isto é, no fim do ano, por ocasião das promoções, ou no tempo em que esteja preparado para ingressar em uma academia ou penetrar naquilo que, em contraste com o estágio da preparação, é considerado o lado serio da vida. É impossível exagerar a perda resultante de desviar-se a atenção do ponto verdadeiramente estratégico, que é o presente, para esse outro relativamente infecundo. Falha o processo exatamente no que procura, intencionalmente, conseguir: — a preparação de alguém para o futuro. Finalmente, a teoria da preparação obriga-nos a recorrer em grande escala ao uso de motivos artificiais de prazer e de dor. Como o futuro não tem poder estimulante e orientador quando separado das possibilidades do presente, algo .deve ser descoberto para exercer aquela função. Empregam-se então promessas de recompensa e ameaças de punição. Trabalho sadio, realizado por motivos atuais e inerente ao próprio processo de viver, é, por assim dizer, automático e inconsciente. O estímulo se acha na situação que se depara atualmente a alguém. Mas desde que se atende a esta situação, precisa-se dizer aos alunos que, se não procederem do modo prescrito, sofrerão a imposição de penas; e, caso obedeçam, podem esperar daí a algum tempo, no futuro, recompensas a seus sacrifícios presentes. Todos sabem quão fartamente se houve de recorrer aos sistemas de punições nos métodos educativos que esquecem as possibilidades presentes, em proveito da prepa-

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ração para o futuro. Para que, depois, o desgosto pela rudeza e esterilidade desse método faça o pêndulo oscilar para o extremo oposto e já agora, não são penas, mas atrações artificiais, engodos, rebuçados de açúcar, que faraó com que os alunos aceitem as doses de informações por que não se interessam, mas que lhes devem ser ministradas em virtude das necessidades futuras. A questão, por conseguinte, em debate Jião é que a educação prepare para o futuro. Se educação é desenvolvimento, ela deve progressivamente realizar as possibilidades presentes, tornando assim es indivíduos rríais aptos a lidar mais tarde com as exigências do futuro. O desenvolvimento não é coisa que se torne completa em determinada ocasião; é um contínuo conduzir para o futuro. Se o ambiente, na escola ou fora dela, fornecer as condições que ponham adequadamente em ação as aptidões do imaturo, é certo beneficiar-se com isso o futuro, que é produto do presente. O erro não está propriamente em cuidar-se da preparação para as futuras necessidades e sim em tornar essa preparação a mola real do esforço presente. Sendo grande a necessidade de preparação para uma vida em contínua evolução, urge empregarem-se todas as energias para tornar-se a experiência presente a mais rica e significativa possível. E como o presente insensivelmente se transforma em futuro, segue-se que, assim procedendo, também teremos tomado em conta o futuro.

última fraqueza do espírito em sua transição da compreensão estática da vida para a compreensão dinâmica. É uma simulação desta última concepção. Paga o tributo de falar muito em desenvolvimento, processo, progresso. Mas todas estas operações são meramente transitórias, não tendo, em si mesmas, significação. Apenas possuem significação como movimentos para chegar-se a alguma coisa remota para a qual nos dirigimos. Uma vez que o desenvolvimento é simplesmente um movimento para atingir-se um completo- modo de ser, o ideal final é imóvel. Um futuro abstrato e indefinido é o que prepondera, com tudo o que ele subentende, em detrimento das energias e oportunidades atuais. Como o alvo da perfeição, o alvo a que tende o desenvolvimento se encontra muito longe e muito para além de nós próprios, a consequência rigorosa é ser inatingível. Por isso, para ser utilizado como guia no presente, deverá ser traduzido em alguma coisa que o substitua. De outro modo, seríamos compelidosj a considerar todas as manifestações da criança como um expandir-se das faculdades latentes, e, por essa causa, como coisas sagradas. Se não obtivéssemos algum critério definido que representasse o fim ideal para julgar, por meio dele, se dada atitude ou dado ato é, com referência àquele fim, uma aproximação ou um recuo, nossa única alternativa seria suprimir todas as influências do' meio para que não prejudicassem o desenvolvimento conveniente e adequado. Não sendo isto exequível, cumpre recorrer-se a um substituto. Em regra, naturalmente, esse substituto do ideal último é alguma ideia que os adultos desejariam que a criança adquirisse. Por conseguinte, recorrendo a "perguntas e respostas", ou a outro artifício pedagógico, o professor trata de "extrair" dos discípulos aquilo que é desejado. Se o conseguiu, isto demonstra que a criança se está desenvolvendo convenientemente. Mas como o discípulo não tem geralmente inciativa própria neste sentido, .o resultado é um tatear ao acaso para se encontrar o que se quer, e a formação de hábito de dependência das "deixas" fornecidas por outros. Exatamènte porque estes métodos se baseiam simula dam ente num princípio verdadeiro e proclamam ter a sanção deste princípio, podem causar mais dano do que o método totalmente "verbal", onde resta, pelo menos, muita coisa a que o aluno possa apegar-se. Dentro da esfera do pensamento filosófico houve duas tentativas típicas para proporcionarem um substituto eficaz do

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2. A educação como desdobramento. — Existe uma concepção de educação que se declara basear-se na ideia de desenvolvimento. Ela, porém, toma com uma das mãos aquilo que dá com a outra. Não se concebe o desenvolvimento como um processo contínuo e sim como um desabrochar de faculdades latentes até atingirem um alvo definido. Este alvo é concebido como uma plenitude, urna perfeição. A vida em qualquer estágio é apenas um evoluir para atingir essa plenitude. Logicamente esta teoria é apenas uma variante da teoria da preparação. Praticamente diferem as duas, porque os partidários da última insistem mais nos deveres práticos e profissionais para os quais alguém se está preparando, ao passo que a teoria do desdobramento tem em vista as qualidades ideais e espirituais da aptidão que se está a desenvolver. A concepção de que o desenvolvimento e o processo consistem no aproximar-se de um último objetivo imutável é a

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fim absoluto. Ambas partiram da concepção de um todo —- de um absoluto — "imanente" à vida humana. O ideal perfeito ou completo não é mero ideal; ele atua, é uma força operante em cada lugar e em cada momento. Mas só implicitamente é que está presente: "potencialmente" ou em uma condição virtual. Aquilo que se chama desenvolvimento é a ação gradual de descobrir e exteriorizar o que assim se encontra rebuçado. FROEBEL e HEGEL, autores das duas tentativas filosóficas a que nos referimos, têm ideias diferentes do meio por que se efetua a progressiva realização ou manifestação do princípio absoluto. Segundo Hegel, essa manifestação se corporifica numa série de instituições históricas que encarnam os diferentes fatores no Absoluto. De acordo com FROEBEL., a força atuadora é a apresentação de símbolos, em grande parte matemáticos, correspondentes aos traços essenciais do Absoluto. Sendo eles apresentados à criança, desperta o Todo ou a perfeição que dorme em seu íntimo. Um simples exemplo esclarecerá o método. Todas as pessoas fa.miliarizada com os jardins de infância conhecem o modo de reunir-se, em círculo, das crianças. Pois bem, o círculo não é apenas um modo convencional de reunir as crianças; ele deve ser usado íf por ser um símbolo da vida coletiva da humanidade em geral". O reconhecimento, por parte de Froebel, da importância das aptidões inatas das crianças, sua carinhosa atenção para com elas e -seu influxo para induzir os outros a estudá-las, representam talvez a contribuição individual mais eficaz, na moderna teoria educacional, para o reconhecimento amplo da ideia do desenvolvimento. Mas a sua formulação da noção do desenvolvimento e a organização de artifícios educativos para incentivá-lo foram grandemente dificultadas pela circunstância de que ele concebia o desenvolvimento como o desdobramento de um princípio latente e já formado. Não conseguiu ver que crescimento é crescer, desenvolvimento é desenvolver, e por isso deu maior importância ao resultado, ao produto, do que ao processo. Deste modo estabeleceu uma finalidade, um objetivo que significada a parada do desenvolvimento e um critério não aplicável à imediata orientação das aptidões a não ser pela sua conversão em fórmulas abstratas e simbólicas. Um objetivo último de completo desdobramento ou desenvolvimento é, conforme a linguagem técnica filosófica, transcendental, isto é, coisa à parte da experiência e percepção diretas. No que diz respeito à experiência, é vazio; representa

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mais uma vaga aspiração sentimental do que alguma coisa que possa ser inteligentemente apreendida e exposta. Esta imprecisão deve ser compensada com alguma fórmula a priori. FROEBEL ligou os fatos concretos da experiência com o ideal transcendental do desenvolvimento, considerando os primeiros como símbolos do último. Considerar símbolos as coisas conhecidas, de acordo com alguma arbitrária fórmula a priori —• todas as concepções a priori são arbitrárias — é um incitamento para a fantasia romântica se prender a analogias que lhe agradem, tratando-as como leis. Depois de bem fixado o plano do simbolismo, deve-se inventar alguma, técnica precisa por meio da qual se possa transmitir aos alunos a íntima significação dos símbolos sensíveis. Como os adultos são os formuladores do simbolismo, também são eles, naturalmente, os criadores e íiscalizadores da técnica. O resultado foi que o amor de FROEBEL ao simbolismo abstrato absorveu, muitas ve^ zes, o melhor de sua intuição profunda e natural; e o desenvolvimento infantil teve como substituto um plano autoritário tão arbitrário e externamente imposto como nunca a história da educação vira outro igual. , Quanto a HEGEL, a necessidade de encontrar algum equivalente concreto e eficaz do inacessível Absoluto tomou aspecto mais institucional do que simbólico. Sua filosofia, assim como a de FROEBEL, faz, em certa direção, uma contribuição indispensável a uma válida concepção do processo da vida. Era evidente para ele a fragilidade de uma abstraía filosofia individualista;, viu a impossibilidade de eliminar a influência das instituições históricas, de tratá-las como formas de despotismo geradas pelo artifício e sustentadas pela fraude. Em sua filosofia da história e da sociedade culminaram os esforços de toda uma série de escritores alemães — LESSING, HERDER, KANT, SCHILLER, GOETHE — para avaliarem a influência formadora dos grandes produtos coletivos institucionais da humanidade. Para os que aprenderam a lição desse movimento, seria de então por diante impossível conceber as instituições ou a cultura como coisas artificiais. Ele destruiu por completo — em teoria, não de fato •— a psicologia que considerava o "espírito uma coisa já completa, possuidora pelo indivíduo, em si mesmo, mostrando a importância do espírito objetivo" — a linguagem, o governo, a arte, a religião — na formação mental dos indivíduos. Mas como HEGEL estava obcecado pela concepção de uma finalidade absoluta,

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viu-se íorçado a arranjar as instituições, tais quais existiam concretamente, em uma escala de crescentes aproximações. Cada uma delas é em seu tempo e lugar absolutamente necessária, porque constitui um estágio do processo de auto-realização do espírito absoluto. Consideradas assim como graus ou estágios, sua existência prova-lhes a perfeita raciomlidade, pois constituem um elemento integrante do total, que é a Razão. Contra as instituições, tais como existem, os indivíduos não têm direitos espirituais; o desenvolvimento e a educação pessoais consistem na assimilação passiva do espírito das instituições existentes. A essência da educação é, pois, a conformidade e não a transformação. Mudam-se as instituições, conforme a história nos mostra, mas, sua mudança, o surgir e o decair das nações, é obra do "Espírito do Tempo". Tirante os grandes "heróis", que são os escolhidos para órgãos do "Espírito do tempo", os indivíduos não tomam parte naquelas mudanças. Nos fins do século XIX esta espécie de idealismo fundiu-se com a teoria da evolução biológica. A "Evolução" era uma força em atividade para a realização de seus próprios fins. Contra ela, ou relativamente a ela, são impotentes as ideias conscientes e as preferências individuais. Ou antes, são apenas o meio pelo qual a evolução se manifesta. O progresso social é um "crescimento orgânico" e não uma seleção experimental. A Razão é todo-poderosa, mas só a Razão Absoluta é dotada de tal poder. O reconhecimento (ou a redescoberta, pois a ideia era familiar aos gregos) de que as grandes instituições históricas são fatores ativos do desenvolvimento intelectual foi grande contribuição para a filosofia da educação. Significou um genuíno progresso sobre ROUSSEAU, que havia prejudicado sua asserção de que a educação deve ser um desenvolvimento natural e não uma coisa exteriormente implantada ou enxertada à força nos indivíduos, com a noção de que as condições sociais não são naturais. Mas em sua noção de uni objetivo final e absoluto para o desenvolvimento completo e que tudo incluísse em si, a teoria hegeliana destruiu as individualidades, embora enaltecendo o Indivíduo, em abstraio. Alguns continuadores de HEGEL procuraram conciliar as exigências do Todo e do indivíduo pela concepção da sociedade como um todo orgânico ou um organismo. Não se pode pôr em dúvida que a organização social pressuponha o adequado exercício da capacidade individual. Mas, organismo social, considerado de acordo

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com as relações dos órgãos do corpo uns com os outros e com todo o corpo, significa que cada indivíduo tem seu papel e funções limitados, e requer ser completado com os papéis e funções dos outros. Assim como se diferenciam as partes dos tecidos do corpo de modo que uma seja mão, e mão apenas, e outras olhos, e assim por diante, e constituindo todas juntas o organismo, também se supõe que um indivíduo se diferencie para os trabalhos materiais da vida social, outro para a função de estadista, outro para a de letrado, etc. Usa-se, deste modo, a noção de "organismo" para dar-se uma sanção filosófica à distinção de classes no organismo social — noção que, em suas aplicações educacionais, significa compressão exterior e, não, desenvolvimento. 3. A educação como o adestramento das faculdades. — Uma teoria que teve grande voga, e que surgiu antes que a noção do desenvolvimento assumisse grande importância, é conhecida pelo nome de teoria da "disciplina formal". Tinha ela em vista o ideal legítimo de que o resultado do processo educativo seria o criarem-se aptidões especiais para as realizações. Uma pessoa adestrada é a que pode fazer melhor as coisas que mais lhe importam, do que sucederia se não se tivesse adestrado; "melhor" aqui significa —• com maior facilidade, eficiência, economia, prontidão, etc. Que isto seja um resultado da educação subentende-se do que já foi dito sobre os hábitos como o produto do desenvolvimento educativo. Mas a teoria em questão toma, por assim dizer, um atalho; considera certas capacidades (que são atualmente discriminadas) como fins ou objetivos diretos e conscientes da educação e não simplesmente como resultados do desenvolvimento. Há um número determinado de capacidades a serem formadas, como se poderiam enumerar as espécies de golpes que um jogador de golfe teria de aprender. Por consequência, a educação deve diretamente visar ao exercício ou treino dessas capacidades. Mas isto subentende o já existirem elas em alguma forma não exercitada; de outro modo, sua criação seria o resultado indireto de outras espécies de atividade e de outros fatores. Já que existem numa forma bruta, basta o trabalho de adestrá-las em repetições constantes e gradativas, para que inevitavelmente se aperfeiçoem. Na frase "dis-

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ciptina formal' 1 aplicada a esta concepção, "disciplina" tanto se refere ao resultado das faculdades exercitadas, como ao método de aperfeiçoá-las por meio de exercícios repetidos» As espécies de capacidades em questão são tais coisas como as faculdades de perceber, decorar, recordar, associar, dar atenção, querer, sentir, imaginar, pensar, etc., que se modelam exercitando-se com o material apresentado. Em sua forma clássica, esta teoria foi expressa por LOCKE, De um lado o mundo exterior apresenta o material ou conteúdo do conhecimento por meio de sensações passivamente percebidas. Por outro lado, no espírito já existem certas faculdades como a atenção, a observação, as de reter, comparar, abstrair, combinar, etc. Resultará conhecimento se o espírito discriminar e combinar as coisas do modo como estão elas unidas e separadas na própria natureza. Mas o que importa para a educação é o exercício ou prática das faculdades do espírito até que de todo se tornem hábitos arraigados. As commrações frequentemente empregadas são a do jogador de bilhar e a do acrobata, que pelo emprego repetido e uniforme de certos músculos conseguem afinal uma habilidade automática. Até a faculdade de pensar se pode aperfeiçoar e converter em hábito por meio de exercícios reiterados de fazer e combinar simples distinções, para o que, no entender de LOCKE, as matemáticas apresentam inigualável material. As ideias de LOCKE se ajustavam perfeitamente ao dualismo de seu tempo. Pareciam dar quinhões iguais ao espírito e à matéria, ao indivíduo e ao mundo. "Uma fornecia a matéria do conhecimento e o objeto sobre o qual o espírito deveria atuar, a outra proporcionava determinadas faculdades mentais, que eram em número pequeno e podiam aperfeiçoar-se por meio de exercícios especiais. O plano parecia tomar na devida conta a matéria do conhecimento e ainda insistia em afirmar que o fim da educação não era a simples absorção e armazenagem de conhecimentos e sim a formação das faculdades pessoais da atenção, memória, observação, .abstração e generalização. Era realista em sua asserção categórica de que, qualquer que fosse o material, provinha este do exterior — e idealista, por ter como meta educativa a formação das faculdades intelectuais. Mostrava-se objetivo e impessoal em sua asseveração -de que o indivíduo, por sí próprio, não pode ter nem gerar quaisquer ideias verdadeiras; e individualista, por colocar a finalidade da educação no aperfeiçoamento de

certas faculdades possuídas, desde o começo da vida, pelos indivíduos. Esta espécie de distribuição de valores caracterizou, com exatidão, as ideias correntes nas gerações que se sucederam a LOCKE; converteu-se, sem expressa referência a LOCKE, em lugar-comum da teoria e psicologia educacionais. Parecia, virtualmente, traçar ao professor uma tarefa definida e, não, imprecisa. Tornou-se relativamente fácil a elaboração de uma técnica da educação. O necessário era somente tratar-se de submeter ao necessário exercício cada uma daquelas faculdades. Este exercício consistia em aios repetidos de prestar atenção, observar, decorar, etc. Graduando-se a dificuldade destes atos, tornando cada série de repetições um tanto mais difícil que a série precedente, organizava-se um completo esquema educativo. Existem vários meios, todos eles concludentes, de criticar esta concepção em seus pretensos fundamentos e em sua aplicação educacional. l — Talvez que o mais direto método de ataque consista em evidenciar que as supostas faculdades inatas de observar, decorar, querer, pensar, etc., são puramente mitológicas. Não existem as tais faculdades já formadas a esperarem ser exercitadas. Há, em verdade, um grande número de tendências originárias, inatas, modos instintivos de proceder, baseados nas relações originárias dos neurónios no sistema nervoso central. Há a tendência instintiva dos olhos, de acompanharem e fitarem a claridade; dos músculos do pescoço, de se voltarem para a luz e para os sons; das mãos, de estender-se e agarrar as coisas; e virar, torcer, fazer girar os objetos, torcê-los e bater-lhes; do aparelho vocal, de emitir sons; da boca, de lançar fora as substanciasse sabor desagradável; de fechar e franzir os lábios, e assim por diante, tendências, essas, em número quase infinito. Mas estas tendências, a) ao invés de serem em número pequeno e bem distintas entre si, são de variedade indefinida, entrelaçando-se mutuamente por todas as espécies de meios sutis; fr) e ao invés de serem faculdades intelectuais latentes, necessitando apenas de exercício para seu aperfeiçoamento, são tendências que reagem de determinados modos às mudanças do meio, de forma a acarretarem outras mudanças. Uma coisa na garganta faz-nos tossir; a tendência é para expelir a partícula prejudicial e modificar, por esse modo, o estímulo subsequente. A mão toca em um objeto quente; é impulsivamente afastada, sem nenhuma participação

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da inteligência. Mas a retirada modifica os estímulos atuadores e tende a torná-los mais concordes com as necessidades do organismo. É por essas mudanças especiais de atividades orgânicas, como reação a mudanças especiais no ambiente, que se efetua o domínio do ambiente a que já nos referimos. E da mesma natureza são todos os nossos primeiros atos de ver, ouvir, tocar, cheirar e provar. Faltam-lhes qualidades mentais, intelectuais ou cognitivas, tomadas estas palavras em seu legítimo sentido, e não há quantidade de exercícios reiterados que lhes comuniquem quaisquer propriedades intelectuais de observação, de formar juízos ou de ação intencional (volição). 2 — Por consequência, o "adestramento" de nossas inatas atividades instintivas não é uma melhoria ou aperfeiçoamento obtidos pelo "exercício", a exemplo do que a ginástica pode operar com os músculos. Consiste antes em a) selecionar entre as reações difusas provocadas em dado momento aquelas que são especialmente aptas à utilização do estímulo. Por exemplo, entre as reações do corpo em geral (1), e da mão em particular, que ocorrem instintivamente quando os olhos são estimulados pela claridade, todas são gradativamente eliminadas, exceto as especialmente adequadas a atingir e segurar os objetos — do contrário não haveria "adestramento". Como já o observamos, as primeiras rcoções, salvo pouquíssimas exceções, são mui difusas e gerais, no caso do infante humano, para que possam ser praticamente utilizadas. Daí a identidade entre "adestramento" ou "treino" com reações ou "respostas" selecionadas. b) Igualmente importante é a coordenação especial que se processa dos diferentes fatores componentes da "resposta". Esta não é simplesmente a seleção das reações da mão que resultam no ato de segurar, mas também dos estímulos visuais particulares que provocam essas reações e não outras, e estabelecem conexão entre as duas coisas. Mas não se limita a isto a coordenação. Podem produzir-se reações características de tempéfatura quando o objeto é segurado. Estas entra1) A ínterconexão é de fato tão grande, há tantos modos de construção, que cada estímulo traz alguma mudança em todo o organismo. Estamos, porém, costumados a esquecer a maioria dessas modificações da atividade orgânica total, concentrando a atenção naquela mais especificamente adaptada aos mais fortes estímulos do momento.

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rão também em linha de conta; mais tarde a reação de ratura pode articuiar-se diretamente com o estímulo óptico e desaparecer a reação da mão — como no caso em que uma chama, independentemente de contacto, mantém uma pessoa a distância. Se uma criança, quando tem um objeto na mão, bate com ele em alguma parte ou o amarrota, fazendo produzir-se um som, a reação auditiva penetra, por sua vez, no sistema das reações. Se certo som (o nome convencional) for produzido por outras pessoas justamente com determinado ato, as reações do aparelho auditivo e do aparelho vocal relacionadas com o estímulo auditivo serão também outros fatores que se associarão para a "resposta" completa e total (1). 3 — Quanto mais especializada for a mútua adaptação da reação e do estímulo (pois, erri vista da sequência das atividades, os estímulos se adaptam às reações assim como as reações aos estímulos), mais rígido e, em geral, menos proveitoso ou utilizável é o "adestramento"-ou "treino1' conseguido. Ou, em termos equivalentes: menos qualidade intelectual ou educativa terá o referido adestramento. O modo habitual de expor-se este fato é dizer-se que quanto mais especializada for a reação, menos transferível se torna a outros modos de procedimento a aptidão adquirida com a prática e aperfeiçoamento dessa reação. De acordo com a teoria ortodoxa da disciplina formal, um aluno, estudando sua íição de leitura, adquire, além da aptidão para ler as palavras da mencionada lição, um aumento de suas faculdades de observação, atenção e memória, aumento que lhe será de proveito quando tiver de empregar essas faculdades em todas as outras coisas que as exigirem. O fato, porém, é que, quanto mais ele se limite a observar e a gravar na memória as formas das palavras, independentemente de sua conexão com outras coisas (tais como a significação das palavras, as frases em que habitualmente são empregadas, a derivação e a classificação das formas verbais, etc.), menos provável é que adquira aptidão que possa aplicar em outras coisas que não seja a mera observação das formas visuais das palavras. Pode suceder que nem mesmo esteja a aumentar sua capacidade de distinguir perfeitamente as formas geométricas; para nada dizermos só1) Compare-se esta afirmação com o que foi dito mais atrás sobre a ordem seriada das "respostas". Lá está mais explícito o modo por que ocorrem esses arranjos consecutivos.

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bre a aptidão gera] para observar. Está unicamente a selecionar os estímulos fornecidos pelas formas das letras e as reações motoras da reprodução oral ou escrita. O campo de coordenação (para empregarmos nossa terminologia anterior) é extremamente limitado nesse caso. As conexões empregadas em outras observações e evocações (ou reproduções) são deliberadamente eliminadas quando o aluno se exercita unicacamente com formas de letras e de palavras. Uma vez que foram eliminadas, não se podem manifestar quando se tornar necessário. A aptidão conseguida para observar e recordar formas de palavras não é útil para a percepção e recordação de outras coisas. Não é transferível — como se diz na terminologia comum. Mas quanto mais amplo for o contexto da ação — isto c, quanto mais variados forem os estímulos e reaçoes coordenados — tanto mais a aptidão adquirida será proveitosa para a execução eficaz de outros atos: não, estritamente falando, por existir alguma "transferência", mas porque a abundância de fatores empregados no ato especial corresponde a um largo campo de atividade, e a uma coordenação flexível, em vez de limitada e rígida.

Além disso, a diferença entre o exercitar-se a habilidade para soletrar por meio da observação das formas visuais das palavras de um breve trecho e o exercício em que se observam essas formas visuais, ao mesmo tempo em que se procura aprender a significação do trecho lido, as derivações das palavras, etc., pode ser comparada à diferença entre exercícios ginásticos com aparelhos de tração para se "desenvolverem'* certos músculos, e um jogo ou esporte. Os primeiros são uniformes, mecânicos, rigidamente especializados. No último caso, varia-se a cada momento; nunca dois atos são perfeitamente semelhantes; têm-se de enfrentar novas emergências ; as coordenações que se formam necessitam manter-se flexíveis e elásticas. Por consequência, o adestramento é muito mais "geral" -— isto é, ocupa mais vasto terreno e encerra mais fatores. Dá-se o mesmo, exatamente, com a educação especial e geral do espírito. Um exercício monotonamente uniforme pode, com a repetição, dar grande habilidade para certa espécie de atos mas a habilidade limita-se a essa atividade, seja ela escrituração mercantil, ou cálculos com logaritmos, ou experiências com hidrocarbonetos. Pode-se ser autoridade num terreno especial e, ser, entretanto, perfeitamente ignorante em matérias não ligadas de perto com aquela, a não ser quando o exercício na referida matéria particular foi feito de forma a ramificar-se pelo terreno de outras matérias.

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4 — Penetrando o âmago do assunto, diremos que o equívoco fundamental da referida teoria consiste em seu dualismo, isto é, no separar a atividade e as faculdades, do objeto ou matéria da atividade. Não existe a coisa que se chama aptidão para ver, ouvir, ou recordar em geral; há aptidões para ver, ouvir e recordar alguma coisa. Ê disparate falar em exercitar-se, em geral, uma aptidão mental ou física, separadamente da matéria implicada em seu exercício. O exercício pode reagir sobre a circulação, a respiração e a nutrição de modo a desenvolver a robustez ou a força, mas este armazenamento de energia é utilizável para fins especiais somente quando o seu uso se fizer em relação com os meios materiais indispensáveis à realização daqueles fins. O vigor muscular habilitará um homem a jogar ténis ou golfe ou a dirigir um barco de vela melhor do que se ele fosse fraco; mas só se utilizando de determinados modos a bola e a raqueta do ténis, ou a bola e o taco do golfe, ou manejando-se a vela e o leme, é que uma pessoa adquire perícia em algum desses desportos ; e perícia em um deles só garante a perícia em outros quando ela significa apti*dão para delicadas coordenações musculares ou quando todos requerem a mesma espécie de coordenação.

5 — Por conseguinte, as capacidades como as de observação, memória, raciocínio, gosto estético, representam resultados organizados da ocupação de nossas inatas tendências ativas, em determinadas matérias. Se um homem observa acurada e plenamente alguma coisa, não é, por assim dizer, por ter apertado um botão para fazer funcionar a faculdade da observação (em outras palavras: por "querer" observar); o fato é que, se ele precisar fazer alguma coisa que só possa ser feita com bom êxito mediante o uso intensivo e extensivo dos olhos e das mãos, naturalmente observará bem as coisas. A observação é um produto, uma consequência da interação dos órgãos dos sentidos e da matéria a que se aplicam. Varia, conseguintemente, de acordo com a matéria em questão. É portanto inútil empreender mesmo o desenvolvimento ulterior das faculdades de observação, memorização, etc., se não tivermos determinado primeiro a espécie da matéria na qual

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queremos que nosso discípulo se torne hábil a observar e a recordar o observado e qual o fím visado com esse exercício. E será o mesmo que repetir por outras palavras o que já foi dito, o declararmos que esse fim deve ser social. O necessário é que uma pessoa observe, grave na memória e adote para matéria de seus juízos as coisas que a tornarão um membro competente e eficiente da comunidade em que se acha associada a outras pessoas; se não fosse assim, faria o mesmo efeito mandar o aluno observar cuidadosamente as fendas da parede ou mandá-lo decorar listas de palavras de uma língua para ele desconhecida. É isso mais ou menos o que fazemos ao adotar a teoria da disciplina formal. Se melhores do que os hábitos assim formados são os de um botânico, químico ou engenheiro, a razão é que se dedicam a matérias mais importantes para a vida. Concluindo esta parte dar exposição do assunto, notaremos que a distinção entre a educação geral e a especial nada tem que ver com transferibilidade de função ou de capacidade. Literalmente considerada, toda a transferência seria miraculosa e impossível. Mas algumas espécies de ativídade são de grande amplitude, subentendendo a coordenação de numerosos fatores. Seu desenvolvimento exige contínuas modificações e readaptações. Ao mudarem-se as condições, certos elementos assumem papel subordinado, ao passo que outros de menor valor passam para o primeiro plano. Há um constante deslocar-se do foco da ação, como se viu no exemplo do jogo ou desporto, em contraste com o exemplo da ginástica de aparelho, com o ato de levantar um peso, em uma série de movimentos uniformes. Por isso, no primeiro caso, adquire-se a prática de fazer novas combinações, uma vez que se mudava de contínuo o foco da ação, de acordo com as alterações apresentadas pela matéria a que a referida ação se aplicava. Quando uma atívidade abrange, por seu objetivo, grande extensão (isto é, quando implica a coordenação de maior variedade de subatividades) e determina, assim, constante e inesperadamente, mudanças de direção em seu progressivo desenvolvimento, é fatal que dela resulte uma educação geral. Porque isto é o que "geral'' significa: amplitude e plasticidade. Na prática escolar a educação satisfaz a essas condições e por isso será geral, na proporção em que tomar em conta as reíações sociais. Uma pessoa pode tornar-se competente em filosofia, ou filologia, ou matemáticas, ou engenharia, ou fi-

nanças, e ser inepta ou inconsiderada em seus atos e juízos sobre matéria alheia à sua especialidade. Se, todavia, o seu interesse nessas matérias se relacionar com atividades humanas de significação social, de muito mais alcance e de amplitude muito maior serão as í£respostas" provocadas e flexivelmente integradas por aquela ativídade especializada. Na prática corrente, o principal obstáculo para uma educação geral do espírito provém de achar-se .a matéria do ensino isolada da contextura social. Dissociadas destarte, a literatura, a arte e a religião operam um tão constritor efeito, quanto o material técnico que ardentemente lhes contrapõem os pedagogos apologistas da educação geral.

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Resumo. — A concepção de que o resultado do processo educativo é a capacidade de se prosseguir ulteriormente a educação, contrasta com outras ideias que influenciaram profundamente a prática do ensino. A primeira concepção contrária considerada foi a de educação como preparo para os futuros deveres ou privilégios. Assinalamos os maus efeitos especiais resultantes da circunstância de que com esse objetivo a atenção, do professor e do aluno, se desvia do único ponto para o qual poderia frutiferamente dirigir-se, que é o aproveitamento das necessidades e possibilidades do presente imediato. Por consequência, prejudica a realização de seus próprios fins. A teoria de que a educação é um desdobramento de faculdades já existentes parece ter mais similitude com a concepção já exposta do desenvolvimento. Mas, encarada nas ideias de FROEBEL e de HEGEL, ela implica, tanto como a doutrina da preparação, a ignorância da interação das presentes tendências orgânicas com o ambiente presente. Considera-se já formado algum todo em estado latente, sendo meramente transitória a importância do desenvolvimento; este não é um fim em si mesmo e sim apenas um meio de exteriorizar aquilo que já existia em estado latente. Como não nos podemos utilizar de uma coisa não exteriorizada ainda, urge encontrarmos algo que a represente. De acordo com FROEBEL, o misterioso valor simbólico de certos objetos e atos (de natureza matemática, em grande parte) substitui o Todo Absoluto que está a "desdobrar-se". Segundo HEGEL, as instituições existentes são seus eficazes representantes atuais. O encarecimento dos símbolos e

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das instituições tende a desviar a atenção do desenvolvimento direto das experiências em riqueza e precisão de sentido. Outra teoria em voga, mas defeituosa, também, é a que entende que o espírito possuí, desde o nascimento, certas faculdades como a percepção, a memória, a vontade, o juízo, a atenção, o poder de generalizar, etc., e que a educação consiste no aperfeiçoarem-se essas faculdades por meio de exercícios repetidos. Esta teoria trata o material da educação como coisa relativamente exterior e indiferente, residindo seu valor unicamente no fato de que ele pode servir para se exercitarem as faculdades gerais. Focalizou-se a crítica contra a separação entre essas pretensas faculdades e destas com a matéria sobre a qual atuam. Patenteou-se que na prática o resultado desta teoria era um descabido exagero no aperfeiçoamento de modalidades restritamente especiais de habilidades, à custa das qualidades de iniciativa, inventiva e readaptação — qualidades, essas, que dependem da interação ampla e contínua de determinadas atividades umas com as outras.

CAPÍTULO 6 A educação conservadora e a progressiva l. A educação como formação, — Chegamos agora a uma teoria que nega a existência das faculdades e exagera o papel exclusivo da matéria de estudo para o desenvolvimento mental e moral. De acordo com ela, a educação não é um processo de desdobramento das qualidades internas nem o aparfeiçoamento de faculdades existentes no espírito. É antes a formação do espírito pelo estabelecimento de certas associações ou conexões de conteúdo por meio da matéria apresentada do exterior. A educação se efetua pela instrução tomada em sentido estritamente literal; é uma edificação feita, de fora para dentro, no espírito. Que a educação seja formadora do espírito, não há nenhuma dúvida; na teoria que propomos, isso já foi afirmado. Mas formação, na concepção que estamos a criticar, tem significado técnico, importando em alguma coisa a atuar do exterior. HERBAKT é o melhor representante histórico desta teoria. Ele nega absolutamente a existência de faculdades inatas. O espírito é simplesmente dotado do poder de produzir várias qualidades de reação segundo as várias realidades que atuam sobre ele. Estas reações qualitativamente diferentes chamam-se apresentações (Vorstellungen). Uma vez chamada à existência, toda a apresentação persiste; pode ser recaícada para baixo do "limiar" da -consciência, por novas e mais fortes apresentações produzidas pela reação do espírito a um novo material, mas sua atividade persiste por seu próprio e inerente impulso, abaixo da superfície da consciência. Aquilo a que chamamos faculdades — atenção, memória, pensamento, percepção, e até os sentimentos, são arranjos, associações e conjuntos ou conjugações formados pela ação mútua dessas apresentações submersas, umas com as outras, e com outras novas apresentações. A percepção, por

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exemplo, é a conjugação de apresentações que resulta do surgir de velhas apresentações que se harmonizam e combinam com outras novas; a memória é a evocação de uma velha apresentação acima do "limiar" da consciência pela sua ligação com uma outra apresentação, etc. O prazer é o resultado do reforço mútuo que as atividades independentes das apresentações se podem prestar pela sua conciliação; a dor, de sua dispersão por diversos modos antagónicos, etc. O caráter concreto do espírito consiste, portanto, totalmente nos vários arranjos formados pelas várias qualidades das apresentações. Esse "equipamento" do espírito ê o espírito. O espírito é totalmente uma questão de "conteúdo". Em matéria educacional três coisas subentende esta doutrina, l -— Esta ou aquela espécie de espírito é formada pelo uso de objetos que despertam esta ou aquela espécie de reação e que produzem este ou aqttele arranjo entre as reaçoes provocadas. A formação do espírito passa toda ela a ser uma questão de apresentação do material educativo conveniente. 2 — Uma vez que as primeiras apresentações constituem os "órgãos aperceptivos" que regulam a assimilação de novas apresentações, a qualidade daquelas apresentações é de máxima importância, O efeito das novas apresentações é, apenas, o de reforçar os agrupamentos anteriormente formados. Assim, a tarefa do educador é primeiramente selecionar o material apropriado de modo a fixar a natureza das primeiras reaçõés — e, em segundo lugar, ordenar a série de apresentações subsequentes na base do lastro de ideias assegurado pelos processos anteriores. A .direção virá de trás, do passado, em vez de estar, como na teoria do "desdobramento", no objetivo final. 3 — Podem-se estabelecer certas fases formais de método para todo e qualquer ensino. A apresentação de matéria nova é obvia-mente o eixo de tudo, mas, uma vez que o conhecer consiste no modo por que essa matéria reage sobre o conteúdo já submergido abaixo da consciência, a primeira coisa será o passo da "preparação" — isto é, o de elevar ao plano da consciência, e por em ativíuade especial, aquelas velhas apresentações que vão assimilar as novas. Logo após a apresentação destas, seguem-se os processos de interação entre as novas e as velhas; depois vem a aplicação do conteúdo ou conjugação nova recentemente formada à execução de algum trabalho. Tudo segue forçosamente este curso; por conseguinte, há um

método de ensino perfeitamente uniforme para todas as matérias e para todos os alunos de todas as idades. O grande mérito de HEKBART está em ter retirado a tarefa do' ensino da região da rotina e do acaso, e tê-la trazido para a esfera do método consciente. Ensinar tornou-se uma atividade consciente com escopo e processo definidos, em vez daquele conjunto de inspirações casuais e de subserviência à tradição. Mais do que isso, tudo no ensino e na disciplina passou a poder ser especificado, em vez de nos termos de contentar com vagas e mais ou menos místicas generalidades sobre os últimos ideais e símbolos espirituais especulativos. HEHBART aboliu a noção das faculdades inatas que se poderiam aperfeiçoar pelo exercício com qualquer espécie de material e tornou importante, acima de tudo, a atenção ao material concreto de ensino, ao conteúdo. HERBART indubitavelmente exerceu influência maior, do que qualquer outro filósofo de educação, no trazer a debate os problemas relacionados com o objeto e as matérias de estudo. Apresentou os problemas de método sob o ponto de vista da conexão dos mesmos com o material do ensino:, o método tinha de cuidar do modo e da sucessão com que o novo material deveria ser apresentado para assegurar sua conveniente interação com o velho. O defeito teórico fundamental desta concepção reside em não tomar em conta a existência num ser vivo de funções ativas e especiais que se desenvolvem pela redireção e combinação em que entram quando se põem em contacto ativo com o seu ambiente. Esta teoria representa o mestre-escola em seus próprios domínios. E este fato exprime, ao mesmo tempo, a sua força e a sua fraqueza. A concepção de que o espírito consiste naquilo que foi ensinado e que a importância do que foi ensinado consiste em sua utilidade para o ensino ulterior, reflete opinião do pedagogo sobre a vida. Esta filosofia é eloquente sobre o dever do professor de instruir os discípulos •— e é quase silenciosa sobre seu privilégio de aprender. Dá grande vulto à influência do meio intelectual sobre o espírito — e esquece a circunstância de que o meio subentende a participação pessoal em uma atividade comum. Exagera mais do que o razoável as possibilidades de métodos conscientemente formulados e empregados e não dá c devido apreço ao papel das atitudes e disposições vitais e inconscientes. Insiste sobre as coisas anteriores, sobre o passado, e aflora ligeiramente a

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atuacão do que é genuinamente novo e imprevisível. Em suma — toma em linha de conta tudo o que é educativo, menos a essência da educação, que é a energia vital buscando oportunidades para seu eficaz exercício. Toda educação forma o caráter, forma a personalidade mental e moral, mas a formação consiste na seleção e coordenação das atividades inatas, de modo que estas possam utilizar o material do ambiente social. Mais ainda — a formação não é apenas a formação de atividades inatas — mas se efetua por meio dessas atividades. É um processo de reconstrução, de reorganização.

Mas a idéía implícita da mesma é a de ser a educação essencialmente retrospectiva; de que ela encara sobretudo o passado e, especialmente, os produtos literários do passado, e de que o espírito só é convenientemente formado na proporção em que se modela sobre a herança espiritual do passado. Esta ideia exerceu tão considerável influência, principalmente na educação superior, que é digna de ser examinada em seus aspectos extremos. Em primeiro lugar, é ilusório seu fundamento biológico. Não há dúvida de que o desenvolvimento embrionário do infante humano apresenta alguns traços das formas inferiores da vida. Mas, de fornia alguma, é uma rigorosa reprodução dos períodos anteriores. Se houvesse alguma rigorosa "lei" de repetição, é claro que não se verificaria o desenvolvimento evolutivo. Cada nova geração se limitaria a reproduzir a existência de seus predecessores. O desenvolvimento, em suma, realizou-se pela interferência de cortes e alterações no primitivo plano de desenvolvimento, E isto sugere que o intuito da educação deve ser o de facilitar essa abreviação do ciclo do desenvolvimento, esses curtos-circuitos do crescimento. Edttcacionalmente, a grande vantagem da imaturidade é habilitar-nos a emancipar os educandos da necessidade de permanecer nessa projeção do passado, de um passado já morto.,. O mister da educação é antes libertá-los da necessidade de reviver, de reatravessar o passado, do que levá-los a uma reiteração deste. O ambiente social dos educandos é constituído pela presença e ação dos hábitos de pensar e de sentir dos homens civilizados. Não tomar em conta o influxo orientador do ambiente atual sobre os jovens é simplesmente abdicar da função educadora. Disse um biologista: "A história do desenvolvimento de diferentes animais... apresenta-nos... uma série de esforços engenhosos, definidos, variados, porém mais ou menos malogrados, para refugir à necessidade de reproduzir os métodos ancestrais e substituí-los por outros mais diretos". Seria, sem dúvida, insensatez, a educação não tentar resolutamente facilitar esforços análogos em atividades conscientes, de forma a obterem eles cada vez melhor êxito. Podem-se facilmente desembaraçar os dois elementos verdadeiros dessa concepção, desvirtuados pela sua associação com elementos falsos. Sob o ponto de vista fisiológico, o fato é que toda criança nasce com determinada quantidade de

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2. A educação como recapitulação e retrospecçâo. — Uma combinação particular das teorias do desenvolvimento e da formação efetuados do exterior para o interior deu origem à teoria da educação como recapitulação biológica e cultural. O indivíduo desenvolve-se, mas seu conveniente desenvolvimento consiste em repetir em estágios ordenados a evolução passada da vida animal e da história humana. A primeira repetição opera-se fisiologicamente; a última se efetuaria por meio da educação. A pretensa verdade biológica de que o indivíduo em seu desenvolvimento desde simples embrião até à maturidade reproduz a história da evolução da vida animal no aperfeiçoamento das formas desde as mais simples até às mais complexas (ou, em linguagem técnica, de que a ontogênese reproduz a filogênese) não nos interessa a não ser no suposto fundamento científico que se julga pode proporcionar à recapitulação cultural do passado. Por essa teoria de recapitulação cultural afirma-se, primeiro, que as crianças até certa idade estão na condição mental e moral da selvageria; seus instintos são de vaguear e depredar porque seus antepassados em determinada época viveram essa vida. Por consequência (concluem) a matéria educativa apropriada a esse período é a produzida pela humanidade — principalmente a matéria literária dos mitos, do folclore e das canções — em análogos estágios de desenvolvimento. Em seguida, dizem, o menino passa a um período correspondente ao pastoril, e assim por diante, até à época em que se acha pronto para tomar parte na vida contemporânea, isto é, até chegar ao estado atual de cultura. Com esta forma particularizada e coerente essa teoria teve pouca voga a não ser em uma escola alemã — escola constituída, em sua maior parte, de continuadores de HERBART.

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atividades instintivas e de que estas são cegas, muitas delas em conflito umas com as outras, -casuais, esporádicas e não adaptadas a seu ambiente imediato, O outro ponto verdadeiro é ser sensato procedimento o utilizarmo-nos dos produtos do passado enquanto forem proveitosos para o futuro. Como representam o resultado de experiências anteriores, seu valor para as experiências futuras pode, por conseguinte, ser considerável. A literatura criada no passado faz parte do ambiente atual dos indivíduos na proporção em que estes a conheçam e utilizem; mas há enorme diferença entre o aproveitá-la como recurso atual e o toma-la como modelo em seu caráter ancestral.

existentes, Kxcetuado o caso do imbecil, estas aptidões inatas são tão variadas e contêm, em estado potencial, tantas possibilidades, até no caso dos mais ininteligentes, que estamos longe ainda de saber convenientemente o modo de utilizá-las. Por conseguinte, se um cuidadoso estudo das aptidões e deficiências inatas de um indivíduo é sempre a primeira necessidade do educador, o segundo passo importante é proporcionar um ambiente que ackme adequadamente todas as energias existentes. A relação entre a hereditariedade e o ambiente põe-se bem manifesta tornando-se como exemplo a linguagem. Se um ser não tiver órgãos vocais que produzam sons articulados, se não tiver aparelho auditivo e outros sentidos receptores, ou senão houver conexões entre esses aparelhos, será pura perda de tempo procurar ensiná-lo a falar. Ele nasceu deficiente a este respeito, e a educação deve conformar-se com essa limitação. Mas, porque tenha ele nascido com tais órgãos, o fato de possuí-los não garante, de modo algum, que ele aprenda a falar alguma língua, nem determina a língua que falará. O que determinará essas coisas será o ambiente em que manifestar sua atividade e onde esta encontrar aplicação. Se ele viesse a morar em um meio anti-social de mudos voluntários, onde os homens se recusassem a falar uns com os outros e usassem apenas, para fazer-se entender, o mínimo de gestos necessários para conservar a sua vida em sociedade, a linguagem verbal lhe seria tão desconhecida como se ele não possuísse órgãos vocais. Mas, se os sons que ele emitisse, os emitisse em um meio em que só se falasse o chinês, os atos que o fizessem produzir sons idênticos aos dos chineses viriam a ser selecionados e coordenados. Pode-se aplicar este exemplo a qualquer espécie'de educabilidade dos indivíduos. Colocarse-á, assim, a herança do passado em sua justa correlação com as exigências e oportunidades do presente.

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l — O desvio do primeiro ponto provém geralmente da compreensão errónea da ideia de hereditariedade. Presume-se que hereditariedade significa que a vida passada determinou de certo modo os traços principais de um indivíduo e que esses traços são tão fixos que pouca mudança séria se lhes pode introduzir. Apreciada desta forma, a influência da hereditariedade se contrapõe à do meio, o que faz com que a atuação desta última seja indevidamente diminuída. Mas para fins educativos hereditariedade significa nada mais nada menos do que os dotes originários do indivíduo. A educação tem que tomar o ser tal qual ele é. O fato fundamental é que determinado indivíduo tem precisamente tal e tal equipamento de atividades inatas. Que tenham estas sido ocasionadas deste ou daquele modo, ou que provenham de antepassados, não tem especial importância para o educador, embora a possa ter para o biologista. O essencial para aquele é que elas agora existem. Suponhamos que se tenha de aconselhar ou orientar alguém com referência a uma sua propriedade herdada. O fato de ter sido herdada, como é claro, não determina a sua futura utilização. O conselheiro encarará unicamente o melhor uso a ciar àquela propriedade existente — de fazê-la render nas condições mais favoráveis. É evidente que ele não pode ter em conta a utilidade daquilo que ali não existe; nem o poderá fazer o educador. Neste sentido, a hereditariedade é o limite da educação. O reconhecimento desta circunstância evita o dispêndio de energia e a irritação resultantes do hábito muito corrente de, pela educação, tentar fazer de um indivíduo aquilo para o que ele por sua natureza não tem aptidão. Mas essa teoria não determina o emprego a dar-se às aptidões

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2 — A teoria de que a matéria apropriada à educação se encontra nos produtos culturais dos séculos passados (quer em geral, quer mais especialmente nas literaturas particulares que foram produzidas na fase de cultura que se supõe corresponder à fase de desenvolvimento das pessoas que estão sendo educadas), não fornece outro exemplo daquele divórcio entre o processo e o resultado do desenvolvimento de que já fizemos a crítica. Conservar vivo o processo de crescimento e de desenvolvimento, conservá-lo vivo de modo a tornar mais fácil o conservá-lo vivo no futuro, esta é a função da matéria

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verdadeiramente educativa. Mas o indivíduo não pode viver senão no presente; o presente não é precisamente uma coisa que venha depois do passado; e muito menos uma coisa produzida por esse passado; ele é aquilo que é a vida ao deixar o passado para trás. O estudo dos produtos do passado não nos auxiliará a compreender o presente, porque o presente não é devido a esses produtos e sim à vida da qual eles eram os produtos. O conhecimento do passado e sua herança é de grande importância quando esse conhecimento se incorpora ao presente mas não por outro motivo. E o erro de fazer os escritos e outras relíquias do passado constituírem o material da educação é que seciona a conexão vital do presente e do passado e tende a tornar o passado um rival do presente, e o presente uma imitação mais ou menos inútil do passado. Em tais circunstâncias, a cultura torna-se um ornamento ou um consolo; um refúgio ou um asilo. Os homens fogem às rudezas do presente para viver entre as imaginárias perfeições do passado, em vez de usar o que o passado proporciona com um fator para aperfeiçoar aquelas rudezas. O presente, em suma, gera os problemas que nos levam a procurar sugestões no passado, problemas que dão sentido ao que encontramos em nossas pesquisas. O passado é passado justamente porque não encerra o nue é característico do presente. O presente, a transformar-se, inclui em si o passado desde que dele se utilize para dirigir seu próprio movimento. O passado é um grande recurso para a imaginação; ele acrescenta uma nova dimensão à vida, mas com a condição de que seja visto como o passado do presente e não como outro mundo sem relação com o presente. A doutrina que menospreza o ato presente de viver e de crescer e desenvolver-se — que é a única coisa sempre presente — volta-se naturalmente para o passado, porque o alvo futuro que se determinou é remoto e vazio. Mas por volver as costas ao presente não lhe será possível retornar a este carregada com os despojos do passado. Pelo contrário, um espírito razoavelmente sensível às necessidades e oportunidades do presente terá os mais fortes motivos para interessar-se pelos antecedentes do presente e não terá dificuldade em retornar a este, pois nunca perdeu sua conexão corn ele.

para o interior, a ideia do desenvolvimento dá em resultado a concepção de que a educação é um constante reorganizar ou reconstruir de nossa experiência. Ela tem sempre um fim " imediato, e, na proporção em que a arividade for educativa, ela atingirá esse fim — que é a transformação direta da qualidade da experiência. A infância, a adolescência, a idade adulta — tudo fica no mesmo nível educativo, no sentido de que aquilo que realmente foi aprendido em todos e em cada um dos estágios da experiência constitui o valor dessa experiência, e também no sentido de que a principal função da vida é, sob todos os pontos de vista, fazer que o ato de viver contribua para o enriquecimento de sua própria significação perceptível. Chegamos assim a uma definição técnica da educação: é it-ma reconstrução ou reorganização da experiência, que esclarece e aumenta o sentido desta e também a nossa aptidão para dirigirmos o curso das experiências subsequentes.

3. A educação como reconstrução. — Em seu contraste com as ideias do desdobramento do interior para o exterior de faculdades latentes, e da formação do exterior

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l — O aumento ou enriquecimento do sentido ou significação da experiência corresponde à mais aguda percepção das conexões e das continuidades existentes no que estivermos empreendendo. A atividade começa de uma forma impulsiva, por assim dizer, cega. Não conhece o que existe ao seu redor, isto é, quais são suas relações com outras ativídades. Uma atividade que acarreta educação ou instrução faz a pessoa conhecer algumas das relações ou conexões que não eram antes percebidas. Recorrendo ao nosso singelo exemplo — uma criança queima-se ao pôr a mão numa chama. De então por diante ela sabe que certo ato táctil em conexão com certo ato visual (e vice-versa) significa calor e dor; ou que certa luz significa fonte de calor. Os atos por meio dos quais um cientista aprende mais coisas em seu laboratório a respeito da chama não diferem desse, em princípio, absolutamente nada. Fazendo certas coisas ele torna perceptíveis certas relações, dantes ignoradas, da chama como outras coisas. Por esta forma, seus atos em relação a essas coisas adquirem mais significação; ele sabe melhor o que está a fazer, quando sua atividade se aplica a tais coisas; pode provocar intencionalmente consequências em vez de limitar-se a esperá-las surgir -— o que tudo quer dizer a rriesma coisa: passou a saber, a conhecer, a entender melhor certas coisas. Ao mesmo tempo, a chama ganhou mais significação; tudo o que se conhece sobre

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A educação conservadora c a progressiva

a combustão, a oxidação, a luz e a temperatura pode tornar-se parte intrínseca de seu conteúdo intelectual.

rotina, a açao, isto é, a ação automática, pode aumentar a habilidade para fazer dada coisa particular. Por esse lado, pode-se dizer que tem efeito educativo. Ela, porém, não conduz a novas percepções de significações ou conexões; limita mais do que amplia o horizonte das significações. E desde que o ambiente pode mudar ou, melhor, está sempre a mudar, e nosso modo de proceder precisa modificar-se de forma a manter-se em conexão bem equilibrada com as coisas, um modo de proceder Isolado e uniforme como o consequente dessa aprendizagem de prática e rotina pode tornar-se desastroso em algum momento crítico. A decantada "habilitação" do aluno converte-se então em grosseira inépcia. O contraste essencial da ideia da educação como uma reconstrução contínua, com as outras concepções unilaterais que foram criticadas, neste capítulo e no antecedente, é que ela identifica o fim (o resultado) com o processo. Verbalmente, isso parece contraditório, mas só o é verbalmente. Em rigor significa que a experiência como um processo ativo prolonga-se no tempo e que seu período ulterior completa o período antecedente; projeta luz sobre as conexões nele implicadas mas até então despercebidas. O resultado final revela, assim, a significação do antecedente, ao passo que a experiência considerada como um todo estabelece uma determinada tendência ou disposição para com as coisas que possuam essa significação. Toda a experiência ou atividade assim contínua é educativa, e toda a educação consiste em ter tais experiências. Resta somente assinalar (o que merecerá depois maior atenção) que a reconstrução da experiência tanto pode ser social como pessoal. Com o fim de simplificar, referimo-nos nos capítulos antecedentes à educação dos imaturos, como se essa educação que os impregna do espírito do grupo social a que pertencem consistisse em trazê-los, sob o ponto de vista das aptidões e dos recursos, até o nível dos adultos. Isto se aplica em geral às sociedades estáticas, que adotam como medida de valor a manutenção dos costumes estabelecidos. Mas não às comunidades progressivas. Estas se esforçam por modelar as experiências dos jovens de modo que, em vez de reproduzirem os hábitos dominantes, venham a adquirir hábitos melhores, de modo que a futura sociedade adulta seja mais perfeita que as suas próprias sociedades atuais. Há já tempos que o homem vem sentindo a extensão em que a educação conscientemente praticada pode eliminar manifestos males sociais fazendo os

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2 — O outro aspecto de uma experiência educativa é o aumento da capacidade de direção ou regulação das experiências subsequentes. Dizer que alguém sabe o que vai fazer ou que pode provocar certas consequências é, naturalmente, dizer que pode prever melhor o que vai acontecer; que pode, por isso, preparar-se com antecipação para assegurar consequências benéficas e evitar as indesejáveis. Portanto, uma experiência genuinamente educativa, que proporciona conhecimentos e aumenta as aptidões, diferencia-se, de um íado, de uma atividade rotineira; e, do outro, de uma atividade caprichosa, a) Na última, a pessoa (í não se preocupa com o que possa acontecer"; " deixa-se levar", evitando relacionar as consaqúências de algum ato (as provas de suas conexões com outras coisas) com o ato referido. Habitualmente vê-se com aborrecimento alguém entregar-se a tais atos sem objetivo, que são considerados como prova de índole caprichosa, ou de descuido ou indisciplina prejudiciais. Daí, a tendência de procurar a causa dessa atividade sem escopo, nos estados de espírito próprios do adolescente, isolados de tudo o mais. O fato, porém, é ser essa atividade impulsiva devida a um mau ajustamento com o ambiente. Os indivíduos procedem caprichosamente toda a vez que são levados pela compulsão externa ou quando, obrigados ou acostumados a obedecer, agem de acordo com o que os mandam fazer, sem ter um fito próprio nem perceber o alcance, daquilo que estão fazendo, sobre outros atos. Alguém pode aprender fazendo coisas que não compreende; até nas atividades mais inteligentes fazemos rnuita coisa sem atenção consciente, porque a maioria das conexões do ato que conscientemente intentávamos praticar não foram percebidas ou previstas. Mas, se aprendemos, é só porque, depois do ato praticado, observamos resultados que antes não observáramos. Mas grande parte do trabalho nas escolas consiste em estabelecer regras para os alunos de tal forma que, mesmo depois de praticado o ato, não podem eles ver ou não são levados a ver a conexão entre o resultado — isto é, a resposta à questão do professor — e o método seguido. Do modo como se lhes apresentam as coisas, estas tomam para eles o aspecto de uma espécie de mágica ou de milagre. Tal procedimento é essencialmente caprichoso e conduz a hábitos caprichosos, b) A

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jovens seguir caminhos que não produzam aqueles males — como também não lhe tem faltado a intuição de que a educação pode tornar-se um instrumento para realizar as mais belas esperanças humanas. Entanto, estamos sem dúvida longe de compreender a eficácia potencial da educação como agente edificador de uma sociedade melhor, de compreender que ela não só representa o desenvolvimento das crianças e dos adolescentes, mas também da futura sociedade que será constituída por eles. Resumo. — A educação pode ser concebida retrospectiva ou prospectivamente. Isto é, pode-se considerar como o processo de adaptar o futuro ao passado, ou como utilização do passado como um dos recursos para o desenvolvimento do futuro. A primeira concepção encontra seus padrões e modelos naquilo que já existiu. Pode-se considerar o espírito como um agregado de conteúdos resultantes de se lhe terem apresentado determinadas coisas. Neste caso, as primeiras apresentações constituem o material a que as últimas serão assimiladas. É importantíssimo encarecer o valor das primeiras experiências dos imaturos, precipuamente por causa da tendência de se considerarem como de pouca monta. Mas estas experiências não consistem em um material exteriormente apresentado e sim na ação recíproca das atividades inatas e do meio, interação que progressivamente modifica tanto as atividades como o meio. O defeito da teoria herbartiana da formação por meio de apresentações está em ter desprezado esta contínua interação e mudança. Aplica-se o mesmo princípio desta crítica às teorias que encontram o primeiro material da educação nos produtos culturais — principalmerite literários — da história humana. Suprimida sua conexão com o meio atual em que os indivíduos têm de agir, tornam-se eles uma espécie de meio rival e perturbador. Seu valor reside em sua utilidade para aumentar a significação das coisas com que nos temos ativamente de haver nos tempos presentes. As ideias sobre a educação expostas nestes primeiros capítulos resumem-se formalmente na concepção da contínua reconstrução da experiência, concepção que se distingue da educação como preparação para um futuro remoto, como "desdobramento", como formação externa e como repetição do passado.

CAPITULO 7 A concepção democrática da educação Até este ponto quase que nos referimos exclusivamente à educação tal como pode existir em qualquer grupo social. Trataremos agora de salientar as diferenças que se produzem no espírito, no material e no método da educação, quando esta opera em tipos diversos de organização social. Dizer que a educação é uma Junção social que assegura a direção e o desenvolvimento dos imaturos, por meio de sua participação na vida da comunidade a que pertencem, equivale, com efeito, a afirmar que a educação variará de acordo com a qualidade da vida que predominar no grupo. É particularmente verdade o fato de que uma sociedade que, não somente rnuda, mas que, também, para estimulá-la, faz da mudança um ideal, terá normas e métodos educativos diferentes dos de outra que aspire meramente à perpetuação de seus próprios costumes. Para tornar as ideias gerais estabelecidas aplicáveis à nossa peculiar prática educacional, é preciso, por consequência, tratarmos mais detidamente da natureza da presente vida social. 1. O que subentende a associação humana. — Sociedade é uma só palavra, mas significa muitas coisas. Os homens associam-se de tddos os modos e para todos os fins. Um homem se acha incluído em uma multidão de grupos diferentes, nos quais os seus consócios podem ser completamente distintos. Figura-se, com frequência, nada terem estes grupos de comum, exceto o serem modos de vida associada. Dentro de toda larga organização social existem numerosos grupos menores: não somente subdivisões políticas, senão também associações industriais, científicas e religiosas. Existem partidos políticos com diferentes aspirações, seitas sociais, quadrilhas, conventículos, corporações, sociedades comerciais

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e civis, grupos estreitamente ligados pelos vínculos do sangue, e outros mais, em infinita variedade. Em muitos países modernos e em alguns antigos, há grande diversidade de nacionalidades, com diferentes línguas, religiões, códigos morais e tradições. Sob este ponto de vista, muitas unidades políticas menores, uma de nossas grandes cidades, por exemplo, são mais um agregado de sociedades frouxamente unidas do que uma compreensiva e bem amalgamada comunidade de ação e de pensamento. Os termos sociedade, comunidade, são, por esse motivo, ambíguos. Têm dois sentidos: um laudatório ou normativo, e outro descritivo; uma significação de jure e outra significação de facto. Ern filosofia social, a primeira acepção é quase sempre a predominante. Concebe-se a sociedade como uma pela sua própria natureza. As qualidades que acompanham esta unidade, a louvável comunhão de bons propósitos e bem-estar, de fidelidade aos interesses públicos e reciprocidade de simpatia, são postas em relevo e encarecidas. Mas quando, em vez de fixar a atenção no significado intrínseco do termo, observamos os fatos que esse termo indica ou a que se refere, não encontramos a unidade e, sim, uma pluralidade de associações boas e más. Incluem-se nela homens reunidos em conluios criminosos, agremiações comerciais que mais saqueiam o público do que o servem e engrenagens políticas que se mantêm unidas pelo interesse da pilhagem. Àqueles que dizem que tais organizações não se podem chamar sociedades por não satisfazerem as exigências ideais da noção de sociedade, pode-se, por um lado, responder que se torna nesse caso tão "ideal" a noção de sociedade, que fica sendo inútil, por não se poder aplicar aos fatos; e, por outro lado, que cada uma dessas organizações, por mais opostas que sejam aos interesses dos outros grupos, tem um tanto das apreciáveis qualidades da "sociedade" e são estas que as mantêm unidas. Há entre ladrões sentimento de honra e uma quadrilha de salteadores tem um interesse comum a vincular todos os seus componentes. Reina entre estes uma afeição fraterna, e nos grupos mais limitados há uma grande fidelidade a seus próprios códigos ou pactos. A vida em uma família pode caracterizar-se por grande segregação, desconfiança e ciúme em relação aos estranhos a ela e, entretanto, cultivar-se em seu seio um afeto e auxílio mútuo modelares. Toda a educação ministrada por um grupo tende a socializar seus membros, mas a qualidade e

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Q valor da socialização dependem dos hábitos e aspirações do grupo. Daí se evidencia, mais uma vez, a necessidade de um julgamento, de uma medida do valor dos diferentes modos de vida social. Na pesquisa desse critério ou medida deveremos evitar dois extremos. Não poderemos criar, com as nossas imaginações, alguma coisa que consideremos uma sociedade ideal. Nossa concepção deve basear-se em sociedades que existam realmente, de modo a obtermos alguma garantia da. exequibilidade de nosso ideal. Mas, por outro lado, o ideal não pode limitar-se apenas a reproduzir os traços que encontramos na realidade. O problema consiste em extrair os traços desejáveis das formas de vida social existentes e empregá-los para criticar os traços indesejáveis e sugerir melhorias. Ora, em qualquer grupo social, mesmo em maltas de ladrões, encontramos algum interesse comum e, além dele, certa porção de interação e reciprocidade cooperativa com outros grupos. Com estes dois característicos fixaremos o critério ou organizaremos um padrão de julgamento. Até que ponto são numerosos e variados os interesses conscientemente compartidos? Até que ponto são intensas e livres as relações com outras formas de associação? Se aplicarmos estas considerações a uma quadrilha de malfeitores, por exemplo, verificaremos que os elos que conscientemente lhe vinculam os membros são pouco numerosos e quase que reduzidos ao só interesse comum do roubo, e que são de natureza a isolar o grupo dos outros grupos, no tocante ao mútuo dar e receber dos valores da vida. Daí resulta que a educação proporcionada por uma tal sociedade será parcial e falseada. Se, por outra parte, tomarmos, como exemplo, a vida familiar para ilustrar o nosso critério, acharemos que existem interesses materiais, intelectuais e estéticos de que todos participam e que o progresso de um de seus membros tem valor para a experiência dos outros membros — é facilmente comunicável — e que a família não é um todo isolado e sim mantém íntimas relações com os grupos econômjcos e comerciais, com as escolas, com as instituições de cultura, assim como com outros grupos Semelhantes, e que desempenha o papel devido na organização política, e desta, em compensação, recebe amparo. Em uma palavra: há muitos interesses conscientemente comunicados e compartilhados — existem vários e livres pontos de contacto com outras modalidades de associação.

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I — Apliquemos, agora, o primeiro elemento deste critério a um país governado despoticamente. Nesse caso não é verdade que não exista numa tal organização interesse comum entre os governados e governantes. A autoridade deve apelar de algum modo à atividade inata dos súditos e por em jogo algumas de suas aptidões. Disse Talleyrand que um governo podia tudo fazer com baionetas, menos assentar-se sobre elas. Esta afirmação cínica encerra, pelo menos, o reconhecimento de que o vínculo de união não é unicamente a força coercitiva. Deve-se, entretanto, reconhecer que os impulsos para que se apela são indignos e degradantes e que tal governo apenas põe em ação a capacidade de temer. Esta afirmativa é, de certo modo, verdadeira. Mas esquece a circunstância de que o temor não é fator necessariamente indesejável na experiência. A cautela, a circunspecção, a prudência, o desejo de prever futuros acontecimentos para evitar o que c prejudicial — nestas qualidades louváveis existe o instinto do medo, tanto quanto na covardia e na abjeta subserviência. O mal está em apelar-se unicamente para o medo. Provocando-se o temor e a esperança de particulares recompensas tangíveis -— isto é, o conforto e o bem-estar — deixam-se no abandono outras qualidades. Ou antes, estas são postas em ação, mas de tal modo que se pervertem. Km vez de fazê-las atuar por sua própria conta, reduzenvnas a meros instrumentos para conseguir o prazer e evitar a dor. Equivale isto a dizer que não há grande número de interesses comuns; não há livre reciprocidade do dar e receber entre os membros do grupo social. O estímulo e a reaçao mostram-se muito unilaterais. Para terem numerosos valores comuns todos os membros da sociedade devem dispor de oportunidades iguais para aquele mútuo dar e receber. Deveria existir maior variedade de empreendimentos e experiências de que todos participassem. Não sendo assim, as influências que a alguns educam para senhores, educariam a outros para escravos. E a experiência de cada uma das partes perde em significação quando não existe o livre entrelaçamento das várias atividades da vida. Uma separação entre a classe privilegiada e a classe submetida impede a endosmose social. Os males que por essa causa afetam a classe superior são menos materiais e menos perceptíveis, mas igualmente reais. Sua cultura tende a tornar-se estéril, a voltar-se para se alimentar de si mesma; sua arte torna-se uma ostentação espetaculosa e arti-

ficial; sua riqueza se transmuda em luxo; seus conhecimentos superespecializam-se; e seus modos e hábitos se tornam mais artificiais do que humanos. A falta do livre e razoável intercâmbio que promana de vários interesses compartidos desequilibra o livre jogo dos estímulos intelectuais. Variedade de estímulos significa novidade e novidade significa desafio e provocação à pesquisa e pensamento. Quanto mais as atividades se restringem a umas tantas linhas definidas — como sucede quando as divisões de classes impedem a mútua comunicação das experiências —• mais tendem a se converter em rotina para a classe de condição menos favorecida, e a se tornar caprichosas, impulsivas e sem objetivos para a classe em boa situação material. O escravo, no definir de Platão, é o homem que recebe de outro 05 objetivos que orientam sua conduta. Man i f esta-se esta condição mesmo quando não haja escravidão no sentido legal desta palavra. Ela existe sempre que um homem-se dedica a uma atividade, cuja utilidade social ele não compreenda e que não encerre para ele algum interesse pessoal. Muito se tem falado sobre a organização científica do trabalho. Mas, uma visão acanhada restringe o campo da ciência a assegurar a eficiência da atuação por meio de acertados movimentos musculares ou físicos. A principal oportunidade para a eficácia da ciência será a descoberta das relações do homem com seu trabalho — inclusive as relações cem os demais que nele tomam parte — para que o trabalhador ponha o seu interesse inteligente naquilo que estiver fazendo. A eficiência da produção exige, com frequência a divisão do trabalho. Mas este se reduzirá a uma rotina maquinal se o trabalhador não vir as relações* técnicas, intelectuais e sociais encerradas naquilo que está fazendo, em relação às demais partes do trabalho, e não se dedicar a seu trabalho por essa compreensão. A tendência a reduzir coisas como a eficácia da atividade e a organização científica do trabalho a técnicas puramente externas, é a prova do ponto de vista unilateral que possuem os que dirigem a indústria — aqueles que lhe determinam os fins. Alheados de largos c bem equilibrados interesses sociais não têm eles estímulo intelectual suficiente para se voltarem aos íatores e relações humanos envolvidos na atividade industrial. As ideias a esse respeito restringem-se aos elementos referentes à produção técnica e à comercialização dos produtos. Não há dúvida de ••que nestes estreitos limites pode haver grande desenvolvimento,

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mas riem por isso a circunstância de não se tomarem em conta importantes fatores sociais deixa de significar uma grande lacuna da colaboração espiritual, com um correspondente dano da vida emocional dos que trabalham.

separação, pondo as nações e as classes sociais em mais íntimas e perceptíveis conexões recíprocas. É comum, entretanto, não se assegurarem plenamente as consequências intelectuais e sentimentos desta supressão material do espaço.

II — Este exemplo (que se aplica, em sua essência, a todas as associações em que não existe a reciprocidade de interesses) conduz-nos ao nosso segundo ponto. O isolamento e exclusivismo de uma quadrilha ou de um corrilho põe em realce seu espírito anti-socíal. Mas encontra-se este mesmo espírito onde quer que tenha algum grupo "interesses próprios", que o privam de plena interação com outros grupos, de modo que o objetivo predominante seja a defesa daquilo que já conseguiu, em vez de ser sua reorganização e progresso por meio de relações cada vez de maior latitude. Isto é o que caracteriza as nações que se isolam uma das outras, as famílias que se adstringem a seus interesses domésticos, como se estes não tivessem conexão com uma vida mais ampla, as escolas quando divorciadas dos interesses do lar e da comunidade, as divisões em ricos e pobres, em doutos e incultos. A verdade fundamental é que o isolamento tende a gerar, no interior do grupo, a rigidez e a institucionalização formal da vida, e os ideais estáticos e egoístas. Não é por acidente que as tribos selvagens consideravam como sinónimos os termos "estrangeiro" e "inimigo". Deriva isto do fato de terem elas identificado sabedoria com a rígida observância de seus antigos costumes. Esta circunstância torna perfeitamente íógico recear a comunicação com outros povos, pois tal contacto poderia dissolver aqueles costumes. Certamente ocasionaria a sua ré* construção, É lugar-comum afirmar-se que a expansão de uma intensa vida mental depende de crescentes séries de contactos e experiências com o meio físico. Mas este princípio se aplica mais significativamente ao campo em que mais costumamos esquecê-lo, que é a esfera das relações sociais. Toda a época de expansão na história da humanidade coincidiu com a atuação de fatores que tenderam a eliminar o afastamento entre povos e classes que dantes viviam isolados. Até os alegados benefícios das guerras quando de todo reais resultam do fato de que os conflitos entre as nações aumentam, pelo menos, as relações entre elas e assim, incidentemente, habilita-as a aprenderem umas com as outras e a alargar, por essa forma, seus respectivos horizontes. As viagens e a atividade económica e comercial já destruíram as barreiras de

2. O ideal democrático. — Os dois elementos de nosso critério se orientam para a democracia. O primeiro significa não só mais numerosos e variados pontos de participação do interesse comum, como também maior confiança no reconhecimento de serem, os interesses recíprocos, fatores da regulação e díreção social. E o segundo não só significa uma cooperação mais livre entre os grupos sociais (dantes isolados tanto quanto voluntariamente o podiam ser) como também a mudar.ça dos hábitos sociais — sua contínua readaptação para ajustar-se às novas situações criadas pelos vários intercâmbios. E estes dois traços são precisamente os que caracterizam a sociedade democraticamente constituída. Quanto ao aspecto educativo, observaremos primeiro que a realização de uma forma de vida social em que os interesses se interpenetram mutuamente e em que o progresso, ou readaptação, é de importante consideração, torna a comunhão democrática mais interessada que outras comunhões na educação deliberada e sistemática. O amor da democracia pela educação é um' fato cediço. A explicação superficial-é que um governo que se funda no sufrágio popular não pode ser eficiente se .aqueles que o elegem e lhe obedecem não forem convenientemente educados. Uma vez que a sociedade democrática repudia o princípio da autoridade externa, deve dar-lhe como substitutos a aceitação e o interesse voluntários, e unicamente a educação pode criá-los. Mas há uma explicação mais profunda. Uma democracia é mais do que uma forma de governo; é, primacialmente, uma forma de vida associada, de experiência conjunta e mutuamente comunicada. A extensão, no espaço, do número de invivíduos que participam de um mesmo interesse de tal modo que cada um tenha de pautar suas próprias ações pelas ações dos outros e de considerar as ações alheias para orientar e dirigir as suas próprias, equivale à supressão daquelas barreiras de classe, raça e território nacional que impedem que o homem perceba toda a significação e importância de sua ativídade. Estes mais numerosos e variados pontos de contacto denotam maior diversidade de estímulos a que itra indivíduo tem de

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reagir; e incentivam, por conseguinte, a variação de seus atos; asseguram uma libertação de energias que ficam recalcadas enquanto são parciais e unilaterais as incitações para a ação, como ocorre com os grupos que com os seus exclusivismos fecham a porta a muitos outros interesses, A ampliação da área dos interesses compartilhados e a libertação de maior diversidade de capacidades pessoais que caracterizam a democracia não são, naturalmente, resultado de deliberação e de esforço conscientes. Pelo contrário — suas causas foram o desenvolvimento das indústrias e d*> comércio, as viagens, migrações e intercomunicações que resultaram do domínio da ciência sobre as energias naturais. Mas depois que esses fatos fizeram surgir maiores possibilidades de formação individual, por um lado, e maior comunhão de interesses por outro, será obra do esforço voluntário o conservá-las e aumentá-las. É indubitável que uma sociedade para a qual sem fatal a estratificação em classes separadas, deve procurar fazer que as oportunidades intelectuais sejam acessíveis a todos os indivíduos, com iguais acilidades para os mesmos Uma sociedade dividida em castas necessita unicamente preocupar-se com a educação da casta dirigente. Uma sociedade móvel, cheia de canais distribuidores de todas as mudanças ocorridas em qualquer parte, deve tratar de fazer que seus membros sejam educados de modo a possuírem iniciativa individual e adaptabilidade. Se não fizer assim, eles serão esmagados pelas mudanças em que se virem envolvidos e cujas associações ou significações eles não percebem. O resultado seria uma confusão, na qual poucos somente se apropriariam dos resultados da atividade dos demais — atividade cega e exteriormente dirigida pelos primeiros.

tence) e que a tarefa da educação se limita a descobrir estas aptidões e a exercitá-las progressivamente para seu uso social. Muito do que se tem dito a respeito é tomado de empréstimo das ideias que, primeiro que todos, PLATÃO ensinou conscientemente ao mundo. Mas as condições sociais que ele não podia modificar levaram-no a restringir estas ideias em sua aplicação. Nunca chegou a poder conceber a pluralidade indefinida das espécies de atividade que podem caracterizar um indivíduo ou um grupo social — e, conseguintemente, restringiu suas ideias a limitado número de categorias de aptidões e de organizações sociais. O ponto de partida de PLATÃO é que a organização da sociedade depende, em última instancia, do conhecimento da finalidade da existência. Se desconhecermos esta finalidade, ficaremos à mercê do acaso e do capricho; se desconhecermos a finalidade, que é o bem, não teremos um critério para decidir racionalmente sobre as possibilidades que devem ser acoroçoadas, ou como deve ser organizada a sociedade; sem isso, não poderemos conceber qual a conveniente limitação e distribuição das atividades — o que ele chamava justiça — indispensável a caracterizar a organização tanto individual como social. Mas como atingiremos o conhecimento do bem final e permanente? Examinando esta questão chegaremos ao obstáculo aparentemente insuperável de que não é possível esse conhecimento a não ser em uma justa e harmoniosa ordem social. De outro modo, o espírito se desorienta e extravia com falsos valores e falsas perspectivas. Uma sociedade desorganizada e cheia de facções estabelece diversos modelos e ideais. Em tais condições é impossível a um indivíduo ser coerente. Só um todo completo é perfeitamente coerente. Uma sociedade que repousa na supremacia de um fator sobre os demais, independentemente de suas exigências racionais ou adequadas, falseará, sem dúvida alguma, o pensamento. Dignifica e eleva certas coisas e condena outras, criando uma mentalidade cuja aparente unidade é forçada e disforme. A educação se conduz, no final de contas, pelos modelos fornecidos pelas instituições, costumes e leis. Só em um Estado justo poderão esses modelos dar a educação conveniente; e só aqueles que prepararam convenientemente o espirito estão aptoa para reconhecer a finalidade e o princípio ordenador das coisas. E, assim, presos em um círculo vicioso. Todavia^ PLATÃO sugere uma saída. Alguns poucos homens filósofos ou amantes

3. A filosofia educacional platónica. — Nos capítulos subsequentes trataremos de desenvolver e mostrar as consequências das ideias democráticas sobre educação; no restante do presente capítulo, consideraremos as teorias educacionais que se desenvolveram em três épocas, quando era especialmente importante o alcance social da educação. A primeira a ser examinada é a de PLATÃO. Ninguém exprimiu melhor que ele o íato de que uma sociedade se acha organizada estavelmente, quando cada indivíduo faz aquilo para o que tem especial aptidão, de modo a ser útil aos outros (ou a contribuir em benefício do todo a que per-

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da sabedoria -^ ou da verdade — poderão, por meio do estudo, conhecer ao menos os lineamentos das normas apropriadas a uma verdadeira existência. Se um poderoso soberano organizasse um estado de acordo com essas normas, a organização poderia conservar-se. Uma educação poderia, então, ser desenvolvida no sentido de selecionar os indivíduos, descobrindo aquilo para que cada um serve e proporcionando os meios de determinar a cada um o trabalho para o qual a natureza o tornou apto. Fazendo cada qual sua própria tarefa e nunca transgredindo esta regra, manter-se-iam a ordem e a unidade do todo. Impossível seria encontrar em qualquer sistema filosófico um reconhecimento mais adequado da importância educativa da organização social e, por outro lado, da dependência em que essa organização ficaria dos meios utilizados para educar seus jovens elementos. Seria impossível encontrar um sentido mais profundo da função .da educação na descoberta e desenvolvimento das aptidões individuais e no exercitá-las e formá-las de modo tal, a articulá-las com a atividade dos outros. No entanto, a sociedade em que se defenderam estas ideias era tão pouco democrática que PLATÃO não procurou praticamente a solução do problema cujos termos tão claramente via. Quando PLATÃO afirmou incisivamente que o lugar do indivíduo na sociedade não deveria ser determinado pelo nascimento ou pela riqueza, ou por qualquer norma convencional e sim por sua própria natureza descoberta no processo da educação, ele não percebia a desigualdade das características dos indivíduos, o caráter único de cada indivíduo. Para PLATÃO os indivíduos se classificavam naturalmente em castas e só em pequeníssimo número destas. Por conseguinte, a função das provas selecionadoras da educação será a de revelar unicamente a qual das três castas platónicas um indivíduo pertence. Não se reconhecendo a verdade de que cada- indivíduo constitui sua própria casta, não se poderia reconhecer a existência da infinita variedade de tendências ativas e de combinações dessas tendências que um indivíduo é capaz de apresentar. O indivíduos eram unicamente dotados de três tipos de faculdades ou aptidões. Por isso a educação logo atingiria um limite estático em cada classe, pois só a diversidade cria a mutação e o progresso. Em alguns indivíduos predominam naturalmente os apetites, e por isso se distribuem pela classe dos trabalhadores

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manuais e dos que se dão a negócios, à qual compete conhecer satisfazer as necessidades materiais humanas. Outros revelam, por obra da educação, que, em vez de apetites materiais, sentem a predominância de um natural generoso, entusiasta e valente. Tornam-se estes os servidores do estado, seus defensores na guerra, e zeladores internos na paz. A limitação dos seus serviços é fixada pela deficiência de sua razão, que é a capacidade de compreender o universal. Os que a possuem recebem a mais elevada espécie de educação e se convertem oportunamente em legisladores — pois as leis são os universais que regulam os particulares da experiência da conduta. Não é verdade, assim, que PLATÃO pretendesse, intencionalmente, subordinar o indivíduo ao todo social. Mas é certo que, não percebendo as diferenças individuais, em toda a sua extensão, a verdadeira incomensurabilidade de cada indivíduo e não reconhecendo, portanto, que uma sociedade pode mudar e mesmo assim ser estável, sua teoria da limitação de aptidões e de castas chegou, de fato, à consequência da subordinação da individualidade à organização social.

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Não podemos ultrapassar a concepção platónica de que o indivíduo é feliz e a sociedade bem organizada quando cada qual se dedica às atividades para as quais está preparado pelo seu natural, nem a sua ideia de que a primacial tarefa da educação é descobrir esta aptidão em seu possuidor e exercitá-la para ser utilizada eficazmente. Mas o progresso dos conhecimentos fez-nos ver a superficialidade da ideia platónica de acumular os indivíduos e suas aptidões naturais em poucas classes bem determinadas; aquele progresso ensinou-nos que as aptidões originárias são indefinidamente numerosas e variáveis. E a consequência deste fato é reconhecer-se que, à proporção que a sociedade se torna democrática, a verdadeira organização social está na utilização daquelas qualidades peculiares e variáveis do indivíduo e não na sua estratificação em classes. Embora fosse revolucionária sua filosofia educacional, não se mostrou, por isso, menos escravizada aos ideais estáticos. Ele pensava que as mudanças ou alterações fossem provas de indisciplina e que a verdadeira realidade era imutável. Por isso, quando pensou em transformar pela raiz as condições sociais existentes, sua aspiração foi edificar um estado em que posteriormente não se verificasse qualquer mudança. Fixara a finalidade última da vida; uma vez orga-

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nizado o estado tendo esta finalidade em vista, nem mesmo as mínimas particularidades deveriam ser alteradas. Malgrado não tivessem estas importância por si mesmas, sua modificação implantaria nos espíritos a ideia da mudança e, portanto, seria dissolvente e anarquizadora. A fraqueza desta filosofia revela-se no fato de que não se poderiam esperar gradativas melhorias da educação que produzissem uma melhor sociedade, a qual, por sua vez, melhoraria a educação, e assim por diante, indefinidamente.. Só poderia surgir a verdadeira educação quando existisse o estado ideal e depois a tarefa da educação se limitaria exclusivamente à conservação do mesmo. Para a existência deste estado dever-se-ia contar com algum acaso feliz, que fizesse a sabedoria de um filósofo coincidir, em um estado, com a posse do poder.

fectibilídade do homem e de uma organização social tendo como amplo escopo a humanidade, O indivíduo emancipado deveria converter-se em órgão e fator de uma sociedade compreensiva e progressista. Os pregadores deste evangelho tinham viva consciênch dos males do estado social em que viviam. Atribuíam esses males às restrições impostas ao livre exercício das faculdades do homem. Essa restrição era simultaneamente perturbadora e corruptora. Seus afervorados esforços para emancipar a vida das restrições exteriores que atuavam para vantagem exclusiva da classe que um passado sistema feudal tornara senhora do poder, encontrou sua formulação intelectual no culto da natureza. Dar plena expansão à "natureza" era substituir unia ordem social artificial, corrupta e iníqua por um novo e melhor reinado da humanidade. A confiança ilimitada na Natureza não só como modelo, senão também como poder operante, era fortalecida pelos progressos das ciências naturais. Uma investigação liberta dos preconceitos e peias artificiais da Igreja e do Estado revelara que o mundo era dominado por leis. O sistema solar newtoniano, que revelava esse domínio das leis naturais, mostrava-se como um quadro de maravilhosa harmonia, onde cada força era contrabalançada por outras. As leis naturais chegariam ao mesmo resultado nas relações humanas, se os homens quisessem desembaraçar-se das artificiais restrições coactoras criadas por eles próprios. Julgava-se que o primeiro passo para assegurar essa sociedade mais social era uma educação de acordo com a natureza. Via-se claro que as limitações económicas e políticas dependiam, em última análise, das limitações do pensamento e do sentimento. O primeiro passo para livrar os homens dessas cadeias externas era emancipá-los das cadeias internas das falsas crenças e dos falsos ideais. Aquilo a que se chamava vida social, e as próprias instituições existentes, .eram demasiado falsas e corruptas para se lhes confiar essa tarefa. Como esperar que elas a empreendessem, se isso significaria sua própria destruição? Ao poder da Natureza, portanto, é que se deveria deixar essa tarefa. Até a extremada escola sensacionalista do conhecimento, então dominante, derivara-se dessa concepção, Insistir em afirmar que o espírito é originariamente passivo e vazio era um modo de glorificar as possibilidades da educação. Se o espírito fosse como urna cera onde se gravavam as coisas objetivas não haveria limites para as

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4. O ideal "Individualista" do Século XVIII. — Na filosofia do século XVIII, encontramo-nos em um círculo bem diferente de ideias. "Natureza" significa ainda um tanto a antítese da organização social existente; PLATÃO exerceu grande influência em ROUSSEAU. Mas a voz da natureza fala por intermédio deste em prol da diversidade dos talentos individuais e da necessidade do livre desenvolvimento de todas as variedades da personalidade. A educação de acordo com a natureza fornece o alvo e o método de instruir e disciplinar. Todavia, levando o caso a seu extremo, os dotes inatos ou originários são por ele considerados como não sociais ou mesmo anti-sociais. Conceberam-se as organizações sociais como meros expedientes para que estes indivíduos insociais pudessem assegurar-se para si próprios maior felicidade privada. Esta exposição, todavia, proporciona apenas uma ideia inadequada da verdadeira importância dessa corrente de ideias. Seu principal interesse residia, na realidade, no progresso, e no progresso social. A sua filosofia aparentemente anti-social não passava de máscara um tanto transparente de um impulso para a concepção de uma sociedade mais ampla e livre — para o cosmopolitismo. O ideal colunado era a humanidade. Na condição de membros da humanidade, e não apenas do estado, líbertar-se-iam as aptidões dos homens, ao passo que nas organizações políticas existentes essas aptidões são reprimidas e falseadas para satisfazerem as exigências e interesses egoísticos dos detentores do governo. A doutrina -do individualismo extremo era apenas uma aplicação das ideias da infinita per-

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possibilidades educativas pelo infhoo do meio ambiente. E uma vez que o mundo objetivo natural é um cenário de harmoniosa "verdade", aquela educação produziria infalivelmente espíritos cheios de verdade.

referimos surgiram como últimas consequências das conquistas napoleõnicas, especialmente na Alemanha. Os estados germânicos pressentiram (e os acontecimentos ulteriores provaram que eles tinham razão) que a atenção sistemática voltada para a educação era o melhor meio de recuperar e manter a integridade e soberania política. Exteriormente eram fracos e divididos. Sob a direção dos estadistas prussianos, esses estados tornaram essa condição um incentivo para o desenvolvimento de um amplo e sólido sistema de educação pública. Tal mudança na prática necessariamente daria origem a uma mudança na teoria. A teoria individualista recuou para um plano afastado. O estado forneceu não só os meios para a manutenção de escolas públicas, como também os objetivos dessas últimas. Se a prática era tal, que o sistema escolar, desde os graus elementares até as faculdades universitárias, fornecia o cidadão e o soldado patriotas e os futuros funcionários e administradores do estado, e promovia os meios para a defesa e expansão militar, industrial e política, impossível se tornava para a teoria não encarecer para a educação o ideal da eficiência social. E com a enorme importância 'dada ao estado nacionalista, rodeado de outros estados rivais e mais QU menos hostis, era igualmente impossível atribuir à eficiência social o sentido de um vago humanitarismo cosmopolita. Desde que a manutenção de uma soberania nacional determinada requeria a subordinação do indivíduo aos interesses superiores do país, não só para a defesa militar, como também para a luta pela supremacia internacional no comércio, tinha-se que reconhecer que a eficiência social exigia análoga subordinação. A educação foi considerada mais como um adestramento disciplinar do que como meio de desenvolvimento pessoal. Como, entretanto, persistia o ideal da cultura como desenvolvimento completo da personalidade, a filosofia educacional tentou conciliar as duas ideias. A conciliação se fundou na concepção do caráter "orgânico" do estado. O indivíduo isolado nada é; só mediante a assimilação das aspirações e da significação das instituições organizadas atinge ele a verdadeira persona-

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5. A educação sob o pomo de vista nacional e social. — Apenas arrefeceu o primeiro entusiasmo pela liberdade, patenteou-se a fragilidade dessa teoria em seu aspecto construtivo. Confiar-se simplesmente tudo à natureza era, afinal de contas, negar-se a própria ideia de educação, e entregá-la aos acasos das circunstâncias. Não só se precisava de um método, como também de algum órgão próprio, de alguma instituição administrativa que efetuasse o trabalho da instrução. Como o "desenvolvimento completo e harmonioso de todas as faculdades" subentendia urna humanidade esclarecida e progressiva, sua consecução requeria uma organização especial. Os particulares aqui e além podiam pregar o evangelho, mas, não, executar o trabalho. Um PESTALOZZI poderia fazer experiências e exortar a seguir seu exemplo as pessoas inclinadas à filantropia e possuidoras de riqueza e poderio; mas o próprio PESTALOZZI reconheceu que um eficaz empreendimento baseado no novo-ideal educativo exigia o amparo dos poderes públicos. Pôr em prática ideias novas sobre educação, ideias destinadas a criar uma nova sociedade, dependia, ao cabo de tudo, da ação dos estados existentes. O movimento a favor do ideal democrático tornou-se inevitavelmente ern uma campanha para a criação de escolas públicas. Em relação à Europa, suas condições históricas identificaram a campanha a favor da educação mantida pelo estado com a campanha nacionalista na vida política — fato este de incalculável importância para ulteriores movimentos. Principalmente pela influência da filosofia germânica, a educação converteu-se numa função cívica e a função cívica se identificou com a realização do ideal do estado nacional. O "estado" substituiu a humanidade; o cosmopolitismo cedeu o lugar ao nacionalismo. Formar o cidadão, e não o "homem", tornou-se a meta da educação (1). As condições históricas a que nos 1) Há muitos traços esquecidos, nas ideias de Rousseau, que tendem intelectualmente para esta direção. Ele se opunha ao então existente estado de coisas, sob o fundamento de qtie ele não formava nem o cidadão, nem o homem. Naquelas referidas condições, ele optava

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mais por tentar formar o último, do que o primeiro. Mas há muitas de suas frases que denotam ser a formação do cidadão a formação idealmente mais elevada, e que indicam que sua tentativa de reforma, contida no Emite, era o melhor em remédio que a corrupção daqueles tempos lhe permitia aconselhar.

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lidade. Aquilo que se antolha ser sua subordinação à autoridade política e a exigência do sacrifício de si próprio ante o dever da obediência a seus superiores, não é, na realidade, mais do que o tornar sua a razão objetiva manifestada no estado —• o único meio pelo qual pode ele tornar-se verdadeiramente racional. A noção do desenvolvimento que vimos ser a característica do idealismo institucional (como na filosofia hegeliana) era exatamente esse esforço consciente para combinar as duas ideias •— a da completa expansão da personalidade e a da total subordinação "disciplinar" às instituições existentes. A latitude da transformação da filosofia educacional processada na Alemanha pela g-eração empenhada na luta contra NAPOLEÃO, pela independência nacional, pode-se inferir da leitura de KANT, que bem exprime o primitivo ideal individualista-cosmopolita. Em seu tratado de pedagogia, constituído por conferências feitas nos últimos anos do século XVIII, ele define a educação como o processo pelo qual o homem se torna homem. No começo da história da humanidade, o homem se acha submergido na Natureza, mas não como Homem, que é criatura dotada de razão, enquanto a natureza apenas lhe dá instintos e apetites. A natureza proporciona unicamente germes, que a educação deve desenvolver e aperfeiçoar. A particularidade da verdadeira vida humana é que o homem precisa criar-se por seus próprios esforços voluntários; tem que se fazer um verdadeiro ser moral, racional e livre. Este esforço criador desenvolve-se pela atividade educativa de numerosas gerações. Sua aceleração depende de se esforçarem os homens conscientemente para educar seus sucessores — educarem, não para o existente estado de coisas, mas para tornar possível uma melhor humanidade futura. Mas essa é a grande dificuldade. Cada geração propende a educar os jovens para agir no seu tempo, em vez de atender à finalidade mais própria da educação, que é* conseguir a melhor realização possível da humanidade como humanidade. Os pais educam os filhos simplesmente para que estes possam prosperar em suas carreiras, e os soberanos educam os vassalos para instrumentos de seus próprios fins. Quem orientará, então, a educação para que a humanidade melhore? Devemos contar com os esforços dos homens esclarecidos em suas iniciativas particulares. "Toda a cultura principia com as iniciativas particulares e depois se propaga na sociedade. Só é possível à natureza humana aproximar-se

gradualmente de seus fins por meio dos esforços de pessoas capazes de compreender o ideal de uma futura condição melhor... Os governantes só se. interessam pela educação para converterem seus súditos em melhores instrumentos para seus próprios fins". Até os auxílios dos governos para as escolas particulares devem ser recebidos com cautela, pois o interesse daqueles em beneficiar sua nação, em vez de terem em vista o melhor para a humanidade, os fará, se subsidiarem escolas, procurar utilizá-las na realização de seus planos. Aqui temos, expressos nesta opinião, os traços característicos, do cosmopolitismo individualista do século XVIII. Por ele se identifica o pleno desenvolvimento da personalidade particular com os próprios fins da humanidade como um todo e com a ideia do progresso. Temos aqui, além disso, o receio expressamente manifestado da influência inibidora de uma educação orientada e regulada pelo estado para a realização daquele ideal. Mas pouco menos «te duas décadas após essa época, os filósofos continuadores de KANT, FICHTF e HEGEL exprimiram a ideia de que a principal função do estado é a educativa — de que, especialmente no caso da Alemanha, o reerguimento nacional deveria ser efetuado por uma educação dirigida de acordo com o interesse do estado, e de que o indivíduo, particularmente considerado, é um ser egoísta e irracional, escravo de seus apetites e das circunstâncias, a não ser quando se submete voluntariamente à disciplina educativa das instituições e das leis nacionais. Com esse espírito a Alemanha foi o primeiro país a empreender um sistema de educação pública, geral e obrigatória, que se estendia desde a escola primária até a universidade, e a submeter à regulamentação e fiscalização de um estado cioso de suas prerrogativas todos os institutos particulares de -educação. Duas consequências derivam deste breve transunto histórico. A primeira é que expressões como concepção individual e social da educação não têm significação alguma, quando isoladas ou destacadas da situação a que se referem. PLATÃO concebeu o ideal de uma educação que conciliasse o cultivo da individualidade com a coesão e estabilidade sociais. As condições de seu tempo forçaram seu ideal a restringír-se na noção de uma sociedade organizada por estratificações em castas, em que os indivíduos eram absorvidos por estas. No século XVIII, a filosofia pedagógica foi altamente individua-

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lista na forma, mas esta forma era inspirada por um nobre e generoso ideal social: o de uma sociedade cuja organização abrangesse a humanidade toda e fomentasse o indefinido aperfeiçoamento do género humano'. A filosofia idealista alemã nos primórdios do século XIX pretendeu outra vez conciliar os ideais de um livre e completo desenvolvimento da personalidade cultivada, com a disciplina social e a subordinação política. Ela fazia do estado nacional um intermediário entre a expressão da personalidade individual, de um lado, e da humanidade, do outro. Por consequência, seria igualmente possível enunciar-se seu princípio inspirador com a expressão clássica, "desenvolvimento harmónico de todas as aptidões do indivíduo" ou com a terminologia mais recente de "eficiência social". Tudo isto robustece a afirmação que inicia este capítulo: a concepção da educação como um processo e uma função social não tem significação definida enquanto não definimos a espécie de sociedade que temos em mente. Estas considerações preparam o caminho para nossa segunda conclusão. Um dos problemas fundamentais da educação em e para uma sociedade democrática é estabelecido pelo -conflito de um objetivo nacionalista com o mais lato objetivo social. A primitiva concepção cosmopolita e "humanitária'/ ressentia-se, ao mesmo tempo, de seu vago e da falta de órgãos de execução e de administração. Na Europa, especialmente nos países continentais, a nova ideia da importância da educação para o bem-estar e progresso humano foi captada pelos interesses nacionalistas e aparelhada para produzir uma obra cujo objetivo social era-nitidamente estreito e exclusivista. Identificaram-se os objetivos social e nacional da educação e o resultado foi um visível obscurecimento do sentido de objetivo social.

sunção de que cada uma tenha interesses exclusivamente seus. Pôr isto em dúvida, equivale a pôr em dúvida a própria ideia de soberania nacional que se admite ser ponto básico • da prática e da ciência políticas. Esta contradição (pois não é nada menos do que isto) entre a esfera mais vasta da vida associada e de mútua cooperação e a esfera mais restrita de empreendimentos e intuitos egoístas e, por isto mesmo, potencialmente hostis, exige dá teoria educativa uma concepção mais clara do que a que se tem até hoje conseguido, da significação de "social" como função e teste do que é educação. Será possível, para um sistema educativo, ser dirigido pelo estado nacional, e mesmo assim, conseguir-se que não seja restringida, constringida e deturpada a perfeita finalidade social da educação? Internamente, tem-se de arrostar a tendência, motivada pelas atuais condições económicas, de se dividir a sociedade em classes, fazendo-se que algumas destas se convertam em meros instrumentos para a maior cultura de outras. Externamente, a questão se relaciona com a conciliação da fidelidade nacional, do patriotismo, com a superior dedicação a coisas que unem todos os homens para fins comuns, independentemente das fronteiras políticas nacionais. Nenhum aspecto do problema pode ser resolvido por meios simplesmente negativos. Não basta fazer-se que a educação não seja usada ativamente como instrumento para facilitar a exploração de uma classe por outra. Devem assegurar-se as facilidades escolares com tal amplitude e eficácia que, de fato, e não em nome somente, se diminuam os efeitos das desigualdades económicas e se outorgue a todos os cidadãos a igualdade de preparo para suas futuras carreiras. A realização deste objetivo exige não só que a administração pública proporcione facilidades para o estudo e complete os recursos da família, para que os jovens se habilitem a auferir proveito dessas facilidades, como também uma ta! modificação das ideias tradicionais de cultura, matérias tradicionais de estudo e métodos tradicionais de ensino e disciplina, que se possam manter todos os jovens sob a influência educativa até estarem bem aparelhados para iniciar as suas próprias carreiras económicas e sociais. Pode figurar-se que essas ideias serão de remota execução, mas o ideal democrático da educação será uma ilusão tão ridícula quanto trágica enquanto tais ideias não preponderarem mais e mais, em nosso sistema de educação pública.

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Esta confusão corresponde à situação presente do intercâmbio humano. Por um lado, a ciência, o comércio e a arte transpõem aã fronteiras nacionais. São grandemente internacionais em qualidade e métodos. Subentendem interdependência e cooperação entre os povos que habitam vários países. Mas, ao mesmo tempo, nunca a ideia da soberania nacional se acentuou tanto na política como presentemente. Cada nação vive em estado de hostilidade recalcada e de guerra incipiente com as nações vizinhas. Cada qual supõe ser o árbitro supremo de seus próprios interesses, e admite-se a pre-

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Aplica-se o mesmo principio às considerações referentes às relações das nações entre si. Não basta patentear os horrores da guerra e evitar tudo o que possa suscitar a inveja e a animosidade internacionais. Deve-se ainda insistir em tudo aquilo que vincula os povos para os empreendimentos e os resultados coletivos que a todos beneficiam, sem nos preocuparmos com fronteiras geográficas, E para a consecução de mais eficiente atitude mental, deve-se incutir o caráter secundário e provisório da soberania nacional, relativamente à colaboração e mútuas relações mais ricas, mais livres e mais fecundas de todos os seres humanos. Se estas conclusões parecerem muito estranhas às considerações próprias da filosofia da educação, essa impressão revelará que as ideias sobre a educação desenvolvidas nas páginas precedentes não foram convenientemente compreendidas. Tais conclusões prendem-se ao ideal genuíno da educação como a expansão das aptidões do indivíduo em um desenvolvimento progressivo orientado para fins sociais. Não sendo assim, só poderia haver incoerência na aplicação de um critério democrático da educação.

dicado em sua realização por fazer das castas, e não do indivíduo, a sua unidade social. Verificou-se que o chamado individualismo do racionalismo do século XVIII continha em si a noção de uma sociedade tão ampla como a humanidade e de cujo progresso o indivíduo seria o fator. Mas faltava um organismo executor para assegurar o desenvolvimento de seu ideal, como o provou com seu retorno à Natureza. As filosofias idealistas institucionais do século XIX supriram essa falta cometendo ao estado nacional aquela função executora; mas, assim procedendo, restringiu a concepção do objetivo social àqueles que faziam parte da mesma unidade política e restabeleceu o ideal da subordinação do indivíduo às instituições.

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Resumo. •— Como a educação é um processo social e há muitas espécies de sociedade, um critério para a crítica e a construção educativa subentende um ideal social .determinado. Os dois critérios escolhidos para aferir-se o valor de alguma espécie de vida social são a extensão em que os interesses de um grupo são compartidos por todos os seus componentes e a plenitude e liberdade com que esse grupo colabora com outros grupos. Por outras palavras: uma sociedade indesejável é a que interna e externamente cria barreiras para o livre intercâmbio e comunicação vda experiência. Uma sociedade é democrática na proporção em que prepara todos os seus membros para com igualdade aquinhoarem de seus benefícios e em que assegura o maleável reajustamento de suas instituições por meio da interação das diversas formas da vida associada. Essa sociedade deve adotar um tipo de educação que proporcione aos indivíduos um interesse pessoal nas relações e direção sociais, e hábitos de espírito que permitam mudanças sociais sem o ocasionamento de desordens. Três típicas filosofias da história da educação foram consideradas sob este ponto de vista. Viu-se que a platónica tinha um ideal teoricamente semelhante ao exposto, mas preju-

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CAPÍTULO 8 Objetivos da educação l. A natureza de um objetivo. — As ideias expostas nos precedentes capítulos sobre a educação anteciparam virtualmente a apresentação dos resultados a que se chega em uma análise da finalidade da educação em uma comunidade democrática. Pois delas se infere que o objetivo da educação é habilitar os indivíduos a continuar sua educação — ou que o objeto ou recompensa da educação é a capacidade para um constante desenvolvimento. Mas esta ideia só se pode aplicar a todos os membros de uma sociedade quando há mútua cooperação entre os homens e existem convenientes e adequadas oportunidades para a reconstrução dos hábitos e das instituições sociais por meio de amplos estímulos decorrentes da equitativa distribuição de interesses e benefícios. E isto significa sociedade democrática. Por isso em nossa investigação das finalidades do processo educativo .não nos preocupamos com encontrar um fim exterior ao mesmo, ao qual a educação ficasse subordinada. Toda a nossa concepção o proíbe. Interessamo-nos de preferência no contraste existente nos casos em que os objetivos ou fins são intrínsecos ao processo sobre o qual atuam e aqueles em que os mesmos são estabelecidos externamente. Verifica-se o último estado de coisas quando as relações sociais não se contrabalançam equitativamente. Pois neste caso algumas partes do grupo social total terão seus fins prescritos por uma imposição exterior; seus fins não surgirão do livre desenvolvimento de sua experiência pessoal e seus pretensos objetivos serão antes meios de realizar os objetivos alheios do que verdadeiramente os seus próprios. Nosso primeiro problema é, por conseguinte, definir a natureza de um objetivo ou fim que exista no interior de uma atividade em vez de lhe ser exteriormente fornecido..

Confrontemos, para isso, os sentidos de meros resultados e de fins. Toda a manifestação de energia produz resultados. Um vendaval carrega as areias do deserto; mudou-se com isto a posição dos grãos de areia. Eis um resultado, um efeito, mas não um fim. Pois nada existe no resultado que complete ou realize o que vem antes. O que há é uma simples redistribuição espacial da areia. O último estado de coisas é tão bom como qualquer outro. Por conseguinte, não há uma base para considerar-se o primeiro como um começo e o último como um fim e para achar-se que haja ocorrido um processo de transformação e realização. Considere-se, agora a atividade das abelhas, em confronto com a mudança de lugar das areias carregadas pelo vento. Os resultados dos atos das abelhas podem chamar-se fins, não porque sejam intencional ou conscientemente produzidos, mas por serem verdadeiras terminações ou remates daquilo que os precede. Quando as abelhas colhem o pólen, fazem cera e constróem alvéolos, cada ato prepara o caminho para o ato seguinte. Prontos os alvéolos, as rainhas põem ovos neles; finda a postura, as abelhas fecham esses alvéolos e os "chocam" mantendo-os na temperatura requerida para os ovos vingarem. Quando as larvas saem dos ovos, as abelhas alimentam-nas até que elas possam cuidar de si mesmas. Ora, somente porque tais fatos não são excessivamente familiares, é que nos sentimos dispostos a esquecê-los, ou a considerá-los, assim como a vida e o instinto, coisas um tanto milagrosas. E por isso não observamos que as características essenciais de tudo aquilo são principalmente a importância da ordem de sucessão de cada ato, o modo pelo qual cada ato anterior orienta o ato posterior, e esse ato posterior toma o que lhe é fornecido e o aproveita para outra fase, até se chegar ao fim, o qual, por assim dizer, resume e remata toda a série de atos. Uma vez que os objetivos ou fins^se relacionam sempre com a natureza dos resultados, a primeira coisa a considerar-se para se saber se há fins ou objetivos é a continuidade intrínseca do trabalho ou atividade em questão. Porque se se tratar de mera série de atos justapostos, dos quais uns devem ser feitos primeiros e outros depois, já não há problemas de fins. Falar-se em objetivo ou fim da educação quando quase todog os atos de um discípulo são impostos pelo professor, quando a única ordem na sequência de seus atos é a proveniente das

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lições marcadas e das direções dadas por outrem, é absurdo. Como se torna igualmente ridículo falar-se em fins ou objetivos quando se permite a atividade caprichosa ou descontínua, sob pretexto da manifestação espontânea da personalidade. Um objetivo ou um fim importa em atívidades seriadas e ordenadas, atívidades cuja ordem consiste no progressivo completar-se de um processo. Dada uma espécie de atividade que deva durar certo tempo è seja cumulativa em seu desenvolvimento no decurso desse tempo — fim ou objetivo significa a previsão do termo ou do possível resultado. Se as abelhas previssem as consequências de seus atos, se percebessem antecipadamente seu termo, em imaginação, teriam possuído o elemento essencial para um objetivo. Por essa causa é disparate falar-se em objetivo da educação — ou de outra qualquer empresa — se as condições não permitirem a previsão dos resultados e nem incitarem uma pessoa a encarar o futuro, procurando prever as consequências de determinado modo de proceder. Em segundo lugar, o objetivo, em sua qualidade de fim previsto, dirige a atividade; não é uma coisa que um mero espectador contempla ociosamente; influencia os passos dados para se chegar ao termo. A previsão funciona de três modos. Primeiro, subentende cuidadosa observação das condições dadas, para ver quais os meios úteis para atingir-se o fim e descobrir os obstáculos existentes no caminho. Segundo, sugere a conveniente ordem ou sequência na utilização dos meios. Facilita a seleção e os arranjos mais económicos. Terceiro, torna possível a escolha entre as diversas alternativas. Se pudermos predizer o resultado 'de procedermos deste ou daquele modo, poderemos comparar o valor de dois modos de proceder e formar juízos sobre sua relativa desejabilidade. Se soubermos que nas águas estagnadas se geram pernilongos e que estes provavelmente são transmissores de moléstias, poderemos, por desagradar-nos esse resultado previsto, dar providências para evitá-lo. Quando não antevemos os resultados como simples observadores de fora, mas como pessoas interessadas nos mesmos, passamos a participar do processo que produz aqueles resultados. Intervímos para produzir esta ou aquela consequência. Estes três pontos, naturalmente, associam-se de perto um com o outro. Só podemos prever determinados resultados quando examinamos cuidadosamente as condições presentes, e

é a importância do resultado que motiva essas observações. Quanto: mais adequadas forem nossas observações, mais variado será o quadro de condições e embaraços que se apresentam e mais numerosas serão as alternativas entre as quais deveremos escolher. Por outro lado, quanto mais numerosas forem as possibilidades reconhecidas da situação, ou alternativas à escolha, mais importância possuirá a atividade escolhida e mais plasticamente se poderá dirigi-la. Quando se pensar só em um resultado, o espírito não terá que pensar em outra coisa; limita-se à significação ligada ao ato. A pessoa segue diretamente para a meta. Algumas vezes pode bastar esse trajeto fácil. Mas se surgirem, nesse trajeto, inesperados embaraços, não teremos à disposição os recursos que teríamos se houvéssemos escolhido o mesmo modo de proceder depois de detido exame das possibilidades do campo de ação. Não poderemos fazer de pronto as necessárias readaptações. A conclusão irretorquível do exposto, é que agir com um objetivo é o mesmo que agir inteligentemente. Prever o termo de um ato é ter 'uma base para observar, escolher e ordenar as coisas e os nossos próprios atos ou aptidões. E fazer tais coisas, isto é, observar, escolher e ordenar quer dizer ter inteligência, espírito ou razão, porque razão ou juízo é precisamente atividade intencional e com um propósito, controlada pela percepção dos fatos e de suas relações recíprocas. Ter em mente fazer uma coisa é prever uma possibilidade futura; é ter um plano para a realização; é notar os meios para a exeqúibilidade do plano e os obstáculos do caminho; — ou, se realmente temos em mente fazer a coisa e não apenas uma vaga aspiração — é ter um plano que leva em conta os recursos disponíveis e as dificuldades da execução. Mente, capacidade mental, é a aptidão para relacionar as condições presentes a resultados futuros, e futuras consequências a condições presentes. E isso é exatamente a significação das palavras •— ter um objetivo ou propósito. Um homem é estúpido, obtuso ou ininteligente — deficiente de espírito, sem juízo, — na proporção em que em qualquer espécie de atividade ele não conhece bem o que está fazendo, e principalmente as prováveis consequências de seus atos. Um homem é pouco inteligente quando se satisfaz com conjeturas mais vagas da que eo"iivÍria sobre o resultado de seus atos, contando sempre com a sorte, ou então quando faz planos sem observar as condições atuais, inclusive suas próprias aptidões. Essa ausência relativa de

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inteligência significa que se deixa guiar mais pelos sentimentos, em relação àquilo que vai acontecer. Para sermos inteligentes devemos "parar, olhar, escutar", a fim de conceber um plano de ação. Identificar a — ação com um objetivo — com atividade inteligente basta para mostrar-lhe o valor — sua função na experiência. Somos muito propensos a transformar em uma entidade o nome abstraio "consciência", Esquecemo-nos de que ele deriva do adjetivo "consciente". Ter consciência é saber aquilo que temos de fazer; conscientes são os traços da atividade eni que se delibera, observa e planeja. Consciência não é uma coisa que possuímos para olhar ociosamente o cenário que nos cerca ou para que seja impressionada pelas coisas do mundo exterior; consciência é a denominação da qualidade intencional de uma linha de ação, da qualidade da atividade que é orientada por um objetivo. Em outros termos, ter um objetivo é dar significação aos aios, e não proceder como máquina; é ter em mente, ter a intenção de fazer alguma coisa e compreender a significação das coisas à luz dessa intenção,

exterior, não deixando, à inteligência, outra coisa a não ser uma escolha maquinal de meios.

2. O critério para o conhecimento dos bons objetivos. — Podemos aplicar o resultado de nossa discussão à consideração do critério necessário para um adequado estabelecimento de objetivos. l — O objetivo a estâbelecer-se deve gerar-se nas condições existentes. Necessita basear-se na consideração do que já está sucedendo, e nos recursos e obstáculos de uma situação. Com frequência violam este princípio as teorias educacionais e morais que se propõem a definir as verdadeiras finalidades de nossos atos. Elas pressupõem a existência de fins exteriores a nossa atividade — fins estranhos ao aspecto concreto da situação, fins derivados de uma fonte externa. Neste caso o problema é levar nossos atos a conseguirem a realização desses fins fornecidos do exterior. Eles são alguma coisa pela qual devemos agir. Pelo menos., tais "objetivos" limitam a ação da inteligência; não constituem a. manifestação do espírito no seu esforço de prever, observar e escolher a melhor das alternativas possível. Limitam a ação da inteligência, porque, previamente elaborados, lhe devem ser impostos por alguma autoridade

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2 — Estivemos a falar em objetivos como se estes pudessem formar-se completam ente antes de tentar-se sua realização. Devemos esclarecer agora este ponto. O objetivo, do modo que primeiro surge, é um mero esboço a tentasse executar. O esforço necessário para tentar realizá-lo põe em prova o seu valor. Se ele é capaz de dirigir a atividade com êxito, nada mais se requer, uma vez que toda a sua função é plantar à frente um marco; e às vezes pode bastar uma simples sugestão. Mas geralmente — pelo menos nas situações complicadas — as primeiras de acordo com esse fim esboçado trazem à luz condições que passaram despercebidas. Isto exige uma revisão do objetivo originário; necessita de acrescentar ou tirar qualquer coisa. Um objetivo deve, portanto, ser plástico, capaz de alterações para adaptar-se às circunstâncias. Ora, uma finalidade estabelecida exteriormente pára o desenvolvimento de uma ação é sempre rígida. Sendo inserida ou imposta do exterior, não se pode supor que tenha relações reais e operantes com as condições concretas da situação. O que sucede no curso da ação, não a confirma, repele ou altera. Limitamornos a insistir na sua realização. O malogro resultante de sua inadaptação atribuímo-lo unicamente às más condições e não ao fato de que o dito fim não é razoável nas referidas circunstâncias. O valor de um legítimo objetivo reside, ao contrário, no fato de que podemos utilizá-lo para mudar as condições. É um meio de se tratarem as condições de modo a se conseguirem, nas mesmas, alterações desejáveis. Um agricultor que aceitasse passivamente as coisas tais quais as encontra, cometeria tão grande erro como o que formasse seus planos sem ter absolutamente em conta o que permitem o solo,, o clima, etc. Um dos males de um abstrato ou remoto fim externo em educação é que sua real inaplicabilidade na prática resulta habitualmente no considerar abrupta ou desastradamente as condições imediatas presentes. Um bom objetivo, pelo contrário, é aquele que leva a observar a experiência atual do aluno, e, concebendo um esboço de plano de desenvolvimento dessa experiência, conserva este constaiitemente em vista e modifica-o conforme as condições se apresentarem. O objetivo, em suma, é experimental, e por isso evolui continuamente à medida que vai sendo provado na ação.

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Objetivos da educação

3 — O objetivo deve sempre representar uma expansão, uma libertação de atividades. A expressão fim em vista é sugestiva, pois coloca em frente do espírito a terminação ou conclusão de algum desenvolvimento. O único meio pelo qual podemos determinar uma atividade é ter à nossa frente as coisas em que ela desfecha ou termina — como um alvo em frente do atirador. Mas devemo-nos lembrar de que o objetivo é unicamente um marco ou sinal por meio do qual o espírito determina a espécie de atividade que deseja pôr em ação. Para falar com rigor —- o fim em vista não é o alvo, e, sim, atingir-se o alvo; uma pessoa, ao fazer pontaria, visa o alvo, mas precisa igualmente ter a vista em sua arma. Os diferentes objetos ern que pomos o pensamento são os meios de orientar a atividade. Deste modo, por exemplo, visamos um coelho; assim fazendo, o que queremos é acertar o tiro: uma certa espécie de atividade. Ou, se o que queremos é o coelho, não será este só por si, independentemente de nossa atividade, e sim como fator em nossa atividade: queremos comê-lo, ou mostrá-lo como prova de nossa perícia de atirador — desejamos fazer alguma coisa com ele. Nossa finalidade é o que faremos com a coisa e não a coisa por si mesma. Atingir o objeto visado constituía apenas um aspecto do fim ativo — a continuação da atividade com bom êxito. É o que quis dizer com a frase usada atrás: "expansão, libertação de atividade". Contrastando com este modo de realizar-se um processo para que a atividade possa prosseguir, está a natureza estática de um fim imposto externamente â atividade. Tem, primeiro, que ser sempre concebido como coisa rígida: algo a ser atingido e possuído. Quando se tem uma tal noção, a atividade é um simples meio inevitável para se conseguir outra coisa; não tem significação ou importância por si mesma. Em comparação com o fim, ela é unicamente um mal necessário — uma coisa que se deve fazer antes de alcançar o objeto que, só ele, tem valor. Por outras palavras — a ideia exterior de um objetivo conduz a separar os meios do fim ao passo que um fim que se desenvolve dentro da própria atividade como um plano para sua direção tem sempre a natureza de fim e de meio, fazendo-se a distinção entre uma e outra coisa por simples comodidade. Cada meio é um fim temporário até que o atinjamos. Cada fim, assim que atingido, torna-se um meio de transportar a atividade para mais além. Chamamo-ío fim

quando marca a direção futura da atividade em que nos empenhamos — e meio, quando marca a direção atual. Toda a separação entre fim e meio diminui na proporção do afastamento a significação da atividade e propende a reduzi-la a um aborrecimento, a uma tarefa, que de boa mente evitaríamos se pudéssemos. Um lavrador tem que lançar mão de plantas e de animais para fazer a sua lavoura. Dar-se-á certamente grande diferença ern sua vida se plantas e animais forem coisas que ele aprecie e ame ou se as considera simples meios a que tem de recorrer para conseguir alguma outra coisa que, só essa, a ele interessa. No primeiro caso, todo o curso de sua atividade é significativo; cada uma de suas fases tem valor próprio. Ele experimenta realizar seu fim em todos os estágios, pois o objetivo ulterior, ou fim em vista, é simplesmente uma coisa que vê à sua frente, para manter sua atividade em plena e livre manifestação. Pois se ele não olhar para a frente, encontrará, mui verossirnilmente, o caminho obstruído. O objetivo é tão definidamente um meio para a ação, como qualquer outro elemento da atividade.

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3. Aplicação à educação. — Nada encerram de particular os objetivos em ou da educação. São análogos aos de qualquer outra espécie de atividade. O educador, bem como o fazendeiro, tem certas coisas a fazer, certos recursos com que o fazer e certos obstáculos a vencer. As condições com que o fazendeiro se tem de avir, quer sejam obstáculos, quer recursos, têm sua estrutura e atuaçao próprias, independentemente de qualquer propósito dele. As sementes germinam, cai a chuva, brilha o sol, os insetos praguejam a plantação, sobrevêm outras pragas, muda-se o tempo. Seu fim é simplesmente utilizar-se destas várias condições, fazer sua própria atividade e 'as energias delas trabalharem concordemente em vez de se contrariarem. Seria absurdo que o fazendeiro se resolvesse a dedicar-se à lavoura sem tomar na devida conta as condições do solo, estações do ano, característicos do crescimento das plantas, etc. Seu intento é simplesmente prever as consequências de sua energia em relação com as das coisas que o rodeiam, e essa previsão é empregada cada dia para orientar seus atos. A previsão de possíveis consequências leva à mais meticulosa e extensa observação da natureza e efeitos das coisas com que se tem de avir, e organização de um plano — isto é, de certa ordem nos atos a praticar.

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Objetivos da educação

Dá-se o mesmo com o educador, seja o pai, ou seja o mestre. É tão absurdo eles estabelecerem seus "próprios" objetivos como o fator adequado ao desenvolvimento das crianças, como o lavrador conceber seu ideal da lavoura independentemente daquelas condições. Ter objetivos ou fins significa a aceitação da responsabilidade das observações, previsões e disposições necessárias para o exercício de uma função — quer o cultivo da terra, quer a educação. Todo o objetivo tem valor na medida em que auxilia a observação, a escolha e a elaboração de planos, hora a hora, instante a instante, quando nos dedicamos a alguma atividade; se ele for de encontro ao nosso próprio senso comum nessas observações e escolhas (o que certo sucederá se imposto exteriormente ou aceito pelo influxo da autoridade) já não é um fim válido e útil, mas prejudicial. E é bom que nos lembremos de que a educação, considerada como tal, não tem objetivos. Só as pessoas, os pais e os professores, etc., é que os têm, e não uma ideia abstrata como a de educação. E por conseguinte esses fins ou propósitos são indefinidamente variados, diferindo de acordo com as 4í±"erentes crianças, mudando à proporção que as crianças crescem e à proporção que cresce a experiência da pessoa que ensina. Até os mais válidos objetivos ou fins que se possam formular em palavras farão, como palavras, mais dano do que bem, a não ser que se reconheça que não são objetivos, mas, antes, sugestões para os educadores, sobre o modo de observar, de olhar para o futuro, e como proceder para libertar e dirigir as energias das situações determinadas em que .elas se encontram. Bem o disse recentemente um escritor: "Levar tal adolescente a ler romances de SCOTT em vez das antigas narrativas de SLEUTH ; ensinar tal menina a costurar; desarraigar o hábito de valentias de JOÃO ; preparar tal classe para estudar medicina — eis alguns exemplos dos milhões de objetivos que ternos atualmente ante nós na obra concreta da educação". Com estas considerações em mente, passaremos a expor alguns característicos existentes em todos os bons objetivos educacionais.

vimos, esquecer as aptidões existentes e fixar-se como fim alguma remota realização ou responsabilidade. Há em regra o pendor de terem-se em mira coisas agradáveis ao coração dos adultos e escolhê-las como fins, independentemente das aptidões dos educandos. Há também a propensão de propor objetivos tão uniformes que desprezam as aptidões especiais e exigências ,de um indivíduo com o esquecimento da circunstância de que toda aprendizagem é coisa que acontece a um indivíduo em lugar e tempo determinados. A percepção mais ampla do adulto é de grande valor para observarem-se as aptidões e deficiências dos mais novos, e a fim de caleular-se o alcance das mesmas. Assim, as habilidades artísticas dos adultos manifestam aquilo de que serão capazes certas tendências da criança. Se não existissem as realizações dos adultos, não saberíamos ao certo o que significariam os atos de desenhar, copiar, modelar e colorir da idade infantil. Semelhantemente, se não existisse a linguagem dos adultos, seríamos incapazes de compreender a significação do instinto infantil de balbuciar sons. Mas uma coisa é uti Hz armo-no s das realizações do adulto como o contexto dentro do qual colocamos e examinamos os atos da puerícia e da adolescência, e coisa totalmente diversa o escolhê-los como objetivos fixos, sem atender à atividade concreta e atual dos educandos.

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l — Um objetivo educacional deve alicerçar-se nas atividades e necessidades intrínsecas (inclusive os instintos inatos e os hábitos adquiridos) do indivíduo que vai ser educado. A tendência de um objetivo como a preparação é, como já

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2 — Um objetivo deve ser passível de converter-se- em um método de cooperação com a atividade daqueles que recebem a instrução. Deve sugerir a espécie de meio necessário para a expansão e organização de suas aptidões. Se ele não se prestar à construção de processos especiais e se estes processos não provarem, corrigirem e ampliarem o objetivo, este não terá valor. Ao invés de auxiliar a tarefa especial do ensino, evitará até o uso do senso comum para observar e avaliar a situação. O efeito disto é fazer esquecer todas as circunstâncias, exceto as que se enquadrem com a meta fixa que se tenha em vista. Todo o objetivo rígido, exatamente pelo fato de ser rígido, torna desnecessário prestar cuidadosa atenção às condições concretas. Uma vez que devemos aplicá-lo de qualquer modo, que adianta observar particularidades que não entrarão em linha de conta? O mal dos fins exteriormente impostos tem profundas raízes. Os professores recebem-nos das autoridades superiores ; estas autoridades professam o que é corrente na comu-

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Objetivos da educação

nidade. Os professores impõem-nos às crianças. A primeira consequência é a de não ser livre a inteligência do professor; é "f orçado a receber os objetivos que lhe mandam do alto. Mui raramente é o professor suficientemente livre das imposições da autoridade fiscalizadora, sobre métodos a adotar, programas de estudos, etc., para poder deixar seu espírito comunicar-se de perto com o espírito do aluno e com as matérias do estudo. Esta desconfiança d* experiência do professor reflete-se, por sua vez, na falta de confiança nas respostas eu reações dos alunos. Estes recebem seus objetivos mediante dupla ou tríplice imposição e sentem-se constantemente perturbados pelo conflito entre os objetivos naturais da sua própria experiência no momento e aqueles que lhes ensinam a aceitar. Enquanto não for reconhecido o critério democrático da importância intrínseca de toda a experiência que se desenvolve, sentir-nos-emos intelectualmente desnorteados pela exigência de adaptação a objetivos exteriores.

um pequeno número de alternativas. Se uma pessoa tivesse conhecimentos integrais das coisas, poderia, quase, partir de qualquer ponto e manter-se em atividade contínua e frutiferamente. Entendendo-se, assim, o objetivo geral ou compreensivo, isto é, no sentido de um amplo descortino do campo da atividade presente, examinaremos alguns dos mais amplos fins em voga nas .-teorias pedagógicas atuais e consideraremos que luz eles projetam nos objetivos imediatos, concretos e diversos, que constituem sempre o verdadeiro interesse do educador. Admitiremos (e em verdade é o que diretamente se infere do que já dissemos) não ser necessário escolher entre eles ou considerá-los como uns excluindo os demais. Quando temos de agir praticamente precisamos escolher ou preferir um ato determinado em determinado tempo; mas pode coexistir sem antagonismo certo número de fins gerais ou compreensivos, desde que signifiquem simplesmente vários modos de contemplar o mesmo cenário. Uma pessoa não pode subir simultaneamente ao cimo de várias montanhas, mas, tendo-se ascendido várias montanhas, as paisagens vistas se completam mutuamente; não mostram mundos incompatíveis antagónicos. Ou, para apresentar a matéria de modo ligeiramente diverso, um fim proposto pode sugerir certas questões e observações, e outro fim nova série de questões a reclamar outras espécies de observações. Por isso, quanto mais fins gerais tivermos, tanto melhor. Um dará relevo àquilo sobre o que outro passou por alto. Uma pluralidade de objetivos determinados pode fazer pelo educador o que faz, para o cientista pesquisador, uma pluralidade de hipóteses.

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3 — Os educadores devem pôr-se em guarda contra os fins que se alegam serem gerais e últimos. Toda a atividade, por mais especializada que seja, é, naturalmente, geral em suas associações ramificadas, pois conduz indefinidamente a outras coisas. Na medida em que uma ideia geral nos torna mais conscientes destas associações, ela é útil e deixa de ser demasiadamente geral. Mas "geral" também significa "abstrato" ou desprendido de toda a contextura específica. E tal abstração significa distância remota e faz-nos retrogradar, mais uma vez, ao ensinar e aprender como simples processo de preparar-se alguém para um fim divorciado dos meios. Dizer que a educação, literalmente, durante todo o tempo em que dura, deve ser a sua própria recompensa, significa que nenhum estudo ou disciplina é educativo a não ser que tenha valor o seu conteúdo imediato. Mas, objetivo verdadeiramente geral amplia a perspectiva do espírito; estimula a pessoa a tomar em conta mais consequências (associações). Significa uma observação de meios e recursos mais vasta e flexível. Por exemplo, quanto mais forças, das que interatuam, o agricultor tomar em conta, na sua lavoura, mais variados serão seus recursos imediatos. Verá maior número de pontos de partida e de meios de realizar o que deseja fazer. Quanto mais completa for a concepção, de alguém, das futuras realizações possíveis, menos sua atividade presente se sentirá manietada por

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Resumo. — Um objetivo corresponde ao resultado de algum processo natural trazido à consciência e tornado em fator para determinar a observação e a escolha dos meios de prossegui-lo. Ter-se um objetivo significa, pois, que uma determinada atividade se tornou inteligente. Especificamente significa a previsão das consequências alternativas resultantes de diferentes meios de ação em dadas circunstâncias, e a utilização daquelas previsões para orientar a observação e experimentação. Um verdadeiro objetivo contrasta, por esse motivo, de todo em todo, com um objetivo imposto exteriormente.

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Este último é fixo e rígido; não é um estímulo para a inteligência em determinada situação, e sim uma ordem dada do exterior para fazer-se esta ou aquela coisa. Em vez de associar-se diretamente à atividade atual, é remoto e divorciado dos meios pelos quais deve ser atingido. Em vez de sugerir uma atividade mais livre e melhor equilibrada, é uma restrição imposta a essa atividade. Em matéria de educação, a voga desses objetivos externamente impostos é causadora do relevo dado à ideia da preparação para um futuro remoto, e dois sentidos do, 368. Estudo, dois significados do, 367-368; necessidade do processo, 4-6; O processo não um fim isolado, 186, 192; relação do processo com o conhecimento, 163-164, 363-364; passividade vs. atividade no, 368, 396; na escola, estudo contínuo com estudo extra-escolar, 394, 395-396. Ver também Dualismos; Faz^r vs. Conhecer; Conhecimento. Esti'dos informativos por excelência, 231. Estudos, Intelectuais vs. Práticos, 288-303; sumário, 303-304. Ver também Educaçpo Cultu-

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ral; Dualismos; Educação Vocacional. Estudos, mau resultado da complicação e congestão, 197; intelectuais", recente reforma nos, 302; isolados, 147148; na típica classe escolar, nominal vs. real, 172; origem, 7; tradicionais, modificação necessária, 105; uma razão para suas persistências, 145146; valores dos, 261-267, 273-274. Ver tambért Matéria. Estudos Práticos, ver Estudos intelectuais vs. estudos práticos. Eu, não fixado mas formando-se continuamente, 385-386; e interesse, dois nomes para o mesmo fato, 386; consciência do, um inimigo para o bom método, 191-192; controle do, como dever moral, 384. Ver também- Indivíduo e o mundo ; Interesse vs. dever ou princípio Ativida-le-índivídual, etc.. Europa bárbara, sua cultura não um produto nativo, 319; influência na educação, 308, 309. Ver também Feudalismo; Idade Média. Evolução, biológica, e o idealismo de Hegel, 63-65; como, confirmando a* prova da continuidade, 370-372. Exames, a necessidade dos, 369. Exercícios seriados e intensivos, para formar hábitos, 293-294; importância excessiva 54-55, 196; fragilidade dos, 150. Experiência, utilização nas recentes experiências, 374, 373375; teoria da limitação e do equilíbrio, 269-270, 355, 365; continuidade através da renovação, 2-3, 10; individual, como absorve a experiência dos outros, 6, 8, 229 239-240, 253, 255; como é danificada pelo ensino mecânico, 230; vs. conhecimento, concepção pre-

matura, 288-292, 303; teoria moderna, 292-298, 299, 304; medida de valor, 153; mediata vs. imediata, 254-256; natureza da, 152-158, 165, í 79. 297r 298, 300-301, 304; sua qualidade para ser mudada pela educação, 11, 24, 15; do aluno, não para ser adotada, 168, í 84-185. 256; reconstrução da85-86; na classe escolar, como sugestão na recente reforma no curso do estudo, 214; lugar da ciência na, 245-250; provando a unidade do objeto e do método, 183-184. Ver também Atividade; Atividade Caprichosa; Dualismos; Método Experimental; Experimentação ; Reconstrução; Rotina ; Pensamento e Experiência. Experimentação, 298-303, 304. Ver também Experiência. Exterior vs. interior, 380-385, 396. Ver também Dualismos; Objetivo. Faculdade Psicológica, 268-269. Ver também Disciplina Formal. Faculdades, como explicadas por Hcrbart, 75-76: na teoria de Locke, 66, 67, 71, 74. " Fases Formais", no ensino, 76-77. Fazer v*. Conhecer, 321, 257, 262-263, 269; relação tornada clara pela ciência experimental, 302-303, 304. Ver também Atividade; Dualismos; Conhecimento como derivado de fazer. Felicidade, a chave para a, 340. Feudalismo, divisão de classes no, 132; condenado pela ciência, 314. Ver também Europ_a bárbara; Idade Média. Fichte, relação entre o Indivíduo e o Estado, 102-104. Filantropia como torná-la construtiva, 353. Filosofia, e o conflito entre o

índice homem e a natureza, 312-314, 318-319; natureza da, 356-365, sumário, 365; íntima relação oom a educação, 361-365. Ver também Aristóteles; Atenas; Dualismos; Platão; Sócrates; Sofistas. Filosofias, morais, e a socialização do indivíduo, 328-332. Finalidade da experiência, definida, 359. Fins, vs. meios, 114-115, 380; em continuidade com os meios, 356; em relação ao interesse, 138-Í40, 150; vs. resultados, 108-109. Ver também Dualismos. Físico vs. Psíquico, 380, reconciliadas, 381-382. Ver também Corpo e espírito; Corpo vs. alma; Dualismos. Fiske, John, e a doutrina da infância prolongada, 48, n1. Focalizar, um aspecto da ação diretiva, 27, 42, 68. Formulação, valor da, 249-250, 253. Froebel, importância dos princípios naturais do crescimento, 126-127; força vs. debilidade de, 62-63, 73. Galileu, e a rejeição da tradição, 325Generalidade da matéria e do método, 357, 358, 359. Generalização, nas teorias de Locke, 294; vaíor da, 249, 253. Geografia como um estudo, definida, 231, 232; geografia doméstica, 233-234; como incluindo o estudo da natureza, 231, 234-235. Geografia e história, sujeitos complementares, 231-235, 240; males do uso mecânico da, 229-230; suas significações, 228-240, 255; sumário, 239240; princípio que governa a escolha da matéria na, 231-232, 234. Ver também história. Geral, ver Particular vs. Geral.

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Goethe, apreciação das instituições, 63. Gosto, como é,, determinado peíoambiente, 19-20. Gregos, apreciação das instituições, 04; identificação da arte e ciência, 215; explicação do sucesso na educação, 154, da eminência intelectual e artística, 40; individualistas, 336; relação entre inteligência e desejo nas suas filosofias, 277, 286, entre o homem e a natureza, 305, 319; distinção entre educação liberal e educação utilitária, 275-280, 284, 284-285, 286; ambiente social dos, 302; visão do espírito, 321-322; os primeiros filósofos, 363. Ver também Aristóteles; Atenas; Dualismos. Guerra, como força educativa, 92-93; como a educação pode prevenir, 106; Europeia, em 1916. usada na ilustração dos processos do pensamento, 159162, 163-164. Habilidade, fundamento próprio, 229, 259-260, 284; perigo do treinamento para, 196, 218219; como um fim do trabalho escolar, 167, 177, 303; inferior à compreensão, 280-281, 299; limitada quando baseada no' mero hábito, 84-85, 89, 343, 372-373; estreita vs. larga, 284-285; como libertadora doespírito para o ato de pensar, 285; transferência da, 69. Hábito, vs. conhecimento, 372374; vs. princípios, 387-388. Ver também Dualismos; Costumes. Hábitos, cegos, 31-32; bloqueados, conscienciosamente acentuados, 382; comum compreensão da palavra, 51-53, 54; formação nos animais, 13, nos seres humanos, 14, 51; como manifestações do crescimento, 49-55, 56-57.

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Hatch, citado na influência grega, 307: crítica, 308. Hedonismo, 383-384. Hegel, doutrina do absoluto, 62, 63-64, 73-74; relação entre o indivíduo e o estado, 102104; a filosofia de, 331-332. Helvécio, crente na onipotèncía da educação, 295. Herbart, teoria das apresentações, 75-77, 86; crítica de. 77-78, 86 . Herder, apreciação das ínstitui. coes, 63. Hereditariedade, falsa ideia da, 80-81; relação com o ambiente, 81-82. Hipóteses, no método científico, 299. História, aproximação biográfica, 236: definição, 231; económica ou industrial, 237-238; valor ético da, 238-239; intelectual, 2.18: métodos do ensino, 236-239; como relacionada à present? vida social, 235239; vida. primitiva como instrrção à, 236-237: para ser incluída na educação vocacional, 351. Ver também Geografia e História. "Homem e a natureza, o, durlísmo do, 321. 356-357, 363; interdependência, 231, 232. 251, 314-315; onerem da ideia de separação, 310-314, 319, 356; reunião pronietida pelo aparecimento da riéncia, 319-320, ainda não realÍ7ada no currículo, 305. Ver também Dualismos. Homem "prá'ico" vs. homem de teoria e cultura, 149. Honestidade, intelectual, como é perdida. 194-195; natureza " moral da, 392. Humanidade, o ideal dos íilÓsofos do século XVIIT, 98, 101, 105-106; como foi enunciada por Kant. 102-103; defeitos da concepção, 104-105.

Humanismo vs. Naturalismo na educação, 251-253, 305-320, 352-353. Ver também Dualismos. Humor, senso de, do professor, destruído, 369. Idade Média, ambiente social, 302; opiniões da, 321-322. Ver também Europa bárbara. Ideal individualista do século XVIII, 98-100, 103-104, 106107; como foi enunciado por Kant, 102-103. Idealismo, 372-373, 378; institucional, 102, 103-104, 107. Ver também Institucionalísmo; Instituições. Ideias, não diretamente comunicáveis, 176; definição, 176-177, 197; uso no ato de pensar, 174; vs. palavras, 157-158. Ignorância, importância do reconhecimento da, 208. Igreja, influência na. educação, 308, 319; conflito cora a ciência, 359-360. Iletrado, como equivalente a in. culto, 259. Imaginação, como efetuada por si mesma, 6; o meio da apreciação, 259; agentes para o desenvolvimento, 259-260; abrindo voo, 382-383. Imaginativo vs. Imaginário, 259. Imaturidade, significado da, 4445, 50, ni, 54, 55, 56, 58; vantagem da, 79. Imitação, como está relacionsda com o controle, 30-31; dos fins vs. dos meios, 38-39; e psicologia social, 36-39. Imprensa, invenção da, efeito na educação, 200. Impressões sensortaís vs. conhecimento livresco, 368; essencial para conhecer e crescer, 377-378; como' usadas na experimentação, 299; e educação superior, 303.; uso excessivo das, 172-173. Ver também Empirismo; Observação.

índice analítico Individualidade, dupla significação, 334-335; da essência da, 132, vs. institucionalismo, 360362; reconhecimento da, no trabalho escolar, 142-143; vs. controle social, 321, 336-337. Ver também Dualismos. Individualismo económico e político, 322; na filosofia de Locke, 66; moral, 328; interpretação filosófica do, 325326, 366; propósito do, 3783/9; religioso, da Idade Média, 322-323; Verdadeiro, sua origem, 336. Indivíduo, o, seu papel no conhecimento, 326-327; e o mundo, 321-336, 338, 356, 357, 363; sumário, 336-337. Indústria, agora científica, 346348, 353. Infância, prolongada, doutrina da, 48-49. Ver também Dependência. Infância, um estado positivo e, não, negativo, 44-45, 53,-58. Inferência, natureza da, 174 . Iniciativa, desenvolvida pela oportunidade de enganos, 217; deficiência para desenvolver, 54, 74; importância na democracia, 94-95, 107. Instintos, bloqueado, consciência acentuada, 382; tratamento impróprio das, 54. Ver Capacidades; Disposição. Institucionalismos vs. Individualidade, 359-362. Instituições, más e boas escolas, 129: na filosofia de Hegel, 63-65; a medida de s°us valores, 7-8; a fortaleza da tradição humanista, 310. Instrução e caráter, 380, 395396; como meio da educação, 75; exposição do problema da, 144-145. Integridade, intelectual, como é perdida, 194-195. Intelecto vs. Emoções, 368-369. Ver também Dualismos. Intelectualidade, unilateral, 141, 151.

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Intelectualismo, abstraio, 329. Inteligência vs. Caráter, 388-392, 395-396; não liberal, 149. Interesse, como controle social, 33-35; dividido, causa e resultados do, 194-196; falsa ideia de, 137-139. 321, 385-386; origem da falsa concepção do, 185-186; sua relação com as condições da ,ocupação, 342; bases filosóficas da depreciação do, 369; outro nome para "eu", 386-. Ver também Atenção; Disciplina vs. Interesse ; Dever vs. Interesse; Dualismos. Interesse individual, 384, 385. Interesses, questão morri da organização dós. 272-273; para serem aprendidos no momento próprio, 126-127. Ver também Objetívos; Valores. Interesses económicos, vs. Interesses científicos, ou estéticos, 359-362. Interesses estéticos, vs. económicos, 359-361. Interior vs. Exterior, 380-385, 395-396. Ver também %Dualismos; Objetívo. Invençfies, devidas à ciência, 245-247. Inventiva, perdida pela disciplina formal, 74. Jardim da Infância, material próprio para, 217-218: Í opôs, também simbólicos, 223-224: técnico, defeitos do, 168-169, 217. Jardins, valor no trabalho escolar, 178, 220-221. 244. n i. Jogo, e apreciação, 256; diferente do trabalho, 223-225, 226227; 348, da peraltíce, ^224; jogo e trabalho no currícu'o, 214-226; 355. 394; sumário, 226-227, 228-229. Ver também Trabalho. Jogos, dramáticos, na educação primitiva. 8; no trabalho escolar, 178.

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Jogos, valor no trabalho escolar, 177-178. Jubo, oomo foi concebido pelos seguidores de Locke, 294; desenvolvido pela oportunidade de cometer enganos, 217. Kant, apreciação das instituições, 63-64; divórcio entre a moralidade e conduta, 383; o ideal individualista cosmopolita de, 102-103; razão do único motivo moral próprio, 389. Lazer, como oposto ao trabalho para ganhar a vida, 288-292. Ver também Dualismos; Trabalho vs. Lazer. Leitura, na teoria da disciplina formal, 69-70, 70-71. Lessing, apreciação das instituições, 63. Liberdade, económica, resultados da falta da, 149; na escola, verdadeira e falsa, 332, 336337; vs. preocupações com a ordem, 359-361. Ver também Autoridade; Conservantismo; Controle; Dualismos; Individualidade. Lições de coisas, vs. conhecimento livresco, 368; defeito das 219, 295, 297. Limiar da consciência, 75, 76. Linguagem, aquisição de uma modalidade do desenvolvimento educativo, 123-124; como uma ampliação da educação, 41-42, 43, 254-255, 394; como veículo do, conhecimento, 1517; hábitos fixados pelo ambiente, 19; como demonstrando relação entre hereditariedade e ambiente, 81; como meío da direção social, 35, 43. Literatura, seu lugar no programa, 260-261, 273; tratamento inconsistente da", 283-284. Locke, e a disciplina formal, 6668, 2°4; atitude para com a verdade, 323.

Lógica, formal, uma generalização do método escolástico, 376. Maneiras, como são fixadas pelo ambiente, 19. Matemática, seu valor como matéria de estudo, 269. Materialismo vs. Eficiência Social, 133. Ver também Realismo. Matéria, como incluindo ocupações ativas e jogo, 255-256; das ocupações ativas pode ser académica, 217-218; definição, 142-143, 182; desenvolvimento da, 391-392; como desenvolvendo disposição, 75; generalidade e totalidade e última causalidade da, 356-357, 358359. 359-360; importância dada por Herbart à, 76, 77, 86; isolada, males da, 147-148; 151, 366"; natureza da, 147, 151, 199-212, 355, sumário, 213; da educação primitiva, 199-200. Ver também Método vs. matéria; Estudos. Matéria vs. Espírito, 142-145, 181, 280-281, 356, 357. Ver também Dualismos. Mediocridade, produzida pelo método geral uniforme, 190. Meio de subsistência, como oposto ao lazer, 288-292. Ver também Trabalho w. Lazer. Meios, ver Fins vs. Meios. Método, definição, 181, 192; dialético, 308-309; essências do, 167-179; sumário, 179-180; geral e individual, 187-190, 198; generalidade do, 357» 358; genético, o princípio do, 236; Herbart 76-77; indivi, dual, características do, 190197, 198; do ato de aprender e do ato de ensinar, 188, 189190; mecânico, 187-189; causa, 54, 155-156, 193, 198; remédio, 2"59-260; escolar vs. extra-escolar, 334; escolas do, 372-378; sumário, 378-379; como definidor da ciência, 210-211, 241; vs. matéria, 321,

índice analítico 368; unidade dos dois 181-187, 198, 356; totalidade do, 357, 358-359. 359-360; tradicional, 105; última causalidade do, 357, 358, 358-359. Ver também DuaHsmos; Método Experimental ; Método lógico. Método educativo do conhecimento, substituindo o método dedutivo, 324-325. Método Experimental, relação com ocupações, 222-223, 251; consequências da falta do, na Grécia, 322; origem, 222-223; como transformando a filosofia da experiência, 206, a teoria do conhecimento, 371-372, 378-379. Ver também Experimentação. Trabalho de Laboratório ; Método Lógico; Método, como definindo ciência ; Ciência. Método Lógico vs. Psicológico, 241-245, 252-253, 315-317. Ver também Dualismos; Método Experimental; trabalho de laboratório; Método, como definidor de ciência; organização da matéria. Métodos, a medida de seus valores, 189-190, 393. Métodos dialéticos, influência na educação, 303-304; mudança gradual dos 347-348, 349; dando caminho ao método experimental, 372-373. Métodos rotineiros, origem e resultados, 186-187. MÍ11, John Stuart, sobre o trabalho das escolas, 372. Montaigne, atitude para com a verdade, 323. Montessori, sistema, crítica do . material usado, 217-218, da técnica, 168. Moral, sua identificação com o racional, 389, com o social, 392-395. Ver também Moralidade; Moral. Moral, teorias da, 380-395; sumário, 395-396. Ver também Moral.

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Moralidade, como afetada pelo ambiente, 19; diferentes concepções da, 380, 383-385; a essência da, de um ponto de vista, 383; essência verdadeira da, 395-396; comum, uma transação, 384. Ver também Moral. Motivação, como é influenciada pelas ocupações ativas na escola, 214-215, 226-227; peia vocação extra-escolar, 342; em relação ao interesse, 137; na eficiência científica, 91-92. Motivo da ação vs. suas consequências, 380, 383-384, 395396. Motivos, artificiais, 59-60, 196. Mulheres, classificação Aristotélica das, 278. Mundo, ver o Indivíduo e o mundo. Música, sua função primária na educação, 260-261; tratamento da, 283-284. Ver também Arte; Belas-Artes. Natural (normal) vs. natural (físico), 122. Naturalismo, ver Humanismo vs. naturalismo. Natureza antí-social, do homem, negada, 25-26; da quadrilha ou corrilho, 92. Natureza, e o objetivo da educação, 121-129, 355; sumário, 134-135; como foi concebida por Kant, 102, por J.-J. Rousseau, 98, 122-123; educação de acordo com, 98-100, 101-103, 107; vs. criação, 128-134. Ver também Dualismos: Hereditariedade em relação ao ambiente; Homem e natureza. Notas, sistema de, porque têm tanta importância, 258; necessidade do, 369. Obediência, como dever moral, 384. Objetivo, condições que tornam um objetivo possível, 109-110;

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a natureza do, 108-112, 115117, 119, 193, 395, 396: Objetivo da Educação, em si, não existe, 116; como foí adotado em diversas épocas, 121122; defeitos e necessidades do tempo ref letido no obj etivo adotado, 121, 137. Objetivos na educação> discussão geral, 108-119, 355; sumário, 119; choque dos objetivos explicados, 149; não fornecidos pela capacidade inata do homem, 124; gerais, uso dos, 121, 134, 267; em relação ao interesse, 137, 150; isolados, origem dos, 366; sociais, necessidade de concepção mais clara, 104; conflito com os nacionalistas, 104, 107; vocacionais, seu lugar na educação, 339-344, 353. Ver também Interesses; Valores. Obj etivo nacionalista da educação, conflito com o social, 104, 107. Observação superficial, 197; o adestramento da, 7P/2. Ver também Experiência como experimentação; Laboratórios; Trabalho d= laboratório; Impressões Sensitivas. Obstinação, vs. vontade 140. Ver também Querer. Ocupação, sua contribuição à vida, 271-272; Ver também Comércio; Trabalho vs. Lazer ; Vocação. Ocupações, atívas, e o fundamento da apreciação, 256; função básica das, 256; relações das, 239-240; lugar na educação, 214-216, 220-223; 226-227, 228-229, 369, 378, 395-396; proveitosas para o uso escolar, 216-223, 302; ocupações sociais, intelectualizadas, 302; e conhecimento moral, 392, 395-396. Ver também Atividades; Atividade.

Ocupações Industriais recente aumento na importância, 346347, 348, 353. Ordenar, um aspecto da ação diretiva, 27, 42-43, 69, n í. Organização da matéria, da criança, 202-203; do adulto, 202-203. Ver também Método Lógico vs. Psicológico. Organização psicológica do conhecimento pela vocação, 342. Ver também Lógica. órgãos aperceptivos, na teoria de Herbart, 76. Orientação como função da educação, 25-43. Orientação, vocacional, própria e imprópria, 343-344. Originalidade, da atitude vs, originalidade dos resultados, 334; do pensamento, 190. Padrões, convencionais vs. individuais, 59; os padrões gregos e a experiência, 290-291; como são determinados pelo ambiente, 19-20; isolados, 366; natureza dos. 257-259, 267, 273-274. Ver também Critério. Palavras vs. ideias, 157. Participador vs. observador, 370-371; atitude do, 136-137. Particular, vs. geral, 376-378; vs. universal, 367. Ver tam~ bem Dualismos. Passividade vs. atividade no saber, 368. Pedagogia, acusação contra, 181182; uma razão para o seu descrédito, 187; "mole", 138. Pensamento, ampliado por meio da simpatia social, 161-162. Ver também Razão; Ato de pensar. Perfeição, como alvo, 61. Perguntas, das crianças, na escola e fora dela, 170-171; sugestivo. 61-62. Personalidade, alto valor da, vs. eficiência social, 132-133, 134135.

índice analítico * Pesquisa original", pelas crianças, 175, 190, 334-335; «m todo ato de pensar, 162. Pestalozzi, e as leis naturais do desenvolvimento, 126; o trabalho de, 100; formação do seu trabalho, pelos seus alunos, 219. Pintura, sua 'função primária na educação, 261 Ver também Arte; Belas-Artes. Platão, filosofia educacional de, 94-98, 106, 106-107, 130, 341; conhecimento como baseado no fazer, 215, como virtude, 389; relação entre o homem e a natureza, 306 opiniões, a respeito de aritmética e geometria, 284-285; a respeito de experiência e razão, 288, 289, 292-293. Ver também Aristóteles; Atenas; Dualismos ; Gregos; Filosofia; Sócrates; Soíistas. Plasticidade, definição, e consequências, 47-48, 50, ni, 56-57. Poesia, o valor da, 264 Política, incluída na educação vocacional, 351-352. Potencialidade, duplo significado da palavra, 44. Pragmatismo, 373, 377-378. Prática vs. teoria, 149, 250, 252, 321, 325, 338, 352, 357, 363364, 369; concepção primária, 286-287, 288-292, 299, visão moderna, 292-298; prática educacional e teoria, 41-42. Ver também Dualismos. Prazer, ver Dor e prazer. Preconceitos, um resultado dos, 193. íremios, necessidade tos, 369. Ver também Punições e recompensas. Preparação, educação como, 5860, 354; sumário, 73-74; fases da, na teoria de Herbart, 76. Presente, importância de viver np, $8-60, 73, 79, 81-82, 86, 342.

"Princípio", verdadeiro significado , do, 388. Ver também Dualismos; Dever. Problema, da disciplina, origem do, 154; educacional, atual, 314-319, 319^320; do próprio aluno, vs. professor ou compêndio, 170. Professor e aluno, relações recíprocas entre, 77, 175-176. Profundeza, intelectual vs. física, 197; uma qualidade moral, 392. Progresso, social, ideia estreita e larga do, 245-246; ideia de Hegel, 363-364; como resultado da ciência, 245-250. Propósito, em relação ao interesse, 136-137. Ver também Objetivo. Psicologia, como modificadora do curso do estudo, 214; como guia ao método individual, 190-191; falsa, do ensino, 31, 36; do empirismo sensacionalista, 297-298; moderna vs. faculdade psicológica, 214, visão da educação vocacional, 348-349, 353; social, e imitação, 36-39. Ver também Estudo infantil. Psicologia, provando interdependência do espírito e corpo,. 369-370, 378-379. Psíquico, ver Físico vs. psíquico. Punição, para despertar interesse, 141-142; sistema da, 60. Ver iambém Dor e prazer; Punições e recompensas. Punições e recompensas, bases filosóficas para, 368-369; Ver também Dor e prazer; Punição. Racionalismo, 329-330, 372-373; vs. empirismo ou sensacionalismo, 376-37.8, 379. Ver iambém Dualismos; Razão. Razão, primariamente considerada como a função humana primordial, 277, o único guia adequado da atividade, 289, 303; como faculdade distinta,

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330; concepção moderna da, 304, 377, essencial ao crescimento e ao conhecimento, 377. Ver também Racionalismo; Ato de pensar; Pensamento. Reajustamento, modalidade do, 382 Realismo, 372-373, 378-379. Ver também Materialismo. Realização, a natureza da, 254261. t _ Receptividade mental, meios de provocar a, 256; envolvida no bom método, 193, 198; uma qualidade moral, 392; uma disposição filosófica, 358-359. Recompensas, ver Punições e recompensas. Reconstrução, como a função da educação, 11, 23, 82-86, 86; da educação necessária, 348-349, 364-365; da educação, da filosofia, da sociedade, toda interdependente, 364, 365; da sociedade dependente da reorganização educacional, 352353, também da legislação e da administração, 353. Ver também Reformadores. Recreação, significação e necessidade da, 226. Reflexão, ver Razão; Ato de pensar; Pensamento. Reforma, educacional, ver Reconstrução, da educação. Reformadores, educacionais, recentes transformações efetuadas no curso do estudo, 214216, 301-302. Ver também Reconstrução. Regra, prescrita, vs. método geral, 188. Relações das coisas, não para serem separadas das percepções, 156-158, 165. Relações não-sociais dentro do grupo social, 5. Ver também Anti-social. Religião, seu conflito com a ciência, 359-360. Renascimento do estudo, 308; características» 309-310, 311.

Reorganização, ver Reconstrução. Reprodução, como continuadora do processo da vida; 1-2, 10. República, de Platão, 306. Responsabilidade, as bases da, 370; fugida pela confiança no dogma, 372; como uma característica do método, 196197, 198; como aumentar o senso de, no rico, 353. Resposta, efetiva, definida, 169170; relacionada aos estímulos, 26-27, 67; somente para estímulos selccionados, 50-51. Retitude, uma característica do método individual, 191-192, 198. Retrospecção, educação como, 79-82. Retrospecto, valor do, 166. Resultados, em contraste com os fins, 103-109; em relação ao interesse, 137. Revolta protestante, e humanismo, 310-311. Revolução Industrial, causa da, 312; como necessitada de reconstrução educacional, 364365; como ampliadora do humanismo, 318. Romanos, influência na educação, 288-308, 319. Rotina, contrastada com continuidade, 369, com a ação educativa, 84-85; com a ação re. flexíva, 159-160, 169; negada pelo objetivo vocacional, 341, .pelo conhecimento, 374-375. Ver também atividades; Atividade. Rousseau, e educação para a cidadania, 100, n l ; na educação natural, 122-129; influência de Platão em, 98; visão das condições sociais, 64. Saúde, um objetivo da educaçfio, 125-126. Schiller, apreciação das instituições, 63.

índice analítico Sèleção, das respostas, 68. Sensacionalismo, ver Empirismo. Sentimentos, em relação à motivação, 137. Sentir, uma modalidade do comportamento, 13. Seres, distinção entre os animados e os inanimados, 1-4. Serviço, social, pode faltar simpatia no, 131. Significação, como atos vêm a ter, 15-17, 23, 83-84, 86, 374, 378; como partes de um ato mental, 31, 32, 296. Significações das atividades, extensão das, 228-229, 239-240. 253, 395. Símbolos, perigo no uso dos, 255-256; perigo e valor dos, 244-245, 249; dependência da imaginação, 260; Froebelianos, 62-63, 73-74; relação de Herbart para com, 77; instrumentos da experiência índireta, 254-255; o aprendizado tornase agora menos dependente dos, 348, 349; necessidade na cultura adiantada, 9; uso no empirismo sensualísta, 296, 296-297. Similitude, causa da, 38; definida e ilustrada, 4, 32-34; modalidade da obtenção, 12. Simpatia, inteligente, principal elemento da eficiência social, 131-132, 134-135; para ser feita construtiva pela educação vocacional, 353; como ato de pensar crescente, 161-162. Simples vs. complexo, falsa noção de, 219-220. Sinceridade, qualidade moral, 392. Sistema, da educação, compulsória e oficial, inicialmente encontrado na Alemanha, 103; atual, como mistura incoerente, 282-283, 286-287. Sistema dualístico, origem do, 176-178; propósito do, 356-357. Sistema nervoso, função do, 369-370.

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Situação social, hostil, evadida pelo subjetivismo, 383, reação, 383-384; atual, o maior mal, 350-351; inconsistência da, 280-286. Ver também Classes distintas. Social, idêntico ao moral, 392393, 395. Sociedade, espirito anti-socíal na, 5, 92793, 106; meios de sua continuidade, 3, 10, 11; despótica, defeitos da, 90-92; meios de formação, 5; ideal, constituição e condições da, 88, 349-350, 353; não um corpo, mas muitos, 22-23, 87-89; como organismo, 64-65; tratamento das variações individuais, 337. Ver também Distinção de classes; Estado. Sócrates. e a natureza do conhecimento, 389-391; e a relação do homem com a natureza, 305-306. Sofistas, os primeiros professores profissionais, 363. Spencer, Herbert, atitude para com a ciência, 243. Subjetívo, ver Objetivo vs. subjetivo. Tensão nervosa do trabalho escolar, causas da, 154-155, 197, 270-271, 335. Teoria da recapitulação, 78-79t 222. Teoria, ver Prática vs. teoria. Teorias da moral, 380-395, sumário, 395-396. Tipos de escolas, explicação histórica dos, 271. Totalidade da matéria e do método, 357, 358-359, 359-360. Trabalho de laboratório, função básica em um novo campo, 256; valor educativo, 177-178, 394; medida do, 259-260; condições próprias, 302-303; material, 218-219; tempo, 303. Ver também Método Ex *rimental; Experimentação; Método lógico; Meto J ' i como de-

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finidor da ciência; Ciência, método impróprio. Trabalho, e trabalho compulsório, 226, 348. Ver também Trabalho; Jogo e trabalho. Trabalho Infantil, prevenção um dever social, 215-216. Trabalho vs. Capital, o problema do dia, 345-347; vs. lazer, 275286, 321, 338, 352, 356, 368, 369; sumário, 286-287. Ver também Dualismos; Lazer. Tradição, revolta prematura contra, 288-289, 303, 324, 336; e os sofistas, 363-364; literária, o enfraquecimento da, 347-348, 348-349. Transcendem" ai Í smo, 366, 372373. Transferência do adestramento, 69, 70, 72. Transmissão da vida, 1-4, 10; dos costumes sociais complexos, 8-9, 10. Treino Manual, tradicional, defeitos do, 217; material próprio para, 217-218, 219. Ver também Educação Vocacional. Uniformidade do procedimento, o mal de um excesso de importância, 193-194; não o equivalente da conformidade, 54. Universal, vs. particular, 339, 376-378. Ver também Dualismos. Uso e significado das coisas, 31. Utilitarismo, na educação elementar, 149; na moral, 384. Valor, dois significados de, 261262, 273-274. Valores educacionais, 254-273, sumário, 273-274, 355-356; segregação e organização dos, 267-273; de certos estudos,

261-267. Ver também Objetivos; Interesses. Valores. Intrínsecos vs. Instrumentais, 261-262, 274. Valores, Instrumentais vs. Intrínsecos, 261-263, 273-274. Variações, individuais, ver Individualidade. Variedade Mental, vs. acessibilidade, 1P3-194. Verdade, atitude antiga e medieval para a, 322; atitude mais tardia, 324-325; sobrevivência da atitude primária, 368. Vida, conteúdo vário do termo, 2, 13; como significando crescimento, 55-56, 56-57; concebida como uma colcha de retalhos, 269-270; renovação da, 1-4, 10, 11; interpretação estática vs. dinâmica, 60-61; como um desdobramento, 60. Vida primitiva, como introdução para. a história 236-237, Virtude, relação para com a ação e conhecimento, 363-364; para o conhecimento, 388-392, 395-396; plena significação da, 393. Vocação, significado da, 338-340, 352-353; como organização do conhecimento de alguém, 342; sentido estreito e largo da, 331-340, 352-353. Ver também Negócios; Comércio; Trabalho vs. lazer. Vontade, apelar para a, como estímulo para o esforço, 186; definição, 146, 150-151; diferença essencial entre fraca e forte, 140-141; dois fatores na, 140-141. Vorstellungen, 75. Windelband, na relação da ciência para com o humanismo, 310. -

RELAÇÃO COMPLETA

DAS OBRAS

DE "ATUAL1DADES 1'EDAGÓGICAS"

1 — Fernando de Azevedo, Novos caminhos e novos fins 2 — John Dewey, Como pensamos 3 — Anísio Teixeira, Educação progressiva 4 — Ed. Claparède, A educação funcional

5 — Afrânio Peixoto, Noções de história da educação 6 — Delgado de Carvalho, Sociologia educacional 7 — Arthur Ramos, Educação e psychanalyse 8 — Adalbert Czerny, O médico e a educação da criança 9 — A. Almeida Júnior. A escola, pitoresca e outros trabalhos 10 — Celso Kelly, Educação social 11 — Hcnri Piéron, Psicologia do comportamento 12 — Henri Wallon, Princípios de psychologia applicada 13 — Djacir Menezes, Dicionário psico-pedagógico

14 — Sylvio Rabello, Psicologia do desenho infantil 15 — A. M. Aguayo, Didática da escola nova 16 —> A. Carneiro Leão, O ensino das línguas vivas — seu valor e a sua orientação cientifica 17 — Delgado de Carvalho, Sociologia aplicada 18 — A. M. Aguayo, Pedagogia científica. Psicologia e direção da aprendizagem 19 — Aristides Ricardo, Biologia aplicada à educação 20 — Aristides Ricardo, Nf>ções de higiene escolar 21 — John Dewey, Democracia e educação 22 — Fernando de Azevedo, A educação e seus problemas 23 — Sylvio Rabello, Psychologia da infanda 24 — J. Melo Teixeira, M. Mendes Campos e outros, Aspectos fundamentais da educação

— Euclidcs "Roxo, A matemática na educação secundária — Sylvio Kabello, A representação do {empo na criança — Afránio Peixoto. Ensinar a ensinar — Ariosto Espinheira, Arte Popular c educação ~- Onofre de Arruda Penteado Jr., Fundamentos do mefhodo — Noemy da Silveira Rudol f er, In troducão à psicologia educacional 31 — Milton da Silva Rodrigues, Educação comparada 32 —• Guerino Casassanta, Jornais escolares 33 — A. Carneiro Leão, Introdução à administração escolar 34 — Paul Monroe, História da educação 35 — A Almeida Júnior, Biologia educacional 36 — Paul Guillaume, A formação dos hábitos 37 ~ Arthur Ramos, A criança-problema 38 • - Francisco Venâncio Filho, A educação e seu aparelhamemo moderno - Arthur J. Jones, A educação dos líderes - Fernando de Azevedo, Velha e nova política - ]. Roberto Moreira, Os sistemas ideais de educação 42 — Theo-baldo Miranda Santos, Noções de psicologia educacional 43 Theobaldo Miranda Santos, Noções de história da educ.açâo René Nihard, O método dos testes Ary I_ex, Biologia educacional

46 — Fernando de Azevedo, Seguindo meu caminho 47 — Theobaldo Miranda Santos, Noções de filosofia da educação 48 — José de Almeida, Noções de psicologia aplicada à educação 49 — I. L. Kandel, Educação comparada 50 — Theobaldo Miranda Santos, Noções de sociologia educacional 51 — Fernando de Azevedo, As universidades nu mundo de amanhã 52 — A. Carneiro Leão, Adolescência e ma educação 53 — Lorenzo Luzuriaga, A pedagogia comemporânea 54 — M.-A. Bloch, Filosofia du educação nova 55 — Paul Foulquié, As escolas novas 56 — Lorenzo Luzuriaga, Pedagogia 57 — Anísio Teixeira, Educação para a democracia 58 — Camille Mélinand, Noções de psicologia aplicada à educação 59 — Lorenzo Luzuriaga, História da educação e da pedagogia 60 — Paul Guillaume, Manual de psicologia 61 — C. M. Fleming, Psicologia social da educação 62 — Roger Cousínet, A formação do educador 63 — André Fouché, A pedagogia das ma tema ticas 64 — Anísio Teixeira, A educação e a crise brasileira 65 — A. Almeida Júnior, Problemas do ensino superior 66 — René Hubert, História da pedagogia 67 — Robert S. Woodworth e Donald G. Marquis, Psicologia

68 — U. Valnir C. Chagas 'Diãáíica especial de. línguas modernas 69 — Roger Cousinet, A educação nova 70 — Henry E. Garrett, Granâes experimentos da psicologia 71 — Lorenzo Luzuriaga, História da educação piíblica 72 — A. Almeida Júnior, E a escola primária? 73 — Gaston Mialaret, Nova pedagogia científica 74 — Paul Foulquié e Gérard Deledalle, A psicologia contemporânea 75 — J. Leif e G. Rustin, Pedagogia geral 76 — John Dewey. Vida e educação 77 — Lorenzo Luzuriaga, Pedagogia social e política 78 — Arthur T. Jersild, Psicologia da adolescência 79 — Nicholas Hans, Educação comparada 80 —i Santiago Hernández Ruiz, Psicopedagogia do interesse 81 — Paul Guillaume, Psicologia da forma 82 — Armand Cuvillier, Pequeno vocabulário da língua filosófica 83 — Paul Osterrieth. Introdução à psicologia da criança 84 — Rafael Grisi, Didática mínima 85 — Robert S. Ellis, Psicologia educacional 86 — Félicien Challaye, Pequena história das grandes filosofias 87 — Iva Waisberg Bonow e outras, Psicologia educacional e desenvolvimento humano (Manual de trabalhos práticos de psicologia educacional) 88 — Maurice Debesse, As fases da educação

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'ira vmxia í 108 — Maurice Debesse e ou-' tros, Psicologia da criança (do nascimento à adolescência) 109 — Dante Moreira Leite (org.), Desenvolvimento da criança 110 — Oswaldo Frota-Pessoa e outros, Biologia, aplicada à educação 111 — Oswaldo Frota-Pessoa e outros, Biologia aplicada à saúde 112 — RogerT Cousinet, A formação] do educador e a pedagogia da aprendiza • gem \ 113/120 — Maurice Bebesse, Gaston Mialaret e outros, Tratado das ciências pedagógicas (8 vols.) 121 — Gilbert Leroy, O diálogo em educação 122 — Anna Bonboir, O método dos testes em pedagogia 123 — W. Kenneth Richmond, A revolução no ensino

124 — Olivier Reboul. Filosofia da educação 125 — Alain Bcaudot, A criatividade na escola 126 — Jerome S. Bruner, O processo da educação 127 — Antoine Léon, Psicopedagogia dos adultos 128 — Anísio Teixeira, Pequena introdução à filosofia da educação 129 - M. Vial, E. Plaisance, J. Beauvais, Os maus alunos 130 — Anísio Teixeira, Educação não é privilégio 131 — John Dewey, Experiência e editcação 132 — Anísio Teixeira, Educação no Brasil 133 — Jean Château e colaboradores, O s grandes pedagogistas 134 — Lucien Brunelle, A nãodiretividade

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Democracia e Educação - John Dewey

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