Pecados Intimos - Ariela Pereira

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PECADOS ÍNTIMOS Ariela Pereira

Copyright© 2015 Ariela Pereira

Todos os direitos reservados de propriedade desta edição e obra são da autora. É proibida a cópia ou distribuição total ou de partes desta obra sem o consentimento da autora. A violação dos direitos autorais é crime estabelecido na lei n°. 9.610/98 e punido pelo artigo 184 do Código Penal.

Revisão: Valéria Avelar.

1º Edição 2015

ÍNDICE DEDICATÓRIA AGRADECIMENTOS CAPÍTULO I CAPÍTULO II CAPÍTULO III CAPÍTULO IV CAPÍTULO V CAPÍTULO VI CAPÍTULO VII CAPÍTULO VIII CAPÍTULO IX CAPÍTULO X CAPÍTULO XI CAPÍTULO XII CAPÍTULO XIII CAPÍTULO XIV CAPÍTULO XV CAPÍTULO XVI CAPÍTULO XVII CAPÍTULO XVIII CAPÍTULO XIX CAPÍTULO XX CAPÍTULO XXI CAPÍTULO XXII CAPÍTULO XXIII CAPÍTULO XXIV CAPÍTULO XXV CAPÍTULO XXVI CAPÍTULO XXVII CAPÍTULO XXVIII CAPÍTULO XXIX

CAPÍTULO XXX CAPÍTULO XXXI CAPÍTULO XXXII CAPÍTULO XXXIII CAPÍTULO XXXIV CAPÍTULO XXXV EPÍLOGO I EPÍLOGO II

DEDICATÓRIA Dedico essa história a todas as mulheres que carregam o trauma de terem sido vítimas de abuso sexual durante a infância.

AGRADECIMENTOS Agradeço a todos os leitores que vêm me acompanhando nessa jornada literária, os quais, com suas palavras de carinho e incentivo, não me permitem desistir de continuar lutando pelo sonho de levar meu trabalho a alcançar cada vez mais pessoas. Agradeço à equipe da Amazon pelo trabalho justo, honesto e transparente, que tem realizado junto aos escritores, valorizando nossas obras, proporcionando-nos a oportunidade de levarmo-las ao público leitor. E por fim, não poderia deixar de agradecer aos meus filhos amados, por cuidarem da nossa casa e de mim mesma (risos), enquanto estou aqui na frente do computador, hipnotizada, fazendo o que mais amo, que é escrever.

CAPÍTULO I

— Você não precisa fazer isso! Ainda dá tempo de desistir! — Trinity me alertou alarmada, pelo que me parecia à milésima vez desde que o professor Anthony me dera à notícia de que Richard Parker concordara em me deixar escrever sua biografia. Estávamos em meu quarto no apartamento que dividíamos no subúrbio de Houston. Ela sentada na beirada da cama, ainda usando a camisola com a qual dormira, enquanto eu, só de toalha, com os cabelos molhados, procurava uma roupa adequada para ir ao encontro do grande Richard Parker. Encontrar a roupa certa não era tarefa fácil, já que o escritório dele ficava em um dos maiores e mais luxuosos edifícios da cidade e minhas vestes resumiam-se basicamente em jeans desbotados, regatas e tops de malha. Não havia nada que se comparasse à magnitude do lugar. Acompanhar o dia a dia durante todo o mês de julho e escrever a biografia completa de uma pessoa de grande importância para o país, tratava-se do trabalho de conclusão do curso de Jornalismo que nós duas cursávamos juntas, a última disciplina antes da formatura. A maioria dos estudantes tinha escolhido falar sobre as celebridades e os políticos locais, tal como Trinity, que decidira escrever sobre o senador Michael Russel, um dos figurões mais populares do Texas. Eu não compreendia qual a relevância de se escrever sobre pessoas tão conhecidas e famosas, cujas vidas estavam expostas nos sites da internet, com acesso tão fácil que bastaria digitar o nome de um deles na barra de pesquisas do Google para se obter o relatório completo. Não existia desafio em escrever sobre uma pessoa assim. Quem perderia seu tempo lendo algo que a mídia fazia questão de disseminar? Quanto a Richard Parker era um verdadeiro desafio. O cara era o pioneiro na extração de petróleo nos Estados Unidos, responsável por tornar nosso o país o décimo primeiro no mundo, no que se referia à exportação de um produto que até recentemente nós apenas importávamos. Era fundador e presidente da Thrive Oil Company, a maior empresa independente de exploração e produção no mundo, com reservas comprovadas e produção de petróleo líquido e gás natural. Isso sem falar na obscuridade que era sua vida pessoal. De acordo com as poucas informações que encontrei ao seu respeito, ele tivera três esposas ao longo de sua vida, todas elas mortas de maneiras suspeitas. A primeira, Elizabeth, com quem se casara aos dezoito anos de idade e tivera uma filha, suicidou pulando do vigésimo segundo andar do prédio onde ficava o apartamento em que moravam em River Oask. Três anos depois, casara-se novamente, com Dayse Rupert, uma famosa modelo, morta em um suspeito acidente de carro. Sua terceira tentativa de obter uma vida conjugal acontecera cinco anos mais tarde, quando se casara com a filha de um dos acionistas da companhia Ryan Johnson, morta pelo que os médicos diagnosticaram como uma overdose de soníferos, em uma casa no lago onde o casal se encontrava. A morte desta ocorrera há mais de cinco anos, desde então Parker parecia ter desistido de construir uma família. Apesar de todas as mortes terem sido suspeitas, nenhuma acusação oficial fora feita contra Parker,

embora, na época, tenha circulado o boato de que todas aquelas mulheres foram assassinadas por ele, que se livrara da culpa por ter muito poder e dinheiro. E essa era a verdade na qual todos preferiam acreditar, inclusive Trinity, por isso tentava me alertar do perigo que era fazer parte do dia a dia dele, convencida de que eu estaria colocando minha vida em risco ao aproximar-me de um assassino. Todavia, nada me faria desistir. O caso era desafiador demais. Interessante demais para uma futura jornalista investigativa. Eu ouvira falar em Parker pela primeira vez há dois anos, ao realizar pesquisas para uma disciplina que discorria sobre a História da economia no país. Apesar da sua indiscutível contribuição para a economia dos Estados Unidos e da obscuridade da sua vida íntima, quase não havia informações sobre ele na internet, em jornais, ou em parte alguma, o que considerei totalmente estranho. Sequer encontrei uma foto recente dele. Tudo isso acabou despertando meu interesse pelo caso. Escrever a verdade sobre Richard Parker era o maior de todos os desafios, a melhor forma de começar minha carreira, um verdadeiro marco na história do jornalismo americano e nada me faria mudar de ideia. O maior empecilho para alcançar meu objetivo consistia em convencê-lo a aceitar falar e este já fora vencido pelo professor Anthony Willian. Não sabia que método ele usara para persuadir um dos homens mais poderosos da América a dedicar grande parte do seu tempo a uma estudante de jornalismo, mas fora convincente o suficiente. Ignorando Trinity, fucei o guarda-roupa antigo com mais interesse. Precisava me apressar em encontrar algo minimamente adequado para vestir. Por fim minhas mãos puxaram uma blusinha marrom com enfeites no decote e o casaquinho preto de lã que podia ser jogado por cima. Ótimo. Era o que tinha de melhor ali. O jeans e as sapatilhas sem saltos teriam que servir. — Será que você não está me ouvindo?! — Trinity alterou o tom da voz. — Esse cara é perigoso. Como você pretende conviver com alguém assim?! Eu não podia culpá-la por se mostrar tão receosa, afinal tivera uma educação voltada para isto. Sua infância fora tranquila, convivera no seio de uma família unida, sendo mimada pela mãe e protegida pelo pai e pelos dois irmãos mais velhos, por ser a única menina entre eles. Assim como eu, ela também viera do interior para cursar a faculdade em Houston. Era de Bartonville e eu de Calvert, cidades igualmente minúsculas. Nos conhecemos ainda no primeiro período da faculdade, quando encontrei sua mensagem no quadro de avisos do campus, a procura de alguém com quem dividir o apartamento. Foi amizade à primeira vista. Éramos bastante parecidas, embora meu passado me diferisse não apenas dela, mas de qualquer outro universitário. — Relaxa Trinity. Não vou ficar sozinha com ele. As entrevistas acontecerão no escritório, onde tem sempre muita gente. — Falei, mais uma vez, enquanto me vestia. — Ele pode tentar te seduzir, como fez com as esposas mortas e depois te matar. — Ela levou uma mão à testa, encenando um gesto de desespero. — Ai meu Deus, não posso nem imaginar uma coisa dessas. Abri minha boca para responder, quando subitamente a porta se abriu e Tom entrou. Ele era o terceiro ocupante do nosso apartamento. Chegou um pouco depois, já no quarto período. Cursava direito e apesar de vir de uma família rica, com condições de lhe pagar uma faculdade particular, preferira estudar na Universidade pública e morar conosco, mesmo tendo que dormir no sofá. O complexo de rejeição inculcado por seus parentes, pelo fato de ser gay, o empurrara para onde se sentia mais querido.

— Que gritaria é essa a essa hora? — Ele indagou, ainda sonolento, espichando-se sobre minha cama, com a cabeça nas pernas de Trinity, que o recebeu calorosamente. — Essa louca vai escrever a biografia de Richard Parker. — Qual Richard Parker? O milionário que matou as esposas? — Tom perguntou, com naturalidade. — Não há provas de que ele matou as esposas. — Rebati, apressando-me em secar os cabelos densos, ruivos, deixando os cachos soltos. — Claro que não, o cara é milionário! Deve ter comprado todo mundo para não ser acusado. — Tom enfatizou seu jeito afeminado. — Como você conseguiu convencê-lo? O sujeito tem fobia de jornalista. — Foi o professor que conseguiu. Fobia de jornalista como? — Eu estava começando a ficar preocupada. — Ele nunca dá entrevista, não se deixa fotografar, evita lugares públicos para não ser incomodado. Sem falar que é um grosso. Em um evento de caridade, que meus pais estavam, ele humilhou o quanto pode uma repórter que tentou entrevistá-lo. Depois daquela noite, qualquer repórter, num raio de mil quilômetros, pensa duas vezes antes de chegar perto dele. Isso explicava a ausência de informações sobre ele na mídia, mas não me deixaria intimidar facilmente. Eu queria aquele furo de reportagem, descobriria o que realmente acontecera com aquelas mulheres, desvendaria os mistérios que cercavam aquele homem. Era meu objetivo e o alcançaria, não importava a que preço. Eu lutara como uma louca para chegar até onde estava, fizera coisas que muitas pessoas não fariam, me envergonhava de algumas delas, mas não me arrependia. Tudo pelo que passara me tornara mais forte e não seria um pequeno empecilho que me impediria de chegar onde eu queria. As pessoas costumavam dizer que os fins não justificavam os meios, no meu caso os fins teriam que ser absolutamente compensadores para se compararem aos meus meios. — Eita, mas vocês estão pessimistas. A carreira que escolhemos traz esses contratempos. Algum dia todos nós precisaremos passar por maus lençóis pelo nosso trabalho. Se vocês não estão dispostos a isso, acho melhor mudarem de ramo. Ambos se entreolharam num gesto de cumplicidade, silenciando-se, pois no fundo sabiam que eu estava certa. Mesmo a carreira de advogado que Tom escolhera, exigia riscos de vez em quando. Satisfeita com o silêncio deles, terminei de secar os cabelos, deixando-os naquela bagunça organizada de sempre, passei um pouco de gloss labial, rímel e pendurei minha bolsa velha atravessada em meu dorso. Estava pronta. — Você pretende ir assim? — Tom analisava-me com olhos arregalados. — Assim como? — Eu entendia que minhas vestes não eram tão sofisticadas quanto certamente eram as das pessoas que trabalhavam no lugar, porém, considerando que eu era ainda uma estudante, não estava tão ruim. — Querida, as pessoas naquele lugar julgam primeiro pela aparência. Depois pela conta bancária, mais adiante, talvez, analisem seu caráter. Pisquei, tensa. Quem precisava de inimigos quando se tinha Tom e Trinity para te desestimular? Por fim, Trinity pareceu perceber o que estavam fazendo e saltou da cama, vindo até mim, para me estreitar em seus abraços amigos. — Já chega Tom. Se é isso que ela quer, vamos apoiar. — Ela me apertou com força contra seu

corpo. — Boa sorte amiga. Estamos torcendo por você, não é Tom? Ela virou-se para ele, que sorriu em resposta, concordando. Deixei o apartamento tão tensa que me esqueci de tomar o café da manhã. Trinity e Tom conseguiram me deixar mais preocupada que o professor quando me dera à notícia de que Parker concordara em falar ao seu respeito. A todos os outros alunos ele dera a resposta dos entrevistados por telefone, quanto a mim, chamara em sua sala para uma conversa particular, olhara dentro dos meus olhos e me alertara, com alarme, que eu devia tomar todo o cuidado possível com Richard Parker, que mantivesse sempre o profissionalismo e acima de tudo não me deixasse seduzir por ele, caso tentasse. Naquele instante, tive a impressão de que a parte em que me aconselhara a não me deixar seduzir se tratava de mais uma das suas investidas em tentar me assediar, como vinha fazendo desde que iniciara a disciplina, há cinco meses. Não se tratava de um assédio agressivo, que ultrapassasse os limites. Ele apenas deixara claro quais suas intenções e, apesar de ser um homem lindo, com aqueles grandes olhos azuis e o físico atlético, que não passava despercebido às outras garotas, eu não queria ninguém por enquanto. Todavia, não o dispensara definitivamente, apenas o deixara no banco de reserva, para o caso vir a me sentir carente ou, porventura, mudar de ideia por outra razão qualquer. A atração que ele dizia sentir por mim tinha sido útil. Podia apostar que se esforçara mais que o necessário para conseguir a oportunidade da minha vida. Dirigi até Downtown, onde ficava a sede da Thrive Oil Company, sem pressa de chegar, pois a reunião com o todo poderoso estava marcada para as nove e ainda eram oito e meia. Chegando lá, estacionei meu velho Ford Maverick do outro lado da rua, em meio aos modelos caros e sofisticados, sem me sentir envergonhada com isso, afinal não era crime ser pobre, era? O edifício era suntuoso, imponente, enorme, como quase tudo em Downtown. Do lado de dentro era tão imenso quanto, o luxo se refletindo em cada detalhe, desde os quadros caríssimos pendurados nas paredes até o carpete no qual pisávamos. Respirei fundo antes de aproximar-me da recepcionista, uma loira elegantemente vestida que estava atrás de um grande balcão de vidro. Ela examinou-me dos pés à cabeça, com expressão de reprovação, quase de nojo, mas não me deixei intimidar, pois já esperava por aquilo. — Sou Dakota Thompson e tenho hora marcada com o Sr. Parker. — Declarei, com a voz firme, deixando claro que a aparência sofisticada dela, ou sua atitude em tentar julgar a minha não me intimidavam. — Só um minuto. — Ela disse, com sua voz delicada antes de examinar o caderno à sua frente. — Está bem aqui. Pode subir. O escritório dele fica no vigésimo segundo andar. Boa sorte. Só faltou ela completar sua frase com um “você vai precisar” para deixar ainda mais evidente o quanto minha aparência não estava apropriada para o lugar. Puta merda! Dividi o elevador com alguns executivos que carregavam valises de couro e vestiam terno e gravata. As mulheres estavam vestidas de maneira sóbria e sofisticada. Todos eles pareciam muito sérios e compenetrados, como robôs que realizavam suas funções mecanicamente. Eu já estava sozinha no elevador quando este chegou ao vigésimo segundo andar, o último do edifício. Quando a porta se abriu, adentrei a sala enorme onde o luxo estava presente em cada detalhe, como na recepção. Sentada a sua mesa de vidro, estava mais uma loira usando roupas caras, com seus cabelos lisos presos em um coque impecável. Essa tinha o rosto de uma boneca, com a pele aveludada, grandes olhos verdes, nariz pequeno e boca carnuda. Parecia uma modelo de capa de

revista. Ela também me examinou dos pés à cabeça, parecendo meio espantada com a minha aparência desmazelada se comparada à sua. — Olá. Sou Dakota Thompson. O Sr. Parker está me esperando. — Falei, com firmeza. — Só um minuto. — Ela levou o telefone ao ouvido, anunciando minha chegada, o tom da sua voz muito doce e submisso. — Ele está em uma reunião de última hora. Perguntou se você pode aguardar. — Seu tom se tornou mais áspero ao se dirigir a mim. — Espero sim. — Declarei consternada. — Sente-se. — Ela gesticulou para o conjunto de poltronas revestidas em couro, antes de desligar o telefone e voltar sua atenção para a tela do seu computador. Acomodei-me em uma das poltronas confortáveis e tirei meu kindle da bolsa, dando continuidade à leitura de “Estátuas de Gelo”, esperando que assim o tempo passasse mais depressa. Todavia isso não funcionou, as horas pareciam arrastar-se lentamente, enquanto meu estômago reclamava a ausência do café da manhã. Se Parker estava me fazendo esperar tanto, com objetivo de me fazer desistir, eu estava determinada a mostrar-lhe quão persistente podia ser. Já era quase meio-dia quando finalmente a secretária anunciou que eu podia entrar. Mas onde estavam os participantes da reunião que eu não os vira saindo? Perguntei-me, certa de que estava sendo deliberadamente evitada. Atravessei a imensa porta envernizada, adentrando uma sala ainda maior que a primeira, luxuosa, com a parede dos fundos toda em vidro, revelando uma esplêndida vista do centro de Houston. As outras paredes eram brancas, decoradas por um único quadro com pintura abstrata, que insinuava a morte. Havia algumas poltronas em couro, formando um U no centro da sala e a grande mesa retangular ao fundo, atrás da qual ele se encontrava sentado, falando ao telefone, de costas para mim. Antes mesmo de aproximar-me o suficiente para ver o seu rosto, sua voz grossa, abrupta, me alcançou, despertando-me um leve tremor, devido à sua rispidez. — Não quero saber de desculpas esfarrapadas! — Ele dizia. — O contrato estava praticamente assinado. Despeça-o imediatamente. Não há lugar para uma incompetência tão absurda nessa empresa. Enquanto se silenciava para ouvir, ele girou sua cadeira colocando-se de frente para mim, seus olhos castanhos claros, ferozes como os de um animal selvagem, cravando-se em meu rosto e quase fiquei sem fôlego. O Sr. Parker era tudo, menos o que eu esperava. Aos trinta e sete anos de idade era dono de um charme que causaria inveja em um garoto de vinte. Suas feições eram duras, apesar do rosto bem desenhado, extremamente másculo e bonito. Tinha o nariz afilado, a boca no tamanho certo, as sobrancelhas grossas sombreavam os olhos. Seus cabelos eram negros, curtos, meio espetados e formavam um belo contraste com a pele clara. Não tinha sequer uma ruga e o físico se revelava perfeito e glorioso por trás do paletó grafite impecável. Fiquei ali imaginando como seria aquele corpo sem o paletó e senti meu rosto esquentando, subitamente, como há muito não acontecia. Tinha certeza de que estava vermelha como um tomate. — Despeça todos e não me incomode mais com esse assunto. — Sua voz ríspida, ameaçadora, parecia um rosnado que ressoava pela sala enorme. Sem desviar seus olhos do meu rosto, ele desligou o telefone, para em seguida, examinar-me dos pés à cabeça, me fazendo sentir ainda mais afetada, meu rosto em brasas.

— Vai se sentar ou pretende ficar aí em pé o dia inteiro? — Seu tom de voz continuava seco e abrupto, sua expressão de poucos amigos. Esforçando-me para não me deixar intimidar, sentei-me na cadeira diante da mesa, agradecendo pela existência do móvel entre nós, como se este fosse capaz de me proteger daquela montanha de fúria ambulante. — Sou Dakota Thompson. Como o senhor já deve ter sido informado, estou aqui para... — Eu sei porque você está aqui. — Ele me interrompeu, bruscamente. — Pensa que é esperta o suficiente para fuçar meu passado e dar seu furo de reportagem, enquanto finge estar interessada na minha histórica contribuição para a economia do país. É só isso que vocês jornalistas querem: se intrometer na vida das pessoas, sem se importarem em expô-las da forma que bem entenderem. Puta merda! Tom estava certo, o sujeito era intragável. Mas eu também podia ser se assim quisesse e não me deixaria humilhar por aquele babaca. Contudo, precisava manter a calma para evitar que ele me dispensasse e me tirasse à chance da minha vida. — O senhor pode não ter compreendido a proposta. — Falei, calmamente, engolindo meu orgulho. — Nada será escrito sem sua prévia autorização, sem mencionar que ainda não sou uma jornalista formada, portanto há poucas chances de que esse trabalho seja publicado. Ele continuava me encarando com escárnio, seus olhos estreitos cravados em meu rosto, como se me sondasse, obviamente procurando a maneira mais eficiente de me ofender um pouco mais e me fazer ir embora. — Você acredita mesmo que um jornal recusaria informações verídicas sobre minha vida, mesmo que escritas por qualquer retardado, ou apenas está se fazendo de estúpida? Na mesma frase, ele insinuara que eu era estúpida e retardada. Definitivamente, eu não era obrigada a ouvir aquilo. Foda-se minha brilhante oportunidade. Se ele queria me fazer desistir, definitivamente conseguira. Eu escreveria a biografia de uma atriz de cabeça oca qualquer, mas me recusava a passar por aquilo durante todo um mês. No limite da minha raiva, levantei-me, encarando-o de volta com minha melhor expressão desafiadora. — Quer saber? Pega sua arrogância assim como sua bizarra história e enfia onde o senhor achar melhor. Eu não preciso disso, posso encontrar pessoas menos desagradáveis para entrevistar. Sem mais, dei-lhe as costas e me dirigi à porta, pisando firme. Eu não sabia de quem tinha herdado meu temperamento estourado, obviamente tinha disso do meu pai a quem nunca cheguei a conhecer, já que minha mãe era a mais pacífica dos seres humanos. — Pare aí mesmo! — Ele esbravejou com tom de autoridade. Subitamente, estaquei, como se minhas pernas se recusassem a obedecer ao comando da minha mente e me levarem para frente. — Então é só isso? — Havia sarcasmo em sua voz, o que contribuiu para aumentar minha raiva. — Você incomoda meio mundo, obrigando seu patético professor a me convencer a gastar meu precioso tempo com seu trabalho ridículo, para desistir na primeira dificuldade? Então era assim que ele denominava sua arrogância? Como uma dificuldade? Furiosa, virei para encará-lo, sentindo-me como se mergulhasse em outra dimensão, ao me deparar com a intensidade do seu olhar sobre mim. Ele era grosso, arrogante, um verdadeiro imbecil, mas era também lindo, quase irresistível. — O senhor está tentando me fazer desistir desde que cheguei aqui. Primeiro me fazendo esperar

durante horas, depois me tratando com estupidez. Agora vem dizer que a culpa é minha? Ele observou-me em silêncio por um longo momento, seus olhos ferozes me fuzilando. — Sente-se. — Seu tom já não era tão áspero, porém continuava autoritário e me vi obedecendo ao seu comando, como se não tivesse mais vontade própria. Ele levou seu corpo para frente, chegando tão perto que o cheiro gostoso do seu perfume me alcançou. — Eu não tenho motivo para te convencer a desistir de escrever sobre mim. Se eu não quisesse isso você sequer estaria aqui. Mas acontece que eu quero. E se vamos trabalhar nisso juntos é importante que você saiba desde já que não faço nada contra a minha vontade. — Ele fez outro momento de silêncio, sondando minha reação. — Agora me diga como isso vai funcionar? Você passará o dia aqui me interrogando? — Não. Na verdade, estou dispensada das aulas na faculdade durante este mês para a conclusão deste trabalho. Mas ainda tenho meu emprego de garçonete em uma lanchonete no período da tarde. Então teremos que nos reunir sempre pela manhã. Meu estômago embrulhou reclamando, mais uma vez, a ausência de alimentação, a fraqueza em meu corpo lembrando-me de que ainda não tinha comido nada naquela manhã. — Isso não vai funcionar. Você tem ideia do quanto meu tempo é precioso? — Ele continuou, sem esperar resposta. — Você precisará vir trabalhar aqui, como minha assistente. Nos intervalos entre um compromisso e outro, nós conversamos. Minha fraqueza aumentava rapidamente. Não estava acostumada a passar fome. Precisava comer alguma coisa ou não aguentaria muito tempo. — Não posso vir trabalhar aqui, assim de repente. Eu não entendo nada de secretariado. Sem falar que já tenho meu emprego. Ele ergueu uma sobrancelha com deboche. — De garçonete? — É um trabalho digno. — Mas não paga tão bem quanto eu te pagarei. — Sua arrogância estava de volta. — Está resolvido, você trabalhará aqui a partir de amanhã. Eu sei o valor que essa oportunidade tem para você. Qualquer jornalistazinho iniciante daria um rim para xeretar minha vida. Portanto, se quiser realmente concluir esse trabalho, precisará estar à minha disposição, para que eu escolha o momento que estarei disposto a falar e essa não é minha única condição. Em primeiro lugar você terá que assinar um documento se comprometendo a manter esse trabalho em sigilo. Ninguém deverá saber que estou falando sobre minha vida a uma estudantezinha qualquer. Fui claro ou há algo nisso que você não entendeu? Engoli em seco me sentindo humilhada por causa da sua arrogância. Passar um mês inteiro suportando aquele idiota seria um verdadeiro inferno. Contudo, estava fraca e faminta demais para pensar sobre isso naquele momento, tudo o que queria era sair dali e comer. — Mas o senhor já tem uma secretária. Ela não vai se incomodar com a minha presença? — Se incomodar procure outro lugar para trabalhar. Eu podia imaginar o tormento que era trabalhar para um homem como ele. Certamente os funcionários da empresa viviam todos humilhados. Logo seria a minha vez. E eu não podia fazer nada para evitar isso, já que ele parecia o tipo de homem que queria e tinha tudo do seu jeito. Droga! — A que horas devo estar aqui amanhã? — Iniciamos o expediente às oito horas, mas mandarei que Lindsay venha mais cedo para te ensinar o trabalho. Portanto, esteja aqui às sete.

O quê?! Ele queria mesmo que eu aprendesse uma profissão que não pretendia seguir? Ia abrir a boca para protestar, quando me ocorreu que seria apenas mais um obstáculo a ser superado rumo aos meus objetivos. As coisas nunca foram fáceis para mim, eu não podia esperar que se tornassem um dia. — Ok. Mais alguma coisa ou já posso ir embora? — Eu só conseguia pensar em comer. Ele estudou-me atentamente, como se me sondasse, da forma que vinha fazendo desde que eu entrara na sua sala. — Pode ir. E não se esqueça de manter sua boca fechada. Nenhum funcionário desta empresa, ou qualquer pessoa que me conheça, deve saber o que você fará aqui. Eu não entendia a razão de tanto mistério se era apenas uma biografia. Mas isso não importava. Desde que eu tivesse meu furo de reportagem, estava tudo bem. Profundamente aliviada, por finalmente poder voltar para casa e me livrar da sua prepotência, levantei-me, todavia, fiz o movimento tão depressa que a vertigem foi inevitável. Vi toda a sala girar diante dos meus olhos, minhas pernas me abandonando, devido à fraqueza adquirida pela falta de uma refeição. A gravidade me puxou para baixo, contudo, antes que atingisse o chão, fui amparada por braços fortes que me ergueram no ar, carregando-me, estendendo-me sobre as poltronas. Não cheguei a perder a consciência, embora tenha saído de mim por alguns segundos e quando voltei me deparei com um par de olhos castanhos, ferozes, profundos, que me fitavam de perto. De muito perto, aliás. Parker estava agachado ao lado das poltronas, o rosto na altura do meu. Mantinha uma mão sob minha cabeça, como se me amparasse, enquanto que com a outra mão tateava seus bolsos a procura de algo. À medida que eu ia voltando à realidade, a proximidade dele ia me atingindo um pouco mais. Subitamente respirar se tornou uma tarefa difícil. Não apenas porque o cheiro gostoso dele estava impregnado no ar, mas pelo calor que emanava do seu corpo. — Vou chamar um médico. — Ele anunciou, tirando o celular do bolso, sua voz tão gentil que não parecia o mesmo homem de minutos atrás. — Não precisa. Eu estou bem. — Você não me parece bem. — Eu apenas saí de casa sem tomar o café da manhã. Não estou acostumada a ficar sem a principal refeição do dia. Foi só isso. Seus olhos assumiram uma expressão de espanto. Refletiu por um instante, antes de formular a próxima pergunta. — O que você deseja comer? Fechei os olhos e respirei fundo, tentando evitar que a perturbadora proximidade dele me impedisse de analisar a situação. Eu estava deitada nas poltronas de couro da sala de um dos homens mais poderosos e que também podia ser um dos mais perigosos do país. Vulnerável e fragilizada, quando na verdade deveria estar ouvindo o relato da sua vida, friamente, sem permitir que minhas emoções interferissem na minha visão sobre os fatos. Droga! Isso não estava dando certo. Eu precisava me livrar da situação atual e me tornar a profissional eficiente que eu desejava ser. — Eu não desejo comer nada. — Tentei parecer firme. — Quer dizer, não desejo comer nada aqui. Já estou me sentindo melhor. Faço uma refeição na rua. Tentei me levantar, mas ele me impediu, segurando-me pelos ombros para me manter deitada, seu

toque despertando algo desconhecido dentro de mim, um calor gostoso que se alastrava por todo o meu sangue, ao mesmo tempo em que meus instintos me ordenavam a me afastar dele. — Você quase desmaiou de fome. Não vai sair daqui antes de fazer uma boa refeição. Suas palavras soavam não como um pedido e sim como se isso já estivesse decidido. — Eu não quero incomodar. — Foi minha última e fracassada tentativa de me livrar daquele tipo de intimidade com meu entrevistado e futuro chefe. Ignorando minhas palavras, ele digitou os números no celular com uma mão, sem deixar de me segurar com a outra. Pediu frango, espaguete e vários tipos de salada em duas refeições, exigindo que tudo fosse entregue em caráter de emergência. Ao encerrar a ligação, enfiou o celular de volta no bolso e me soltou para puxar uma poltrona para perto de mim. Sentou-se a passou a observar-me em silêncio. Mas que situação constrangedora! A grande repórter espichada na sala do poderoso Richard Parker, sob a mira do seu olhar. Essas coisas só aconteciam comigo mesmo. — Por que você saiu de casa sem comer nada? — Ele perguntou, com tom neutro, depois do longo silêncio. Por que ele queria saber disso? — Não tive tempo. Acordei tarde. — Por que você escolheu escrever sobre mim como seu trabalho final da faculdade? Porra! Dessa vez ele me pegou. Dizer que desvendar o que acontecera com suas esposas mortas seria um grande furo de reportagem, não seria a resposta adequada, embora fosse à verdadeira. — Por que acho que sua participação no crescimento da economia do país está sendo essencial e merece ser destacada. — Menti. — Claro. E a morte das minhas esposas não tiveram nada a ver com sua decisão. — Ele estava sendo sarcástico e, mais uma vez, senti meu rosto queimar, como se estivesse ficando vermelho. — É. Fiquei curiosa a esse respeito também. Principalmente por haver tão poucas informações sobre o caso na mídia. — Nunca gostei de expor minha vida. — Então porque concordou em me deixar fazer sua biografia? O espanto surgiu mais uma vez em seus olhos castanhos. — Seu professor não te contou como conseguiu me convencer? Sua pergunta despertou a curiosidade dentro de mim. Que ligação ele tinha com meu professor? Eu precisava saber. — Não. Vocês já se conheciam? — Eu tenho uma razão para ter concordado com isso. — Ele prosseguiu, ignorando minha indagação. — Mas esta será a última revelação que vou te fazer. Cada palavra dele contribuía para o crescimento da minha curiosidade. Ouvir suas revelações seria mais que um furo de reportagem, seria uma imensurável satisfação pessoal. — O senhor pretende me revelar toda a verdade? Seus olhos voltam a ficar ferozes, assustadores, ao passo em que sua fisionomia se contraia como estava quando eu entrei na sala. — Sim. — Sua resposta foi breve e seca e por alguma razão desconhecida, despertou-me um calafrio na espinha. Cogitei dar continuidade ao nosso diálogo, pois me parecia à oportunidade ideal de começar meu

trabalho, de arrancar toda a verdade sobre ele. Todavia o toque estridente do telefone nos interrompeu e ele se levantou para atender. Trocou algumas palavras com sua bela secretária, sem que me passasse despercebido o fato de que ele a tratava pelo primeiro nome, demonstrando intimidade. Instantes depois, a porta se abriu e ela entrou carregando uma caixa térmica com as refeições. Observou-me com espanto, me fazendo sentir ainda mais envergonhada por estar deitada ali. — Deseja almoçar agora, senhor? — Ela abriu um largo sorriso ao se dirigir a seu chefe, sem que ele retribuísse. — Sim. Pode servir. Cuidadosamente, ela tirou a comida da caixa térmica organizando os pratos sobre a mesa dele, onde também disponibilizou copos, pratos, talheres e água mineral. — Deseja mais alguma coisa? — Ela me lembrava um cachorrinho adestrado quando se dirigia ao chefe. — Não. Pode ir. — A loira mais bonita e elegante que eu já vi pessoalmente, deixou a sala, não sem antes me lançar um novo olhar, desta vez sem disfarçar a hostilidade. Surpreendendo-me, o Sr. Parker enfiou seus braços entre meu corpo e o couro das poltronas, erguendo-me no ar, carregando-me. — Isso não é necessário. Já posso caminhar sozinha. — Protestei meu rosto pegando fogo de vergonha. — Cuidado nunca é demais. Ele me sentou na cadeira diante da mesa e acomodou-se no seu lugar do outro lado, o aroma da comida me fazendo salivar. Começamos a comer mergulhados no mais absoluto silêncio. O frango com salada de legumes estava uma delícia. Enquanto comia, notei o quanto o Sr. Parker tinha modos sofisticados, certamente estava acostumado a frequentar os melhores restaurantes do país e do mundo. Percebi também que ele estudava cada um dos meus movimentos, obviamente horrorizado com meus modos grotescos, de quem nasceu e cresceu no interior, o que também foi para a minha extensa lista de constrangimentos daquele dia. — O senhor sempre come no escritório? — A pergunta me escapuliu entre uma garfada e outra. — Só quando não tenho tempo de sair. — Acontece com frequência? — Esse interrogatório já faz parte do seu trabalho? Na verdade, eu tinha tantas perguntas a lhe fazer que não sabia por onde começar. Mas saber a respeito de onde fazia suas refeições, com certeza não era minha prioridade, embora tudo sobre ele parecia me interessar ainda mais que antes de conhecê-lo pessoalmente. — Não. Eu só estava tentando puxar assunto. — Falei, sem graça. — Não precisamos conversar sobre o que não está relacionado ao seu trabalho. Porra! Eu podia ter isso dormir sem essa! Apesar da gentileza que estava me fazendo o Sr. Parker não se cansava de ser grosseiro, isso parecia inerente à sua personalidade e podia facilmente ser a razão que levara a primeira esposa dele a cometer suicídio. Mas o que acontecera com as outras? Mais que nunca eu estava interessada em saber e a certeza de que isso aconteceria no dia seguinte, me fez terminar de comer rapidamente, para que o amanhã chegasse mais depressa.

Terminamos a refeição mergulhados naquele silêncio tenso. Antes que eu deixasse o prédio, ele me alertou, mais uma vez, que eu devia manter minha atividade em sigilo. Para todos os efeitos eu seria apenas a nova secretária. Quando saí à rua, eu carregava comigo quatro novas grandes certezas. Primeiro: o Sr. Parker era bipolar, podendo se mostrar um ogro em um momento e um gentleman no instante seguinte; segundo: havia mais mistérios cercando a vida dele que eu pudera supor; terceiro: eu entraria para a história do jornalismo americano com aquela oportunidade única e quarto: eu precisava ser muito cautelosa com o Sr. Parker, pois embora sendo de uma forma indiscutivelmente diferente, ele tinha o poder de me intimidar como apenas uma pessoa conseguira fazer antes e essa pessoa estava morta. Não era o momento de ficar remoendo as lembranças do passado, mas foi inevitável. Enquanto dirigia de volta ao subúrbio da cidade, em direção à lanchonete para pedir demissão, elas voltaram com toda a força, me deixando vulnerável e fragilizada como eu abominava me sentir. O rosto daquele demônio que fizera parte de toda a minha infância voltava nítido em minha mente, o perigo que ele representava todos os malditos acontecimentos. Já se passara muito tempo. Eu precisava esquecer aquilo. Precisava dar fim às malditas lembranças como dera fim nele. Liguei o som do velho Maverick no último volume deixando que a voz de Katy Perry me trouxesse de volta para o presente.

CAPÍTULO II Três dias antes.

Da sacada do apartamento eu encarava a as luzes da cidade à minha frente embora não as enxergasse realmente. Minha mente estava absorta pelas lembranças de um passado nebuloso. A noite estava quente como quando Elizabeth se jogara desta mesma varanda, há quinze anos, tirando sua vida e também minha razão de viver, sem que eu fosse capaz de compreender seus motivos. Mesmo com o passar dos anos, jamais entendi o que a levara a fazer aquilo. Sequer deixara um bilhete suicida. Desde que voltara a adquirir aquele apartamento, há duas semanas, onde eu vivera os únicos anos felizes da minha vida, ao lado dela, a única mulher que fui capaz de amar, vinha tentado fazer o que ela fizera. Todavia, ainda não encontrara forças para pular. Eu sabia que estava preparado para partir, para me livrar da tortuosa solidão que minha vida se tornara, mas ainda assim não encontrava coragem. Não compreendia como Elizabeth conseguira fazer aquilo com tanta facilidade. Ingeri mais um grande gole do meu uísque preferido e observei, pela milésima vez, a rua movimentada lá embaixo. Seria um intervalo de poucos segundos entre eu me atirar e me espatifar no asfalto. Talvez aquela fosse à decisão mais acertada que eu já tomara em minha vida, afinal não havia mais nada que me prendesse a este mundo. Se por um lado eu tinha tudo, por outro, aquele que realmente importava, eu não tinha nada. Todas as pessoas de quem eu me atrevera a gostar, me foram tiradas, de maneiras bruscas, inexplicáveis, sem que eu soubesse quem me odiava a ponto de fazer aquilo. Eu contratara os melhores detetives particulares do país na tentativa de que algum deles conseguisse fazer o trabalho que a polícia não conseguia realizar, mas absolutamente nada fora desvendado realmente. Ninguém conseguira descobrir quem vinha assassinando todas as mulheres com quem eu me envolvia, fossem esposas ou namoradas. Inclusive os casos secretos foram descobertos e as mulheres assassinadas, não me restando outra opção que não desistir. A mais tempo do que eu conseguia me lembrar, não tinha um relacionamento com uma mulher que não fossem as prostituas que contratava às escondidas, sempre uma diferente de cada vez, para não colocar a vida delas em risco também. Mas aquelas garotas não eram capazes de preencher o vazio que se tornara minha existência, pois com elas era apenas sexo, sem qualquer emoção além de tesão momentâneo. Eu gastara muito dinheiro para encobrir todos os assassinatos, impedindo que estes se tornassem de conhecimento público e prejudicasse ainda mais minha imagem. A população sequer ficara sabendo sobre meu envolvimento com algumas das mulheres que foram mortas. O mais próximo que os investigadores chegaram do assassino, fora à certeza que todos eles obtiveram de que se tratava de uma pessoa muito próxima a mim, alguém da minha família, ou do meu restrito círculo de amigos, embora nenhum deles fosse capaz de me apontar exatamente o

culpado. Estava tão desesperado para descobrir quem era o maldito assassino e dar um fim naquilo, que cheguei a procurar pessoas que se diziam ligadas ao mundo espiritual. Cogitando que pudesse ser o espírito de Elizabeth me fazendo pagar pelo motivo que a levara a se matar, sem que eu conhecesse esse motivo. Sabia apenas que eu fora o causador das suas razões, o que me dava quase certeza de que o assassino das minhas outras mulheres era um dos membros da minha família, já que passaram a me odiar depois da morte Elizabeth. Mas quem? Qual deles seria frio e inteligente o suficiente para matar tantas pessoas e passar despercebido aos melhores investigadores? Era difícil saber. Até porque todos eles cortaram relações comigo depois da morte da sua princesinha. Não faziam questão de esconder o quanto me culpavam. Eu era odiado pela minha própria filha, de quem eles cuidavam e que parecia ter aderido à rejeição por parte de todos. Ela me procurava apenas nas raras ocasiões em que precisava pedir mais dinheiro, como se a gorda mesada que eu lhe dava não fosse suficiente. Bebi mais um pouco do uísque quando, subitamente, o toque do telefone arrancou-me dos meus pensamentos. Quem poderia ser uma hora daquelas? Não podia ser alguém da empresa, pois aquela gente me temia o suficiente para ser incapaz de me incomodar a essa hora da noite. Meio tonto pelo efeito da bebida, caminhei vagarosamente até a sala e atendi o aparelho. — Boa noite. Richard é você? A voz do outro lado da linha era masculina e hesitante. Embora me parecesse familiar, não consegui distinguir de quem se tratava. — Eu mesmo. Quem fala? — Indaguei, com a firmeza que já fazia parte do meu tom de voz devido ao hábito de falar apenas com os subordinados. — Sou eu, Anthony. — Ele ficou em silêncio, como se esperasse alguma reação da minha parte e a minha reação foi intensa, um misto de surpresa e confusão explodindo dentro de mim, embora eu nada deixasse transparecer. Há exatamente quinze anos ninguém da minha família me procurava e agora estava recebendo um telefonema do meu irmão. — Tudo bem Anthony? — Indaguei, impedindo que minha voz esboçasse qualquer emoção. — Estou bem e você? — Bem. Seguiu-se outro longo silêncio. Eu tive a impressão de que ele hesitava em me falar o que pretendia. Anthony era apenas um ano mais velho que eu. Estava cursando a faculdade quando Elizabeth morreu e todos cortaram relações comigo. De acordo com os meus investigadores, ele se tornara professor universitário. — Eu sei que já faz muito tempo que não nos falamos, mas ainda assim gostaria de te pedir um favor e é muito importante para mim. A curiosidade queimou dentro de mim, mil possibilidades se passando em minha mente. — Pode falar. — Eu tenho uma aluna que está findando o curso de jornalismo, cujo trabalho final é escrever a biografia de uma figura de grande importância para o país e não sei por qual razão ela

escolheu escrever sobre você. Eu queria te pedir que aceitasse falar com ela. Processei suas palavras e minha mente fervilhou. A primeira coisa que cogitei foi que aquilo se tratava de uma armadilha para me tirar mais uma pessoa. Como há muito tempo eu não me envolvia com uma mulher, ele me mandaria a mais sedutora e irresistível das garotas, afim de que ela me convencesse a perder a cabeça e me apaixonar para depois matá-la. Poderia também ser uma tentativa de me fazer falar sobre minha vida e descobrir o que levara Elizabeth a se atirar do vigésimo andar, para me culpar um pouco mais. Talvez ainda, desconfiasse que as mulheres com quem me envolvi foram assassinadas e quisesse se certificar dos fatos antes de tentar me prejudicar de alguma forma. Mas e se não fosse nada disso? E se ele apenas quisesse ajudar uma estudante? Não, isso era impossível. Anthony nunca fora tão prestativo a não ser que estivesse apaixonado pela garota. Enfim, apesar de todo o perigo que isso representava, não deixava de ser um desafio, ou uma forma de me reaproximar da minha família. Sem mencionar que seria útil deixar minha biografia completa antes de pular da sacada. Revelar toda a verdade que me cercava para que todos soubessem que eu não era o assassino que muitos acreditavam e que não tive culpa pelo que acontecera a Elizabeth, pelo menos não que eu soubesse. Seria a única forma possível de todos conhecerem minha realidade, minha tortuosa solidão, como me sentia em relação ao desprezo que recebia da única família que tive. Afinal, depois de morto eu não poderia ver a piedade que todos sentiriam por mim. Isso era simplesmente perfeito, a oportunidade ideal de todos conhecerem a verdade sobre Richard Parker. Se fosse uma armadilha eu saberia me livrar. — Você ainda está aí? — A voz de Anthony partiu do outro lado da linha. — Sim. Eu estava pensando. — E o que decidiu? — Pode enviar sua aluna. Será útil a existência de uma biografia minha. Eu não queria que ele entendesse minha última frase. — Obrigada. Ela se chama Dakota Thompson. Que dia e hora ela pode ir te procurar? — Na segunda. Nove horas. No meu escritório. — Então fica combinado. — Ele fez uma pausa. — Richard, não se esqueça de que ela é muito especial para mim. O que ele queria dizer com isso? Me despertar um possível senso de competição? Proteger a garota? Era impossível saber. — Eu não me esquecerei. — Então obrigada mais uma vez. Fico te devendo essa. Adeus. — Adeus. E encerramos a ligação. Enchi meu corpo com mais uísque, movendo-me mecanicamente, minha mente absorta pelos pensamentos, analisando cada palavra daquela conversa, tentando adivinhar quais eram as verdadeiras intenções do meu irmão. Eu não podia acreditar que ele enviaria uma garota a quem dizia ser especial, à toca do leão, aos poderes do homem que considerava o destruidor da vida da inocente Elizabeth. Havia algo por trás disso e eu iria descobrir. Se tratasse de uma armadilha, para me fazer gostar e perder mais uma vez, eu não lhe daria tempo de concluir o seu plano, estaria morto

muito antes disso. Bebi um grande gole do uísque que escorregava suave pela minha garganta seca e voltei à sacada, concluindo que meu grande salto precisaria esperar até que a aluna do meu irmão terminasse de escrever minha biografia. Encontrar forças para falar sobre tudo com uma estranha, seria o meu primeiro desafio. O primeiro passo seria descobrir quem era ela. Pensando nisso, tirei o celular do bolso da calça de moletom e procurei o número de James entre os contatos. Ele atendeu no segundo toque. James era um dos detetives particulares que já trabalhara para mim, um dos mais competentes entre tantos. Nunca descobrira o que eu realmente queria saber, mas era ágil e competente em obter informações sobre pessoas. — Olá Sr. Parker. — Ele era formal como devia ser. — Olá James. Preciso dos seus serviços para descobrir quem é uma pessoa. — Estou à sua disposição. — Considerando o preço que eu lhe pagava, ele estaria. — É uma aluna da Universidade Pública de Houston. O nome é Dakota Thompson e está terminando o curso de jornalismo. Isso é tudo o que eu sei. — Não será um trabalho difícil. Amanhã mesmo entro em contato com as informações. — Estou esperando. Sem mais, encerramos a ligação. Guardei o celular de volta no bolso ao passo em que uma lufada de vento frio me atingia, causando-me arrepios. Apesar do calor que fizera durante todo o dia seria uma noite fria. Mais uma que eu dormiria sozinho. Esvaziei o copo com um grande gole e projetei mais uma vez em minha mente o momento em que Elizabeth se jogara daquela sacada, o quanto devia estar desesperada, sem que eu jamais tenha compreendido a razão ou minha parcela de culpa nela. Eu estava no trabalho quando tudo aconteceu. Quando me ligaram do hospital ela já estava morta. Sem conseguir afastar os pensamentos, vaguei pelo apartamento, que tinha menos da metade do tamanho daquele em que eu morava há duas semanas, já que ainda estava no começo da minha vida na época em que o comprara, pouco tempo depois do meu casamento. Deitei-me na cama e como vinha acontecendo todas as noites, eu rolei de um lado para o outro durante um longo tempo antes de conseguir pegar no sono. O sábado amanheceu frio e cinzento como não era comum durante o mês de julho em Houston. Dispensei o convite de um dos nossos importadores para um almoço beneficente preferindo me concentrar no trabalho, pois assim ocuparia mais eficientemente minha mente. Trabalhei na companhia até meio dia, analisando documentos, estudando novas propostas e dei continuidade ao trabalho em casa durante a tarde. Era quase noite quando o recepcionista do prédio interfonou em busca de uma autorização para a entrada de James e minutos depois o detetive muito alto e magro, de olhos perspicazes, estava adentrando meu apartamento com um grosso envelope marrom em uma das mãos. — E então? Muitas descobertas escabrosas? — Indaguei, gesticulando para que ele se acomodasse em um dos sofás, meus instintos, ou talvez apenas meu pessimismo, me alertando de que não havia coisa boa naquele envelope. — Quase não consigo encontrar as informações, cara. A garota é um enigma. — Ele entregou-me o

envelope. — Dá uma olhada e tira suas conclusões. Está tudo aí. Curioso, abri o envelope e uma fotografia colorida caiu sobre minhas pernas. Era de uma garota ruiva, muito jovem, meio descabelada. Sua pele era delicada, o rosto parecia esculpido à mão. Os grandes olhos azuis completavam sua beleza enigmática. Tinha um amplo sorriso e seu jeito de olhar me deixava meio intrigado. Apesar de parecer uma adolescente que perdera a escova de cabelos, ela era indiscutivelmente atraente, portanto a possibilidade de que meu irmão a estava manipulando a me conquistar para depois eliminá-la, como hipoteticamente fizera com todas as outras, não podia ser descartada. Ele certamente contratara investigadores, com eu fizera. Sabia que eu vivia mergulhado na solidão e um homem solitário podia ser seduzido muito facilmente. Entretanto, quando comecei a ler o relatório que James redigira, imediatamente descartei a possibilidade de que aquela garota estava sendo manipulada. Ela não era o que parecia. Fiquei quase chocado, pelo que li ao seu respeito, por tudo o que ela passara e principalmente pelo que fizera. Ao final do longo relatório, olhei mais uma vez para sua foto, tentando compreender como uma criatura de aparência quase angelical podia possuir pecados íntimos tão graves. Eu precisava tomar cuidado dobrado com ela, pois podia estar armando contra mim junto com meu irmão. De acordo com as informações, não havia nenhuma relação entre eles que não de aluno e professor, contudo, se houvesse e isso passara despercebido a James, significava que o perigo era ainda maior. Por outro lado, eu não precisava me preocupar tanto com isso, afinal eu escolhera seguir o caminho que Elizabeth seguira há muitos anos e estaria morto antes que Anthony tivesse tempo de concluir qualquer plano que pudesse ter elaborado contra mim. Se é que esse plano realmente existia. Na segunda-feira, no horário combinado, Lindsay me ligou para informar sobre a chegada da Srta. Thompson à empresa. Era hora de dar início ao meu plano. Eu a deixaria esperando durante horas, se ela desistisse teria certeza de que não passava de uma estudante em busca de um furo de reportagem. Afinal havia muitas pessoas merecedoras de uma biografia em Houston, eu não era tão importante para que ela esperasse por tanto tempo. Todavia, ela não desistiu. Era quase meio-dia quando ordenei a Lindsay que a deixasse entrar. Pessoalmente a Srta. Thompson era ainda mais bonita que na fotografia. Embora tivesse vinte e dois anos de idade, parecia ser muito mais jovem, me lembrava uma adolescente. Tinha a pele rosada, translúcida, o rosto bem desenhado, a boca ampla e perfeita, o nariz afilado e grandes olhos azuis claros. Seus cabelos vermelhos, desorganizados, emprestavam-lhe um charme todo especial. Parecia um anjo com sua aparência frágil e delicada. Se eu não conhecesse seu passado juraria que era a mais inocente das criaturas. Seu rosto estava vermelho, seus olhos fixos em mim. Estava tendo a reação que eu costumava ver nas mulheres quando me conheciam, mas diferentemente das outras, ela não jogava seu charme para mim, pelo contrário, parecia tentar esconder seu interesse. Quando desliguei o telefone na cara de Edward, o incompetente chefe do departamento de recursos humanos, instintivamente, meus olhos desceram pelo corpo dela. Suas roupas eram toscas, mas não foi isso que chamou minha atenção e sim as curvas perfeitas dos seus peitos pequenos, acentuadas pela blusinha de tecido fino marrom com um decote generoso e enfeitado. As pernas longas e firmes eram realçadas pelo jeans colado e surrado. Se meu irmão a estava usando para me seduzir, definitivamente escolhera a pessoa certa. Ela não

era uma mulher exuberante, sequer usava maquiagem, saltos altos, roupas sensuais, ou mesmo penteava os cabelos decentemente, porém, apesar da sua intrigante simplicidade, conseguia ser tão atraente que não contive uma ereção. Merda! Era isso que eu temia. Precisava manter a prudência e não me deixar levar pela minha libido. — Vai se sentar ou pretende ficar aí em pé o dia inteiro? — Não consegui e nem fiz questão de disfarçar minha irritação, por ela ter o atrevimento de despertar aquela reação em mim, como certamente meu irmão planejara. Ela ficou ainda mais vermelha, antes de sentar-se, ao passo em que minha ereção se tornava mais firme, a ponto de me fazer sentir dor. Eu precisava me livrar daquela menina. Não conseguiria conviver vários dias com esse desejo e não poder tocá-la, pois tinha consciência do perigo que isso representava principalmente para ela, se as coisas realmente fossem como eu imaginava. Ela tentou falar educadamente comigo, eu não dei ouvidos, estava furioso com a situação, pelo fato de me sentir derrotado por uma garota que era quase uma criança e descontei minha raiva nela. Depois de receber algumas ofensas ela mostrou que fazia jus ao passado que tinha e explodiu, revidando minha grosseria, desistindo do que viera buscar. Quando me deu as costas, pronta para ir embora, um turbilhão de pensamentos invadiu-me a mente. As suposições surgindo em massa. E se Anthony fosse inocente? E se tudo isso fosse fruto da minha imaginação e não houvesse armação alguma, mas apenas uma estudante tentando se dar bem na vida e meu irmão me oferecendo a chance de uma reconciliação? — Pare aí mesmo! — Esbravejei, seguindo a um impulso. Ela parou sem hesitar, sua obediência me agradando. Seguindo a mais um comando meu, voltou a sentar-se diante de mim, quando então decidi que a deixaria escrever a história da minha vida, definitivamente. Não apenas porque Anthony me pedira, mas pela ambição em deixar minha trajetória gravada antes de partir, não importando os conflitos que teria que enfrentar durante esse processo. Por fim, cheguei a um consenso com a garota e quando eu pensei que ela não conseguiria mais me surpreender naquele dia, ela subitamente desmaiou, ali diante de mim e o que restava da minha resistência foi por água a abaixo. Quando dei por mim já estava com ela entre meus braços, aflito pelo que lhe acontecia, o que piorou logo que descobri que tinha minha parcela de culpa pelo seu mal-estar, por tê-la deixado esperando durante tantas horas de estômago vazio. Droga! Talvez eu merecesse todos os acontecimentos da minha vida. Eu não permitiria que ela saísse dali no estado em que se encontrava, correndo o risco de desmaiar novamente, desta vez em meio a pessoas perigosas e estranhas. Então, como estava na hora do almoço, pedi a refeição para nós dois e, mais tarde, quando aquela menina, que era apenas cinco anos mais velha que minha filha, deixou minha sala, continuei pensando nela, durante todo o dia. Perguntei-me se a tinha ajudado com a intenção de amenizar minha culpa, mas a resposta não era essa. A verdade era que eu restava verdadeiramente preocupado com seu bem-estar e naquele instante constatei que pela primeira vez em minha existência eu me preocupava realmente com alguém e isso era espantoso. Durante o transcorrer da tarde, eu não consegui mais afastar a Srta. Thompson do meu pensamento. A todo o momento minha mente projetava a curva dos seus seios firmes e pequenos, sua fragilidade irresistível, sua pele aveludada. Ah, o que eu não daria para tocar aquela pele!

Lindsay se mostrou insatisfeita quando uma mesa para a Srta. Thompson foi colocada na sala que ela ocupava, obviamente não por ter que dividir seu trabalho e sim a minha atenção. Cinco anos já se passaram desde que ela viera trabalhar para mim e ainda não se cansara de tentar se tornar a nova Sra. Parker. Há alguns anos, em uma noite em que eu me sentia dolorosamente solitário, acabei cedendo às suas investidas, mas não deixei que acontecesse de novo, para não colocá-la em perigo. Ela devia me agradecer e não ficar emburrada cada vez que eu demonstrava meu desinteresse. À noite, quando me encontrei novamente sozinho em meu apartamento, entrei em um dos sites onde costumava contratar as garotas de programas. Eu não tinha preferência por biótipo, bastava que fosse uma mulher bonita. Mas esta noite em especial eu procurei por uma que fosse ruiva e bastante jovem, para que pudesse imaginar que estava fodendo a Srta. Thompson.

CAPÍTULO III Eu estava simplesmente esgotada quando cheguei em casa aquela tarde, não apenas pela guerra de nervos que o Sr. Parker travara contra mim, mas pela dificuldade em conseguir demissão da lanchonete. Eu trabalhava lá há exatos quatro anos, desde que ingressara na faculdade e Ronald, o proprietário, simplesmente se recusava a me dar as contas, argumentando que eu devia tê-lo avisado com antecedência, quando na verdade eu sabia que o que ele não queria era abrir mão de uma funcionária que trabalhava muito e exigia pouco. Surpreendi-me ao encontrar Tom no apartamento, já que ele estudava à tarde, enquanto que eu e Trinity estudávamos e trabalhávamos no mesmo horário. — O que foi? Por que não está na faculdade? — Perguntei, deixando-me afundar no sofá ao lado dele, diante da televisão onde era exibido um filme musical. — To deprimido. O Taylor foi jantar ontem com aquela vadia da Kristen. Taylor era o cara que com quem ele tinha um caso complicado. Taylor ainda não assumira sua homossexualidade e de vez em quando saía com garotas para não despertar a desconfiança dos seus pais. Tomei o pacote de batatas Ruffles da sua mão e enchi minha boca com o salgadinho. — Se você for ficar deprimido toda vez que ele fingir que gosta de mulher, é melhor se internar logo numa clínica para maníacos depressivos. — Credo como você é cruel. Não precisa tripudiar da minha dor. — Ele tomou as batatinhas de volta, fingindo estar emburrado. — E como foi lá com o milionário? Projetei a imagem do Sr. Parker em minha mente e uma corrente de calor se manifestou em meu sangue. A personalidade bipolar dele se tornava insignificante diante do seu charme irresistível, daqueles olhos castanhos que pareciam enxergar minha alma. — Vou trabalhar lá disfarçada de secretária. — Respondi animada. — Não é maravilhoso? Ainda nem me formei e já estou trabalhando disfarçada. Tom fitou-me com uma expressão de incredulidade cuja razão eu só compreendi quando ele falou: — E você pretende trabalhar em uma das maiores companhias do país, vestida assim?! — Assim como? — Examinei minhas roupas procurando que havia de errado com elas. — Tive uma ideia. — Ele me encarou com uma expectativa que não me agradou nem um pouco. — Vamos às compras. Vou fazer de você uma verdadeira executiva. Sem esperar respostas, ele levantou-se, segurou-me pela mão e saiu me puxando na direção do meu quarto. — Espera aí Tom. Eu não posso fazer isso. Não posso gastar dinheiro sem necessidade. Além do mais não vejo nada de errado na forma como me visto. — Você não vai gastar nada criatura. Se há uma coisa de boa que meus pais não me deixam faltar são os cartões de crédito. Ainda assim eu não queria aquilo, pois odiava fazer compras. — Deixa para outro dia. Não to afim.

Ele virou-se para me fitar, com tristeza no olhar. — Eu to arrasado. Fazer uma obra de arte em você vai ajudar a me animar. Então era isso: ele queria me usar como cobaia para distrair seus pensamentos de Taylor e se eu recusasse seria a megera da história. — Ok, você venceu. Mas não vou gastar nem um centavo e nem ficar enfeitada como uma perua. Ele abriu um amplo sorriso, como se sua depressão subitamente tivesse desaparecido. — Deixa tudo comigo. Você não vai se arrepender. Eu tenho um excelente gosto para moda, o que não é o seu caso. Tomei um banho rápido, vesti um vestidinho de malha curto e folgado, pendurei minha bolsa em volta do torso e saí com James na sua Land Rover, o ar condicionado dentro do veículo nos poupando do calor insuportável. Passamos à tarde em um dos maiores shoppings do centro da cidade. Tom me fez entrar em cada loja de roupa cara e sofisticada que encontrava e comprou tudo o que julgou que ficava bem em mim. Quando já não conseguíamos carregar as sacolas de compras, ele me obrigou a entrar em um salão de cabeleireiro, sem que eu entendesse porque razão precisava de um. O dono do salão era amigo de Tom e ambos concordaram que eu precisava de uma reforma. Foram horas de tortura, várias mãos trabalhando em mim ao mesmo tempo, arrancando minhas sobrancelhas, fazendo minhas unhas, escovando meus cabelos. Quando terminaram olhei meu reflexo no espelho e quase não me reconheci. Meus cabelos estavam lisos e pareciam mais longos. Meu rosto parecia mais saudável por causa da maquiagem e das sobrancelhas bem desenhadas. Era quase noite quando deixamos o salão. Eu estava exausta e concordamos em parar na praça de alimentação para um lanche. Estávamos fazendo os pedidos quando meu celular tocou. Era o professor Anthony. — Olá professor. — Atendi tentando parecer mais animada que realmente estava. — Olá Dakota. Estou incomodando? — De jeito nenhum. — Bem... Considerando que estamos no final de disciplina e em breve eu não vou ser mais seu professor, eu queria te convidar pra... Jantar. O que você acha? — Ele parecia hesitante como um garoto tímido. Na verdade, eu já estava esperando por esse convite dele, achava inclusive que ele tinha demorado a fazê-lo, pois desde que iniciara a disciplina, há cinco meses, vinha demonstrando interesse por mim. E embora eu não tivesse ninguém há muito tempo, por priorizar os estudos, não tinha certeza se queria me envolver ainda. — Não vou poder. Meu amigo Tom me arrastou para uma tarde de compras. Estou exausta. — Amanhã então? Tom compreendeu a conversa e começou a gesticular, escandalosamente, para que eu aceitasse o convite. Mas eu nunca fora uma pessoa influenciável. Pensava na melhor maneira de recusar, quando o professor completou: — Acho que seria interessante se eu te acompanhasse durante a realização do seu trabalho final. Entendi a jogada dele. Estava disposto a me favorecer, em detrimento do trabalho dos demais alunos, em troca da minha atenção. Pois bem, se ele queria jogar eu toparia, se saísse perdendo ainda assim estaria no lucro, já que ele não era nem um pouco de se jogar fora.

— Nesse caso, pode ser amanhã. A que horas você me pega? — Oito está bom? — Sim. — Até amanhã estão. E encerramos a ligação. Tom começou a bater palmas, como se aplaudisse o episódio que acabara de assistir. — Poxa! Finalmente você vai tirar as teias de aranha que já devem ter se formado aí embaixo. Minha vida sexual era algo tão complicado, devido aos traumas adquiridos durante os acontecimentos do passado, que nunca me senti à vontade para falar sobre ela, nem mesmo com amigos tão íntimos como Tom e Trinity. A brincadeira maldosa dele serviu apenas para me deixar chateada. Meu último namorado tinha sido Jacob, um adolescente com quem eu costumava ficar quando estava no reformatório. Depois que cheguei em Houston apenas um garoto atraiu a minha atenção, Noah, um cara da faculdade com quem saí algumas vezes. Quando percebi que Trinity também estava interessada, decidi que seria melhor para todos que eles ficassem juntos, pois assim eu poderia me dedicar cem por cento ao curso. Minha decisão de deixá-lo tinha sido tão acertada que mais de quatro anos depois, eles ainda estavam juntos, embora Noah ainda insistisse em fazer um climinha quando estava com Trinity na minha presença, recusando-se a tocá-la, como se não passasse pela cabeça dele que isso não me importava nem um pouco. Quando chegamos de volta ao apartamento, Trinity ficou louca com a quantidade de coisas que Tom me comprara. Não o deixou sossegado enquanto não o fez prometer que a levaria às compras também. Do dia seguinte, como precisaria chegar ao meu novo trabalho mais cedo, despertei quase de madrugada. Tomei um banho demorado, vesti um macacão branco com decote quadrado e comportado, que se colava ao meu corpo até a cintura, ressaltando minha silhueta e partia mais folgado nas pernas. Tom me garantira que era totalmente sofisticado, embora eu me sentisse um travesti usando aquilo. Calcei as sandálias novas de saltos altos, arrumei os cabelos que o amigo de Tom conseguira deixar milagrosamente lisos e comportados, fiz uma maquiagem discreta e completei o visual com a bolsinha minúscula também nova, que custara o equivalente a um mês do meu salário na lanchonete. Não havia muito a fazer antes de sair, pois organizara antecipadamente todo o extenso roteiro de perguntas que faria ao Sr. Parker, deixando espaço para as indagações que obviamente surgiriam à medida que ele narrasse sua história. Estava tudo no meu notebook. Desta vez fui mais cuidadosa e comi um pouco de cereal com leite antes de sair, com cuidado para não fazer barulho e acordar Tom que dormia no sofá da sala. Cheguei à Thrive Oil Company no horário certo. Encontrei o andar térreo do prédio quase completamente deserto, bem diferente do dia anterior, quando estava fervilhando de gente. Nem mesmo a recepcionista estava lá e deduzi que isso se devia ao horário. Havia um segurança uniformizado parado diante da porta, a quem me apresentei e de quem obtive autorização para subir. Desta vez fui à única ocupante do elevador até chegar ao último andar, que também estava deserto. Percebi que havia uma mesa a mais na sala que Lindsay ocupava, com computador, algumas pastas e uma planta de plástico, certamente colocada ali para mim. Tomei a liberdade de explorar minha nova aquisição, o que durou pouco, pois logo o elevador se abriu e a

secretária entrou, com sua beleza e elegância estonteantes e sua cara emburrada de quando não se dirigia ao chefe. — Bom dia. Como o Sr. Parker me recomendou estou aqui para te apresentar a empresa. Começaremos com os andares mais baixos e subimos. — Ela falava mecanicamente, como um robô programado, seu rosto desprovido de qualquer emoção. Assenti com um gesto de cabeça e a segui pelo prédio. Conheci vários setores, alguns inclusive que eu sequer cogitava existir em uma empresa e tudo me parecia muito desinteressante. Administração definitivamente estava longe de ser a área em que eu almejava atuar. A aventura do jornalismo parecia estar no meu sangue. A sede por novas descobertas, por escrever para o mundo, sempre me acompanhava. Quando chegamos ao andar anterior ao nosso, o expediente já havia iniciado, portanto tive a oportunidade de conhecer dois dos demais acionistas da Thrive. Eram eles David Smith, segundo Lindsay, amigo de Parker desde a faculdade, quem o ajudou no início de tudo. Ele tinha mais ou menos a mesma idade que Parker, embora não fosse tão conservado. Tinha cabelos loiros, olhos azuis escondidos atrás das lentes grossas dos óculos e um físico esguio. Precisava me lembrar de investigá-lo mais tarde, pois nos romances policiais o culpado pelos crimes era sempre o melhor amigo do suspeito. A outra acionista era Melanie Walker, uma mulher de cabelos curtos, pretos, com cerca de quarenta anos, muito simpática. Essa também ajudou a fundar a empresa, embora não fosse amiga de Parker antes disso, o que não me impediria de investigá-la também. Após o demorado tour, retornamos a nossa sala, quando então Lindsay me deu instruções sobre como a máquina de Xerox funcionava, e como o Sr. Parker gostava do seu café, como se minha função ali fosse resumir-se somente a isso. Eu já tinha conseguido me livrar dela, estava sentada atrás da minha mesa, navegando pelos sites de notícias, quando o elevador se abriu e o Sr. Parker entrou. Era a visão mais gloriosa que eu já tivera hoje. Alto, elegante no seu terno cinza feito sob medida e a gravata da mesma cor sobre a camisa branca. Seus cabelos curtos, impregnados de gel, estavam jogados para cima, numa bagunça organizada, tinha a barba bem-feita, o rosto másculo e a pele saudável ligeiramente bronzeada. Possuía um magnetismo tão irresistível que irradiava por todo o ambiente. Seus olhos castanhos encontraram os meus e quase parei de respirar, por causa da intensidade do seu olhar. O tempo parecia ter parado enquanto nos encarávamos, até que ele finalmente desviou o olhar. — Srta. Thompson. Na minha sala. Imediatamente. — Ele disse, ignorando a saudação de Lindsay, sua voz ao mesmo tempo máscula e áspera. Sem esperar resposta, adentrou sua sala. Mais que depressa, peguei meu notebook e entrei atrás dele. Enquanto o observava tomando seu lugar atrás da sua mesa, respirei fundo, várias vezes, tentando acalmar o calor que passeava pelo corpo, para que ele não percebesse o quanto me atingia e me achasse patética. Ao virar-se de frente ele estudou atentamente meu corpo e meu rosto, com expressão neutra, me fazendo corar sem que eu pudesse evitar. — Sente-se. — Gesticulou para a cadeira do outro lado, autoritário, para em seguira tirar um documento da sua valise. — Preciso que você assine isso. É um documento exigindo confidencialidade a respeito do que faremos aqui. — Sua frase me pareceu ter um sentido dúbio e uma nova corrente de calor se alastrou dentro de mim, me fazendo corar intensamente. Eu não compreendia o poder que aquele homem tinha de me afetar. Jamais antes me sentira assim por causa

do sexo oposto. Sempre fui bastante controlada, a ponto de conduzir com sabedoria todos os meus relacionamentos afetivos. Mas o Sr. Parker, definitivamente, conseguia me deixar fora de controle, com apenas um olhar. Esperava que ele não percebesse isso, pois certamente zombaria de mim. — Absolutamente ninguém, nem mesmo Lindsay pode saber que você está escrevendo minha biografia. O tom de gravidade em sua voz deixou-me em alerta. Tentei imaginar as razões de tal exigência, mas era difícil saber, pois as possibilidades eram inúmeras e descobrir era minha função. — Sem problemas. — Deslizei para mim o documento que ele abandonara sobre a mesa e li resumidamente antes de assinar. Ansiosa para começar a ouvir sua história, abri meu computador, buscando a pastas onde estavam as perguntas. — Então, podemos começar? Ele fitou-me com espanto. — Você está pensando que não tenho o que fazer? — Seu tom de voz era tão abrupto que me assustou. O que havia de errado com ele? Que porra de mau humor constante era aquele? — Bem, eu pensei que... — Pensou errado! — Me interrompeu sem economizar na rispidez. — Conversaremos quando eu estiver desocupado, se chegar a desocupar em algum momento. Agora pode ir. Se eu encontrar tempo te chamo. Senti a raiva pipocar em minhas veias, não apenas pela sua insuportável arrogância, mas por menosprezar algo que me era tão importante quanto aquele trabalho. Talvez ele estivesse me enrolando, talvez não pretendesse falar sobre si mesmo. Concordara em me receber apenas para não negar o pedido do professor. — Sr. Parker, se o senhor não pretende me deixar escrever sua biografia, por favor, seja sincero comigo e me deixe livre para procurar outra pessoa antes que seja tarde. Ele me fuzilou com olhos mortais, como se quisesse me queimar viva. Embora eu não fosse uma pessoa que me intimidava com facilidade, encolhi-me trêmula na cadeira, arrependida por tê-lo desafiado. O Sr. Parker não era poderoso apenas nos negócios, mas também em lidar com pessoas. Tinha o poder de intimidar facilmente. Aquele era seu jeito de ser, o tratamento hostil não era atribuído apenas a mim, por isso tinha pena dos seus subordinados. — Srta. Thompson, se eu não quisesse que você escrevesse minha biografia, acredite você não estaria aqui. Eu não preciso e nem tenho motivos para enrolar ninguém, sou homem suficiente para dizer não quando necessário. Agora me deixe em paz para que eu possa trabalhar. Desviando sua atenção de mim, ele levou o telefone ao ouvido e esbravejou um punhado de ordens a Lindsay. Puta da vida levantei e deixei a sala, pensando seriamente em desistir daquele troglodita, porém, se todos os seus funcionários o suportavam, eu deveria me esforçar para fazer o mesmo. Certamente ele era um homem muito amargo e solitário para tratar as pessoas à sua volta daquela forma. Ou talvez essa grosseria fizesse parte da sua personalidade, o que explicava o suicídio da sua primeira esposa. Talvez as outras tivessem suicidado também, apenas para se livrarem dele. Eu precisava saber o que acontecera com aquelas mulheres e dependia daquele imbecil para obter as respostas. Puta que pariu, por que tudo tinha que ser tão difícil? Lindsay pareceu satisfeita ao me ver deixar a sala de Parker vermelha de raiva e não economizou no rebolado ao ir atender as ordens dele. Durante toda a manhã não fiz mais nada que não xerocar documentos e navegar na internet, sob a

observação atenta de Lindsay que não fazia questão de esconder sua hostilidade. Ao meio-dia fiz uma refeição solitária em um pequeno restaurante a dois quarteirões dali. No meio da tarde, finalmente o todo poderoso ligou-me, ordenando que entrasse.

CAPÍTULO IV

Peguei meu computador e respirei fundo, para manter a calma e evitar que a arrogância dele me intimidasse ou me atingisse de qualquer outra forma. Encontrei-o sentado em uma das poltronas, com uma perna cruzada sobre a outra, parecendo mais à vontade que de manhã e ao mesmo tempo triste, quieto, como se algo o incomodasse. Tinha um copo de uísque na mão e o nó da sua gravata estava frouxo. Sentei-me, lentamente, na poltrona diante dele e abri meu computador, esperando pelo seu comando para começar a fazer as perguntas. Os olhos dele passearam pelo meu rosto e meu corpo, minuciosamente, estudando cada detalhe em mim, sem sequer disfarçar. Vi o fogo da luxúria reluzindo em seus olhos castanhos, quando encontrou os meus e senti meu sangue ferver nas veias, tão lascivamente que minha face queimou, certamente corando e denunciando-me. Puta merda! Quando não era sua arrogância, era seu charme que me deixava sem chão! De todos os homens que eu conheci logo esse troglodita conseguiu me atingir. Eu realmente tinha um ímã para problemas. — Então, por onde quer começar? — Ele perguntou, a voz calma desta vez, embora não chegasse a ser gentil. — Pelo começo. Fale-me sobre sua infância. Os lábios dele se curvaram num largo sorriso, revelando dentes brancos e perfeitos. Afinal o Sr. Parker sabia sorrir, que surpresa! Mas infelizmente era um sorriso de ironia. Porém, um sorriso irônico era melhor que sua carranca de sempre. — Estou aqui me perguntando se minha vida não vai dar um nó na sua cabeça. — Não me subestime Sr. Parker. Sou mais forte do que pareço. Ele ficou sério, seus olhos expressando algo indecifrável. Tive a impressão de que estava me analisando. — Eu nasci em Sugar Land. Fui encontrado em uma lixeira por um mendigo quando ainda era recém-nascido. Me levaram ao hospital, depois a uma casa de adoção. Os Parker me adotaram quando eu tinha um ano de idade. Caramba! Ele era adotado! Ninguém no mundo da notícia tinha essa informação. Meu furo como repórter seria ainda mais espetacular do que eu esperava. Em breve eu seria uma das jornalistas mais famosas do país. Puta merda! Puta merda! — Na época eles tinham três filhos, Peter, Jonathan e Anthony, todos mais velhos que eu. Minha mãe adotiva, Alice, sonhava em ter uma menina. O sonho dela se realizou quando eu tinha dois anos de idade e Elizabeth nasceu. O quê?! Ele estava falando de Elizabeth a sua esposa suicida? Caramba! Eu estava atônita com estas informações. Havia mais nessa história que qualquer mortal podia supor. — Você não vai escrever isso? — Ele perguntou sua fisionomia carregada.

— Ah, não. Quer dizer... Eu faço algumas anotações, mas a história completa guardo na memória até chegar em casa e redigir tudo. — Hesitei antes de perguntar. — A Elizabeth que nasceu, era sua primeira esposa? Aquele brilho misterioso, indecifrável, estava de volta ao seu olhar. Eu daria um rim para saber o que se passava pela cabeça dele quando fazia aquele olhar. — Sim, ela mesmo. — Ele ingeriu um grande gole de uísque. — Nós crescemos juntos. Frequentamos as mesmas escolas, brincamos nos mesmos parques e comemos a mesma comida. Apenas o carinho dos nossos pais era diferente entre nós. Eles a veneravam por ser a única menina da família. Tudo o que ela queria, eles lhe davam. Quanto a mim fiquei ainda mais desprezado depois do nascimento dela. Mas não me sentia mal com isso. Tudo o que me importava era ter uma família unida como aquela e principalmente ter o amor de Elizabeth. — Ele bebeu outro grande gole do uísque antes de continuar. — Ela me venerava como era adorada pelos nossos pais. Nunca olhou para outro garoto. Começamos a namorar quando ainda éramos crianças. Quando nossos pais descobriram ficaram furiosos, porque a princesinha deles estava se envolvendo com um suburbano de origem desconhecida como eu, porque ela amava mais a mim que a eles. Fizeram de tudo para nos separar, mas não conseguiram. Quando fui aceito na Universidade Estadual de Houston ela ainda não tinha terminado o segundo grau e eu a fiz escolher entre largar tudo e vir comigo ou ficar com sua família e terminar os estudos. Ela nem pensou duas vezes e deixou tudo para trás. Foi então que todos passaram a me odiar, tanto meus pais quanto meus irmãos. Achavam que eu estava destruindo a vida dela. Que a princesinha deles merecia algo melhor que eu. Enquanto fazia faculdade, eu trabalhava em uma empresa petrolífera para pagar o aluguel de um apartamento no subúrbio, onde morávamos. Trabalhava durante o dia e estudava a noite. Tentei convencer Elizabeth a fazer o mesmo e terminar os estudos, mas ela não era tão forte, conseguia apenas trabalhar, para ajudar nas despesas e sempre se sentia cansada demais para ir às aulas. Dois anos depois ela engravidou de Hillary e logo parou de trabalhar para cuidar da criança. Quando terminei a faculdade, já tinha um cargo bastante elevado na empresa, em pouco tempo abri a minha própria companhia e comecei a prosperar. Mas o trabalho exigia muito de mim e Elizabeth começou a se sentir sozinha. Subitamente, ele se calou, seus olhos fixos no vazio a sua frente, expressando tamanha angústia que senti vontade sentar ao seu lado, acariciar seus cabelos com carinho e garantir-lhe que tudo ficaria bem. Sua dor parecia tão grande e insuportável que eu não conseguia pensar em mais nada que não em amenizá-la com um abraço afetuoso. Precisei de um esforço inumano para permanecer em meu lugar, pois não tinha esse tipo de intimidade com ele, embora quisesse muito. Seguiu-se um longo momento em que o silêncio preenchia todo o ambiente, até que por fim meu profissionalismo falou mais alto que meus sentimentos e indaguei: — Foi por isso que ela suicidou? Por se sentir sozinha? O Sr. Parker ergueu seus olhos para me encarar, parecendo surpreso, como se tivesse se esquecido da minha presença ali. — Eu não sei. — A amargura estava evidente tanto na sua voz quanto no seu olhar. Ele se levantou, foi até o pequeno frigobar no canto da sala e reabasteceu seu copo com uísque. Era perceptível o quanto seu passado ainda o afetava e eu não sabia se fazê-lo falar o ajudaria a desabafar ou o prejudicaria ainda mais. Contudo, minha vontade de saber a verdade era maior que minha disposição em ajudar. — O senhor precisa me falar a verdade. Que motivo levou Elizabeth a cometer o suicídio?

Ainda em pé, perto do frigobar, ele cravou seus olhos ferozes em mim. — Está insinuando que a culpa foi minha? Sua pergunta tinha tom de acusação, sua voz áspera como quase sempre. — Uma mulher apaixonada a ponto de deixar tudo por um homem e com uma filha pequena não tiraria a própria vida sem uma razão muito forte. Me arrependi por ter pronunciado as palavras no instante em que fechei a boca. O Sr. Parker parecia ter saído de si. Como se estivesse dominado por uma fúria descontrolada, atirou o copo na parede, estilhaçando-o, os cacos de vidro voando para todos os lados, depois cravou seus olhos mortais em meu rosto, numa ameaça silenciosa de que me atacaria a qualquer momento. Nesse instante, tive quase certeza de que ele era capaz de matar e poderia facilmente ser o assassino das suas mulheres. Em pânico, coloquei-me em pé, deixando meu computador se espatifar no chão e corri para a porta, todavia ele foi mais rápido e tomou-me o caminho, segurando-me pelos dois braços para me deter, suas mãos me apertando com tanta força que quase gritei de dor. — Você está me acusando?! Também acha que matei Elizabeth?! — Seus olhos faiscavam em uma fúria selvagem, ameaçadoramente. — Se acha que sou um assassino porque se ariscou a ficar aqui sozinha comigo? Não passou pela sua cabeça que posso acabar com a sua vida também? Meu coração batia acelerado de medo, minhas pernas tremiam. Se eu ainda tinha alguma dúvida de que ele matara suas três esposas esta acabava de se dissipar. O cara tinha o olhar de um assassino. Parecia um louco, com a fisionomia contraída, o cabelo despenteado, a pele suada. “Caramba! Onde fui me meter! Devia ter ouvido os conselhos de Trinity.” Sem afrouxar a pressão de suas mãos em meus braços, ele me empurrou para a porta fechada, chocando minhas costas contra ela, prendendo-me ali. Elevou meus pulsos acima da minha cabeça com apenas uma mão, enquanto levava a outra ao meu pescoço, circundando-o, fazendo uma leve pressão. — Por favor, me solta. O senhor está me assustando. — Falei, apavorada. Várias cenas se passavam em minha mente. Podia vê-lo tirando minha vida de várias formas diferentes, ali, em seu escritório, sem que ninguém pudesse me ouvir se eu gritasse. — Está com medo Dakota? — Sua voz soou ameaçadora e ao mesmo tempo sarcástica. — Pela forma como você matou seu padrasto, não pensei que fosse uma garota que sente medo tão facilmente. — Puta merda! Ele tinha me investigado, sabia sobre um passado que eu vinha tentando esquecer. Ele observou a expressão dos meus olhos, antes de prosseguir. — Por que o espanto? Achou que eu contaria minha vida a uma pessoa sem saber nada sobre ela? Eu não sou um assassino como você pensa, mas você é. — Sua mão afrouxou em meu pescoço, embora continuasse ali, acariciando minha pele, suavemente, descendo para meu colo, quase tocando meus seios. Por mais incrível que pudesse parecer, o desejo se misturou ao medo dentro de mim. Eu gostava de ser acariciada por ele, e gostava muito. — Eu não posso tirar sua razão por dar fim àquele pervertido, mas também não posso culpá-lo por fazer de você a putinha dele. — Sua mão insolente subiu até meu rosto, seu polegar acariciando meus lábios, tentadoramente. — Se eu tivesse no lugar dele, também colocaria meu pau nessa boquinha gostosa. — Ele pressionou seu corpo grande e sólido contra o meu, pude sentir sua firme ereção de encontro ao meu ventre e houve uma explosão de sensações indefiníveis dentro de mim. Raiva, medo e tesão se misturavam, fazendo meu sangue ferver nas veias, como nunca acontecera antes.

— Me solta senão vou gritar. — Minha voz saiu trêmula, denunciando o quanto minha respiração estava ofegante. — Por que eu deveria te soltar se estou vendo em seus olhos que não é isso que você realmente quer? — O senhor não sabe o que quero. — Mas é claro que eu sei. E é isso que vou te dar. Sem que eu esperasse, ele inclinou sua cabeça e seus lábios encontraram os meus, o desejo se intensificando com o simples contato. Tentei manter a boca fechada, mas foi impossível, pois todo o meu corpo clamava por aquele beijo, minha mente travava uma batalha contra meu corpo, que o queria ardentemente. Então, deixei que sua língua explorasse minha boca, tão avidamente que quase fiquei sem fôlego, enquanto sua mão livre passeava pelo meu corpo, apalpando-o por sobre as roupas. O desejo se sobressaiu a qualquer outra sensação dentro de mim. Tanto o medo quanto a raiva deixaram de existir restando apenas e excitação. Era um desejo selvagem, indescritível, que tomava conta de todo o meu ser, enlouquecedoramente, como jamais antes havia experimentado ou sequer imaginava existir. Sem deixar de me beijar daquela forma ensandecida e ciente de que não precisava mais segurar meus pulsos, já que eu estava completamente rendida, o Sr. Parker os libertou, deixando a mão livre passear pelo meu corpo. Quando a colocou sobre um dos meus seios, por sobre o tecido do macacão, fazendo uma leve pressão, um gemido abafado me escapou de encontro aos seus lábios. Naquele momento nada mais importava que não a lasciva crua que jazia dentro de mim. Queria que ele me tocasse mais intimamente, que tirasse minhas roupas e me possuísse ali mesmo, sobre as poltronas. Porém, para meu total desapontamento, ele simplesmente parou tão subitamente quanto começara. Afastou sua boca da minha e espalmou suas mãos na porta, um pouco acima da minha cabeça, embora mantivesse seu corpo pressionando ao meu. Encostou sua testa na minha e fechou os olhos, sua respiração muito pesada, seu hálito gostoso acariciando a pele do meu rosto. — Eu não posso fazer isso com você. — Falou, num sussurro quase inaudível. Todo o meu corpo estava em chamas, clamando pelo dele, enquanto minha mente se tornava confusa. Não sabia o que pensar ou o que dizer. Sabia apenas que o queria como jamais quis alguém antes. — Eu quero que faça. Seus lábios se curvaram em um sorriso e gelei por dentro, pois como seus olhos estavam fechados eu não podia saber se ele estava zombando de mim. — Você não sabe o que está dizendo, é apenas uma criança. — Seus olhos se abriram e fixaram nos meus, a amargura refletida na sua expressão. — Eu não sirvo para você. Sou um homem que sai apenas com prostitutas, que não fica com uma mulher mais de uma vez. Você sabe o que aconteceu a todas as mulheres que se envolveram comigo. Não foram apenas aquelas com quem me casei, houve muitas outras. Você não quer isso, eu sei. — Eu não tenho medo de nada nem de ninguém. — Puta merda! O que eu estava dizendo? Seria mesmo capaz de colocar minha vida em risco por ele? Eu sabia que sim. Como se tivesse acabado de receber um soco no estômago, ele se afastou, dando-me as costas para ir em direção ao frigobar, deixando um vazio desolador em seu lugar.

— Não diga tolices, Srta. Thompson. Há poucos minutos você estava se tremendo de medo de mim. — Ele passou por cima dos restos do meu computador e dos cacos de vidro, com tanta naturalidade que parecia não os ver no chão. — Apesar do que, admiro a coragem com que você cortou a garganta do seu padrasto. — Ele tirou a garrafa de uísque da pequena geladeira e começou a beber direto do gargalo, ao mesmo tempo em que se virava para me observar, seus olhos fixos em meu rosto, como se procurasse a reação que suas palavras me causariam. E a minha reação não podia ser pior. Embora nada deixasse transparecer, eu me sentia como se estivesse sufocando, o ar faltando em meus pulmões. Os acontecimentos do passado eram dolorosos demais para que fossem relembrados, que dirá mencionados. Eu só queria esquecer tudo, apagar da minha memória todas as vezes que aquele maldito me violentara, repetidamente, desde os meus doze anos de idade, e principalmente esquecer aquela tarde que eu estava sozinha em casa e ele chegara tão bêbado que transara comigo durante horas, me humilhando me machucando, antes de cair num sono profundo, quando então eu encontrara coragem para dar um fim àquilo e cortara sua garganta com a faca da cozinha. Como punição, passei alguns anos em um reformatório, onde minha filha nasceu e me foi tirada antes mesmo que eu tivesse tempo de escolher o seu nome, para ser levada à adoção, de modo que nunca mais a vi. Por outro lado, o reformatório fora útil, pois finalmente encontrara sossego para me dedicar aos estudos, livre da minha mãe alcoólatra e daquele verme. — Não gosto de falar sobre esse assunto. — Declarei. — Eu também não gosto de falar sobre meus pecados, no entanto estou contando tudo a você. — Isso é diferente. Estou fazendo um trabalho acadêmico e não mexericos. — Agora, com toda a sala entre nós, eu pude raciocinar com mais clareza e recordei-me da macabra declaração que ele fizera, de que não foram apenas suas esposas a serem mortas. Essa era uma informação preciosa. — Então quer dizer que outras mulheres com quem o senhor se envolveu, que não apenas suas esposas foram mortas? Eu fui até os restos do meu computador no chão e comecei a juntar seus cacos, fingindo uma naturalidade inexistente ao fazer a pergunta. — Sim. Muitas outras. Eu dei muito dinheiro à polícia para que os assassinatos não chegassem ao conhecimento público. Levantei-me para fitá-lo no rosto, atônita. — Isso significa que todas elas realmente foram assassinadas? Inclusive suas esposas? — Sim. Todas. — Quantas? — Cinco. Contando aquelas com quem me casei. Eu estava quase chocada com tantas revelações escabrosas. — Quem fez isso? — Alguém muito próximo a mim. — Como assim? — Eu não sei quem foi. Ninguém sabe. Contratei os melhores detetives particulares do país e eles não descobriram nada. Apenas chegaram ao consenso de que é alguém muito próximo, pois descobriu meus casos secretos e tinha acesso a informações muito particulares. — Mil possibilidades se passavam em minha mente. O assassino podia ser alguém da sua família, determinado a destruir sua felicidade para vingar a morte de Elizabeth. Parecia absurdo, mas era o que qualquer pessoa

pensaria. — Pode ser alguém da sua família vingando a morte de Elizabeth, não é? Ele fitou-me em silêncio por um breve instante, para em seguida abandonar a garrafa de uísque sobre o frigobar e com alguns passos diminuir a distância entre nós, meu corpo estremecendo em expectativa. Mas ele não chegou muito perto. — Dakota. — Sua voz tinha um tom de gravidade. — Não perca um minuto do seu tempo tentando desvendar essa história, porque nem os investigadores mais experientes conseguiram. Escreva seu trabalho e esqueça o resto, pois isso pode ser arriscado para a sua vida. Eu não podia acreditar que ele estava preocupado comigo. Será que havia alguma sensibilidade por trás daquela grossa camada de arrogância? — Quando escolhi estudar jornalismo eu estava ciente dos riscos que a profissão oferece. Serei uma repórter investigativa porque o perigo me atrai Sr. Parker e são poucas as coisas que conseguem me intimidar. — “Como o senhor conseguiu”. — Você não sabe onde está se metendo. Aquilo era um aviso? Uma ameaça? Era impossível saber. Mas de uma coisa eu tinha certeza: não sossegaria enquanto não desvendasse aquele mistério.

CAPÍTULO V

— Como elas foram assassinadas? Nesse momento o toque estridente o telefone o atraiu. Sua voz foi áspera ao atender, quando então constatei que a arrogância fazia parte da personalidade dele, não agia assim apenas comigo. Eu tinha pena dos seus funcionários por precisarem tolerá-lo diariamente. Trocou algumas palavras malcriadas com alguém a quem não consegui identificar e desligou o aparelho. — Acho que hoje encerramos por aqui Srta. Thompson. Continuamos quando for possível. Ah, então eu tinha voltado a ser a Srta. Thompson. — Ok. Já está tarde mesmo. Preciso ir para casa e me arrumar. Tenho um compromisso. — Merda! Eu disse aquilo com a intenção de alfinetá-lo, mas de repente me sentia estúpida e infantil por tal atitude, principalmente porque ele não esboçou qualquer reação, como se eu não fosse nada para ele como realmente não era, pois estive vulnerável em seus braços, totalmente entregue e ele se esquivou, deixando claro que nem para uma transa eu servia. Preferia as prostitutas. Constrangida, juntei o que restava do meu computador e deixei a sala, evitando encará-lo mais uma vez, pois já estava difícil suficiente obrigar os meus pés a me levarem para fora. Ao sair percebi que Lindsay me observava com hostilidade, atribuindo mais atenção às minhas roupas amarrotadas e ao meu batom borrado que ao meu computador despedaçado entre minhas mãos. Era como se ela fosse capaz de adivinhar o que acontecera lá dentro. Contudo, Lindsay era a menor das minhas preocupações, eu tinha muito em que pensar, havia muitas informações novas a serem processadas, relacionadas, desvendadas e digitadas. Precisava de tempo para isso e ficar ali tirando cópias definitivamente me atrasaria. Sem falar que era perturbador demais olhar para o Sr. Parker e saber que ele conhecia meu passado obscuro. Eu não queria vê-lo mais hoje. Como eu não era funcionária fixa da empresa, não precisava seguir todas as normas à risca e minha primeira desobediência foi ir para casa mais cedo aquela tarde, um pouco antes do encerramento do expediente. Fiz todo o trajeto de Downtown até o subúrbio sem ver o caminho, minha mente absorta pelos pensamentos. Repassava todos os acontecimentos daquele fim de tarde, as novas revelações feitas pelo Sr. Parker, o fato de saber sobre o meu passado e principalmente a forma como me beijara, me deixando subjugada à luxúria, determinada a entregar-me a ele, se ele me quisesse. Mas ele não quis e isso me magoava. Há muito tempo eu não desejava um homem e quando finalmente desejei fui rejeitada. Droga! O fato de ele saber sobre meu passado também me incomodava. Ninguém conhecia minha história, nem mesmo Trinity e Tom, meus melhores amigos. Agora um dos homens mais poderosos do país sabia de tudo e isso me fazia sentir-me envergonhada por ter sido violentada repetidamente por um bêbado que tinha idade de ser mau pai, e ao mesmo tempo julgada por ter tirado a vida dele. Tudo era muito confuso, novo e estranho.

O Sr. Parker não era poderoso apenas no mundo dos negócios, mas também como pessoa. Em questão de horas ele conseguira despertar-me um turbilhão de emoções contraditórias, arrebatadoras como eu jamais experimentara antes e precisava lutar contra esse poder que ele exercia sobre mim, capaz de me fazer perder completamente o controle e chegar ao ridículo de ficar à sua disposição, como ficara quando estava em seus braços, pronta para ser possuída, com a maior facilidade. Certamente ele me rejeitara por me considerar muito fácil. Droga! Como pude me rebaixar tanto? Ao chegar em casa encontrei o apartamento deserto. Trinity estava no seu trabalho na loja de flores e Tom na faculdade. O lugar estava uma bagunça, precisando de faxina urgente, mas não seria eu a fazê-la. Embora tivesse esse costume, hoje não estava com disposição para nada. Tomei um banho demorado e relaxante, vesti um shortinho minúsculo e regata folgada e parti em busca de algo onde pudesse escrever, precisava colocar as informações em texto enquanto ainda estavam frescas. Fucei o quarto de Trinity até encontrar o velho computador de mesa que ela usava quando chegamos aqui. Era praticamente uma sucata e não pegava internet, mas para digitar o texto servia. No dia seguinte eu compraria um notebook novo. Não tinha muito tempo, pois logo o professor Anthony estaria aqui para me levar para jantar fora. Não era um encontro em que eu estivesse interessada, mas seria útil agora, para distrair meus pensamentos de Parker. Anthony era um homem atraente, talvez fosse capaz de me fazer parar de pensar naquele troglodita. Talvez fosse disso que eu precisasse: uma romântica noite de sexo, como há muito não tinha. Aquela atração louca que sentia por Parker podia ser resultado de uma carência afetiva, na qual eu estava disposta a dar fim naquela noite. Abri uma garrafa de vinho e me acomodei na minha cama com o velho computador sobre as pernas esticadas para frente. Vasculhei minha memória e relembrei cada palavra de Parker, transformando-as em um texto literário que em breve seria lido pelo mundo inteiro. Estava com apenas dois parágrafos terminados quando o som estridente do meu celular me atraiu. Não reconheci o número na tela, mas atendi. — Alô. — Srta. Parker não é permitido nessa companhia que os funcionários abandonem seus postos antes da hora. — A voz máscula e ríspida de Parker era inconfundível e me despertava um calor gostoso. — Acontece que não sou sua funcionária de verdade. Então acho que posso sair um pouquinho mais cedo. — Acontece que aqui não admitimos funcionários de mentira. Se a Srta. Quiser continuar em seu posto, precisa voltar a cumprir seu horário. Um frio atravessou meu estômago. Ele estava ameaçando me demitir, impedindo-me de concluir meu trabalho, se eu não voltasse? Mas que cretino! Ele sabia que eu não arriscaria perder aquela chance, em hipótese alguma. — O senhor quer que eu volte à companhia ainda hoje? Mas é quase noite, não há mais ninguém aí. — Protestei. — Se não quiser seguir as normas, procure outra pessoa sobre quem escrever. Não vou dar regalias a ninguém. Ou trabalha direito ou não trabalha. — Sem mais, encerrou a ligação. Sua arrogância era inacreditável. Como alguém podia ser tão amargo, a ponto de tratar mal todos que o cercavam? Furiosa e ao mesmo tempo determinada a não o deixar me fazer desistir. Troquei as roupas

confortáveis por um dos vestidos que Tom me comprara sem prestar muita atenção à roupa. Sabia apenas que era preto e colado demais, quase me sufocava. Era elegante o suficiente para o jantar com Anthony, pois tinha certeza de que não sairia da Thive antes das oito da noite. Precisava avisar ao professor que me apanhasse lá. Ajeitei os cabelos com os dedos, pendurei a bolsinha cara no ombro e saí. Na sala encontrei Tom, Trinity e Noah, cuja chegada eu não percebera, tão concentrada estava no meu trabalho. — Onde você tá indo essa hora? — Foi Trinity quem perguntou. — O maldito Sr. Parker exigiu que eu cumprisse a carga horária, ameaçando me demitir porque saí mais cedo. Você tinha razão Tom, o cara é insuportável. Não, insuportável é elogio para ele. Ele é a verdadeira reencarnação de um dos carrascos da Idade Média. Sem esperar que um deles jogasse na minha cara que tinham me avisado, abri a porta e saí, pisando firme, a raiva queimando em minhas entranhas. Era noite quando cheguei à Thive Oil Company. Como pela manhã, encontrei o saguão praticamente deserto, com exceção do segurança uniformizado. Identifiquei-me a ele e descobri que este já estava informado sobre minha chegada. O todo poderoso sequer duvidou de que eu viria. Filho da puta! Quando o elevador se abriu no vigésimo segundo andar e me deparei com a enorme sala completamente escura e deserta, um calafrio percorreu-me a espinha, meus instintos me alertando sobre o perigo. Fui direto à porta da sala de Parker e bati, para me certificar de que ele realmente estava ali e eu não estava sozinha. Logo ele abriu a porta. Estava diferente, sem o paletó e a gravata, com a camisa para fora da calça. Tinha os cabelos emaranhados e o cheiro forte de uísque partia dele. Apesar da aparência desmazelada, conseguia ser irresistivelmente atraente, com toda aquela masculinidade crua e viril. Era impossível evitar os pensamentos lascivos ao olhar para ele. — Então. Estou aqui. O que o senhor quer de mim? — Indaguei, tentando afastar os pensamentos. Ele percorreu o olhar por todo o meu corpo, de cima abaixo, me fazendo corar como uma adolescente imatura. E sua boca se curvou em um meio sorriso. Eu não podia acreditar que ele me fizera vir até aqui apenas para zombar um pouco mais de mim. — Entre. — Ele falou, com seu peculiar tom de autoridade. Ao entrar na grande sala, cuja vista da parede dos fundos agora revelava as luzes magníficas do centro de Houston, constatei que os cacos de vidro não estavam mais ali. Tudo estava limpo e organizado. — Preciso que você digite um relatório a ser enviado aos nossos importadores canadenses. Pensei em pedir que Lindsay fizesse hora extra, mas me lembrei que ela já tinha chegado mais cedo para ajudar você. Então, como você saiu mais cedo e receberá o mesmo salário que ela, achei que seria justo te chamar de volta. Eu não podia acreditar! Ele estava me dando uma satisfação? Era um grande avanço para o homem das cavernas. — Estou de acordo. Porém, considerando que o senhor não tem nenhum dedo faltando e poderia muito bem digitar seu relatório sozinho, mas em vez disso me fez dirigir do subúrbio até aqui e possivelmente perder o meu encontro, acho que podemos nos dedicar um pouco à sua biografia. O que acha? Ele sorriu, um sorriso estonteante e sincero que me deixou fascinada. Um sorriso dele era como um raio de sol em um dia chuvoso. — Você tem sempre um porém não é Srta. Thompson? — Ele apoiou os cotovelos sobre a mesa,

tocou seus lábios com os dois polegares e completou: — Se fizermos apenas meu relatório seu encontro poderá ser salvo, mas se começarmos a falar sobre mim, com certeza você o perderá. Entre jantar com o professor Anthony e ouvir mais sobre a vida dele, eu ficaria com a segunda opção. — Não era um encontro tão importante. Vamos ao trabalho. Ele analisou-me por um longo momento, como se me sondasse e não era a primeira vez que fazia aquilo. — Você é ambiciosa Srta. Thompson. Tome cuidado, isso pode destruir sua vida. — Eu tive a sensação de que ele me comparava a si mesmo e não encontrei uma resposta para aquilo. — Você vai precisar de um computador. Pegue o notebook que está na sua mesa na outra sala. Comprei para repor o que você perdeu. Ele é seu, mas pode usar para fazer meu relatório. — Obrigada, mas não posso aceitar que o senhor me compre um computador. Fui eu quem quebrou o meu. — Eu sei, mas a culpa foi minha. Agora faça o que estou mandando. Tive a impressão de que não seria bom contrariá-lo agora, pois corria o risco de fazê-lo desistir de falar. Usaria seu computador hoje, mas não o levaria para casa. Fiz o que ele disse, animada com a perspectiva de ouvir sua narrativa. Se continuássemos nesse ritmo, terminaria aquele trabalho antes do planejado e logo meu nome estaria entre os dos mais famosos jornalistas do país. Podia visualizar, mentalmente, vários jornais disputando a minha contratação. Sentei-me do outro lado da mesa, pousando o computador sobre o móvel com tampo de vidro e comecei a digitar o relatório que ele me ditava. Era um trabalho enfadonho, considerando que o mundo dos negócios não me despertava o mínimo interesse. Para mim aquilo não passava de um punhado de palavras formais sem nexo. Por outro lado, estar diante do Sr. Parker fazia tudo valer à pena. Eu gostava de olhar para ele, admirar sua postura imponente, autoritária, sua autoconfiança, como se nada fosse capaz de atingi-lo, suas feições másculas, seu charme inigualável. Tudo nele me atraía, inclusive o cheiro de uísque que exalava. Aquele homem era uma tentação, um convite descarado ao prazer. Mas infelizmente não me queria. Terminamos o relatório e o observei enviá-lo por e-mail. — Então. Podemos começar agora? — Indaguei animada, tirando o bloquinho de anotações e uma caneta que carregava na bolsa. — Se vamos falar sobre minha vida, vou precisar de mais uísque. — Ele se dirigiu até o frigobar no canto da sala, servindo-se. — Aceita? — Não, obrigada. Eu estava bebendo vinho. Acho que não convém misturar. — Voltou a sentar-se no seu lugar, com o copo na mão. — Você é um enigma para mim. Que tipo de garota, na sua idade, deixaria de ir a um encontro para se dedicar a um trabalho escolar? — Do tipo que quer vencer na vida. — Então você acha que a vida profissional é mais importante que a vida afetiva? Refleti em suas palavras e cheguei à triste conclusão que sim, eu preteria um relacionamento ao meu futuro profissional, o que colocando de acordo com o ponto de vista abordado por ele, me fazia parecer uma pessoa fria e insensível. — É, eu acho sim. Pelo menos até me apaixonar. O que não vai acontecer com o cara que eu ia ver

hoje. Eu ainda o estou conhecendo. — Se ainda o está conhecendo, como pode ter certeza de que não se apaixonaria por ele futuramente? — Eu não tenho certeza. Só acho que reconhecerei o homem a quem vou amar quando o ver pela primeira vez. — Os olhos dele se tornaram intensos sobre os meus, despertando-me uma onda de calor. Não consegui sustentar aquele olhar por muito tempo e desviei minha face para o outro lado. — Não estamos aqui para falar de mim e sim do senhor. Como foi o começo da sua vida empresarial e como se tornou o pioneiro na extração do petróleo nos Estados Unidos? Ele ingeriu uma grande dose de uísque antes de começar a falar. Então, narrou detalhadamente sua trajetória no mundo dos negócios. Como fundara a Thive Oil Company, com a ajuda do seu amigo David Smith, o segundo maior acionista atualmente, como prosperara com rapidez, embora tivesse que abrir mão de alguns prazeres da vida. Quanto mais o ouvia, mais ficava fascinada com a sua inteligência, seu talento e sua perseverança. Ao mesmo tempo, minha mente insistia em tentar relacionar as pessoas que sempre o cercaram aos assassinatos. Quem entre todos com quem ele convivia era o louco que matara todas aquelas mulheres? Eu precisava saber. O toque do meu celular interrompeu sua narrativa. Era o professor Anthony e só então me ocorreu que me esquecera de ligar para cancelar nosso jantar. Como era estúpida! — Olá professor. — Atendi e vi a expressão de Parker mudar de neutra para alarmada. — Fui ao seu apartamento, mas me disseram que o Sr. Parker te chamou para fazer hora extra. Algum problema? — Não. Nenhum. Eu apenas saí mais cedo hoje e ele quis que eu pagasse as horas. — A expressão de Parker se tornava cada vez mais atônita. — Desculpe não ter avisado, mas me entreti com o trabalho a acabei esquecendo. — Ainda não é tarde. Você pode vir agora? Questionei-me se era capaz de trocar a forma natural e espontânea com que o Sr. Parker falava sobre sua vida por um jantar romântico e cheguei à conclusão de que não. Não apenas porque minha vida profissional vinha em primeiro lugar, mas porque algo mais forte que eu me prendia perto daquele homem. — Vamos remarcar. Estou ouvindo as declarações do Sr. Parker agora. Houve um longo momento de silêncio do outro lado da linha. — Muitas descobertas significativas sobre ele? — Você não pode imaginar quantas. Mas espere para saber tudo quando o trabalho estiver findado. — Sua amiga Trinity me convidou para o aniversário dela amanhã. Você se importa se eu for? A pergunta dele só fazia sentido porque eu sabia que era um pedido de autorização para me ver. Se eu dissesse que não me importava, estaria consentindo em ficar na companhia dele na festa. “Ah Trinity, você me paga por essa!” — Claro que não me importo. Nos vemos lá. Até amanhã. — Até. E encerramos a ligação. A expressão com que Parker me fitava era assustadora. Um misto de espanto e alarme. — Por acaso o professor com quem você estava falando e com quem você ia jantar hoje, é o

mesmo que me procurou pedindo para te receber? — Sim. Por quê? — Merda! Por que você não me falou isso antes?! — Ele esbravejou, ao passo em que esmurrava a mesa, sem que eu compreendesse a razão da sua súbita mudança de humor. — E que diferença faz se eu ia jantar com o professor Anthony ou outro qualquer? O senhor por acaso o conhece? — Não. — Sua resposta foi breve, seca e não me convenceu. Ele levantou-se para ir até o frigobar reabastecer seu copo com uísque. — Não minta para mim Sr. Parker. — Indignada, o segui. — O senhor não teria essa reação se não o conhecesse. Quando concordou em me deixar fazer esse trabalho, pensei que estava determinado a falar a verdade, mas agora vejo que não. Ele virou-se para me fitar, seus olhos sombrios fixando-se nos meus. — Não fale bobagens. — Sua voz parecia o grunhido de um animal. — Quando te mandei assinar aquele termo de confidencialidade, era para você não sair falando por aí cada passo que desse. Você não devia ter dito ao seu professor que está aqui. — Não fui eu quem disse, foram meus amigos, quando ele foi até o nosso apartamento. Mas isso não importa. Quero que me diga porque ele não podia saber que estou aqui. — Só quando me calei, percebi que minha voz estava mais alterada do que eu pretendia. Com dois passos o Sr. Parker diminuiu a distância entre nós. Sua proximidade, unida àquele cheiro de uísque misturado com perfume masculino caro, perturbando-me tanto que fiquei sem fôlego. — As pessoas podem pensar que estamos... — Ele não concluiu a frase. — Que estamos o quê? — Você não entende? Não é comum ficar no escritório sozinha com o chefe à uma hora dessas. As pessoas podem deduzir errado e isso colocaria sua vida em risco. A cada palavra sua, eu ficava mais convencida de que ele estava mentindo sobre não conhecer Anthony. — Mas o que Anthony tem com isso? — Não podemos confiar em ninguém. Coloca isso na sua cabeça. Há muito tempo eu desisti de ter qualquer intimidade com mulheres que não fossem as prostitutas, para não colocar mais vidas em perigo. — Se o senhor sabia que minha vinda aqui a esta hora colocaria minha vida em perigo, por que me chamou? O relatório podia ser feito amanhã. Ele aproximou-se mais um passo, enquanto eu recuava outro. Queria muito aquela proximidade, ser tocada e beijada novamente por ele, mas antes de tudo, precisava de respostas. — Por que eu sou um idiota. Ele abandonou seu copo sobre a mesa e avançou para mim, com tanta agilidade que não tive tempo de escapar, ou talvez eu não quisesse escapar. Segurou-me pela cintura, uma das suas mãos pressionando minhas costas com firmeza, mantendo meu corpo colado ao seu, a outra mão acariciando meu rosto. — Por que você tinha que ser tão linda? Sem aviso prévio, ele apossou-se dos meus lábios, com avidez, me deixando sem opção que não corresponder ao beijo, o calor do desejo queimando dentro de mim, se alastrando por todo o meu corpo, me deixando úmida no meio das pernas.

Não havia como resistir, às sensações que aquele beijo me despertava. Eram intensas demais, indescritíveis, enlouquecedoras. Afundei minhas mãos nos seus cabelos macios, atrás da sua cabeça, puxando-o mais para mim, ao passo em que sua ereção se fazia de encontro ao meu ventre e eu esfreguei meu corpo ali, experimentando sua rigidez por sob as roupas, deixando claro o quanto o queria. Eu o queria mais intimamente, dentro de mim, com urgência, ou seria capaz de enlouquecer. Sem deixar de me segurar firmemente pelas costas, ele deslizou sua outra mão pelo meu corpo, explorando cada parte de mim, deliciosamente, me fazendo querer aquilo cada vez mais. Sua boca gostosa escorregou para o meu pescoço, onde passou a plantar beijos e lambidas. — Dakota, não me deixe fazer isso com você, impeça-me, porque eu não tenho forças. — Sua voz estava sussurrada, por causa da respiração pesada. — Não quero impedi-lo... Com um gemido rouco, ele nos conduziu até as poltronas onde me fez deitar e acomodou-se sobre mim, todo o seu corpo colado ao meu, o calor que emanava dele fazia meu sangue ferver do mais lascivo desejo. Voltou a beijar-me com voracidade, sua língua explorando minha boca voluptuosamente, ao mesmo tempo em que sua mão percorria meu corpo, intensificando a luxúria que tomava conta de mim. Seus lábios escorregaram para o meu colo, seus beijos quentes incendiando minha pele. Quando estava quase alcançando meus seios, ele subitamente parou e levantou-se, abandonando-me sobre o estofado, sem reação. — Eu não posso fazer isso... — Disse, sem me encarar. Eu não podia acreditar! Ele estava me rejeitando pela segunda vez! Mas que merda! Por que ele começava se não pretendia terminar? Eu podia entender que queria proteger minha vida, mas para todos os efeitos estávamos ali trabalhando, ninguém nunca saberia se transássemos. Nesse momento, o toque do meu celular ecoou pela sala. — Não vai atender seu telefone? — Ele perguntou, dando-me as costas, com a clara intenção de esconder o volume que sua ereção fazia na calça. Minha vontade era de dizer umas verdades a ele, mostrar-lhe o quanto estava sendo covarde por rejeitar uma mulher que o queria e queria com todas as suas forças, mas não me rebaixaria a tal ponto, ele que fosse para o inferno. Sentindo o tesão dar lugar à raiva dentro de mim, levantei-me, ajeitei o vestido em meu corpo, fui até minha bolsinha cara e peguei o celular que tocava insistentemente. Era o professor Anthony novamente. — Olá professor. — Fiz questão de enfatizar a palavra “professor” ao atender e como já esperava, o Sr. Parker virou-se para me fitar com espanto. — Eu não sei se estou incomodando, se estiver saiba que essa não é minha intenção. — Sua voz era hesitante e extremamente gentil, como a do imbecil à minha frente nunca seria. — Estou ligando para saber se você vai precisar de carona quando terminar aí. — Na verdade eu já terminei por aqui hoje. — Eu fazia questão de fitar Parker nos olhos enquanto falava. — Não vou precisar de carona, mas ainda não é tão tarde, podemos sair e comer alguma coisa. O que acha? Eu podia ver a raiva reluzindo nos olhos de Parker. Ótimo!

— Acho ótimo. Onde nos encontramos? — Onde você sugere? — Tem um restaurante na Wild com a Seven Street. É um ótimo lugar e fica perto de onde você está. Pode ser lá? — Pode sim. Quem chegar primeiro espera o outro. — Até já então. E encerramos a ligação. — Não existe uma regra que proíbe envolvimento entre aluna e professor? — Parker indagou. Ele estava em pé no centro da sala, com as roupas desalinhadas, os cabelos emaranhados, o olhar raivoso. Parecia mais atraente que um oásis no deserto. Mas era covarde demais para fazer o que queria. — Não sei. Mas mesmo que houvesse Anthony não se intimidaria com isso, pois não é um covarde. Pendurei minha bolsa no ombro e me dirigi para a porta, porém, ele deteve-me a meio caminho, segurando-me o pulso, o simples contato enviando uma corrente de desejo que passeava por todo o meu corpo, terminando em meu sexo. — Por que está fazendo isso? — Fazendo o quê? Vivendo minha vida do jeito que quero? — Não é isso que você quer. — Mas quando não se pode ter o que se quer, parte-se para a segunda opção. Esperei que ele me impedisse de sair, que voltasse a tomar-me em seus braços e me fizesse sua, que seu desejo por mim fosse maior que seus temores, todavia, em vez disso, a mão dele afrouxou em meu punho e as lágrimas ameaçaram aflorar em meus olhos. Antes que ele percebesse o quanto sua rejeição me magoava, deixei a sala quase correndo.

CAPÍTULO VI Observei a Srta. Thompson deixar minha sala, batendo a porta com força atrás de si e me senti o covarde que ela me considerava, por deixá-la ir, quando na verdade queria tê-la em meus braços durante toda a noite e saciar esse desejo violento que tomava conta de mim desde que a vira pela primeira vez. Há muito tempo eu não sentia algo parecido por uma mulher, aliás, nunca antes desejara alguém com a intensidade que a desejava. Mas ela era quase uma criança. Eu precisava respeitar isso. Todavia, minha maior covardia tinha sido chamá-la aqui há essa hora, sem necessidade, colocando sua vida em perigo. Não havia relatório nenhum a ser enviado, eu queria apenas impedi-la de ir se encontrar com outro homem, como ela insinuara que faria. Contudo o que eu não esperava era que esse homem fosse Anthony. Isso colocava a vida dela duplamente em perigo, pois Anthony era meu principal suspeito pelos assassinatos, por ter sido o mais apegado a Elizabeth entre os irmãos. Sem mencionar que ele colocara Dakota em minha vida e isso podia ser uma armadilha. Droga! Onde eu estava com cabeça quando deixei minhas emoções falarem por mim? Fui até meu copo e bebi todo o restante do uísque com um só gole. Já estava tonto pelo efeito da bebida e precisava dirigir de volta para casa, mas isso não me importava, pelo contrário, um acidente fatal me pouparia o trabalho de pular da sacada. Abasteci o copo novamente e me deixei afundar no estofado, meus pensamentos voltados para Dakota, em como ela ficara excitada em meus braços, pronta para ser possuída, linda, vulnerável e em como eu fora covarde em me esquivar. Em questão de poucas horas ela estaria nos braços de Anthony, trêmula de tesão, como estivera nos meus e ele lhe daria o que ela queria. Merda! Por que as coisas tinham que ser assim?! A raiva que me tomava era tão perturbadora que atirei o copo longe, estilhaçando-o, os cacos voando. Era o segundo copo que eu quebrava no mesmo dia, movido pela raiva. Talvez estivesse perdendo o controle. Talvez a solidão estivesse me enlouquecendo. Talvez eu não possuísse estrutura suficiente para conviver com Dakota todos aqueles dias, ignorando a atração que sentia por ela. Talvez eu devesse acabar com tudo hoje mesmo. Para que esperar mais? Não havia motivo. Não havia ninguém para sentir minha falta. Mas precisava esperar um pouco mais, pelo menos até que minha biografia estivesse pronta. Eu só precisava ser forte. Além do mais, Anthony saberia que não tive nada com Dakota, já que ela me deixara para ir encontrá-lo. Afastando tais pensamentos, pendurei meu paletó no braço, apaguei a luz e deixei a sala. Os dois cômodos tão vazios e obscuros quanto à solidão que me tomava. Encontrei meu carro com facilidade na garagem deserta e dirigi em alta velocidade até em casa. Não tinha comido nada desde o almoço, mas não sentia fome. Após o banho demorado o cansaço finalmente se manifestou em meu corpo, mas sabia que não conseguiria dormir quando me deitasse, apesar de ser quase meia-noite. Então, liguei o computador e comecei a navegar nas redes sociais.

Geralmente, quando estava nesse estado de melancolia, procurava uma prostituta nos muitos sites destinados a isso, como se elas fossem capazes de preencher o imenso vazio existente dentro de mim, quando na verdade sabia que elas não eram. Estivera com uma durante quase toda a noite anterior, fazendo sexo selvagem e nada tinha mudado. Ao amanhecer, o vazio estava de volta e se tornava ainda mais doloroso quando imaginava que a única mulher que eu realmente queria e queria com todas as minhas forças, estava, naquele momento, nos braços de outro homem. Não um homem qualquer, mas aquele que podia ser o assassino que arruinara a minha vida. Eu não sabia o que era mais doloroso: imaginar o que eles estavam fazendo agora, ou cogitar que ele podia matá-la, com a intenção de me afetar. Consegui dormir por algumas horas no sofá da sala. No horário certo estava pronto para ir ao escritório, esperando que Lindsay me arranjasse um analgésico para a dor infernal e familiar que a ressaca causava em minha cabeça. Chegando lá, no instante em que deixei o elevador, meus olhos se detiveram em Dakota, sentada atrás da sua mesa, forçando uma postura profissional. Estava linda, usando uma blusa bege de tecido até o decote, terminando com tela transparente. Os cabelos estavam desalinhados com no dia em que a conhecera e não lisos como ontem. Sua boca bem desenhada era realçada por um batom cor de rosa, que parecia um convite tentador. Estudei-a atentamente, em busca de alguma evidência de que tivera relações sexuais com Anthony, mas era impossível saber. — Srta. Thompson, na minha sala, imediatamente. — Usei o mesmo tom com que falava com qualquer funcionário, para não despertar a desconfiança de Lindsay sobre o quanto desejava aquela garota, embora tivesse quase certeza de que ela já percebera, pois era inteligente e conhecia todos os meus passos. Agora me restava pensar em uma desculpa para tê-la chamado, já que ela não entendia absolutamente nada do que fazíamos ali. E eu tinha poucos segundos para pensar. Não podia simplesmente perguntar a ela se fizera sexo com meu irmão. Quando me acomodei atrás da minha mesa, ela já estava atravessando a porta, as curvas perfeitas do seu corpo exibidas pela saia colada e longa da mesma cor da blusa. Eu poderia olhar para ela o dia inteiro e não me cansaria. — Pois não Sr. Parker. — Ela disse. Pude ver o brilho do desejo em seus grandes olhos azuis. O modo como seu rosto corava ao se dirigir a mim e a certeza de que ela me queria tanto quanto eu a desejava foi o suficiente para que meu pau ficasse duro dentro da calça. Porra! Por que eu não conseguia me controlar? — Preciso que me arranje um analgésico. — O senhor me chamou até aqui para me dar uma ordem que poderia ser dada lá fora? Eu sabia! Dakota simplesmente não conseguia obedecer calada, eu tinha pena do sujeito que um dia se tornaria chefe dela. — Sim. Mas se não quiser obedecer, a porta da rua é serventia da casa. — Eu estava furioso por ela ter passado a noite com Anthony e não conseguia disfarçar. — O senhor sabe que eu não vou embora daqui enquanto não terminar meu trabalho. Se a intenção de me infernizar for essa, pode desistir. — Se você contestar todas as ordens que receber quando tiver um emprego de verdade, estará sempre na fila dos desempregados.

— Eu não acredito que existam tantos chefes arrogantes como o senhor por aí. — E eu não acredito que existam tantas pessoas que construíram um império do nada também. — Não é porque o senhor é próspero que precisa pisar nas pessoas. Como assim pisar nas pessoas? Eu não estava pisando em ninguém. Simplesmente dei-lhe uma ordem, bem simples por sinal. — Eu nunca pisei em ninguém. Do que você está falando? — Nunca pisou?! O senhor é um poço de arrogância. Todos nessa empresa têm pavor da sua intolerância. Ela parecia tão furiosa quanto eu e de repente já não sabia porque começamos aquela discussão. — Por que está tão zangada? O querido professor não fez o serviço direito ontem à noite? Os olhos dela se escancararam atônitos, seu queixo caiu. Porra! Eu tinha ido longe demais, mas era tarde para voltar atrás. — Como se atreve a zombar da minha vida íntima?! — Seus olhos faiscavam de raiva. — Não estou zombando. Só fiquei curioso sobre o que aconteceu entre vocês. Seus olhos raivosos se estreitaram sobre os meus. — Isso não é da sua conta! Furiosa, ela deu-me as costas e deixou a sala, os saltos das suas sandálias fazendo eco sobre o piso. Ela era uma das poucas pessoas que se atrevia a discutir comigo. Isso mostrava o quanto era corajosa, como fora quando cortara a garganta do seu padrasto tarado e quando deixara que sua filha, resultado dos estupros que sofrera, fosse levada. Será que ela nunca procurara a garota? Eu tinha curiosidade em saber. Precisei ligar para Lindsay me trazer o analgésico. O dia foi de muito trabalho. Enfrentei duas enfadonhas reuniões, analisei alguns documentos, assinei muitos papeis. No meio da tarde ainda havia muito a fazer, mas decidi parar para conversar com Dakota, não apenas porque ela tinha o direito de escrever seu trabalho, mas porque estar na presença dela havia se tornado a melhor parte do meu dia. Eu estava acomodado em uma das poltronas de couro quando ela entrou, sua beleza singela atraindo-me como um ímã. — Eu sei que o senhor é um homem muito ocupado e agradeço por me reservar um pouco do seu tempo. — Ela parecia ainda mais linda ao se esforçar para conter o rubor que se faz na sua face, quando examinei seu corpo de cima abaixo enquanto ela ocupava a poltrona diante de mim, pousando o computador novo sobre as pernas. Para falar sobre meu passado sombrio eu precisava de uísque e o saboreava lentamente do copo na minha mão, o qual não passou despercebido aos sagazes olhos de Dakota. — Um dia você vai entender porque estou te reservando esse tempo. A curiosidade se estampou no azul dos seus olhos. Fitou-me em silêncio por um longo momento, a sede por informações evidente na sua fisionomia. — Então vamos começar. Me conte como as cinco mulheres foram assassinadas. — Primeiro me conte como foi sua noite com o professor. Puta que pariu, o que havia de errado comigo? Eu não tinha nada a ver com a vida dela, sem falar que praticamente a empurrei para aquele encontro, quando me recusei a fazer amor com ela, ali sobre as mesmas poltronas onde estávamos sentados. — Não aconteceu nada de interessante. Conversamos um pouco, comemos e depois fomos para

casa. Cada um para a sua. O que não quer dizer que futuramente não acontecerá. O professor Anthony é um bom homem. Se era só isso, podemos continuar? Senti como se tivessem me livrado de um peso que estava em minhas costas, por saber que ela não transara com ele, o que como ela mesma disse, ainda podia acontecer, sem que eu pudesse fazer nada para evitar. Antes de começar a falar o que ela queria ouvir, fiz uma incursão mental, relembrando os acontecimentos do passado, quando minha vida começara a se tornar o inferno que era atualmente. Não era fácil falar sobre aquilo, mas era necessário, primeiro porque queria deixar a verdade devidamente registrada, segundo para atender ao pedido do meu irmão em deixar Dakota fazer seu trabalho. Era o primeiro contato por parte de alguém da minha família em anos, talvez uma chance de me reconciliar com todos antes de morrer. — Três anos depois que Elizabeth se matou me casei com Dayse, uma modelo que conheci em um evento. Acho que me casei mais pela beleza dela que por outra coisa. Nosso casamento durou pouco mais de um ano, até que o carro dela capotou na rodovia. A princípio achamos que tinha sido um acidente, mas logo a polícia encontrou evidências de que o freio do carro tinha sido cortado. Depois de muito investigarem o caso a única conclusão a que conseguiram chegar foi de que o assassino era alguém do nosso ciclo de amizades, já que tínhamos dado uma festa há dois dias e um dos convidados podia ter cortado os freios. Depois disso, passei um longo tempo sozinho. Até que conheci Kate, uma estudante de medicina. Não chegamos a nos casar, mas namoramos por mais de um ano. Ela foi envenenada no dormitório da universidade. Até então eu não tinha relacionado aquelas mortes a mim, acreditava que eram inimigos delas. Então me arrisquei uma terceira vez e me casei com Sheila, à filha de um dos acionistas. Estávamos em lua de mel na minha casa no lago. Saí para correr e quando voltei ela estava morta na cama, ainda de camisola. Foi envenenada com soníferos. A polícia constatou, mais uma vez, que o assassino era o mesmo e que se tratava de alguém próximo a mim, a ponto de conhecer aquela casa. Então me convenci de que o problema era comigo. Contratei os melhores investigadores particulares do país e nada descobriram. Depois disso, tentei dois relacionamentos secretos, mas foram descobertos e as mulheres mortas. Uma asfixiada no próprio apartamento e a outra atropelada. Depois disso desisti de me relacionar com qualquer mulher, que não fosse uma prostituta contratada. E isso já faz mais de cinco anos. — Vi uma expressão de piedade surgindo nos olhos de Dakota e fiquei ainda mais furioso. — Quem o senhor acha que pode ter feito isso? — Alguém que me odeia e me conhece muito bem. Mas não faço ideia de quem. — O senhor fez mal a alguém enquanto construía seu império? — Definitivamente não. — E quanto a Elizabeth, quem mais, além de sua família, a amava a ponto de culpá-lo pela morte dela? Algum amigo de faculdade era afim dela? Eu sabia onde ela queria chegar, todos os investigadores cogitaram a mesma hipótese. O autor desses crimes podia ser um dos nossos irmãos, ou mesmo alguém contratado pelos nossos pais, numa doentia vingança pela morte de Elizabeth, me fazendo pagar por tê-la tirado deles, porque ela escolhera ficar comigo e não com eles. Mas se nem os melhores investigadores descobriram o culpado, não seria Dakota a fazê-lo. — Todos os investigadores chegaram ao consenso de que pode ser alguém da nossa família, com raiva porque eu a destruí. Mas não encontraram provas contra nenhum.

— E quanto ao seu amigo David Smith. Vocês se conheceram na faculdade, será que ele não era apaixonado por Elizabeth a ponto de querer destruí-lo por tê-la tirado dele? Refleti por um instante em suas palavras. Era uma possibilidade que ninguém tinha levantado antes. Todavia, se David gostava de Elizabeth, jamais fiquei sabendo. — Acho que não. Nós três éramos muito amigos. Estávamos sempre juntos. E David tinha uma namorada naquela época. A Olívia. — Mas nunca se casou, até hoje. Pensei um pouco mais a respeito e concluí que seu ponto de vista fazia sentido. David era uma pessoa tão apagada que passara despercebido de qualquer suspeita durante todo esse tempo. O que parecia não fazer sentido nenhum, era que ele fosse um assassino. Eu o conhecia bem, o cara tinha dificuldade até em pedir um prato em um restaurante, por causa da timidez. Alguém assim não seria capaz de matar. Ou seria? Isso sem mencionar que nunca fiquei sabendo porque razão ele não se casara com Olívia, ambos estavam sempre juntos, agarradinho. Costumávamos sai os quatro: eu eles e Elizabeth. Os vi juntos por algum tempo depois que eu e Elizabeth nos casamos, mas logo passei a vê-lo somente sozinho e nunca me preocupei em perguntar o porquê. — Isso não faz o menor sentido. Mas ao mesmo tempo parece fazer. — Nada nessa história parece fazer sentido. Meu faro de jornalista me diz que pode ter sido ele. Agora contrate um bom detetive e mande investigá-lo. Ela estava me dando ordens? A Srta. Thompson era mesmo única. — Ainda há uma coisa nessa história toda que me intriga bastante. Por que Elizabeth se jogaria da sacada se vocês eram apaixonados? Eu não entendo. A convivência de vocês era ruim? Ela tocou no centro da ferida. Eu acreditava que Elizabeth era tão feliz quanto eu, em nosso casamento. Estávamos apaixonados, começando nossa vida, não fazia o menor sentido ela ter se matado. Partiu sem deixar nenhum bilhete de despedida ou explicando o motivo que a levara a fazer aquilo. Essa era a dor que jamais me deixaria, aquela que eu carregava em minha alma há quinze longos anos, na qual em breve daria fim. — Dakota... Acho melhor continuarmos outro dia. Estou cansado. Você pode aproveitar o restante do expediente para digitar seu trabalho, eu não me importo. O computador é seu. Pode usar à vontade. Ela me fitou com olhos de compaixão, o último sentimento que eu queria despertar-lhe. — Tudo bem. Continuamos depois. — Fiquei surpreso por ela concordar sem arranjar uma briga, como sempre fazia. — Hoje é o aniversário de Trinity. Faremos uma festinha no nosso apartamento. Nada de mais, só uma coisa simples. Se o senhor quiser aparecer por lá está convidado. Vou deixar o endereço na minha mesa. — Acho que não vai ser possível. — Vou deixar o endereço assim mesmo. Para o caso de mudar de ideia. Sem mais, ela deixou a sala, meus olhos hipnotizados pelo seu traseiro firme se movendo dentro da saia colada. Seguindo sua sugestão, telefonei para James, solicitando uma investigação minuciosa sobre David, embora duvidasse que algo seria encontrado. Elizabeth povoou meus pensamentos durante o restante da tarde e o início da noite. Quando todos deixaram a empresa, eu permaneci em minha sala mergulhado no meu familiar tormento, aquele

causado por não conhecer as razões que a levaram a tirar a própria vida, experimentando a mais nociva das dores, a dor que me acompanhava há anos, a suposição de que eu a levara àquilo, por me dedicar mais ao trabalho que a nós dois. Minha vida acabara no instante em que Elizabeth se jogara daquela sacada, o que se estendeu foram tentativas infelizes de reconstruir uma felicidade perdida. Ao emergi dos meus pensamentos, dei-me conta de que já era quase dez horas da noite e eu tinha esvaziado toda a garrafa de uísque. Precisava voltar para casa e dar continuidade à minha solidão por lá. Então, pendurei o paletó no braço e deixei a sala. No outro cômodo, percebi que Dakota tinha deixado, sobre sua mesa, o computador que eu lhe comprara, certamente por se negar a aceitar o presente. Mas que garota orgulhosa! O computador era dela. Sobre a mesa havia também um pedaço de papel com um endereço, provavelmente do seu apartamento, onde estava tendo a festa de aniversário da sua amiga. Seria uma verdadeira tentação, vê-la em um ambiente não profissional, com roupas de festa, solta e descontraída. Apenas vê-la já melhoraria minha noite. Resistir era uma verdadeira batalha. Por outro lado, ir lá significaria colocar a vida dela em risco, a não ser que eu levasse o computador e o usasse como pretexto. Parecia uma ridícula infantilidade, mas era exatamente o eu que faria. Decidido, peguei o notebook e saí. Embora estando tonto, pelo efeito do uísque, dirigi com rapidez rumo ao subúrbio da cidade.

CAPÍTULO VII O apartamento era pequeno demais para aquela quantidade de pessoas e isso porque Trinity convidara apenas nossos amigos mais íntimos da faculdade. Todos estavam ali, aqueles com quem convivemos durante quatro anos e que em breve veríamos apenas em raras ocasiões como aquela. A música tocava em volume alto, alguns dos jovens se balançando ao som de Beyoncé, outros apenas conversando. Trinity estava radiante, parecia uma princesa em meio aos convidados, usando um vestido branco sem alças com bojos em meia taça que se colava ao seu corpo até a cintura de onde partiam as várias camadas de saia, ressaltando sua silhueta bem desenhada e combinando perfeitamente com as sandálias de saltos altos da mesma cor. Seus cabelos loiros dourados estavam lisos em fio reto, caindo pelos ombros, realçando sua pele aveludada e seus olhos cor de mel. Ela era muito mais extrovertida que eu, conseguia se destacar em qualquer lugar por causa desse seu jeito despojado unido à sua beleza. Noah não saía do lado dela, embora evitasse tocá-la quando percebia que eu estava olhando, como se isso me importasse minimamente. Tom não ficava atrás no quesito elegância, usava jeans rasgados e uma camiseta com a estampa da sua banda de rock preferida na frente. Os cabelos curtos, loiros dourados estavam arrepiados como sempre. Quanto a mim, também optara por usar jeans e uma blusinha preta de alças, com strass no decote. Meus cabelos estavam soltos, como eu gostava e a maquiagem era discreta. Estávamos todos nos divertindo. Como sempre acontecia nas festas realizadas pelos acadêmicos. Bebendo cerveja, falando alto, interagindo. Quando a porta se abriu e Anthony entrou, todos pararam para observar, curiosos a respeito do que um professor fazia em uma festa de alunos, algo bastante incomum. Por sorte o professor Anthony era muito querido por todos. Trinity apressou-se em ir recebê-lo, cumprimentando-o com simpatia, Noah, Tom e alguns outros dos alunos que o conheciam fizeram o mesmo. Após os cumprimentos, os olhos dele percorreram toda a sala, detendo-se ao me encontrarem. Gesticulei com minha garrafa de cerveja em sua direção, em um cumprimento jovial. Não era exatamente ele o homem que eu queria que entrasse por aquela porta, mas esperar pelo Sr. Parker seria otimismo demais da minha parte. Tinha que me contentar com o professor. Embora fosse um homem muito bonito, com expressivos olhos azuis contrastando com a pele bronzeada e aquela barba ligeiramente crescida acentuando sua masculinidade, ele não me atraía. Nosso jantar durante a noite anterior servira apenas para me fazer ter mais certeza disto. Conversamos bastante, rimos e nos divertimos juntos, porém, em nenhum momento, eu deixara de pensar no Sr. Parker quando estava com ele. Fiquei com pena ao vê-lo vindo em minha direção e fui ao seu encontro, alcançando-o no centro da sala. — Bela festa. Me fez lembrar meus tempos de faculdade. — Seus olhos cálidos estavam cravados nos meus.

— Você ainda está em seus tempos de faculdade, só que em outro estágio. — Pensando desta forma, até que você está certa. — Quer uma cerveja? — Quero sim. Caminhamos lado a lado para a cozinha, todos os olhares se voltando para nós. Mostrei-lhe o freezer onde estavam às cervejas e o deixei se servir. Apesar dos seus trinta e poucos anos de idade, ele não se diferia tanto dos outros convidados. O jeans e a camiseta que usava lhe emprestavam um aspecto jovial. — Então, como foi o trabalho hoje? Muitas descobertas? Esse era o assunto preferido dele: o meu trabalho e principalmente minhas descobertas sobre Parker. — Sim, algumas. Mas como já te falei, não posso contar nada. — Entendo. Por causa do termo de confidencialidade. Se ele entendia por que perguntava? — Isso mesmo. Ele se colocou diante de mim, fitando-me profundamente nos olhos, antes de dizer: — Quero que você entenda, que independente do que acontecer. Do que você venha a descobrir, você é muito importante para mim e sempre será. Fitei-o desconfiada. — Como assim do que eu venha a descobrir? — Com o tempo você vai entender. De repente eu não tinha mais dúvidas: havia alguma ligação entre ele e Parker e eu precisava saber. — Seja sincero comigo, você conhece Parker de onde? — Por que você não pergunta isso a ele? Puta merda! Então realmente eles eram mais que simples conhecidos. Minha mente fervilhava em busca de respostas. De súbito, senti o peso de um olhar sobre mim. Instintivamente, virei naquela direção e meu coração deu um salto no peito. O Sr. Parker estava em pé no centro da sala, lindo! Com a camisa para fora da calça, os primeiros botões abertos, revelando um pouco dos músculos do seu peito. Tinha os cabelos meio emaranhados e sua postura altiva e imponente lhe conferiam um charme irresistível. Segurava um computador e mantinha seus olhos cravados em mim. Ele era o centro das atenções, as pessoas paravam de dançar ou de conversar para observá-lo. No instante em que Trinity caminhou em sua direção, a segui para assegurar-me de que ela não o expulsaria da festa, por achar que se tratava de um penetra. — Trinity esse é Richard Parker. — Apressei-me em falar. — Sr. Parker, essa é Trinity, a aniversariante. A expressão que surgiu nos olhos dela foi um misto de surpresa e admiração, o que não me espantava, afinal ele era dono de uma beleza admirável. Podia apostar que todas as mulheres faziam aquela expressão ao vê-lo pela primeira vez. — É um prazer te conhecer Trinity. — Ele falou, estendendo-lhe a mão, sem lhe dar muita atenção, seu olhar concentrado no professor Anthony, o que serviu para atiçar minha curiosidade. — Desculpe não ter trazido um presente, mas vir foi uma decisão de última hora.

— O prazer é meu. Sem problemas, quanto ao presente. Seja bem-vindo e fique à vontade. — Ela não desviava os olhos dele, capturada pelo seu magnetismo. — Vim trazer seu computador. — Ele estendeu o notebook para mim. — Não é meu. Não posso aceitar. — Que isso amiga, tá dispensando um computador novo? — Trinity tirou o computador das mãos dele e se afastou, talvez porque sabia que se ficasse eu a faria devolver. Contudo, eu tinha coisa mais interessante para fazer, como por exemplo, colocar Parker e Anthony cara a cara. Assim, segurei-o pelo pulso e o puxei na direção do professor, que continuava em pé, estático, perto do freezer. — Quero te apresentar uma pessoa. Ambos ficaram diante um do outro, encarando-se. Como eu esperava, pareciam nervosos e evidentemente se conheciam. — Como vai Anthony? — Parker indagou, estendendo sua mão, sua voz embargada de emoção, mostrando não apenas que se conheciam pessoalmente, mas eram íntimos. — Como vai Richard? — Anthony apertou a mão dele, seu olhar indisfarçavelmente hostil. — E então, qual dos dois vai me dizer de onde se conhecem? Eles continuaram se encarando em silêncio por um longo momento. Até que Parker falou: — Somos irmãos. Como assim irmãos? Eu tinha ouvido errado? Então, comecei a ligar as coisas e relembrei o momento em que ele me dissera que um dos seus irmãos se chamava Anthony. Mas o sobrenome do professor era outro. — Não. Não somos. — Anthony franziu o cenho, seus olhos reluzindo um ódio mortal. Com a voz alterada prosseguiu. — Ele é apenas um bastardo que meus pais fizeram a loucura de recolher no lixo e levar para dentro de casa para destruir a vida da minha irmã. Vi os lábios de Parker tremerem, a dor se refletindo em seus olhos lindos. — Eu não destruí a vida dela. — Sua voz soou tão alterada que atraiu a atenção de alguns estudantes. — Eu a amava tanto quanto você. Anthony o empurrou com as duas mãos, Parker sequer se moveu. Sem pensar, me coloquei entre os dois, de frente para Anthony. — Como você pode guardar tanto ressentimento depois de dezessete anos?! — Sua atitude me chocava. — Não foi Parker quem a empurrou daquela sacada. Ela pulou porque quis! A expressão com que ele me fitou, era assustadora. — Como você sabe? Você por acaso estava lá? Ele estava insinuando que Parker matara Elizabeth? Isso era terrível, mas não impossível. De repente eu já não sabia o que pensar. Virei para Parker e vi a angústia refletida em seus olhos castanhos. Por alguma razão que desconhecia, eu me recusava a acreditar que ele era um assassino. — Se você acha que ele é um assassino, por que me deixou escrever sobre ele? — Indaguei, olhando de volta para Anthony. Nesse instante percebi que alguém desligara o som e todos ouviam aquela discussão. — Você está do lado dele? — Anthony parecia atônito, em meio à sua fúria. — Eu não estou do lado de ninguém. Isso não é uma competição.

Anthony percorreu os dedos através dos seus cabelos curtos, como se tentasse se acalmar. — Eu queria fazer isso por você. Você queria tanto. Seu argumento não me convenceu. Na minha opinião ele desconfiava de Parker e se aproveitara do meu desejo de escrever sobre ele para obter mais informações. Era isso que o meu coração dizia e desde que perdera minha filha, por me recusar a fugir daquela casa de reabilitação, eu aprendera a nunca mais deixar de ouvir a voz do meu coração. — Não acredito em você. Por favor, vai embora daqui. — Dakota não faz isso. — Parker me alertou, sua voz grossa quase sussurrada atrás de mim. — Então é isso? Você caiu na lábia desse maldito? — Anthony percorreu seus olhos dos meus pés até minha cabeça, com um misto de fúria e desdém nos olhos azuis. — Eu não esperava isso de você. Pensei que você fosse diferente. Mas é só mais uma vadia tentando se dar bem na vida. A raiva queimou em minhas veias, minha mão estava a meio caminho do rosto dele, quando fui empurrada para o lado com um safanão, para em seguida ver Parker avançar para ele, esmurrandolhe a face, tão violentamente que um fio de sangue escorreu do canto de sua boca. Todavia, Anthony também era forte e ágil, em sua defesa, desferiu um soco na altura do estômago de Parker, o que pareceu enfurecê-lo ainda mais, pois este partiu para cima do professor como um touro indomado atacando sua vítima. Com punhos cerrados, passou a esmurrar-lhe hora no rosto, hora no abdômen, repetidamente, brutalmente. Sem que Anthony conseguisse se defender, até que Noah e Tom interferiram, tentando segurá-los. Como não conseguiram, outros rapazes vieram ajudar e logo ambos estavam imobilizados. — Isso não vai ficar assim. Você vai me pagar! — Anthony esbravejou, seu olhar mortal cravado no rosto de Parker. — Tira ele daqui. — Falei aflita e os rapazes o conduziram para a saída, desaparecendo com ele porta afora, enquanto os outros libertavam Parker. — Me desculpa. Eu não queria estragar sua festa. — Eu esperava tudo daquele homem, menos ouvi-lo proferir um pedido de desculpas. — Foi ele quem estragou. Fico impressionada como uma pessoa pode guardar tanto ódio durante tanto tempo. — Não é apenas ele. Toda a minha família me odeia da mesma forma. — Pelo que entendi, eles acham que você empurrou Elizabeth da sacada. É isso? Ele fitou-me em silêncio por um longo momento antes de responder. — Sim. É isso. Fitei-o desconfiada. E se Anthony e toda a sua família estivessem certos? E se Parker realmente matara Elizabeth? E se fosse o autor da morte das outras mulheres também? Eram possibilidades que mereciam ser consideradas, afinal se os membros da sua família adotiva o odiassem a ponto de sair matando todas as mulheres com quem ele se relacionava, seria mais vingativo matar a ele mesmo. Na realidade, nada parecia fazer sentido naquela história. — E você acha que esse ódio que eles sentem por você motivou um deles a cometer todos aqueles assassinatos? — Quais assassinatos? — A voz de Trinity alcançou-me e só então percebi que ela ouvia a conversa de perto, totalmente alarmada. — Depois eu te conto Trinity. — Me conta agora. No que você tá se metendo?

Fiquei perdida entre ela e Parker, até que ele falou: — Já vou indo. — Segurou-me pelo braço, puxando-me para a porta, colocando-nos para fora, com sua habitual postura de autoridade impossível de ser contestada. Estávamos no corredor, sem que pudéssemos mais ser ouvidos, quando ele prosseguiu: — Você precisa tomar muito cuidado, Dakota. Não alimente os pensamentos de Anthony a nosso respeito. Não o deixe acreditar que há algo entre nós. Você percebeu o quanto ele me odeia, não foi? Então, assim é possível tirar conclusões. Eu entendia o que ele queria dizer: que Anthony podia ser o assassino e me mataria por ter saído da festa acreditando que estávamos tendo um caso. A teoria fazia sentido, mas eu ainda não sabia direito em quem acreditar. — Não se preocupe comigo. Sei me defender. — Eu acredito em você. Mas mesmo assim, evite sair sozinha, ok? Ele se despedia, mas eu não queria que fosse. Gostaria que me convidasse para sair, depois a ir a sua casa, ou que ficasse um pouco mais na festa. Estar perto dele estava se tornando quase uma necessidade, apesar de todas as suspeitas, e isso me assustava. — O senhor não precisa ir agora. Fique um pouco na festa e se divirta. — Acredite, ficar aqui com você era o que eu mais queria. Mas não posso. Sem mais, ele acariciou-me a face, muito suavemente, seu toque tão simples despertando uma tempestade de emoções no meu interior. Em seguida, deu-me as costas e partiu, suas últimas palavras passeando pela minha mente, em busca do verdadeiro sentido. Ele estava dizendo o que e eu já sabia: que me queria, mas tinha receio em colocar minha vida em risco. Até quando ele pensaria assim? Com o fim de toda aquela tensão, decidi aproveitar a festa. Bebi todas, dancei e me diverti, enquanto fugia das perguntas de Trinity sobre o que ela ouvira. Depois do episódio, nenhum dos rapazes se atreveu a me paquerar, o que considerei um fator positivo, pois naquele momento da minha vida eu tinha pensamentos para um homem apenas: aquele que não me queria. Por volta das três horas, a maioria dos convidados já tinham ido embora, quando então me dirigi ao meu quarto, completamente bêbada e me deitei sem trocar de roupas, adormecendo rapidamente. Acordei na manhã seguinte com uma terrível dor de cabeça, que piorou quando constatei que estava atrasada para o trabalho. Puta merda! Meu terceiro dia de trabalho significativo e eu já estava atrasada. Tomei um banho muito rápido, vesti um dos vestidos de perua que Tom me comprara, ajeitei os cabelos e saí. Na sala a bagunça estava assustadora. Havia garrafas de cerveja vazias espalhadas para todos os lados; os cinzeiros estavam abarrotados de pontas de cigarros; os móveis fora do lugar; duas pessoas dormiam por ali, no chão. Dirigi em altíssima velocidade até Downtown e ainda assim cheguei quase nove horas. — Você está totalmente atrasada. Não admitimos esse tipo de conduta nesta empresa. — Lindsay me repreendeu, com rispidez, no instante em que dei meu primeiro passo para fora do elevador, o que, unido à minha dor de cabeça, quase me fez voar no pescoço dela. Me detive apenas por saber que não valia à pena. — Deixe para repreender os funcionários quando você tiver sua própria empresa. Enquanto isso pode me deixar em paz. — Retruquei. Ela me encarou com olhos furiosos.

— Não pense que transando com o chefe você terá regalias. Você é só mais uma que passa pela cama dele. Como tantas outras de quem ele sequer lembra o nome. A raiva pipocou em minhas entranhas. Então ele transava com todas, menos comigo? Senti que as lágrimas ameaçavam aflorar em meus olhos, mas não daria à Lindsay o prazer de me ver chorando. — Inclusive com você? — Isso não é da sua conta! Ela pegou alguns papéis de sobre a mesa e se dirigiu para a sala dele, a certeza de que tinha sido, ou ainda era sua amante me sufocava, deixando meu coração apertado no peito, sem que eu compreendesse a razão já que não tinha nada com ele. De repente eu me sentia uma intrusa entre eles dois por ocupar, com meu trabalho, o tempo que ele poderia estar dedicando a ela e às outras com quem transava. Droga! Uma longa e interminável hora depois, Lindsay deixou a sala de Parker, com a fisionomia tão contraída quanto quando entrara. — Ele quer falar com você. — Ela disse, sem me encarar, tomando seu lugar à mesa. Encontrei-o sentado atrás da sua mesa, impecável, lindo a altivo como sempre, a paisagem urbana de Houston às suas costas fazendo-o parecer ainda mais poderoso. — O senhor quer falar comigo? — Permaneci em pé, o mais longe possível dele. O Sr. Parker me examinou atentamente no rosto, antes de varrer meu corpo com aquele olhar faminto, como se me devorasse em pensamentos. Talvez fosse sua forma habitual de olhar para todas as mulheres, eu que era idiota a ponto de acreditar que havia algo mais por trás daquele gesto. — Pelo tamanho das suas olheiras e considerando o seu atraso, parece que a festa de ontem de estendeu por muito tempo depois da minha saída. — Era uma festa. Festas não terminam cedo. — Se divertiu muito? — Sim. Mas se o senhor me chamou aqui para falar sobre minha vida particular, acho melhor gastar o seu tempo com as suas outras funcionárias. Tenho certeza de que Lindsay apreciaria bastante isso. Seus olhos se estreitam confusos sobre os meus. — Do que você está falando? — O senhor sabe do que estou falando. Lindsay me contou sobre sua conduta com as funcionárias. — Ah, sei. Lindsay. Ela está magoada, não acredite em tudo o que diz. — E por que ela está magoada? — Isso não vem ao caso. — Por acaso o senhor dormiu com ela algumas vezes e depois a dispensou? Com quantas exatamente já fez isso? Eu já não conseguia conter a raiva dentro de mim. — Por que a curiosidade? Pretende colocar isso na minha biografia? — Talvez. — Então coloque que eu não posso ter um relacionamento sério, mas nem por isso vou deixar de fazer sexo, porque transar é muito bom. Puta merda! Eu podia ter ido dormir sem essa. Agora meu rosto estava queimando de vergonha. — Mas não foi para falar sobre minhas puladas de cerca que te chamei aqui. Aconteceu um golpe político na maior empresa petrolífera do Brasil e o preço do petróleo cresceu tanto por lá que o país

vai preferir importar. Como era esperado, eu fui o primeiro fornecedor a ser procurado, mas quero ver de perto como está à situação. Então viajaremos para o Brasil depois do almoço. Se você quiser ir para casa arrumar suas malas, pode ficar à vontade, mas esteja pronta às duas horas. Lentamente, digeri suas palavras, perguntando-me se ouvira claramente. Ele queria que eu o acompanhasse em uma viagem de negócios a um país desconhecido, cuja língua apenas seus nativos sabiam falar? — Eu não entendo nada dos seus negócios. Tenho certeza de que Lindsay será mais útil que eu nessa viagem. — O que eu estava dizendo? Minha primeira oportunidade de ficar sozinha com ele em lugar exótico e eu tentava empurrar Lindsay para o meu lugar. Havia alguma coisa de errado comigo, só podia. — Isso já está decidido. Você será minha secretária nessa viagem. Não há nada de mais a fazer. Apenas as atas das reuniões, atender ao telefone e preparar o café. Além do mais serão apenas três dias, no máximo. — Não tenho certeza se vou conseguir desempenhar o papel de secretária numa coisa tão importante. — Então não desempenhe. Eu me viro sozinho. Mas comigo você vai. Eu não vou te deixar aqui sozinha com Anthony solto por aí achando que tenho um caso com você. Ah. Então o problema era Anthony. Ele estava tentando me proteger e eu não sabia se considerava isso uma atitude linda e romântica ou se o odiava pelo fato de me julgar tão frágil, a ponto de não saber me defender. — O senhor é quem sabe. — Dei de ombros antes de me virar de costas. — Estou indo para casa arrumar as malas. Não me culpe por arrancar alguns dentes da sua verdadeira secretária caso ela venha com gracinhas para o meu lado. Sem mais, deixei sua sala. Ao atravessar a porta, percebi que Lindsay me observava furiosa enquanto eu organizava minha mesa antes de sair. Estava esperando ela dizer apenas uma grosseria para lhe mostrar quão quente era o sangue nas minhas veias, mas ela não disse nada. Apesar de tudo, eu tinha pena dela. Afinal quem podia culpá-la por odiar uma pessoa que estava tomando seu lugar nessa viagem?

CAPÍTULO VIII

Quando voltei ao apartamento, Trinity ainda não tinha saído para o trabalho e fui obrigada a enfrentar um verdadeiro interrogatório sobre a discussão que ela presenciara entre Parker a Anthony na noite anterior. Ela queria saber de tudo e eu não podia lhe contar nada, por causa de termo de confidencialidade. Como se seus instintos a alertassem do perigo, ela usou todos os argumentos possíveis para tentar me convencer a desistir daquele trabalho e ir escrever sobre alguém menos complicado e perigoso. Mas eu jamais desistiria. Não apenas porque aquela biografia garantiria o sucesso do meu futuro profissional, mas porque se tornara imprescindível desvendar todo aquele mistério que girava em torno de Richard Parker. Almoçamos o espaguete com queijo que ela preparou, enquanto mudávamos o foco da conversa para o seu relacionamento com Noah. Ela estava ansiosa para que ele a pedisse em casamento, mas eu achava essa decisão muito precipitada, pois apesar de namorarem a quase quatro anos, ambos estavam apenas começando suas vidas. Às duas horas em ponto, quando a campainha tocou, eu estava com as malas prontas. Escolhera levar roupas de calor, pois ouvira dizer que o Brasil era muito quente. Para a viagem, usava jeans, regata com renda no decote e tênis, afim me sentir confortável durante o voo. Esperava encontrar Parker ao abrir a porta, mas no lugar dele viera um homem franzino, usando um uniforme de motorista. — Sou Ethan, o motorista do Sr. Parker. Ele me mandou levá-la ao aeroporto. — O homem falou ao observar meu espanto. — Claro. Está tudo pronto. Despedi-me de Trinity, que faltou ao trabalho para me ver partir, com um abraço apertado e deixei que o homem carregasse minha mala prédio abaixo. Na enorme e luxuosa limusine, ele nos conduziu não ao aeroporto da cidade, como eu esperava, mas a um particular, situado nas proximidades de Houston. Chegando lá, fui conduzida ao avião de grande porte, cujo interior me deixou estupefata. Era simplesmente incrível, o lugar parecia uma sala confortável, decorada com móveis sofisticados. Havia poltronas de couro, carpete felpudo, uma mesinha de centro com tampo de vidro, frigobar e as paredes eram pintadas com uma cor escura. O ar condicionado deixava o ambiente ainda mais confortável. — Gostou? — Richard surgiu de um corredor, observando meu estado de perplexidade, com aquele olhar que parecia estar zombando de mim. Ele estava lindo como sempre. Usava uma camisa branca social impecável, com as mangas enroladas até os cotovelos e calça cinza. Meu coração batia mais depressa quando eu olhava para ele. — Uau! É lindo! — Depois que levantarmos voo, te levo para ver o resto. Sente-se. Acomodei-me em uma das poltronas e fiquei sem fôlego quando ele se inclinou diante de mim

para colocar meu cinto de segurança. O calor que emanava dele, seu cheiro másculo e gostoso me atingiam ferozmente, despertando-me o mais primitivo dos desejos. — Vamos direto ou faremos alguma escala? — Perguntei, com a intenção de amenizar o desejo lascivo que corria pelo meu corpo, quando o vi sentar-se na poltrona diante de mim, — Vamos direto. Será um voo de dez horas. Pousaremos no aeroporto de Salvador. Uma cidade neutra que nossos futuros clientes escolheram para fazer a reunião. — Ele fez uma pausa antes de continuar. — Você quer comer ou beber alguma coisa? — Uma água. Usou o interfone para fazer o pedido e minutos depois uma moça morena, usando um uniforme azul claro tão colado que revela cada uma das suas curvas generosas, surgiu dos fundos do avião carregando uma bandeja com água mineral e uma dose de uísque. Ela sorriu largamente para o Sr. Parker, antes de nos servir e ir embora rebolando descaradamente os quadris. Será que não existia uma mulher na face da terra que não flertasse com aquele homem? Enquanto ingeríamos nossas bebidas o avião levantou voo, tão suavemente que só percebi o ocorrido porque estava observando a janelinha redonda. — Acho que dez horas é muito tempo para ficar sem fazer nada. Podíamos aproveitar para dar prosseguimento ao meu trabalho, o que acha? — Indaguei. — Srta. Thompson, você não consegue pensar em outra coisa? — E o que há para se pensar quando se está com um homem como o senhor? A expressão que surgiu em seus olhos foi tão maliciosa e ao mesmo tempo fervorosa que senti meu rosto corar, meu sangue incendiando nas veias, em um misto de vergonha e desejo. Puta merda! Eu precisava pensar antes de falar, quando estava na presença daquele homem. Mas era claro que havia muitas coisas para se imaginar quando se estava com um homem como ele. Todas as mulheres imaginavam o mesmo, comigo não era diferente e ele sabia disso, por essa razão me olhou daquela forma quase escandalosa. — Se você não consegue pensar em outra coisa quando está comigo, então vamos ao que te interessa. Mas antes você vai conhecer o resto do avião. Sem esperar resposta, ele tirou meu cinto de segurança, excitando-me novamente com sua proximidade, segurou-me pelo pulso e me puxou na direção do corredor por onde saíra antes. Era um corredor pequeno, com duas portas de cada lado e uma aos fundos. Ele abriu a dos fundos e pude ver um quarto tão luxuoso quanto à sala, com cama de casal, carpete, abajures e um banheiro. Minha mala estava ao lado da cama. — Você pode descansar aqui durante a viagem se quiser. — Havia malícia em sua voz e não pude deixar de me lembrar da forma íntima como a moça que nos serviu o encarara. Talvez ele a trazia para um desses quartos quando viajava sozinho. — Está bem. — Concordei resignada. Passamos novamente pela sala e seguimos pelo corredor por de onde a morena saíra. Havia uma cozinha muito bem equipada e limpa ali. Com duas funcionárias trabalhando. De volta à sala, nos acomodamos em nossas poltronas. Havia mais quatro delas desocupadas, deixando evidente que o avião carregava no máximo seis passageiros. Ele bebeu um grande gole do seu uísque, como se a bebida o ajudasse a lembrar do passado. — O que você quer saber primeiro? — Indagou. Tirei o notebook que ele me dera da minha bolsa, notando a satisfação com que ele observou o

aparelho. — Fale-me sobre sua infância. Como era seu relacionamento com sua família. Pela primeira vez desde que o conheci, vi o Sr. Parker falar sobre sua vida sem aquele habitual brilho de angústia no olhar e isso me fez sentir culpada por tê-lo feito sofrer durante as outras entrevistas, com as lembranças de um passado que o machucava. Eu sabia o quanto era doloroso recordar aquilo que nos magoava. Pelo menos me reconfortou saber que ele tivera uma infância feliz, sempre cercado pelo amor de Elizabeth, embora não tivesse muita atenção por parte dos pais adotivos e quanto mais ele falava, menos eu compreendia porque ela suicidara. A noite podia ser vista através da janelinha do avião quando cheguei à conclusão de que ouvira o suficiente para umas trinta páginas de texto, se não parasse para registrar tudo antes de ouvir mais, acabaria me esquecendo. — Vamos parar por hoje. Tenho que escrever isso antes de receber mais informações. — Finalmente! Pensei que passaríamos a viagem inteira nessa situação. — Ele estava sendo sarcástico e isso me irritava. — Ainda temos muitas horas de voo pela frente. Quer jantar agora e descansar um pouco? Apesar do tom de indagação, suas palavras soavam mais como uma ordem. — Sim. — Carne ou frango? — Carne. Ele usou o interfone para dar as ordens e pouco depois à morena apareceu carregando uma bandeja, sem deixar de rebolar, exibindo seu corpo voluptuoso, do qual o Sr. Parker parecia gostar, pois olhava descaradamente. Ela serviu o assado de carne com salada sobre a mesinha de centro e pude jurar que deu uma piscadela para ele antes de se retirar. Puta que pariu! Certamente no instante em que eu pegasse no sono eles dois se atracariam. Como o Sr. Parker podia se denominar um homem solitário se para onde ia havia mulheres à sua disposição, com quem aparentemente já tivera relações? Fizemos a refeição em silêncio, embora nossas trocas de olhares falassem por nós, evidenciando o quanto nos queríamos. Contudo, apesar de desejá-lo com todas as minhas forças, eu já não tinha certeza se seria capaz de me entregar a um homem que tinha tantas mulheres à sua disposição, sabendo que seria por apenas uma ou algumas noites, como tinha sido entre ele e suas demais funcionárias. Eu não queria ser apenas mais uma em sua cama, para depois ter que vê-lo me ignorar para dar toda a sua atenção à sua próxima conquista, como acontecia com Lindsay e aquela comissária, a quem ele vinha ignorando para dar sua atenção somente a mim. Eu não trabalharia com ele por muito tempo mais, mas se me entregasse, seria tempo suficiente para me tornar uma Lindsay na sua vida. E definitivamente, não queria isso para mim. Após a refeição o Sr. Parker segurou-me pela mão e me conduziu para a cabine onde estava minha mala, surpreendendo-me ao entrar junto comigo no pequeno espaço, fechando a porta atrás de nós. Olhei em seus olhos e não tinha nenhuma dúvida de que o queria, com uma urgência desesperada, porém o temor de ser usada e jogada fora falava mais alto dentro de mim. — Se o senhor puder me dar licença, eu gostaria de descansar um pouco. — Você terá muito tempo para descansar no Brasil. Agora tenho outros planos para nós. — Como assim?! Ele não podia decidir por mim! Contudo, o Sr. Parker sabia ser persuasivo quando queria.

Segurou minhas mãos entre as suas, fitou-me profundamente nos olhos e continuou falando. — Acredite Dakota. Eu tentei evitar que isso acontecesse, mas já não tenho mais forças para lutar contra o desejo que sinto por você. Não suporto mais olhar para você todos os dias e não te tocar; passar as noites sozinho, imaginando que você possa estar com outro homem. Eu te quero demais e não ter você está se tornando uma tortura mais dolorosa do que eu possa suportar. Um turbilhão se pensamentos invadiram minha mente. Pretendia perguntar-lhe se essa era a razão de ter me trazido naquela viagem, mas antes que pudesse proferir as palavras, meus lábios foram selados pelos seus, num beijo que me deixou quase sem fôlego. Tentei resistir, mantendo os lábios cerrados, mas foi impossível, as sensações que aquele simples contato me despertava era mais intensa do que eu pude controlar e logo entreabri os lábios para receber a língua dele que penetrou minha boca, se movendo dentro dela, voluptuosamente, meus instintos me fazendo corresponder com a mesma urgência, como se estivéssemos famintos um pelo outro. Ele segurou-me firmemente pelas costas, puxando meu corpo para si. Senti o calor que emanava dele, os músculos do seu tórax pressionando meus seios, sua ereção se fazendo na altura do meu ventre e tudo se perdeu no desejo escaldante que tomou conta de mim. Já não me recordava do que pretendia dizer a ele antes. Talvez não me recordasse sequer do meu nome. E foi nesse instante que a minha decisão de evitá-lo, para não me tornar apenas mais uma em sua lista, sucumbiu à luxúria desenfreada que pulsava em minhas entranhas, tornando-me alheia a tudo mais que não a cada toque seu. Enlouquecida, enterrei meus dedos nos seus cabelos curtos atrás da sua cabeça, fazendo uma suave pressão, puxando-o mais para mim, para que ele soubesse o quanto eu o queria, e queria desesperadamente. Com mãos urgentes, puxei a barra da sua camisa de dentro da sua calça e procurei os músculos do seu tórax, acariciando-os com as pontas dos dedos. Como era bom tocá-lo! Não havia palavras que pudessem descrever a sensação de senti-lo diretamente, sem as barreiras das roupas. Seus músculos eram duros, bem definidos e sua pele parecia em chamas sob meu toque, o que me deixava loucamente excitada. Esfreguei meu corpo contra sua ereção, por sob as roupas, e fui recompensada por um gemido abafado que partiu dos lábios dele. Inebriada, comecei a desabotoar sua camisa, até conseguir tirá-la do seu corpo, maravilhada com a virilidade e solidez dos músculos do seu peito. O Sr. Parker escorregou sua boca para meu pescoço, beijando minha pele suavemente, fazendo-me sentir como se estivesse em chamas, ao mesmo tempo em que usava as duas mãos para deslizar as alças da minha regata para baixo, passando-as pelos ombros, deixando a peça de algodão enroscada na minha cintura, para em seguida abrir o fecho do meu sutiã, com habilidade, afastando-se o suficiente para contemplar meus seios desnudos. — Você é ainda mais linda que nos meus sonhos. — Ele sussurrou, com a respiração ofegante. Normalmente eu ficaria constrangida em estar nua diante de um homem, foi assim durante toda a minha breve vida sexual. Mas com o Sr. Parker eu me sentia totalmente à vontade, desinibida e apesar de todas as suspeitas que havia sobre ele, eu jamais me sentira tão segura como naquele momento, na sua inigualável presença. Ele voltou a beijar-me na boca, com urgência, me deixando sem chão. Segurou-me firme pelas costas e pressionou meu corpo no seu, com mais força. Senti o contato direto dos meus seios com o

seu tórax rochoso e quase enlouqueci de desejo, um gemido selvagem escapando-me dos lábios. — O que foi minha menina? Está gostando disto tanto quanto eu, não é? — Ah, sim... Muito... Desde a primeira vez que o vi... Desejei que isso acontecesse... — eu tinha dificuldade para falar, por causa da respiração pesada. Sem deixar de me segurar pelas costas, ele me fez inclinar para trás, enquanto sua boca voltava a passear sobre minha pele em chamas, trilhando o delicioso percurso até meus peitos. Ao alcançar um deles, lambeu meu mamilo duro, ritmadamente, para em seguida sugá-lo com força, tão gostosamente que não contive outro gemido. Partiu para o outro seio e o colocou inteiro na boca, mamando sem dó, como se quisesse devorá-lo. Eu estava encharcada no meio das pernas, como estive em raríssimas ocasiões. Se ele me tocasse ali, mesmo que de leve, eu gozaria. Como se soubesse exatamente o que eu queria, o Sr. Parker ergueu-me em seus braços, carregando-me para a cama, estendendo-me sobre o colchão, colocando-se sobre mim. Com gentileza, abriu o zíper do meu jeans e o desceu lentamente, até tirá-lo pelos pés, fazendo o mesmo com a calcinha. Eu estava completamente nua diante dos seus olhos cobiçosos, carregados de luxúria, enquanto meu peito subia e descia por causa da minha dificuldade em puxar o ar. Se ele não voltasse a me tocar logo, eu seria capaz de morrer. Como se lesse meus pensamentos e estivesse determinado a saciar o meu mais lascivo desejo, ele inclinou-se para beijar minha barriga, sua língua quente e úmida passeando sobre mim, excitando-me cada vez mais. Deslizou até meu sexo, lambendo minha vulva, superficialmente, deixando-me louca com a expectativa do que faria em seguida. Todavia, sem que eu esperasse, ele puxou-me com um safanão, colocando-me de bruços, depois de quatro. Empurrou meu torso para baixo até que meu rosto encontrasse o colchão e segurou meus quadris para empinar mais minha bunda, deixando meu sexo totalmente exposto naquela posição. Em seguida, abriu mais minhas pernas e colocou sua boca em mim, onde eu era mais sensível. — Ahhh! — Gritei, descontrolada de tesão. Ele enfiou sua língua habilidosa na minha vagina lambuzada, movendo-a para fora e para dentro, fodendo-me assim, enlouquecendo-me, para logo deslizá-la até meu clitóris, estimulando-o com movimentos rápidos e circulares. Deixei escapar outro grito, alucinada, enlouquecida de prazer e quando ele prendeu meu clitóris ente seus lábios, sugando-o, eu não mais consegui me segurar e explodi num orgasmo arrebatador, que quase me fez perder os sentidos. Puta merda! Como aquilo era bom! Por que esperamos tanto por isso? O Sr. Parker parecia se alimentar do meu gozo, chupando a entrada do meu canal. Permaneci naquela posição, aguardando pelo seu comando. Olhei para trás e vi quando ele ergueu o seu corpo, colocando-se em pé sobre o colchão, livrando-se da sua calça e da cueca. Pernas longas, peludas, e firmes revelaram-se diante dos meus olhos, todavia o que me deixou extasiada foi o membro, grande, grosso, convidativamente duro. Tirou um pacote de preservativos do bolso, abriu a embalagem com os dentes e desenrolou o látex com cuidado, para em seguida colocar-se de joelhos atrás de mim, esfregando a cabeça do seu pau no meu sexo lambuzado, me fazendo tremer em expectativa. Bastou um movimento dos seus quadris e ele estava dentro de mim, preenchendo-me completamente com seu tamanho, me proporcionando um prazer inigualável, como eu jamais

experimentara antes. — Puta que pariu! Que bocetinha apertada e quente! Vou me acabar nessa boceta! — Ele sussurrou, quase em um grunhido. Puxou seus quadris para trás e os trouxe novamente, numa estocada rápida, brusca, deliciosa. Repetiu o movimento e desta vez foi ainda mais fundo dentro de mim, tão prazerosamente que perdi o controle sobre mim e voltei a gritar incessantemente, as lágrimas brotando dos meus olhos sem que eu compreendesse a razão. Ele sibilava, arremetia-se contra mim cada vez mais depressa, mais fundo, o som dos nossos corpos se chocando, violentamente, ecoando pelo aposento. Suas mãos seguravam firmemente meus quadris, como se para me impedir de sair do lugar caso eu tentasse escapar. — Ah, gostosa, me pede para te foder. — A voz dele era rouca e meio selvagem. — Me fode... Me fode muito... — Balbuciei, entre um gemido e outro. — Gosta do meu pau na sua boceta? — Ah... Sim... Como gosto... — Então diz que vai dar para mim todo dia. — Mesmo excitado, com tom de selvageria, sua voz não perdia o timbre de autoridade e sem que eu compreendesse isso me excitava ainda mais. — Ah, sim... Todo dia... Quero esse pau na minha boceta toda hora... Com um grunhido, ele segurou meus cabelos, puxando minha cabeça para trás e para o lado, enterrou sua língua na minha boca, lascivamente e estocou com mais força dentro de mim. O que foi a minha perdição, pois logo um novo orgasmo se formou nas minhas entranhas. Como se percebesse o que acontecia, o Sr. Parker parou, virou-me de frente, com mãos nada gentis, porém incrivelmente excitantes como tudo nele e montou-me, encaixando seus quadris entre minhas pernas, penetrando-me novamente com força, indo fundo no meu interior, meu canal latejando em volta da sua virilidade. — Quero assim, minha menina. Quero olhar nos seus olhos enquanto goza. Ele voltou a me beijar na boca, ao mesmo tempo em que reiniciou as estocadas, enlouquecendome de prazer. Contornei seus quadris com minhas pernas e me movimentei sob seu corpo, levando-o mais fundo em mim. A forma como nossos corpos se colava de cima abaixo, pele com pele, movendo-se numa dança harmoniosa e prazerosa, me despertava sensações indescritíveis que me incentivavam a entregar-me cada vez mais à luxúria louca que me engolfava. Era tudo muito intenso e novo para mim. Não demorou muito, logo meu corpo enrijeceu, sucumbindo ao gozo que ameaçou me estilhaçar. Parker ergueu seu rosto para fitar-me nos olhos e hipnotizada pela intensidade do seu olhar, me deixei explodir num orgasmo arrebatador. Meu corpo arqueou sem que eu pudesse controlar e lancei minha cabeça para trás, gritando, gemendo e chorando como uma alucinada. Antes que eu parasse, Parker gozou dentro de mim, seu corpo ondulando sobre o meu, seus espasmos intensificando meu prazer, até que ficamos moles sobre o colchão. Parker beijou-me demorada e vagarosamente nos lábios antes de escorregar para o lado e tirar o preservativo. Puxou-me para ele, aninhando-me em seu peito largo. Naquele instante o silêncio era quebrado apenas pelo som frenético dos nossos corações acelerados.

CAPÍTULO IX Durante todos os meus vinte e dois anos de vida, jamais passara pela minha cabeça que sexo podia ser tão bom. Por que não era assim com Jacob, meu namorado do reformatório? Por que fora tão repugnante quando meu padrasto me tocara? Eu simplesmente não conseguia entender. Teria sido especial também para Parker? Obviamente não. Ele era um homem experiente, bom de cama. Devia ser assim com todas que passavam pelos seus braços. — Por que você está se tremendo, Dakota? — Parker indagou como se emergisse do seu próprio mar de pensamentos. — Eu não sei. — Você não está se sentindo bem? — Pelo contrário. Nunca me senti melhor antes. Ele sorriu e era o sorriso mais encantador da face da terra. Acariciou meus cabelos com a ponta dos dedos. — Acho que não te trataram muito bem na cama, minha menina. Processei suas palavras e senti meu corpo estremecer violentamente. Ele estava se referindo ao que acontecera entre mim e meu padrasto, um assunto que tanto me envergonhava, me fazia sentir inferiorizada, suja e ao mesmo tempo uma coitada. Por que ele tinha que mencionar algo que eu queria tanto esquecer? Precisava ficar um pouco sozinha para esconder minha imensurável vergonha. — Preciso ir ao banheiro. — Minha voz soou trêmula sem que eu pudesse controlar. Não compreendia porque estava tão fragilizada. Contudo, quando tentei me levantar, ele me impediu, segurando-me firmemente contra seu corpo. — Você não vai mais a lugar nenhum sem mim. E nem tente fugir porque isso aqui é um avião. Agora me diga o que está te incomodando. Seu tom era firme e autoritário, como se suas palavras fossem incontestáveis. — Não tem nada me incomodando. Só quero fazer xixi. Não posso? Ele se colocou sobre mim, aprisionando-me sob seu corpo grande, como se realmente fosse o meu dono. — Pode desde que eu vá junto. Ele estava falando sério? — O senhor é quem manda. Ele voltou a sorrir, um sorriso tão estonteante que salivei, desejando beijar aquela boca linda. Como alguém podia ser tão sedutor mesmo quando estava sendo insuportável? Então, libertou-me para que me levantasse e realmente me seguiu até o banheiro, um espaço pequeno demais para uma pessoa, imaginava para duas. O que aconteceu em seguida foi totalmente constrangedor. Sentei-me completamente nua no vaso, sob o olhar atento dele e agradeci aos céus que minha bexiga colaborou e não me deixou passar por mentirosa. Quando terminei, ele segurou-me a mão e me puxou para o minúsculo boxe, colocandonos sob os jatos da água de temperatura agradável do chuveiro. Ali, pude observar seu corpo

completamente e fiquei extasiada com sua beleza. Ele tinha o tórax e os braços musculosos, sem exagero; as coxas eram grossas e firmes, como as de um atleta; seus ombros eram largos e formavam um conjunto perfeito com os quadris estreitos; havia uma única trilha de pelos negros que partia de seu umbigo e terminava na sua pélvis ligeiramente peluda. Bastou olhar para sua nudez, para que eu ficasse sem fôlego, o formigamento se fazendo na altura do meu ventre. — Agora vou te dar um banho. — Ele pegou uma esponja, lambrecou-a generosamente com sabonete e começou a deslizá-la sobre minha pele, suavemente, começando pelo pescoço, descendo pelos ombros. Contornou meus seios, sem tocar meus mamilos, como se propositalmente quisesse me deixar em expectativa e continuou o percurso até meus tornozelos, ignorando minhas zonas erógenas, numa espécie de tortura. Mas era uma tortura deliciosa, como tudo o que Parker fazia. Em questão de minutos eu já não me recordava do motivo que me levara a deixar a cama, minha mente sucumbindo às sensações que meu corpo experimentava. Eu já não conseguia mais pensar, mas apenas sentir. Apreciava, deliciada, o desejo crescendo dentro de mim à medida que Parker escorregava aquela esponja por cada centímetro da minha pele e ver que ele sentia o mesmo, me deixava ainda mais enlouquecida. Eu permanecia quieta, apenas sentindo, deixando que ele me desse prazer. Por fim ele pareceu se compadecer de mim e tocou-me onde eu mais queria, enfiou a mão entre minhas pernas e esfregou a esponja macia sobre meu sexo. Ai, porra! Como aquilo era bom. Ensandecida de luxúria, lancei minha cabeça para trás e sibilei, minha vagina palpitando de tesão, minha umidade se intensificando. — Gosta disso, não é? — Ele indagou sua respiração pesada denunciando o quanto também estava excitado. — Ah... Sim... Com a mão livre, ele segurou meus cabelos atrás da cabeça e forçou-me a fitá-lo nos olhos, para em seguida, tomar-me os lábios, beijando-me com aquela urgência que me deixava louca, sua língua ávida explorando cada centímetro da minha boca. Deixou a esponja cair no chão e tocou meu sexo com sua mão, massageando meu clitóris com movimentos circulares, ao mesmo tempo em que me aprisionava entre seu corpo e a parede sólida, esmagando meus seios com seu tórax musculoso. Gemi. Um gemido de puro prazer, abafado pela boca dele. Lutei bravamente contra o orgasmo que ameaçava me estilhaçar, pois queria aproveitar mais um pouco aquele momento tão gostoso, suas carícias tão íntimas, seu corpo delicioso colado ao meu. Percorri minhas mãos através da sua pele, inebriada com sua masculinidade viril e segurei seu pau duro como uma pedra entre meus dedos, masturbando-o devagar. A boca dele escorregou para um dos meus peitos ao mesmo tempo em que dois dos seus dedos se entraram na minha vagina, movendo-se lá dentro, em um vai e vem enlouquecedor. Abri mais minhas pernas, a fim de senti-lo mais fundo e gemi alto dessa vez, lançando minha cabeça para trás, louca de prazer. Parker sabia exatamente o que fazer com uma mulher. Fodia minha vagina lambuzada com seus dedos enquanto chupava meu peito, massageando meu mamilo entre seus dentes. Foi inevitável, logo eu estava gozando na mão dele, meu corpo convulsionando descontroladamente, numa luta por espaço entre ele e a parede do boxe, meus gemidos partindo altos.

Quando o êxtase passou, meu corpo ficou tão mole que quase desabei. Só não caí no chão porque Parker me segurou, abraçando-me forte de encontro ao seu corpo. — Calma, minha menina, acostume-se com isso. — Ele acariciou carinhosamente meus cabelos molhados, antes de trazer seus lábios até os meus, beijando-me com sofreguidão, fazendo meu descontrole sucumbir ao desejo selvagem que seu beijo me suscitava. Quando a mão dele escorregou pelo meu corpo, apertando minha bunda, acariciando minha pele, novamente senti como se estivesse em chamas e desejei ardentemente senti-lo duro dentro de mim. Todavia, ele me surpreendeu ao trocar de lugar comigo, apoiando suas costas na parede. Pousou a mão sobre minha cabeça e empurrou-me para baixo. — Agora me mostra o que mais você sabe fazer com essa boquinha linda. Eu nunca tinha feito sexo oral antes, simplesmente porque a ideia nunca tinha me parecido tão convidativa como naquele momento. Era impressionante como com Parker eu me sentia encorajada a fazer tudo, mais que isso, eu queria fazer tudo com ele. Excitada, desci minha boca pelo seu corpo, experimentando sua pele com a ponta da minha língua, até alcançar seu pênis duro, com suas veias protuberantes, o líquido escorrendo pela ponta. Salivei desejosa, ansiosa pelo que faria em seguida. Comecei lambendo a cabecinha, em círculos, o líquido salgado se misturando à minha saliva. Então, lambi as laterais, até a raiz. O enterrei devagar em minha boca e quando pensei que não havia mais espaço para o seu tamanho em mim, Parker empurrou minha cabeça, levando-o mais fundo, até a minha garganta. Porra! Aquilo era bom. Movida pelo tesão e ao mesmo tempo pelo desejo de satisfazê-lo, passei a mover minha cabeça para a frente e para trás, freneticamente, levando-o cada vez mais fundo, trazendo de volta. Quando o apertei entre meus lábios e suguei com força, fui recompensada por um gemido grosso, meio selvagem que parecia ter partido do fundo da alma dele. Aquilo me deixou loucamente excitada. Não consegui me conter e levei minha mão até meu sexo, tocando-o da mesma forma que Parker me tocara há pouco. Notei que estava inchada ali, talvez pelo tesão. Eu chupava o pau dele com vontade ao mesmo tempo em que me masturbava. Nunca tinha experimentado nada igual, me sentia como um animal no cio. Logo ele segurou firme meus cabelos, levando minha boca até a raiz do seu pau, usou a outra mão para erguer-me o rosto e, com outro gemido, gozou, seu corpo lindo ondulando, sua fisionomia se contraindo de prazer, seus espasmos se fazendo dentro de mim, seu esperma quente jorrando abundantemente na minha garganta. Porém, apesar do que ele tinha feito comigo, não me senti encorajada a engolir aquilo. Esperei que ele ficasse imóvel, tirei minha boca e cuspi o esperma no vaso. — Ah sua safadinha, quer dizer então que você tem nojo de mim? — Ele estava ofegante, recostado na parede, como se corresse o risco de cair. Sorri sem graça. — Não tenho coragem de engolir aquela coisa. Ele me puxou para junto do seu corpo, abraçando-me pela cintura, seu rosto a poucos centímetros de distância do meu. Contornei seu pescoço com meus braços e me aconcheguei mais a ele, extasiada com a sensação do contato direto da nossa pele nua. — Da próxima vez você vai engolir. Sem esperar que eu o contestasse silenciou meus lábios com os seus, sua língua habilidosa

entrando e saindo da minha boca, lascivamente, me fazendo incendiar. Será que esse tesão nunca teria fim? Começávamos tudo de novo, quando ouvimos uma batida na porta da cabine. — Quem é? — Parker gritou sem desgrudar seu corpo do meu. — Senhor, pousaremos em Salvador dentro de meia hora. — Partiu a voz da comissária do outro lado da porta. — Ok, entendi. — Olhou dentro dos meus olhos e completou: — Vamos ter que ser rápidos agora. Não pude deixar de sorrir da forma como ele falou e ao mesmo tempo de satisfação pelo que faríamos em seguida. Eu estava exausta quando deixamos o avião no aeroporto movimentado. Era noite e me sentia confusa porque deixamos Houston durante o dia e já tinham se passado muitas horas. Estranhava também o fato de todos à nossa volta estarem falando eu outro idioma. Eu nunca tinha viajado para outro país, por isso tudo me parecia estranho. Fomos recebidos por um homem afrodescendente, bastante simpático, que falava inglês com um sotaque carregado. Ele nos conduziu para fora do aeroporto, ajudando Parker a carregar as malas até uma luxuosa limusine que nos esperava. O veículo era tão sofisticado e confortável quanto o que me conduzira de casa até o aeroporto de Parker. Nos acomodamos na parte traseira, enquanto o homem tomava o volante e nos conduzia pelas ruas pouco iluminadas de Salvador. Parker estava sentado diante de mim, enquanto eu me esforçava para manter meus olhos abertos, tamanha era minha exaustão. — Definitivamente acho que exagerei com você. — Parker disse sorrindo, enquanto bebericava seu uísque. Não encontrei forças para responder, pois estava quase adormecida. Nosso trajeto foi rápido, logo a limusine estacionou e saltamos diante de uma construção pitoresca de dois andares, cuja fachada me lembrava uma casinha de bonecas. Era pintada de bege claro, com portas e janelas brancas, havia muitas plantas na frente, varanda nos vários quartos dos dois andares. — É uma pousada, Dakota. Vamos ficar hospedados aqui. Parker praticamente precisou me carregar para dentro. Na recepção, fomos recebidos por um rapaz mulato, bastante sorridente que também falava inglês com o sotaque carregado. Entregou a chave à Parker e subimos pelas escadas, o jovem carregando as malas atrás de nós. O quarto era excêntrico e confortável. Com paredes em marfim, tinha detalhes em estilo colonial e toda uma parede coberta por um jardim natural seguro atrás de uma tela. Era mobiliado por uma cama grande, armários, mesa com cadeiras estofadas, escrivaninha e criados mudos. Havia uma porta que certamente dava acesso à varanda, de onde partia um som desconhecido, estranho, mas eu estava cansada demais para explorá-la agora. Tirei apenas os tênis e desabei sobre a cama usando o jeans e a regata. Logo Parker uniu-se a mim, só de cueca, aconchegando meu corpo ao seu, deliciosamente. — Dorme bebê, você está precisando de descanso. — Ele falou, acariciando meus cabelos com dedos gentis. Joguei uma perna e um braço sobre ele, encostei meu rosto em seu peito másculo e, inalando seu cheiro gostoso, mergulhei num sono profundo. Quando despertei, o sol escaldante penetrava o quarto através da porta escancarada da sacada.

Pisquei várias vezes, demorando para me localizar, quando então me recordei de que estava numa pousada no Brasil e embora tenha adormecido nos braços de Parker, ele não se encontrava mais ali. Percorri meus olhos ao redor, constatando que o aposento era mais amplo do que eu percebera ao chegar durante a noite. Cogitava ir até o banheiro procurar Parker, quando meus olhos se depararam com um bilhete escrito à caneta sobre o criado mudo, junto com um cartão de crédito. Li o recado que Parker deixara. Fui trabalhar. Não demoro. Use o interfone para pedir comida se sentir fome e o cartão caso precise de mais alguma coisa. Não se esqueça de estar nua sobre a cama quando eu voltar. Com desejo, Parker. Nua sobre a cama quando ele chegar?! Quem ele pensava que eu era? Sua escrava sexual? Joguei o bilhete no chão, frustrada com sua ausência e fui até a varanda. Fiquei extasiada com a paisagem que se revelou diante de mim. Estávamos muito próximos do mar, a cerca de dez metros de distância. Havia coqueiros, barracas no calçadão e muitas pessoas aproveitando a praia. O cheiro do ar parecia diferente do de Houston. Tudo era exótico e diferente. Aquele som desconhecido que eu ouvira ao chegar era o balanço das ondas. Voltei ao quarto e constatei no relógio de parede que era quase meio-dia, por isso meu estômago estava roncando de fome. Eu podia usar o interfone para pedir comida, como Parker me instruíra, mas não pretendia ficar trancada ali com um sol lindo daqueles lá fora. Afinal eu tinha o cartão de crédito dele. E embora não apreciasse fazer compras, estava determinada a me misturar à multidão de turistas, sendo que para isto precisava de um guarda-roupa novo. Decidida, tomei um demorado banho frio, vesti um vestidinho de algodão verde folgadinho e curto, verifiquei se meu kindle e celular estavam na bolsa e saí, torcendo para encontrar alguém que falasse inglês. Cumprimentei a recepcionista, uma mulata baixinha, sorridente, na minha língua e, para minha total satisfação ela respondeu no mesmo idioma. — Onde encontro um restaurante e uma loja que vende biquínis por aqui? — Indaguei. — Tem um restaurante aqui ao lado. — Ela gesticulou para a esquerda. — E dois quarteirões adiante você encontrará uma loja. Lá vende tudo para praia e faz depilação para biquínis. Depilação para biquínis? O que era isso? — Obrigada. Ao deixar a pousada, fui atingida pelo sol escaldante. Eu acreditava que o sol de Houston era intenso, mas não chegava aos pés desse. Era realmente tórrido, fazia meus olhos arderem. Agora entendia porque a maioria das pessoas usavam chapéus de palha e óculos escuros. Precisava comprar essas coisas.

CAPÍTULO X

Antes de qualquer coisa, entrei no exótico restaurante que a recepcionista me indicara e almocei uma espécie de salada de frutos do mar com o tempero picante, porém agradável. Em seguida, fui à loja de biquínis. Não tive pena do cartão de crédito de Parker, afinal ele era milionário, nem perceberia a ausência do dinheiro de umas comprinhas. Comprei tudo o que eu tinha direito, biquínis de diferentes cores e modelos, duas saídas de praia, uma bolsa e um chapéu de palha, chinelos, óculos escuros, protetor solar e uma toalha de praia. Quando fui ao caixa pagar a conta, a atendente perguntou, com uma naturalidade impressionante, se eu precisaria da depilação para biquíni. Receei que sim e ela me conduziu para um cômodo pequeno nos fundos do estabelecimento, onde outra moça, uma mulata de alta estatura, me fez sentir pena de mim mesma. Ela simplesmente arrancou todos os meus pelos púbicos com cera quente, numa verdadeira seção de tortura, pela qual eu não pretendia voltar a passar. Ali mesmo troquei o vestido por um biquíni azul céu, com bojos em meia taça e a peça de baixo era pequena demais, se comparado aos biquínis encontrados nos Estados Unidos. Joguei a saída de praia colorida, curta e folgada, por cima e me dirigi à praia, a brisa do mar acariciando agradavelmente minha pele. Como estava vestida de acordo com a maioria das pessoas, logo me misturei à multidão, tornando-me apenas mais uma turista aproveitando o dia de sol. Ao alcançar à areia branca, aluguei um guarda sol e uma cadeira de praia, observei o proprietário montar tudo no lugar que eu escolhi, despi-me da saída de praia, passei protetor solar em todo o meu corpo e sentei-me confortavelmente. Tirei meu kindle da bolsa e dei continuidade à leitura de “Estátuas de Gelo”. Estava relaxada como em poucas ocasiões na minha vida. A brisa com aroma de mar amenizando o calor, proporcionando-me uma sensação agradável. Perguntei-me se devia telefonar para Parker e avisá-lo onde estava, caso ele chegasse à pousada antes de mim, mas me ocorreu que eu não tinha o número do celular dele e o meu estava sem cobertura. Então, voltei a relaxar, apreciando a brisa, o calor e a minha leitura. Estava totalmente entretida na leitura quando um homem afrodescendente, com cabelos rastafári e a pele coberta por tatuagens me abordou, falando em português, sem que eu compreendesse uma palavra do que dizia. Ele carregava uma maleta de metal, o que me fez suspeitar de que vendia algo, como muitos outros nativos faziam por ali, entretanto, eu não sabia o que era e ele se recusava a aceitar ou a entender o meu “não” em inglês, falando insistentemente, com a voz cada vez mais alterada. Eu estava começando a entrar em pânico, quando uma garota de cabelos loiros, que parecia ter acabado de sair da água, respondeu a ele em português, para que em seguida, ele se afastasse, não sem antes me lançar um olhar insolente. — Olá, sou Alice. — Ela estendeu-me a mão, falando fluentemente inglês. Levantei-me para apertar a mão dela. — Dakota. — Americana?

— Sim. Você também? — Canadense. — Ela inclinou-se até uma a toalha que estava sob um guarda sol onde um garoto gordinho se encontrava sentado, concentrado na tela do seu smartphone. — Você está aqui sozinha? — Sim. Meu acompanhante está trabalhando. — Sorri sem graça. — Estamos precisando de um membro no time, se quiser pode jogar conosco. Ela gesticulou para o pequeno grupo de jovens da nossa idade que jogava vôlei na areia, a cerca de dois metros de onde estávamos. Parecia divertido e embora eu nunca tivesse sido boa em interagir com pessoas, a ideia me parecia quase irresistível. — Acho que não posso deixar minhas coisas aqui sozinhas. — Pode ficar tranquila, meu irmão toma conta para você. Ah, esse é meu irmão Jimmy. — Ela gesticulou para o garoto, que tirou os olhos da tela do aparelho por menos de dois segundos, para cumprimentar-me. Os amigos dela a chamaram de volta e tive que decidir rápido. — Então, você vem? E por que não? — Sim. Guardei meu kindle de volta na bolsa, a desloquei para perto do garoto e uni-me ao grupo, Alice apresentando-me aos demais, pessoas simpáticas que pareciam não ter nada mais em que pensar a não ser na diversão. Iniciamos uma nova partida do vôlei, meninos contra meninas, numa competição acirrada, mais justa agora com a minha chegada, já que ambos os times estavam em igual número de integrantes. Aquilo era mais divertido do que eu imaginara, os saltos sobre a areia fofa eram uma verdadeira acrobacia, o choque com chão não machucava quando caíamos, pelo contrário, era uma diversão a mais. A todo instante interrompíamos a partida para irmos nos refrescar na água do mar, mais agitadas que as águas do golfo do México, na praia de Galvestone, a única que eu conhecia. Imaginei-me ali com Tom, Trinity e nossos demais amigos da faculdade, seria muito animado. Precisava me lembrar de convidá-los a conhecer o Brasil algum dia. Eu estava me divertindo tanto que não vi as horas passarem. O sol já estava mais ameno, anunciando o final da tarde, quando fui abordada por dois homens mal-encarados que usavam terno e gravata em plena areia, atraindo a atenção de todos à sua volta. — Dakota Thompson? — Um deles indagou, me fuzilando com olhos nada gentis. — Depende de quem quer saber. Os demais jovens se aproximaram, formando um círculo do qual eu e os dois gorilas nos tornamos o centro. — Algum problema? — Um dos rapazes canadenses quis saber. — Somos investigadores contratados pelo Sr. Richard Parker e precisamos que venha conosco. Será que eu tinha ouvido direito? Parker contratara investigadores para me procurar, como se eu fosse uma fora da lei foragida? — Diga ao Sr. Richard Parker que irei encontrá-lo quando eu quiser. — Tentei dar-lhe as costas, totalmente constrangida. Eu simplesmente tinha me tornado o centro de todas as atenções de quem podia nos enxergar e pela forma como os dois brutamontes agiam, passavam a impressão de que eu era uma criminosa que estava sendo presa. — Desculpe, mas fomos contratados para levá-la. — O sujeito me segurou firme pelo pulso, sem

que eu tivesse forças físicas suficientes para me libertar. — Onde estão suas coisas? — Solta ela, cara. — Um dos rapazes que eu acabara de conhecer interferiu, os demais assumindo a mesma postura desafiadora. Temi que eles pudessem se machucar se enfrentassem aqueles homens em uma luta braçal, sem mencionar que o escândalo seria ainda maior. — Tudo bem, pessoal, é só o demente do meu chefe sendo ele mesmo. Derrotada, mostrei ao homem onde estavam minhas coisas e me deixei ser conduzida pela areia, como uma criminosa sendo levada à prisão, pelo menos era essa a imagem que todos tinham. Chegando ao calçadão, avistei Parker vindo da direção da pousada e a raiva pipocou em minhas veias. Como ele se atrevia a me tratar daquela forma? — Como o senhor se... — Por Deus, Dakota! Você tem ideia do que passei sem saber onde você estava, ou o que tinha acontecido?! — Ele me interrompeu com sua voz rude e áspera, como se estivesse com a razão, irritando-me ainda mais com a sua arrogância e prepotência de sempre. Porém desta vez ele tinha ido longe demais. — Você tem noção de todas as possibilidades em que pensei! — Seu olhar estava alarmado, sua fisionomia contraída, suas roupas desalinhadas evidenciando seu estado de aflição. Compreendia que ele cogitara que o assassino tinha me encontrado, todavia, isso não lhe dava o direito de colocar investigadores atrás de mim. Furiosa e livre da mão do troglodita, passei direto por ele, me dirigindo, com passos apressados, para a pousada. — Eu estava na praia me divertindo. Isso aqui é uma cidade turística e quis aproveitar o sol, pois não tenho nenhuma obrigação de esperar pelo senhor, nua na sua cama, como me ordenou no bilhete. Ele me seguia de perto e com o intuito de me deter, segurou-me pelo antebraço, virando-me para ele, sob o olhar curioso de todos que nos rodeava. — Por que você não deixou um bilhete, ou mesmo me ligou para avisar?! Eu precisava reconhecer que devia ter avisado, embora tal falha não lhe desse o direito de fazer o que me fizera, me tratando como se eu fosse uma propriedade que lhe pertencia, desprovida de vontade própria. — Eu admito que devia ter avisado. Ainda assim o senhor não podia ter colocado esses dois atrás de mim, eu sou adulta, sei me cuidar e não sou sua propriedade. Puxei meu braço da sua mão com um safanão e retomei meu percurso rumo à pousada, o sangue fervendo em minhas veias. Eu devia voltar para os Estados Unidos e deixá-lo sozinho com sua arrogância, aliás, era exatamente o que faria, eu não era obrigada a tolerar aquilo. Ainda me seguindo de perto, ele tirou seu paletó e tentou vesti-lo em mim. Não deixei, jogando a peça no chão. — Dakota, você está quase nua. — Eu estou de biquíni. Pessoas de biquíni circulam por aqui o tempo todo. — Mas não você. Quando eu pensei que ele já tinha esgotado sua cota de idiotices por um dia, ele simplesmente ergueu-me do chão, pendurando-me em seu ombro, carregando-me para a pousada, como se quisesse mostrar a todos que eu era sua propriedade, sem que eu pudesse fazer nada para impedi-lo. A situação era humilhante, constrangedora e pirou quando atravessamos o hall da pousada, abarrotada de hóspedes, subindo pelas escadas.

Apenas chegando ao quarto ele colocou-me de volta no chão, voltando à porta para receber meus pertences das mãos dos seus investigadores que nos seguia. — Como se atreve a me tratar assim!? Não sou uma criança, tampouco o senhor é meu dono! — Eu estava tão furiosa que sentia minha face queimar. — Enquanto estivermos juntos, você é minha Dakota Thompson! — Sua voz era um grunhido animalesco, seu olhar expressando um misto de raiva e ameaça enquanto se aproximava. — Precisa estar à minha disposição, sempre que eu quiser e nunca, nunca sair sem o meu conhecimento. Oi!? Eu tinha ouvido direito?! Ele só podia estar brincando. Involuntariamente, o canto da minha boca se curvou, num riso diabólico, sem que nada mais em mim acompanhasse o gesto. — Arranja outro brinquedinho cara. Eu estou voltando para casa agora mesmo. Decidida, dei-lhe as costas, pegando a toalha branca no cabide, dirigindo-me ao banheiro onde me livraria do protetor solar que me impregnava a pele, entretanto, antes que alcançasse a porta, ele me deteve, agarrando-me com braços poderosos, prendendo-me contra seu corpo. — Você não vai a lugar nenhum. — Me solta, ou vou fazer um escândalo. — Eu me debatia violentamente, na fracassada tentativa de me libertar dos seus braços fortes. — Pode gritar o quanto quiser. Aqui é o Brasil e nós somos turistas. Sem que eu compreendesse o sentido da sua afirmação, ele me conduziu até a parede, segurando meus pulsos acima da minha cabeça, aprisionando-me entre o concreto e seu coro grande, imobilizando-me por completo. — Me solta Sr. Parker, eu estou falando sério. — Eu mal conseguia respirar devido à forte pressão que ele fazia contra mim, que dirá me mover. — Desculpa bebê. Eu não queria te constranger, apenas estava ficando louco com seu desaparecimento sem explicação. Se coloque por um instante no meu lugar. Há um louco matando todas as pessoas de quem eu gosto e você é uma dessas pessoas. Passei horas penando que tinha acontecido o pior. — Seu tom de voz estava manso, suas palavras fazendo todo o sentido, ainda assim, eu me recusava a ceder. Ele tinha agido como um troglodita, pior que isso, ele tinha agido como um carrasco. Eu não podia aceitar isso. — Não existe uma justificativa para o que o senhor fez. Me solta, eu quero ir para casa. — Não! — Sem que eu pudesse fazer nada para impedi-lo, sua mão começou a passear pelo meu corpo seminu, enquanto sua boca buscava a minha, sem que eu permitisse que a alcançasse, esquivando meu rosto, sendo que seus lábios encontraram a pele do meu pescoço, plantando uma deliciosa trilha de beijos e lambidas na minha pele suada. — Você vai ficar comigo, Dakota. Se quer ir à praia, eu te levarei. Cancelarei todas as reuniões para ficar com você. Te levarei para conhecer todas as praias deste país se quiser. — Sua voz assumira um tom rouco, extremamente sensual, enquanto sua mão continuava explorando minha pele lambuzada de protetor solar, sua boca passeando pelo meu pescoço e queixo, lambendo, mordicando, despertando o desejo adormecido dentro de mim. Parker sabia o que fazia e pouco a pouco conseguiu o que queria, minhas resistências foram desmoronando, a raiva sucumbindo ao desejo violento que nascia dentro de mim, fazendo meu sangue ferver mais uma vez, desta vez da mais crua lasciva. — Me solta, Parker. — Fiz uma última tentativa, mas minha respiração pesada denunciou que eu

já não estava tão certa da minha decisão e ele sabia disso. Levou sua mão livre até meu queixo, segurando-me assim, imobilizando meu rosto inclinado para cima e me beijou, um beijo faminto, selvagem, que me deixou quase sem fôlego. Ele era um homem experiente, capaz de me transportar do ódio ao desejo em um espaço de tempo inacreditavelmente pequeno, entretanto, eu precisava lutar conta isso, não podia deixar que a vontade dele prevalecesse sempre. Sua ereção se fez rija contra meu ventre e, ensandecida, esfreguei meu corpo nela, rendendo-me à luxúria que tomava conta de mim, avisando-lhe que ele conseguira o que queria, eu estava completamente subjugada a si. E como eu esperava, ele afrouxou suas mãos dos meus pulsos, quando então, seguindo a um impulso, aproveitei para escapar. Fazendo uso de toda a minha agilidade, corri para o banheiro, trancando-me lá dentro antes que ele tivesse a chance de me alcançar novamente. Afinal eu tinha conseguido vencer Richard Parker, contrariando suas vontades, sua irritante soberania. Eu devia estar me sentindo vitoriosa, contudo, sentia vontade de bater minha cabeça na parede. Estava muito melhor do lado de fora, nos braços dele, que ali sozinha, prestes a enfrentar uma chuveirada solitária e quem sabe voltar para Houston, acompanhada da mesma solidão, deixando para trás o único homem que eu desejara em anos. Estava certo que ele agia quase sempre como um imbecil, mas era o imbecil que eu desejava. Uma tarde na praia, ou uma partida de vôlei, ou ainda o vexame pelo qual me fizera passar, não era nada se comparado a estar com ele. Merda! Mil vezes merda! Eu ainda podia voltar atrás, mas se o fizesse pareceria ridícula, verdadeiramente escreva dos meus próprios desejos. Então, desolada, arrependida, livrei-me de biquíni e me coloquei sob os jatos de água fria do chuveiro, quando de repente, houve um estrondo ensurdecedor e a porta do banheiro veio abaixo, para em seguida Parker invadir o pequeno cômodo. Observei-o chocada, incapaz de qualquer reação diante daquilo. Ele era realmente louco, mas era o louco que eu queria. — Você não vai a lugar nenhum e isso não está mais aberto à discussão. — Seu tom era incontestável como quase sempre, seus olhos devorando minha nudez, reluzindo luxúria ao se deterem no meu sexo depilado, uma luxúria tão intensa que me atingiu com a força de um vendaval. “Oh! Me pega logo, meu bem” Então, sem que mais palavras fossem necessárias, ele me tomou em seus braços, com uma fome avassaladora sem que eu conseguisse ou quisesse mais resistir. Sob a água que caía abundante, entreguei-me ao beijo, aos seus braços fortes, às suas carícias, ensandecida, permitindo-lhe que me fizesse sua ali mesmo, em pé, contra a parede, como se fossemos dois animais no cio. E como se nunca fosse suficiente, logo deixei que me levasse para a cama, onde continuamos entregues ao que havia de melhor entre nós, porque era bom, era vital, porque tê-lo dentro de mim tinha se tornado uma necessidade cuja satisfação era tão urgente que tudo mais se tornava insignificante diante da sua grandeza. Quando por fim à exaustão nos tomou, ficamos imóveis nos braços um do outro, inebriados, nossos corpos ofegantes, suados, colado um no outro, experimentando o silêncio gostoso quebrado apenas pelo balançar das ondas do mar que partia de perto, quando eu já não me recordava do motivo que nos levara a brigar. — Nunca mais me faça brigar com você, bebê. — Ele disse com a voz calma e gentil, como eu

nunca presenciara antes. — Então não me dê mais motivos. — Não darei. — Ele percorreu seu dedo indicador da minha testa até os meus lábios, vagarosamente. — Apesar do que aconteceu, esses estão sendo os melhores momentos da minha vida em muitos anos. — Sua voz estava carregada de emoção e sem que eu compreendesse a razão, quis chorar. — Estão sendo os melhores da minha vida também. — Falei com sinceridade. Ele começou a beijar meu pescoço, suavemente, suscitando uma nova onda de desejo que se alastrou depressa nas minhas veias, a exaustão se esvaindo devagar. — Vou cancelar todas as reuniões dos próximos dias para que tenhamos mais tempo juntos. Isso vai evitar que você saia sozinha por aí, colocando sua vida em risco. Senti como se alguma coisa nas suas palavras estivesse me escapando, me passando despercebido, tentei refletir a respeito e descobrir o que era, mas minha sanidade estava comprometida pelo fogo do desejo que queimava em minhas entranhas, se intensificando à medida que a boca dele descia pelo meu corpo, deliciosamente, fazendo com que tudo se perdesse no prazer inigualável que me proporcionava. Era noite quando, saímos na limusine conduzida pelo motorista e jantamos comidas típicas da região, cujos ingredientes eu desconhecia, embora apreciasse o sabor, em um restaurante todo construído de palhas de coqueiro, iluminado apenas com velas aromáticas, localizado à beira mar, próximo a uma praia quase deserta, com uma paisagem estonteante. Após o jantar, caminhamos descalços, de mãos dadas, pela areia, a brisa do mar, agora mais fresca, esvoaçando meus cabelos soltos e a saia rodada do meu vestido cor de rosa de costas nuas. Parecíamos um casal de namorados apaixonados, quando na verdade eu não fazia ideia do que éramos um para o outro, sabia apenas que o queria mais a cada instante que passava ao seu lado. De volta à pousada, transamos durante quase toda a noite, na varanda, sobre a mesa, no banheiro e finalmente na cama, até que adormecemos aconchegados nos braços um do outro. Quando despertei na manhã seguinte, o sol já penetrava o quarto, o barulho das ondas parecendo mais distante que durante a noite, devido à movimentação mais intensa dos turistas. Ao mover-me, gemi, todo o meu corpo dolorido, principalmente no meio das pernas. Tateie o colchão a procura de Parker, mas não o encontrei, a consternação começava a me invadir quando o vi entrar pela porta da varanda, a visão me deixando sem fôlego. Ele usava apenas uma sunga de praia preta, que se colava ao seu corpo, exibindo o enorme volume na parte da frente e a rigidez das suas nádegas redondas atrás. Os raios do sol banhavam os músculos perfeitos do seu corpo, suas coxas bem torneadas estavam totalmente expostas. A forma como ele se movia era simplesmente fascinante, exalava uma masculinidade crua na sua forma mais magnífica. Ele tinha os cabelos molhados e o cheiro gostoso da sua loção pós barba preenchia o ambiente. Ficar ali parada, olhando para ele, controlando o impulso de atirar-me em seus braços, e morder cada parte daquele corpo gostoso, era uma missão quase impossível. — Bom dia. — Ele disse, com o sorriso mais encantador da face da terra. — Bom dia. — Respondi meio sem graça, por estar ali de cara inchada de tanto dormir e descabelada diante de um monumento como aquele. Ele foi até a antessala, retornando com uma grande bandeja de palha repleta de comida. Pousou-a aos meus pés sobre o colchão, sentando-se ao lado.

O cheiro de café fresco preencheu o ambiente me fazendo salivar. Havia sanduíches de queijo com presunto, pão fresco, uma espécie de geleia marrom esquisita, frutas, sucos e quitutes típicos da região, cujos nomes eu não conseguia pronunciar, devido à complexidade da sua sonoridade. Sentei-me, mantendo lençol branco de algodão colado ao meu corpo, ocultando-me a nudez. Ao fazer o movimento, outro gemido de dor escapou-me dos lábios. — Você está bem? — Só um pouquinho dolorida, aqui em baixo. — Servi-me do suco de laranja e um sanduíche, evitando encará-lo, por causa do meu constrangimento. — Nesse caso acho melhor você não me provocar, ou as coisas vão ficar bem piores aí. Não pude deixar de sorrir do seu tom safado. Será que ele nunca estava saciado? Eu também não, bastava olhar para ele para que o desejo queimasse dentro de mim. — Hoje vou te levar para conhecer as praias no interior do estado. Ouvi dizer que são espetaculares. — E o seu trabalho? — Eu te disse ontem que cancelaria as reuniões. Fiz isso hoje cedo. Teremos mais dois dias somente para nós. — Isso não vai prejudicar seus negócios? — Quem precisa de negócios quando se tem uma Dakota em sua vida? Sorri de novo, de puro contentamento, suas palavras me fazendo sentir especial. Eu nunca o tinha visto tão descontraído como naquela manhã, parecia outra pessoa. Não existia o mínimo vestígio do homem rude e arrogante que presidia a Thive Oil Company. Foi impossível evitar. Após o café, entreguei-me a ele de novo, cedendo àquele desejo louco que parecia me consumir mais e mais. Era quase meio-dia quando deixamos a pousada, ambos com trajes de praia por baixo das roupas coloridas, embora eu não tivesse certeza se toleraria vê-lo usando apenas aquela suga preta de banho na frente das brasileiras que eram capazes de enfrentar uma depilação para biquíni com a frequência de quem fazia as unhas. No jipe sem capota que ele alugara, seguimos pela beira-mar de Salvador durante um longo tempo, percorrendo quilômetros e mais quilômetros de praias, algumas lotadas de banhistas, outras quase desertas. Porém nenhuma delas era tão deslumbrante quanto aquela na qual paramos. Suas águas cristalinas tinham vários tons de azul, tão transparentes que podíamos enxergar os recifes até muito distante, onde se formavam piscinas naturais e a vida marítima era abundante. Quase não havia pessoas, apenas algumas famílias com crianças, que pareciam moradores locais. Caminhamos descalços por ali, nossos pés submersos nas águas rasas, mas o sol estava escaldante e logo procuramos abrigo no único comércio local, uma barraca de palha, onde comemos peixe assado com farinha de puba. E assim foram nossos dois dias como turistas no Brasil, passeando, conhecendo lugares deslumbrantes, onde a natureza se exibia na sua forma mais perfeita. Todavia, a maior parte do tempo, passamos no quarto da pousada, entregues ao tesão louco que sentíamos um pelo outro e que parecia não ter fim. Durante aqueles dias, Parker parecia outra pessoa, mostrando-se uma companhia agradável, solto, descontraído e espontâneo, um lado seu que eu sequer imaginava existir por trás do executivo arrogante que ele era.

CAPÍTULO XI

No quarto dia, partiríamos de volta para Houston às dez horas da manhã, por isso programei o despertador do celular para me acordar um pouco mais cedo. Notei que Parker estava diferente aquela manhã, mais calado, sério, distante. Tínhamos acabado de tomar o café da manhã, eu me dirigia para o banheiro, com a toalha de banho pendurada no ombro, quando ele falou: — Precisamos conversar. — Seu tom de voz era seco e frio. Um mau presságio me foi anunciado pelo calafrio que percorreu minha espinha. — Fala. — Cruzei os braços diante do corpo, como se eles fossem capazes de me proteger daquilo que ele diria. — Senta. — Sentei-me em uma das cadeiras estofadas, enquanto ele se mantinha em pé. — O que aconteceu entre nós aqui, foi maravilhoso, os melhores dias da minha vida, mas... — Ele estava hesitante. — Não podemos continuar. Processei suas palavras e, lentamente, senti meu sangue gelar em minhas veias, meu coração ameaçando parar de bater, uma tempestade silenciosa se formando dentro de mim. Todavia, nada deixei transparecer, permaneci imóvel, fitando-o no rosto. — Tudo bem. — Empurrei as palavras através do nó que se formava na minha garganta seca, fingindo uma indiferença que não existia. Ele me encarou com espanto antes de continuar. — Espero que você entenda. Aqui somos nós dois, mas em Houston há um assassino louco matando as pessoas de quem eu gosto e você é uma dessas pessoas. Eu queria, com todas as forças do meu coração ficar com você, mas não posso colocar sua vida em risco dessa maneira. Refleti por um instante e foi como se minha ficha finalmente caísse. Ele planejara isso tudo desde o início, jamais precisara de uma secretária no Brasil, pois não me levara à única reunião que comparecera, me trouxera nessa viagem com o objetivo único de ter sexo fácil à sua disposição. Sabia, desde o início, que seria passageiro, eu seria apenas mais uma aventura em sua vida, como tantas outras, apenas mais uma mulher a passar por ele, como Lindsay, a comissária do avião e muitas mais. Logo ele estaria me ignorando para dar sua atenção à sua próxima conquista, como agia com elas. Isso explicava porque ele nunca me pedira para chamá-lo pelo seu primeiro nome, nunca me dera essa liberdade, como também nunca me prometera nada. Desde o início eu desconfiava que seria assim, não compreendia porque me deparar com uma verdade que eu já esperava me doía tanto. Senti uma vontade louca de chorar, mas não daria esse gostinho a ele, não o deixaria conhecer meus verdadeiros sentimentos, que iam muito além do tesão. Era uma paixão descontrolada o que eu sentia por aquele homem e saber que nunca mais o teria em meus braços me doía como se mil facas perfurassem meu corpo. Contudo, ele nunca saberia disso, não permitiria que debochasse de mim, por ter sido tola a ponto de me apegar tão intensamente durante uma aventura puramente sexual.

— Tudo bem Sr. Parker. — Lutando bravamente contra as lágrimas que ameaçavam banhar o meu rosto, forcei um sorriso e empurrei as palavras para fora. — Não precisa me explicar isso, eu entendo perfeitamente e estou de acordo. Me diverti muito aqui também. Foi uma ótima aventura. Sem mais forças para me conter, segui para o banheiro, me esforçando para não correr. Quando fechei a porta atrás de mim, finalmente deixei as lágrimas rolarem, a dor insuportável dilacerandome a alma. Abafei meus soluços com a mão, perguntando-me onde eu estava com a cabeça quando imaginara que um homem como Parker ficaria com uma garota como eu. Se ele sentisse algo por mim, eu não me importaria em arriscar minha vida para ficar com ele, pelo contrário, lutaria ao seu lado para pegar aquele maldito assassino. Eu já sabia sobre a existência dele, não me descuidaria e ainda tinha a chance de apanhá-lo, me fazendo de isca. Mas era muito da minha parte esperar que Parker sentisse por mim o mesmo que eu sentia por ele. Sob a água do chuveiro, chorei até que minhas lágrimas pareciam ter secado. Minha pele estava começando a ficar enrugada, quando a maçaneta da porta girou, mas Parker não esperava que eu tivesse trancado a porta. — Dakota, se apresse. Temos hora marcada para usar o aeroporto. — Sua voz estava seca e ríspida como o homem arrogante que eu tinha conhecido em Houston. Por Deus! Será que ele estivera fingindo durante todos esses dias? — Estou indo. — Respondi, forçando a firmeza na voz. Olhei-me no pequeno espelho e constatei o quanto meus olhos estavam inchados e vermelhos pelo pranto. Droga! Mas ele não notaria, pois tinha voltado a ser o Parker que ignorava as mulheres de quem já tinha conseguido o que queria. — Algum problema? — Ele indagou desconfiado quando deixei o banheiro enrolada na toalha. — Não. Evitei virar meu rosto na sua direção e apressei-me em me vestir. Optei por jeans, tênis, camiseta e óculos escuros. Enquanto percorríamos a beira-mar na limusine, em direção ao aeroporto, apreciei aquela vista enquanto podia, levando comigo a lembrança do lugar onde vivera os momentos mais felizes da minha existência. A certeza de que não se repetiriam, sufocando-me, dilacerando-me a alma. Deixamos Salvador exatamente às dez horas da manhã. Com o pretexto de que precisava digitar as informações que ele me fornecera sobre sua vida durante nossa vinda, tranquei-me na cabine onde estava minha mala. E foi realmente o que fiz, dei continuidade ao texto, já bastante adiantado, afinal o trabalho talvez fosse capaz de me distrair da minha dor incessante. Eu não sabia como conseguiria conviver com Parker dali em diante, olhar para ele todos os dias, desejá-lo sem poder tocá-lo, talvez vê-lo se interessando por outra garota, como Lindsay o vira interessado por mim. Seriam dias de angústia, mas não podia interromper meu trabalho. Este já estava à frente da metade. Não seria necessário todo o mês de julho para concluí-lo como imaginara no início, terminaria em poucos dias. Me esforçaria para isto. Poucas horas depois houve uma batida na porta, seguida da voz áspera de Parker. — Você precisa almoçar Dakota. — Estou indo. Ao levantar-me, olhei meu rosto no espelho e meus olhos já não estavam tão inchados ou vermelhos, podia deixá-lo olhar-me no rosto sem perceber que eu tinha chorado.

Movendo-me com uma segurança forçada, sentei-me na poltrona diante dele com a mesinha de tampo de vidro garantindo uma distância segura entre nós. — Carne ou frango? — Ele perguntou, com uma carranca, mostrando quem verdadeiramente era. — Frango. — Consegui esboçar um sorriso falso. Ele usou o interfone para fazer o pedido e logo a comissária com suas roupas coladas veio servir a refeição. Nesta viagem ela teria todas as chances com ele, pois eu pretendia permanecer trancada em minha cabine até chegarmos a Houston. Antes de nos deixar, ela deu aquela piscadela maliciosa para ele e me perguntei se já tinham transado enquanto eu estava trabalhando. — Como está o trabalho? — Ele indagou ainda muito sério, antes de levar uma garfada de legumes à boca. — Bem. Acho que terminaremos antes do que eu pensava. — Embora não sentisse fome, forcei a comida a descer pela minha garganta seca. Ele fitou-me com espanto. — Mas não era o mês todo? — Não será necessário. Seu irmão estipulou um mês para toda a turma porque nem todos os entrevistados teriam disponibilidade para falarem todos os dias. No nosso caso foi diferente. Falamos todos os dias, às vezes durante horas. Um pouco mais de informações e será suficiente. — Ingeri um grande gole da minha água, fazendo a comida descer. Ele estreitou seus olhos sobre os meus, fitando-me demoradamente. — Sentirei falta da sua companhia. — Disse. “Mentiroso! Se você tivesse o mínimo de consideração por mim, não teria me dado um fora!” — Eu também sentirei falta da sua. — Friamente, estiquei meus lábios para esboçar outro sorriso falso. Após a refeição me recolhi de volta à cabine, sem conseguir deixar de imaginar em que parte do avião Parker transaria com a comissária. Era a oportunidade perfeita para ele, já que não tinha nenhum ser humano que pudesse ficar sabendo. Com meu coração partido, porém ciente de que o tempo o curaria, mergulhei de cabeça no trabalho, transformando a narrativa de Parker em texto literário. Não mencionaria nossa aventura no Brasil, para que ele não ficasse sabendo o quanto me atingira, quando lesse aquele texto. As horas se passaram sem que eu percebesse, logo tinha mais de cinquenta páginas digitadas, quando então o cansaço me dominou e adormeci. Despertei com a batida de Parker na porta. — Vamos pousar Dakota. — A voz dele partiu do outro lado. — Ok. — Respondi sentindo-me cansada. Eu não tinha trancado a porta, ainda assim ele não entrara. Não compreendia como depois de vivermos tantos momentos lindos juntos, nos tratávamos como dois estranhos. Mas a vida era assim. Eu que ainda não tinha aprendido a lição. Era madrugada quando pousamos em Houston, a baixa temperatura me atingiu em cheio quando desci do avião, sem que eu tivesse um casaco sequer para me salvar. Não tinha me preparado para desembarcar de um avião durante a madrugada, depois de passar três dias em um país que fazia calor até durante a noite. Ali mesmo, no aeroporto particular de Parker, nos despedimos, com palavras formais e uma troca

de olhares que denunciava nosso desejo por algo mais, todavia, quando ele tentou me abraçar, me esquivei. Se era para terminar, que terminasse definitivamente. Como era quase manhã, combinamos que eu não iria à Thrive naquele dia, para que pudesse descansar da viagem. Trêmula de frio, entrei na limusine que veio me apanhar na pista de pouso e fui conduzida para casa pelo mesmo motorista que me trouxera. Dessa vez carregava um imenso vazio no peito, uma tristeza que há muito não sentia. Mais um sentimento que Parker enraizara em mim. Entrei no apartamento na ponta dos pés para não despertar Tom do seu sono no sofá da sala. Fui direto para o meu quarto, tomei um banho quente relaxante, troquei as roupas por um moletom velho confortável e deitei-me, os pensamentos fervilhando-me à mente, as lembranças de Parker me impedindo de adormecer. De repente eu estava de volta ao velho trailer em Calvert, onde morava como minha mãe e meu padrasto. Como acontecia com frequência, ela tinha saído para o seu trabalho noturno de garçonete e eu estava sozinha quando o maldito chegou bêbado. O fedor de álcool misturado a cigarro preenchendo o ambiente, me causando náuseas. Dominada pelo medo, abandonei o velho sofá diante da televisão ligada e corri para me trancar no banheiro, mas não fui rápida suficiente, ele me alcançou. Agarrou-me pelos ombros e me arrastou para a cama que dividia com minha mãe, suas mãos ásperas e sujas percorrendo meu corpo. Eu já sabia o que aconteceria e comecei a chorar desesperada, embora soubesse que minhas lágrimas seriam em vão, pois todas as vezes eu chorava e mesmo assim ele não parava. Me jogou sobre a cama, inclinando-se sobre e mim, o fedor do seu hálito a poucos centímetros de distância do meu rosto. Com uma só mão rasgou meu vestido florido de cima a baixo, jogando os trapos no chão, para em seguida arrancar minha calcinha com um safanão. Enojada, em pânico, desesperada, gritei, me debati, supliquei para que ele não continuasse, mas nada o deteve. Então, aprisionando-me sobre o colchão com seu corpo pesado, ele desceu suas calças até os joelhos, colocou seus quadris entre minhas pernas e me penetrou. Seu pênis grosso rasgando-me por dentro, forçando passagem no meu canal seco. Gritei mais alto, de dor desta vez. Chorei, supliquei que ele parasse, mas ele continuou, por muito tempo, machucando-me, humilhandome, até estar saciado, quando então me deixou de lado e mergulhou no seu sono profundo, do qual eu decidi, naquele exato instante, nunca mais deixá-lo acordar. Despertei com o som estridente de uma buzina que partia da rua lá embaixo. Estava ofegante, com meu coração disparado no peito, meu corpo coberto por um suor frio. O sonho tinha sido tão real que ainda podia ver o rosto demoníaco daquele maldito claramente diante de mim. Matá-lo, fora a decisão mais certa que eu já tomara, o único meio de dar fim àquilo. A consequência mais terrível foi o fato de terem levado minha filha ao nascer, porém, mesmo que eu o tivesse deixado vivo, as leis dos EUA não deixariam uma garota de dezesseis anos de idade, filha de uma viciada em drogas ficar com a guarda de uma criança. Quando encontrasse a pessoa certa, teria outros filhos e esqueceria minha pequenina, tão linda, frágil, angelical. Eu a vira apenas uma vez, no instante em que nascera, mas jamais esqueci sua imagem, aquele corpinho minúsculo branco com a cabeleira ruiva. Olhei no relógio sobre o criado mudo e constatei que eram três horas da tarde, eu dormira quase durante o dia inteiro. Desanimada levantei-me, lavei o rosto, para em seguida partir pelo apartamento em busca de comida, não que estivesse com fome, mas precisava acumular energias.

Fiquei satisfeita por Tom estar na faculdade e Trinity no trabalho, assim não perceberiam meu estado de melancolia. Não havia muitas opções na geladeira quase vazia. Tive sorte em encontrar um pedaço de queijo com o qual preparei um sanduíche e comi com o único iogurte que tinha ali. Meu estômago estava embrulhado por causa das imagens quase reais do sonho passando-se em minha mente. Era desprezível constatar que depois de sete anos aquele maldito ainda me afetava. Merda! Esperava que minha filha tivesse um destino melhor. Ainda com náuseas, voltei ao meu quarto e dei continuidade à escrita da biografia de Parker. Narrando os acontecimentos que ele me revelara, constatando o quanto ele era mentiroso por ter afirmado que saía apenas com prostitutas, quando na realidade tinha uma história com Lindsay, a comissária do avião e sabia-se lá com quantas mais. Estava tudo pronto, todas as informações que eu colhera até aquele momento estavam em forma de texto, faltava muito pouco para terminar. Cansada, deixei o quarto, perplexa ao perceber que já era noite, sem que eu tivesse notado o tempo passar. Realmente, trabalhar era o melhor remédio para espantar os fantasmas, tanto os do passado quanto os do presente. Na sala encontrei Trinity, Tom e Noah, espichados no sofá, tomando cerveja. — Minha nossa! Olha só quem resolveu aparecer. — Tom exclamou. — Dak, como você está bronzeada! Eu não sabia que você tava em casa. Chegou quando? — Trinity quis saber. Agindo como o idiota de sempre, Noah afastou o braço que mantinha em torno dos ombros dela. Eu não sabia se ela realmente não percebia a atitude dele ou se apenas fingia não perceber para evitar atritos. Mas era impossível não notar. — Cheguei essa madrugada. Não quis acordar vocês. Deixei-me afundar entre Trinity e Tom, agradecida por tê-los em minha vida. Pessoas com escrúpulos, leais e verdadeiramente amigas. — O professor Anthony telefonou e pediu para você ligar pra ele quando chegasse. — Trinity transmitiu o recado. — Quero é distância daquele sujeito. — Cara, ele deve ser muito louco, escondendo esse tempo todo que é irmão de Richard Parker. — Noah falou. Senti um aperto no coração ao ouvir o nome de Parker. O que ele estaria fazendo nesse exato momento? Eu daria um braço para saber. Era deprimente pensar que por três dias eu fizera parte da rotina dele, estando ao seu lado em todos os momentos do seu dia e da sua noite e que agora sequer sabia onde e com quem ele estava. — Ai, me conta tudo, como foram as coisas no Brasil? — Trinity indagou. Remoí minha tristeza, a dor daquela paixão não correspondida que se recusava a me deixar e respirei desanimada. — Foi legal. — Falei, sentindo-me pressionada pelos olhares deles atentos sobre mim, esperando uma narrativa detalhada da viagem. — Só legal? — Foi Trinity quem disse. — Olha, aí tem coisa. — Tom era mais perceptivo. — Ninguém volta de um país paradisíaco com um bronzeado desses nesse estado de ânimo, a não ser que algo muito sério tenha acontecido e se bem te conheço, aposto minha herança como Richard Parker está metido nisso.

— Ah, meu Deus! Você transou com ele?! — Trinity praticamente gritou. Permaneci em silêncio, vasculhando minha mente em busca de uma mentira convincente, mas não fui rápida suficiente, eles sacaram tudo. — Eu não quero falar sobre isso. — Resmunguei mal-humorada. — Por que você ficou com esse cara, Dakota?! Ele pode ser um assassino! — Os olhos atônitos de Noah quase saltaram sobre mim. — Foi um erro, tá gente. Não vai mais acontecer. — E você saiu quebrada dessa. — Tom completou, com sua magnífica sabedoria. — Pois é a vida não é feita só de coisas boas. — Bem, não se pode dizer que sexo não é uma coisa boa... — Vi quando Trinity chutou a canela dele, fazendo-o parar. — Mas para toda tristeza tem remédio e para a sua eu sei exatamente qual é. — Qual? — Eu começava a ficar curiosa. Ele estendeu-me sua garrafa de cerveja. — Esse. — Valeu, mas não to a fim de beber. — Reage amiga, você não pode ficar assim por causa de quem não te merece. — Trinity recitou a frase que tanto ouvira ao longo da sua vida. — Então, o que vocês acham de ingressos para o jogo final do campeonato estadual entre Dallas Cowboys e Houston Texans que vai acontecer amanhã? — Tom indagou. Eu e Trinity nos entreolhamos exultantes. Ir a um jogo daqueles era simplesmente o clímax da diversão, um programa reservado aos privilegiados. Sem deixar de nos encarar, gritamos como duas alucinadas. Era bom demais para ser verdade. — Espera. — Falei. — Onde você vai conseguir os ingressos? O jogo já é amanhã. — Eu já consegui querida. Meu tio é um homem influente. Me arranjou cinco ingressos há dias. Eu e Trinity voltamos a nos encarar, gritando como duas loucas. — E ainda vai sobrar um ingresso. — Noah resolveu falar. — Esse está reservado para o Taylor. Vai que ele aceita. Eu Trinity nos entreolhamos novamente, desta vez com cumplicidade, dividindo a compaixão que sentíamos por nosso amigo amar alguém que o rejeitava publicamente. — E o nosso trabalho e sua faculdade? — Perguntei. — Eu vou faltar amanhã. Mas o jogo será às quatro da tarde, vocês podem pedir para sair mais cedo. Afastando todo o desânimo que vinha me abatendo desde que Parker me dera um fora, levantei-me e com euforia declarei: — Sabe de uma coisa, Tom? Você é o melhor amigo que uma mulher com o coração partido pode ter. Eu Trinity pulamos sobre ele ao mesmo tempo, beijando-o na face, enquanto ele tentava, em vão, escapar. Noah permaneceu quieto no sofá, observando nossa bagunça.

CAPÍTULO XII Meu despertador me acordou, na manhã seguinte, no exato momento em que eu precisava me levantar e me aprontar para ir à Thrive, continuar o trabalho com Parker. Fiz várias tentativas de deixar a cama, mas não consegui. Eu não tinha estrutura psicológica para olhar para aquele homem, relembrar o sabor do seu beijo, o calor do seu corpo, todos os momentos lindos que vivemos e ter a certeza de que nunca mais aconteceria, de que tudo se perdera na certeza de que tinha sido apenas uma aventura passageira. Como ele pôde ter sido tão falso ao afirmar o quanto me desejava? Em dizer que estava vivendo os melhores momentos de sua vida, quando na verdade sabia que seria passageiro? Mas os homens eram assim, fazia parte dos instintos deles. Talvez outro dia eu me atrevesse a voltar a olhar para ele, mas não hoje, pois estava magoada demais. Eu sabia que estava fraquejando ao colocar meus sentimentos acima do meu sonho profissional, mas não deixaria que isso estragasse minha carreira, no dia seguinte eu retomaria a construção da biografia e a findaria. Ficaria em casa apenas hoje. Tentei voltar a dormir, mas foi em vão. Logo me levantei e fui para a cozinha em busca de alimento, caminhando na ponta dos pés para não incomodar Tom que dormia no sofá. Comi cereais com leite, voltei ao quarto, tomei um revigorante banho frio, vesti short e regata confortáveis e parti para a faxina pesada que aquele apartamento estava precisando urgentemente. Comecei pela cozinha, a fim de deixar que Tom dormisse um pouco mais na sala, porém o toque do telefone o despertou. Ele levantou e atendeu antes que eu alcançasse o aparelho a tempo de impedir a interrupção do seu sono. — Alô. — Ele disse sua voz rouca pelas horas de sono. Ouviu por um longo momento e desligou, retornando ao sofá. — Quem era? — Perguntei, enquanto tentava consertar o aspirador que estava sempre danificado. — O Richard Parker. Meu coração disparou no peito. — O que ele queria? — Falar com você. — E por que você desligou? — Porque ele tava sendo arrogante e minha tolerância para grosseria logo de manhã é zero. Quem podia culpá-lo? Parker era realmente insuportável quando queria. O telefone tocou novamente e minhas mãos começaram a transpirar, minhas pernas ficando trêmulas. — Deve ser ele de novo. Você não vai atender? — Tom perguntou. Eu não estava pronta para ouvir a voz dele sem deixar que o desejo falasse por mim. — Não. Atende você. Diz que não fui trabalhar hoje porque estou muito gripada, mas amanhã eu irei. — Você tá gripada?

— Claro que não Tom. É só uma mentira esfarrapada. Atende logo antes que ele decida vir aqui pessoalmente. Preguiçosamente, Tom deixou o conforto do sofá a tendeu o aparelho. — Alô. — Ouviu por um instante. — Ela tá gripada, de cama, com o maior febrão. Pediu para avisar que vai trabalhar só amanhã. — Ouviu novamente. — Não precisa, a gente está cuidando dela, já até compramos o remédio... — Ele colocou o telefone de volta no lugar e se virou para me fitar com uma expressão que não gostei muito. — Além de ser grosso e doido ele ainda desligou na minha cara. Acho melhor você se deitar e começar a tossir porque ele está vindo pra cá. Fitei-o atônita. — O quê?! — Isso que você ouviu. Tom voltou a se deitar, calmamente, como se o mundo não estivesse desmoronando sobre a minha cabeça. Eu não queria ver Parker e menos ainda queria vê-lo enquanto fingia estar doente. O que eu ia fazer agora? — Tom, não abra a porta se ele tocar a campainha. — Foi à única ideia que me ocorreu. — Tá doida? Eu acabei de dizer a ele que você tá de cama. Como pode não ter gente em casa? — O que eu faço agora? — Não to te reconhecendo Dakota. Você é a garota mais forte e esperta que eu conheço. Da um jeito nele. Agora vai que quero dormir mais um pouco. Sobre a parte de eu ser forte e esperta Tom estava certo, pelo menos eu era assim antes de conhecer Parker. Aquele homem estava me mudando para pior. Sem saber mais o que fazer, corri para o quarto, troquei apressadamente as roupas confortáveis por uma camisola longa e comportada que eu ganhara em uma brincadeira de amigo secreto e nunca tinha usado, baguncei mais os cabelos já naturalmente emaranhados e deitei-me sob o edredom, esperando que tivesse tempo de suar o suficiente para simular uma febre indo embora antes que Parker chegasse. Não demorou muito, logo a campainha tocou e cada fibra do meu corpo se contraiu de tensão. Ouvi vozes masculinas partindo da sala, não apenas as de Tom e Parker, havia mais alguém, embora eu não conseguisse compreender o que eles diziam. Em questão de minutos houve uma batida na porta e os três homens entraram em meu quarto, embora eu enxergasse apenas um deles. Parker estava acompanhado por Tom e um homem de meia idade que se vestia como um médico. Sua presença parecia irradiar por todo o ambiente. Estava mais lindo que nunca, impecável no seu terno cinza e gravata da mesma cor. Os cabelos lambuzados de gel estavam bem penteados, emoldurando sua face bem desenhada, o queixo másculo. Eu perdi o fôlego ao olhar para ele, meu coração insistindo em trabalhar mais depressa no peito, as borboletas fazendo festa no meu estômago. Após observar-me atentamente por um momento, ele percorreu seus olhos lindos pelo quarto e quis que um buraco se abrisse sob mim e me engolisse. O quarto pequeno, além de ter cortinas floridas na janela e uma mobília precária, estava uma verdadeira bagunça, com roupas espalhadas sobre os móveis, uma porta do guarda-roupa aberta parecia vomitar o vestiário colorido. — Como você está? — Parker indagou aproximando-se tanto que o cheiro gostoso do seu perfume me alcançou, me fazendo arrepiar. — Estou melhor. Acordei com febre, mas tomei um antitérmico e já passou. — Fingi uma tosse

depois de falar. — Você não devia tomar remédio sem receita medica. — Seu tom era ríspido e autoritário como eu já conhecia e irritou-me. — Esse é o Dr. White. — Ele gesticulou para o velho homem ao seu lado. — O trouxe para dar uma olhada em você. Minha irritação se intensificou. Quem ele pensava que era para trazer um médico a minha casa sem me perguntar antes? Parker não era o dono do mundo e os terráqueos não eram todos seus servos como ele certamente considerava. — Se eu precisasse de um médico, eu mesma teria chamado um. Agora se quiserem me deixar repousar eu agradeço. A boca dele se curvou num meio sorriso e apesar de me parecer o espetáculo mais fascinante da terra, também dava a impressão de que debochava de mim. — Pode examiná-la doutor. — Ele deu a ordem. Cogitei fazer um escândalo para evitar que aquele estranho me tocasse sem necessidade, mas quis evitar um vexame diante do homem que não tinha culpa de ter sido chamado. Enquanto o médico ouvia meu pulmão com seu estetoscópio, percebi que Tom não tirava seus olhos de Parker, movendo-se discretamente pelo cômodo para examiná-lo de todos os ângulos possíveis. Quem podia culpá-lo por apreciar aquela montanha ambulante de pura masculinidade? Após escutar meus pulmões o médico, mediu minha pressão arterial, minha temperatura, examinou meus ouvidos, olhos e língua, por fim, virou-se para Parker e declarou: — A moça não tem nada. Não encontrei nenhum vestígio de gripe. Tom e eu nos olhamos com cumplicidade. Enquanto ele sorria para mim com diversão, eu procurava um buraco para me esconder. — Eu estava, mas já fiquei boa. — Tentei me explicar, mas não fui convincente, o argumento serviu apenas para me deixar mais constrangida. — Vocês podem nos deixar sozinhos um instante? — Parker falou como se precisasse colocar uma indagação na sua ordem. Tom e o médico saíram do quarto de imediato, deixando-me sozinha com a fera. Eu mataria Tom por isso depois. Sem que nada tivesse me preparado para aquele momento, Parker sentou-se na beirada do meu colchão, todo o meu corpo me alertando da sua proximidade. Logo minha respiração estava pesada, o sangue correndo mais quente em minhas veias. Por mais que eu tentasse, não conseguia ser indiferente àquele homem. — Por que você não foi ao trabalho hoje, Dakota? — Ele perguntou, seus olhos estreitos sobre os meus. — Porque ainda estou cansada da viagem. — Menti. Ele respirou fundo, uma tristeza dolorosa refletindo em seu olhar sem que eu compreendesse a razão. Meu coração me ordenou a confortá-lo, minha mente me mandou ficar quieta, ambos travando uma batalha dentro de mim. — Dakota, eu tenho uma razão para querer minha biografia registrada e não gostaria que você desistisse. Que razão? Eu queria muito saber, mas não era íntima o suficiente para perguntar. — Eu não vou desistir. Isso nem me passou pela cabeça. Amanhã estarei cedo na empresa. Hoje realmente estava cansada.

Ele tocou minha testa suavemente, acariciando-a, talvez com a intenção de me torturar ao me dar uma minúscula demonstração daquilo que eu não poderia ter. Inebriada com seu contato, fechei meus olhos e me esforcei para controlar minha respiração ofegante, mas não funcionou e logo minha boca estava aberta para puxar o ar, denunciando o efeito que ele tinha sobre mim. Eu precisava fugir daqueles sentimentos, pois era humilhante deixar que ele percebesse o quanto eu o desejava, sendo que ele não me queria de verdade. Então, ignorando o fato de que usava uma camisola pavorosa, levantei-me, colocando-me em pé no centro do aposento. — Agora que estamos esclarecidos, acho que o senhor já pode ir embora. Ele abriu a boca para dizer algo, mas pareceu desistir. Desviando os olhos dos meus, levantou-se e se dirigiu para a porta. — Te espero amanhã então. Sem mais, abriu a porta e saiu. Logo ouvi as vozes partindo da sala, inclusive a Trinity, embora não compreendesse uma palavra do que diziam. Eles conversaram demoradamente, enquanto minha curiosidade crescia. Até que por fim os dois pareceram deixar o apartamento. No instante seguinte, Tom e Trinity invadiram meu quarto correndo como dois alucinados. — Amiga! Que homem é aquele! Eu quase tive um infarto olhando para ele. No dia da festa não tinha reparado em tudo aquilo. — Tom falou, enfatizando seu jeito naturalmente afeminado. — E pelo jeito ele gosta de você. Para se preocupar em trazer um médico aqui. — Há! Ele só estava interessado na biografia. — Deitei-me melancolicamente na cama. — Para que ele quer essa biografia, se tem nojo de repórter? — Tom era esperto e já estava tão desconfiado quanto eu. — Eu não sei, mas aí tem coisa. — Ele é conhecido por tratar mal qualquer jornalista que escreva sobre sua vida pessoal e agora quer expô-la assim, tão abertamente? Eu e Tom nos fitamos em silêncio por um longo momento, nossas mentes trabalhando em busca de uma resposta para a mesma questão, contudo era impossível saber. — Aff! Vocês pensam demais. O que tem isso? Talvez ele queira ficar famoso, ou tentar destruir as suspeitas de assassinato que recaem sobre ele. — Trinity fez uma pausa antes de prosseguir. — Ele não confessou nenhum assassinato não, né? — Não Trinity. Mas numa coisa você está certa: nós pensamos demais e agimos de menos. Vamos dar uma faxina nesse apartamento senão daqui a pouco começam a aparecer os ratos. — Eu não vou poder. Tenho entrevista com o senador daqui a pouco. — Trinity disse. — Eu também vou ficar te devendo essa. Preciso falar pessoalmente com Taylor sobre o ingresso para o jogo. E ambos deixaram o quarto tão depressa quanto tinham entrado. Não vi problema em fazer a faxina sozinha. Me movimentar faria bem ao meu corpo e à minha mente. Então, voltei a vestir as roupas confortáveis, liguei o som no último volume, me deliciando com a voz rouca dos Scorpions e dei início àquela maratona que se estenderia por toda a manhã. Precisávamos sair de casa com pelo menos uma hora de antecedência se quiséssemos chegar ao NRG Stadium a tempo de pegar o início do jogo. Como se tratava de um dos maiores acontecimentos

esportivos dos últimos tempos em Houston, obviamente o trânsito estaria engarrafado nas proximidades do estádio. Às três horas em ponto, estávamos todos prontos. Trinity usava jeans rasgados nas pernas, a camiseta do nosso time e boné. Eu também usava jeans, mas dispensara o boné e a camiseta do time, optando por um top de malha preto. Tom e os rapazes também usavam a camiseta do time. Estávamos todos exultantes porque Taylor aceitara acompanhar Tom ao evento. Era a primeira vez que ele concordava em aparecer em público ao lado do companheiro e nosso amigo merecia ser feliz mais que muitas pessoas. Fomos todos no carro de Tom. Como previsto o trânsito estava caótico, mas ainda assim conseguimos chegar antes do início do jogo. O NRG Stadium era a maior arena da cidade, localizado em Reliant Parkway parecia esplendoroso com sua fachada em branco e vidro. O estacionamento estava lotado e havia uma multidão de jornalistas ali, a maioria tentando entrevistar as pessoas famosas que entravam para ver o jogo. Olhei fascinada para eles e me vi naquele seu lugar, fotografando, entrevistando, transformando o que presenciava em texto. Faltava pouco para que eu chegasse lá. Do lado de dentro havia jornalistas também, porém em menor número, cobrindo o evento. Nas arquibancadas lotadas, ocupamos nossos lugares e logo o jogo teve início. O placar estava de vinte e três a dezoito para o nosso time, o Houston Texans, quando decidi que precisava esticar as pernas, então avisei a Trinity que ia ao banheiro e deixei meu assento, passando pelo espaço pequeno entre as fileiras de cadeiras abarrotadas de gente. Estava atravessando o pavilhão central, quando percebi que Noah me seguia. — Preciso falar com você. — Ele disse, segurando-me a mão para me deter. — Fala. — Respondi consternada, desconfiada de que não iria gostar do que ele diria. — Aqui tem muita gente. Vem comigo. Sem que eu esperasse, ele saiu me puxando pela mão, até que me dei conta de que já estávamos do lado de fora do estádio e ele acenava para um táxi que passava, que por sorte não parou. — Você ficou doido? Aonde quer me levar? — Puxei minha mão da dele. — Preciso ficar a sós com você. — Seu tom era rouco, seu olhar cálido e não gostei disso. Tinha a impressão de que estávamos traindo a confiança de Trinity. — Fala o que você tem para falar logo. Porque eu quero voltar para o jogo. Ele segurou minhas duas mãos e se colocou muito perto de mim, fitando-me profundamente nos olhos. — Tem certeza que você não sabe? — Não. Não sei. — Menti, eu sabia exatamente onde ele queria chegar. — Eu gosto de você Dakota. Sempre gostei. Nunca esqueci o tempo que passamos juntos. E quando fiquei sabendo que você saiu com aquele assassino, quase enlouqueci. Suas palavras despertaram a raiva em mim, primeiro por trair a confiança de Trinity, segundo por chamar Parker de assassino. Ele era insuportável, mas não um assassino. — Já chega! — Esbravejei, puxando minhas mãos das dele. — Volte para sua namorada que é o seu lugar. Como você pode fazer isso? Trinity te ama! — Mas não é ela que eu amo. Só estamos namorando porque você me empurrou para os braços dela. Eu demorei a perceber, mas agora tenho certeza: você, Dakota, é a mulher que eu amo. E sei que você ainda gosta de mim, ou não teria passado todo esse tempo sozinha. Uma garota como você.

Eu não podia acreditar no que meus ouvidos ouviam. Ele só podia ser lunático ou muito burro para acreditar que eu passara todo esse tempo sem ninguém porque ainda gostava dele. Estreitei meus olhos sobre os seus, me esforçando para segurar o punhado de palavrões que insistiam em tentar atravessar minha garganta, quando de repente, sem que eu esperasse, ele me segurou firme pela cintura, puxando-me para si e tomou meus lábios, ignorando meus protestos, roubando-me o beijo forçado. Lutei bravamente contra ele, debatendo-me, contudo, apesar de não possuir grande porte físico, ele era muito mais forte que eu e foi apenas quando mãos fortes o puxaram de mim, que ele parou.

CAPÍTULO XIII

Atônita, observei Parker esmurrar o rosto dele, repetidamente, sem que Noah conseguisse se defender da fúria implacável que parecia tomar conta do outro. — Para. — Gritei, temendo que Parker o matasse. — Já chega! — Sai daqui seu merdinha. E não volte a colocar suas patas em uma mulher sem a permissão dela. — Parker esbravejou, com aquele tom de voz e aquela carranca que assustaria até Mike Tyson. Estava ofegante pelo esforço da luta. Livre das mãos de aço, Noah voltou correndo para o interior do estádio. — O que você tá fazendo aqui? — Indaguei surpresa. — Eu estava sentado no meu carro do outro lado da rua, tentando convencer a mim mesmo a não entrar aí. Meu coração disparou no peito. — E por que você não podia entrar? Ele fitou-me fixamente nos olhos, meu mundo se perdendo na calidez do seu olhar. — Porque eu não posso alimentar esse sentimento. As borboletas começaram a fazer piruetas no meu estômago. — Do que você está falando? Eu sabia do que ele estava falando, mas queria, não, mais que isso, eu precisava ouvi-lo pronunciar as palavras. Sem deixar de me fitar, daquela forma que me levava a um passeio nas nuvens, ele tocou meu rosto com uma mão, acariciando minha pele, suscitando-me o calor do desejo. — Você sabe do que estou falando. O que aconteceu no Brasil não foi apenas sexo, pelo menos não para mim. — Ele hesitou antes de prosseguir. — Eu sou completamente louco por você, Dakota, embora saiba que preciso lutar contra esse sentimento, pela sua segurança. Quando sua amiga me disse que vocês viriam aqui hoje, eu percebi que não sou forte o bastante. Comecei a imaginar você se divertindo, sorrindo, com tantos homens a sua volta, e perdi a cabeça... Meu coração batia tão depressa no peito que parecia querer saltar pela boca, minhas pernas estavam trêmulas, meu sangue fluía mais quente nas veias. Eu não sabia se queria matar ou agradecer a Trinity por dizer a ele que viríamos ao jogo. Era magnífico ouvi-lo admitir que eu significava algo para ele, tanto quanto ele significava para mim, embora, por outro lado, eu não podia me esquecer de que ele me dera um fora no Brasil. — No Brasil, o senhor disse que não podíamos continuar. — E não podemos. Isso colocaria sua vida em risco. Mas eu sou egoísta, não consigo ficar longe de você. — Eu não tenho medo de nada. — Foi tudo o que consegui dizer. No instante seguinte, ele me tomou em seus braços, seus lábios buscando os meus, sem que eu encontrasse forças para resistir ao beijo que veio sôfrego, quase violento, roubando-me o fôlego,

obstruindo-me qualquer pensamento racional. Pude constatar o quanto senti falta daquele contato com ele, o quanto era bom ser beijada por aquele homem, senti-lo assim tão perto, tão meu. Naquele momento compreendi que meus sentimentos por ele iam muito além de uma paixão corriqueira. Eu o amava, não sabia como isso era possível se o conhecia há tão pouco tempo, mas estava definitivamente perdida de amor. Aquele beijo parecia me transportar para um estágio diferente da minha vida, no qual a certeza de que eu estava amando pela primeira vez me fazia um novo ser humano, uma pessoa capaz de se doar, como jamais tinha sido antes. Estar com Parker era o que eu queria para minha vida, não tinha nenhuma dúvida disso e não seria um assassino a me fazer desistir dele. — É Richard Parker! — A voz masculina, eufórica e desconhecida, partiu de muito perto, sobressaltando-nos. Apenas depois que interrompemos o beijo, nos demos conta de que uma pequena multidão de jornalistas se formava a nossa volta, fotografando-nos repetidamente. De súbito me ocorreu que ainda naquele dia eu estaria em todos os jornais da cidade como namorada de Parker e um assassino louco estaria no meu encalço. Puta merda! — Sr. Parker. Pode nos dizer quem é sua nova namorada? — Outro repórter perguntou, sem deixar de nos fuzilar com sua câmara fotográfica. Parker empurrou-o com violência, quase o jogando na calçada, antes de segurar-me a mão e me puxar para a rua, abrindo caminho entre os jornalistas insistentes e inconvenientes. Precisei de um enorme esforço para acompanhar o ritmo acelerado dos seus passos largos e apressados enquanto atravessávamos a rua movimentada. No acostamento do outro lado, ele abriu a porta do carona de uma BMW cinza e praticamente me empurrou para dentro, fez a volta, abriu a outra porta e tomou o volante. Partiu em altíssima velocidade, os pneus cantando sobre o asfalto, o carro ultrapassando perigosamente os outros veículos que transitavam por ali. — Vai devagar. — Pedi, apavorada. Todavia, ele parecia não me ouvir, continuava correndo. Íamos a cento e sessenta por hora, o que parecia impossível no centro da cidade. Apesar de Parker se mostrar um motorista habilidoso, desviando dos outros carros com maestria, eu não conseguia afastar o pânico que tomava conta de mim. Estava começando a ficar desesperada de medo, quando finalmente ele parou, estacionando bruscamente no acostamento. Inclinou-se sobre o volante, repousando sua testa nele. Ficou assim por um logo momento de silêncio, até que, de repente virou-se para mim e me abraçou, apertando-me com força de encontro ao seu corpo, afundando meu rosto no seu pescoço deliciosamente cheiroso. Foi inevitável, o calor do desejo se alastrou rapidamente pelo meu sangue, todavia, percebi que ele estava trêmulo e fiquei confusa. Como um homem forte e poderoso como Parker podia tremer descontroladamente? — Me desculpa Dakota. — Ele sussurrou sua voz tão trêmula quanto seu corpo. Entendi que ele estava se referindo ao fato de termos sido fotografados juntos pela imprensa. Isso me preocupava, afinal teria um assassino na minha cola, mas eu era esperta o suficiente para conseguir me defender, aquele ataque de nervos dele era desnecessário. — Está tudo bem. Tudo vai ficar bem. Ele afastou-se para me fitar no rosto. — Como você pode dizer que está tudo bem, se acabei de colocar sua vida em risco?

— Não foi culpa sua. Você não me forçou a nada. — Claro que foi minha culpa! Eu devia ter sido mais prudente. Não deveria ter ido àquele estádio. — Acho que você está fazendo tempestade num copo d’água. Uma fúria meio selvagem se refletiu em seu olhar, me impulsionando a afastar-me, quase atravessando a porta fechada do veículo. — Você não sabe o que é perder todas as pessoas de quem já gostou! — Sua voz parecia uma trovoada em um dia de tempestade. — E saber que a culpa da morte delas foi sua! Eu tinha perdido minha filha, ele não podia me acusar de não conhecer a dor. Transtornada, abri a porta do carro e saí, caminhando sem rumo pela rodovia. Não tinha me afastado nem dois metros quando ele tomou-me o caminho. — Aonde você vai? Volta para o carro. — Na boa, você não pode me dar ordens. — Não estou te dando ordens. Estou pedindo. Por favor, volta para o carro. É perigoso caminhar numa rua movimentada como essa, sem falar que não faz o menor sentido. Eu precisava reconhecer que ele estava certo. Era loucura tentar chegar a algum lugar caminhando por uma rodovia movimentada, ademais eu não queria me afastar dele realmente. — Não me acuse de não conhecer a dor da perda, Sr. Parker, pois a conheço muito bem. Perder uma filha, mesmo que não tenha sido para a morte, também pode ser bastante doloroso. Ele percorreu os dedos através dos seus cabelos curtos, num gesto de nervosismo. — Me desculpa Dakota. Eu não estava pensando direito. Poxa, dois pedidos de desculpas de Richard Parker na mesma tarde! Apesar de tudo, era uma grande evolução. Em silêncio, entrei de volta no carro, enquanto ele fazia o mesmo. Deu a partida e nos introduziu de volta ao trânsito movimento daquele fim de tarde, mais devagar desta vez. O sol forte ofuscandome as vistas através do para-brisa. — Vamos passar no seu apartamento e pegar suas coisas. Você vai ficar comigo agora. Ele estava falando sério? Eu não sabia se soltava fogos ou pulava do carro em movimento. Ficar com Parker, em seu apartamento, era tudo o que eu queria, no entanto, mais uma vez ele estava decidindo minha vida sem me perguntar antes e isso era frustrante. — Eu não vou para o seu apartamento. — Declarei birrenta. — Claro que vai. Você não está mais segura e a partir de hoje não sairá das minhas vistas. — Não posso deixar Trinity sozinha. Eu divido o aluguel com ela. — Eu continuo pagando sua parte, mas você fica comigo. O que fazer quando se tinha o homem mais delicioso e controlador do universo ditando sua vida? Não havia saída que não concordar. Parker sabia ser persuasivo quando queria. Talvez ele desconfiasse que eu não deixaria meu apartamento facilmente se passássemos por lá, então nos levou direto para River Oask, onde morava. Ao adentrar seu prédio, estacionando na garagem, fiquei surpresa com a simplicidade do edifício. Não chegava a ser nem de classe média. Estava abaixo disso. Eu esperava que um milionário como ele morasse na luxuosa cobertura de um edifício muito mais sofisticado que aquele. — Mando alguém ir buscar suas coisas amanhã. — Ele declarou, ao abrir a porta para mim.

Ciente de que era inútil discutir com ele, simplesmente dei de ombros e saí, seguindo-o para o precário elevador. O apartamento dele era pior que o meu, eu estava quase chocada! O que um homem rico como ele fazia numa pocilga daquelas? A sala era pequena, apenas um balcão a dividia da cozinha. Pelo que pude perceber, havia apenas um quarto ali. Apesar da simplicidade do lugar, os móveis eram caros, principalmente os aparelhos eletrônicos sobre a estante. Por outro lado, as paredes estavam desprovidas de quadros, a decoração rústica nua de qualquer alegria. O ar condicionado estava ligado e tornava o ambiente agradável. — Você por acaso está falido e não contou para ninguém? — Perguntei sem pensar. Os lábios dele se curvaram num amplo sorriso e foi o suficiente para que meu coração saltasse como um louco no peito. Era o sorriso mais estonteante da face da terra e o fato de saber que eu era responsável por despertá-lo me era imensamente satisfatório. — Não. Mas gosto deste lugar. É especial para mim. — Ele tirou seu paletó e afrouxou o nó da sua gravata, enquanto eu umedecia meus lábios, instintivamente, minha boca salivando por aquele homem. Pela forma como ele estava vestido, eu podia apostar como tinha ido direto da Thrive para o estádio. — Sente-se. Você quer beber alguma coisa? — Sim. Uma água. — Sentei-me no sofá caro que não combinava em nada com o lugar, quando então me ocorreu que precisava ligar para Trinity e avisar onde estava. — Vou dar um telefonema, você se importa? — Fique à vontade. — Ele se deslocou para a cozinha minúscula. Tirei meu celular do bolso do jeans e falei rapidamente com Trinity, não conseguimos conversar muito, pois ela ainda estava no estádio e o barulho lá era infernal. Enquanto eu falava, Parker entregou-me um corpo grande com água gelada e acomodou-se no outro sofá com seu copo de uísque na mão, observando-me. Quando desliguei, foi à vez do telefone dele tocar. Ele afastou-se para atender. Ciente de que ele falava sobre seus negócios, decidi explorar o apartamento. Não havia muita coisa para ver. A porta aberta da sacada atraiu-me a atenção, então me aventurei a descobrir qual a vista de Houston, Parker tinha todos os dias. Do lado de fora, o calor começava a amenizar, ao passo que o sol se punha, formando uma linha amarelada no horizonte. A vista não era tão terrível. Dali se podia avistar o longo tapete de pequenos prédios residenciais até se perder de vista. Parecia um lugar tranquilo, se comparado ao subúrbio onde eu vivia. — Dakota! — A voz de Parker me alcançou quase em um grito de alarme, assustando-me tanto que deixei o copo com a água espatifar-se no chão. Virei para ele e o vi em pé no meio da sala, ainda com o celular na mão, observando-me com olhos alarmados, mais que isso, sua expressão estava aterrorizada. — O que você tá fazendo aí?! — N-nada... Só olhando. — Minha voz vacilou pelo susto. — Não pode? Ele ficou paralisado por mais um minuto, com aquele olhar sombrio cravado em meu rosto, então respirou fundo, deixando seu corpo relaxar. Abandonou o celular sobre o sofá e veio até mim. Chegou tão perto que seu calor me roubou o fôlego. — É perigoso aqui.

— Me sinto segura. — Não se sinta. Sem deixar de fitar meus olhos, ele acariciou minha face com a palma da mão, para em seguida tomar-me os lábios, beijando-me avidamente, bloqueando minha mente para qualquer pensamento racional. Logo suas mãos estavam segurando minhas costas, firmemente, prendendo-me contra seu corpo másculo, o calor da luxúria passeando livremente pelo meu sangue, arrebatando-me. Eu devia negar-me a ele, por ter me dado um fora depois de passarmos três dias nos braços um do outro e porque eu temia que ele fizesse isso de novo, todavia eu não estava em condição de pensar em mais nada que não em suas mãos grandes passeando sobre minhas curvas. Eu queria Parker e queria com todas as minhas forças, não me importava o que ele me dissera antes, ou que minha vida estivesse em perigo ao seu lado, tudo o que importava era o que eu sentia. Sua boca gostosa escorregou para meu pescoço, beijando-me ali, intensificando o desejo que queimava nas minhas entranhas. — Eu te quero tanto... — Sussurrei, num gemido quase de súplica, afundando meus dedos nos seus cabelos curtos. Ele afastou-se para encarar o meu rosto, sua expressão surpresa, como se não esperasse ouvir aquelas palavras. — Não mais do que eu te quero, minha menina. Sem desviar seus olhos castanhos claros dos meus, ele ergueu-me no ar, carregando-me para a sala, estendendo-me sobre o sofá macio, meu torso erguido pelo braço do móvel. Então, sentou na beirada do estofado, inclinando-se sobre mim, segurando-me firmemente pelas costas, apertando-me contra si, ao mesmo tempo em que voltava a beijar minha boca, voluptuosamente, me fazendo incendiar do mais lascivo desejo. Pouco a pouco, tudo desapareceu a minha volta, a não ser aquele homem. Eu não enxergava mais nada, não conseguia mais pensar, apenas o sentia mergulhada no desejo selvagem que me envolvia. Suas mãos passeavam pelo meu corpo, buscando minha intimidade oculta pelas roupas enquanto sua língua explorava minha boca. Ele chupou meu lábio inferior, para em seguida descer aquela boca gostosa pela minha pele, trilhando o caminho para a minha perdição. Interrompeu para tirar minha blusa e o sutiã. Contemplou meus peitos desnudos por um instante, antes de abocanhar um deles, sugando meu mamilo duro de tesão. Lancei a cabeça para trás e gemi, um gemido de puro prazer. Movida pela luxúria, afundei meus dedos nos seus cabelos na altura da sua nuca e fiz uma leva pressão, trazendo-o mais para mim, extraindo mais daquele prazer insano que ele me proporcionava. Logo sua boca passeava por cada parte do meu corpo, sugando e lambendo minha pele, como apenas Parker sabia fazer. Parou para tirar meu jeans e minha calcinha, colocando-se em pé, contemplando minha total nudez com olhos sequiosos. Por mais incrível que pudesse parecer, eu não me sentia constrangida em ficar nua diante do seu olhar, pelo contrário, gostava de ser admirada por ele. — Tão linda... — Ele sussurrou, enquanto tirava, vagarosamente, suas roupas, sem deixar de observar minha nudez.

CAPÍTULO XIV

Ficou completamente nu diante de mim, o pênis totalmente duro esticado para cima, se estendendo até seu umbigo. Um espetáculo magnífico aos olhos de qualquer mulher com sangue nas veias. Era impossível ficar indiferente à perfeição do corpo dele, aos músculos salientes do tórax, aos braços rochosos, ao abdômen sarado, porém, o que mais me enlouquecia era aquela trilha de pelos que partia do seu umbigo e terminava na sua pélvis. Minha vontade era de morder aquela parte do seu corpo. Sem que eu esperasse, Parker pegou seu corpo de uísque completo até a metade e voltou a sentarse ao meu lado. Cuidadosamente, começou a derramar o líquido gelado sobre minha pele, sem se importar com o fato de que a bebida escorria pelas minhas laterais e manchava o estofado branco. Começou pelo pescoço, descendo até meu ventre, um fio da bebida escorrendo para meu sexo, me fazendo estremecer em expectativa pelo que aconteceria em seguida. — Eu adoro um uísque de boa qualidade. — Ele falou com malícia, seus olhos brilhantes fixos nos meus. Contornou meus lábios com sua língua deliciosa, antes de escorregá-la para baixo, sua boca habilidosa chupando o uísque da minha pele, lascivamente, me deixando com a sensação de que meu corpo estava em chamas. Gemi alto quando ele desceu mais a boca, percorrendo a trilha do uísque em meu ventre, sugando o líquido, até alcançar meu sexo, quando então dobrou uma das minhas pernas para cima e estendeu a outra para o chão, deixando-me arreganhada diante do seu olhar faminto. — Essa bocetinha pelada me deixa doido. Mantenha-a sempre assim. — Ele colocou sua boca no meu sexo, sua língua mergulhando entre meus grandes lábios, se infiltrando na minha vagina lambuzada, movendo-se em um vai e vem que me enlouquecia. — Ah! Porra, que delícia! — Balbuciei, num gemido, ensandecida de prazer enquanto ele me fodia com sua língua. Completamente dominada pela luxúria, segurei seus cabelos curtos os e puxei, ao mesmo tempo em que movia ligeiramente meus quadris, esfregando minha boceta na boca dele. A língua deliciosa deixou o meu canal e partiu para meu clitóris, movendo-se em círculos sobre ele, ritmadamente, deixando-me ainda mais doida. Sem parar de me lamber desta forma, Parker introduziu apenas o seu polegar na minha vagina e foi a minha perdição, logo explodi em num orgasmo arrebatador, que me fazia gritar sem querer, meu corpo sacudindo descontroladamente. Ele se alimentou dos resquícios do meu prazer antes de trazer sua boca à minha, dando-me sua língua para que eu a chupasse e o fiz deliciada, agindo como um animal no cio. — Esse é seu sabor Dakota. Gosta? — Ele sussurrou, seu hálito quente acariciando minha face. — Ah, sim... Desde que venha de você. — Sinta um pouco mais. Ele introduziu sua língua novamente em minha boca e a suguei gulosa, extasiada.

Eu ainda não tinha me recuperado do orgasmo, quando pouco a pouco tomei consciência do corpo dele completamente colado ao meu, de cima abaixo, sua pele nua em contato direto com a minha, seu tórax musculoso esmagando meus seios frágeis, deliciosamente e o fogo da luxúria cresceu novamente em mim, incendiando-me de dentro para fora, me arrancando um gemido. Sabendo o que eu queria, Parker pressionou seu pau, duro como pedra, no interior da minha coxa, lambuzando-me com seu líquido viscoso. — É isso que você quer? — Sua voz era um sussurro rouco. — Ah... Sim... — Então peça. — Me dá esse pau gostoso. — Não me convenceu. — Ah, por favor, mete esse pau na minha boceta. — Huumm... Tenho outros planos. Sem aviso prévio, ele colocou-se em pé, levando-me junto, deixando-me sentada na beirada do estofado enquanto se colocava diante de mim, seu membro rijo na altura do meu rosto. — Me chupa gostosa. — Grunhiu, selvagemmente. Então, segurou firme em meus cabelos, atrás da cabeça e conduziu minha boca até sua virilidade, observando-me colocá-lo na boca. Seu tamanho me preencheu e chupei firme, inebriada, parando para lamber a cabecinha, enterrando-o novamente em mim, cada vez mais fundo. Quando o levei tão fundo que chegou até minha garganta, fui recompensada pelo gemido grosso, excitante, que parecia partir do fundo do seu âmago. Parker me fez parar. Com sua mão firme em meus cabelos, ergueu meu rosto para encará-lo. — Vai engolir tudinho hoje? — Não. — Humm, não era a resposta que eu queria. Com toda a sua experiência, ele me fez deitar de lado no sofá, de frente para ele, minha cabeça erguida sobre o cotovelo, de modo que eu ainda pudesse alcançar seu sexo ao mesmo tempo em que meu corpo ficava completamente à sua disposição. Encheu novamente minha boca com sua masculinidade, empurrando minha cabeça com uma mão, enquanto levava a outra à minha intimidade, mergulhando um dedo entre meus lábios vaginais para massagear meu clitóris com movimentos circulares, enlouquecendo-me. Seu pau abafou-me um gemido ensandecido e abri mais minhas pernas, para ampliar seu acesso, enquanto levava seu pau até minha garganta, cada vez mais depressa e fundo. Eu estava quase gozando na mão dele, quando seu pau se tornou mais duro no meu interior e ele simplesmente parou, retirando-se de mim ao mesmo tempo em que parava de me tocar. — Vai engolir meu esperma, Dakota? Porra! Isso era chantagem. — Sim... — Respondi enlouquecida. Surtaria se ele não me deixasse gozar. — Então peça. — Por favor, me deixe engolir seu esperma. — Boa menina. Voltou a introduzir seu pau gostoso na minha boca ao mesmo tempo em que voltava a massagear

meu clitóris inchado de tesão. Segurou firme em meus cabelos e moveu seus quadris em um vai e vem fodendo minha boca, deliciosamente. Logo ficou mais duro e com um gemido erótico esporrou, enchendo-me a boca com seu leite quente, que engoli sem hesitar, gostando daquilo muito mais do que esperava. Ele parou de massagear meu sexo, antes que eu gozasse. Filho da puta! Segurou-me embaixo dos braços e me puxou para cima, com a facilidade de quem manuseava uma criança. Abraçou-me forte, colando seu corpo ao meu, nossos rostos a poucos centímetros de distância. — Você joga sujo Richard Parker. — Circulei seu pescoço com meus braços, intensificando nosso contato. Ele sorriu amplamente, um sorriso estonteante, capaz de deixar a mais frígida das mulheres com a calcinha molhada. A minha estaria se eu estivesse usando uma. — Eu sempre consigo o que quero. Não me importam os meios. — Você é um safado. — Que boca suja essa sua. Vou ter que silenciá-la. Então, ele cobriu meus lábios com os seus, chupando minha língua com ardor, intensificando o tesão que tomava conta de cada uma das minhas terminações nervosas. Esfreguei meu corpo no seu, como se necessitasse daquele contato para sobreviver e logo sua ereção se refez de encontro ao meu ventre, o fato de ser responsável por isso incendiando-me um pouco mais. — Está vendo o que você faz comigo? — Sua voz era um sussurro entrecortado pela respiração ofegante. — Não mais do que você faz comigo. Ele voltou a sugar minha língua, lascivamente, ao mesmo tempo em que aninhava seu pau entre minhas pernas fechadas, logo abaixo da minha boceta lambuzada, movendo-se assim, nossos líquidos se misturando. — Ah! Delícia. Não posso mais esperar. Preciso foder essa bocetinha. — Ele foi até sua calça jogada no chão, tirou uma camisinha da carteira, abriu a embalagem com os dentes e a colocou. Voltou a beijar-me nos lábios, conduzindo-me para o sofá, até que eu estivesse sentada. Com um safanão, puxou minhas pernas para frente, depois para cima, pendurou-a em seus ombros, inclinandose e me penetrou, com outro safanão, tão brusco, forte e intenso que um grito agudo me escapou. Parker puxou os quadris e os trouxe novamente, penetrando-me fundo, forte, esticando as paredes escorregadias do meu canal, deliciosamente, o som das nossas pélvis se chocando ecoando pela sala pequena. — Ah... Que bocetinha apertada... Gostosa... Vou me acabar de tanto te foder. Sem desviar seu olhar meio selvagem do meu, ele continuava me fodendo com tudo, arremetendose contra mim cada vez mais depressa, até que um novo orgasmo se formou nas minhas entranhas e explodi, gritando e chorando enquanto gozava no pau dele, enlouquecida de prazer. — Assim minha criança, goza no meu pau. Os olhos dele não se desviavam dos meus e foi magnífico gozar sob a intensidade aquele olhar. Quando eu parei de me sacudir, Parker beijou-me sofregamente na boca, um beijo carregado de luxúria e das mais devassas promessas. — Agora fica de quatro. — Deixou o meu interior. Sua voz tinha tom de autoridade e obedeci

ansiosa, colocando-me de quatro sobre o sofá. Ele ficou de joelhos atrás de mim, posicionou seu pau na minha entrada e voltou a me penetrar, com força, indo tão fundo que um grito alto me escapou. Porra! Isso nunca deixava de ser tão bom? Parker segurou meus quadris com uma mão de cada lado, fodendo-me cada vez mais depressa, mais forte, mais fundo, enlouquecendo-me de prazer. Desferiu uma palmada na minha bunda e gritei novamente, ensandecida. Bateu na outra nádega e isso foi tão bom que supliquei por mais. Não havia palavras que pudessem descrever tudo o que aquele homem me fazia sentir. Loucura talvez fosse à palavra mais adequada, pois eu agia como um animal no cio, quanto mais ele me dava daquele pau, mais eu queria. — Ah... Dakota... Vou gozar... Vem comigo... Meu corpo reagiu violentamente ao comando da sua voz e logo o êxtase me arrebatou uma terceira vez, tão intenso que quase desfaleci ao mesmo tempo em que, com um gemido rouco, ele se esvaía dentro de mim, seus espasmos se fazendo de encontro às paredes sensíveis do meu canal. Caímos moles sobre o estofado, eu de bruços, ele em cima de mim. Ficamos ali imóveis por um longo momento, o silêncio quebrado apenas pela nossa respiração ofegante, até que ele se afastou apenas o necessário para se livrar do preservativo cheio e voltou para meus braços, deitando-se de lado no sofá, me ajeitando na mesma posição, de frente para si. Nossos corpos colados de cima abaixo, o contato direto das nossas peles nuas me proporcionando a melhor sensação que uma mulher podia ter depois de três orgasmos. Seu rosto estava a poucos centímetros de distância do meu, meu olhar preso ao seu e ele sorriu, largamente, encantadoramente. — O que foi? — Sorri de volta, hipnotizada. — Estou feliz. — Eu também. — Há muitos anos, eu não sentia meu coração bater assim por alguém. — E o meu nunca tinha batido assim. Ele ficou sério, subitamente. Acariciou minha face com a ponta dos dedos, quando então compreendi que éramos duas almas feridas que se encontravam ao longo de um caminho tortuoso. — Eu te amo, Richard. — A frase me escapou e, no instante seguinte, me arrependi pelo descuido. A reação dele foi tudo, menos o que eu esperava. Repentinamente, seu rosto se contraiu, como se seu corpo estivesse tomado por uma grande dor, a expressão que refletiu em seu olhar foi de uma tristeza tão profunda que me fez querer chorar. — Você não devia me amar. — Ele se levantou indo à cozinha em busca de mais uísque, deixando-me atônita, confusa sobre o sofá. Eu quis perguntar por qual razão não podia amá-lo, mas acreditava que conhecia a resposta, ele estava me alertando para o fato de que a qualquer momento podia me descartar, com frieza, como fizera no Brasil e para o fato de que eu estava ali não porque ele gostava verdadeiramente de mim, mas porque não queria que eu fosse assassinada e sua consciência se tornasse pesada mais uma vez. Apesar de já conhecer todas aquelas verdades, deparar-me com elas me doía tanto que parecia dilacerar-me por dentro. Todavia, não deixaria transparecer o quanto estava magoada, para não parecer boba ou fraca, por amar quando não era correspondida.

— Onde fica o banheiro? — Levantei-me, fingindo indiferença às suas palavras, quando na verdade elas me atravessavam como uma espada afiada. — No quarto. À sua frente. — Ele gesticulou para uma direção, segurando seu copo de uísque, ainda completamente nu, como eu, seus olhos passeando pelo meu corpo, com uma fome que parecia não ter fim, os meus passeando pelo dele, os pensamentos devassos voltando. — Depois do banho vou te levar para jantar. Obviamente ele me levaria a um restaurante luxuoso, como uma pessoa na posição dele costumava frequentar, apesar do que, depois de ver seu apartamento nada mais me surpreenderia, mas se levasse eu não estaria vestida adequadamente. — Não tenho roupa para ir a um restaurante. — Essas aí estão boas para mim. — Ele gesticulou para meu jeans e blusa que eu catara do chão. — Mas se você quiser comprar alguma coisa, tem um shopping no caminho do restaurante. Fazer compras de novo? Isso estava se tornando rotina desde que o conhecera. — Prefiro comprar alguma coisa. Me dirigi para o quarto dele. Era o cômodo mais amplo do apartamento, embora ainda fosse pequeno. Mobiliado por poucos móveis, porém caros. Estava impecavelmente organizado, o que me fazia sentir ainda mais envergonhada pela bagunça que ele presenciara no meu quarto, a grande cama de casal parecia nunca ter sido usada. Aos fundos estava a porta do banheiro, para onde fui. Apenas ao entrar percebi que Parker me seguia e foi inevitável, sob os jatos de água do chuveiro, nos entregamos mais uma vez àquele desejo louco que surgia com apenas um olhar e se intensificava mais cada vez que nos tocávamos. Mais tarde, quando deixamos o apartamento, Parker vestia calça social preta e camisa de mangas compridas, enroladas até os cotovelos, da mesma cor. Usando apenas os dedos ele conseguira deixar seus cabelos naquela bagunça organizada que o tornava sexy como o inferno. Ele era o tipo de homem que qualquer mulher desejaria ao olhar, no entanto era comigo que estava, embora o motivo não fosse exatamente o que eu queria. Fomos direto para o shopping, onde eu trocaria meus jeans por um vestido de noite. Entramos na mais sofisticada das lojas, a vendedora vestida com requinte vindo nos atender, seus olhos verdes brilhando na direção de Parker, como eu já esperava que fosse. Experimentei alguns vestidos e como fiquei indecisa entre três, decidi levar todos, optando por usar um modelo azul claro, tão colado que revelava cada uma das minhas curvas, tinhas as costas nuas e uma grande fenda frontal na saia longa e reta. Escolhi sandálias de salto prata, e ainda no vestiário fui socorrida pela vendedora que se mostrou generosa ao dar um jeito no meu cabelo de vassoura, prendendo-os num coque e emprestando-me seu batom vermelho escuro. Fiquei satisfeita ao ver a admiração e a cobiça reluzindo no olhar de Parker quando deixei o vestiário, pronta para irmos. — Você está linda. — Ele usou seu cartão para pagar a conta e deixamos o shopping. O restaurante que Parker escolheu era o lugar mais sofisticado onde eu já tinha estado. O grande salão parecia iluminado com luzes douradas, sobre cada mesa havia um lustre redondo delicado, as toalhas das mesas eram brancas, sobre elas havia taças de cristal e talheres de prata. Estava abarrotado de pessoas, mas elas falavam tão baixo que parecia não haver ninguém. Fomos recebidos por uma loura com cerca de quarenta de anos de idade, que parecia conhecer Parker, mostrando-se muito mais simpática com ele que comigo. Foi mais uma que precisei xingar

mentalmente, por paparicar o meu homem. Jantamos codorna ao molho, um prato tão sofisticado que tinha um nome, embora eu não conseguisse decorá-lo. Estávamos envolvidos numa aura de romantismo, paz e tranquilidade, a conversa fluindo espontânea entre nós, como sempre era quando estávamos a sós em outro lugar que não seu escritório. A impressão que eu tinha era a de que conhecia Parker há muito tempo, tão íntimos nós parecíamos. Após o jantar passeamos de mãos dadas por uma pracinha movimentada localizada próxima ao restaurante, sem demorarmos muito ali. De volta ao apartamento, fomos direto para o quarto, saciar nosso desejo louco sobre a cama que parecia nunca ter sido usada. Transamos praticamente durante toda a noite, o desejo que nos impulsionava a agir como dois animais no cio, se tornando cada vez mais intenso, o prazer inesquecível, até que a exaustão nos tomou e adormecemos nos braços um do outro, completamente nus e saciados.

CAPÍTULO XV Despertei meio desnorteado, demorando para me localizar. Estranhei que estava na minha cama, em meu apartamento, pois eu nunca dormia naquela cama grande demais para uma pessoa apenas, preferia o sofá. Relembrei que Dakota tinha dormido em meus braços, o cheiro gostoso dela ainda estava ali, mas onde ela estaria? Ainda nu, levantei-me e parti pelo apartamento à sua procura, não havia muito onde procurar e não demorei a descobrir que ela não estava em parte alguma. Onde estaria? A sirene estridente de uma ambulância, vinda da rua, atraiu-me a atenção. Com um mau pressentimento, corri para a sacada e vi a pequena multidão de pessoas se formando em torno de algo diante do prédio. Parecia um corpo. À distância me impedindo de distinguir claramente. Oh meu Deus! Dakota. Aflito, voltei ao quarto, vesti um jeans e corri para a saída, quando então constatei que a porta estava destrancada. Alguém entrara no apartamento. Ah, não! Dakota! Minha doce Dakota! Meu coração estava apertado no peito enquanto eu descia pelo elevador precário. Ao alcançar a rua, para meu total desespero, confirmei minhas suspeitas: o corpo de Dakota, ainda nu, estava espatifado no chão, de costas, os braços abertos, uma perna estirada a outra dobrada, seus olhos sem vida ainda abertos, fitando o vazio à sua frente, um fio se sangue escorrendo pela sua boca. Alguém a tinha jogado da sacada, o maldito assassino que ninguém conseguia apanhar. Tomado pela dor de mil facas perfurando minha pele, gritei seu nome, como se me apegasse ao último vestígio de esperança de que ela me ouvisse e se levantasse, mas ela permaneceu imóvel, paralisada. Aproximei-me mais, tentei tocar sua pele delicada, mas os enfermeiros me impediram. Muitos braços me empurrando para longe. — Dakota! — Gritei novamente, minha alma dilacerada, minha mente se recusando a aceitar a verdade. Os braços continuaram me conduzindo em meio à multidão de pessoas, até que eu não conseguia mais vê-la. Despertei do pesadelo com meu corpo banhado de suor, meu coração disparado no peito. Tinha sido tão real que aquela dor insuportável ainda estava em mim, dilacerando-me de dentro para fora. Olhei o rosto de Dakota, profundamente adormecida ao meu lado e precisei tocá-la para me certificar de que ela era real. Acariciei a pele delicada da sua face, suavemente, com as pontas dos dedos e os lábios dela se curvaram ligeiramente, embora ainda dormisse. Respirei aliviado. Estava tudo bem, pelo menos por enquanto. Eu não sabia quando o maldito assassino atacaria, tinha certeza apenas de que ele a mataria, como matara todas as outras com quem me envolvi e a culpa seria minha. Eu levaria a morte para a vida daquela menina tão jovem, cheia de sonhos, iniciando sua jornada. Se ela morresse, eu teria seu sangue em minhas mãos, seria como se eu mesmo a tivesse matado e a única forma de evitar que isso acontecesse seria indo antes que ela, seria encontrando coragem para finalmente pular daquela maldita sacada. Se eu estivesse morto, o maldito assassino

pouparia a vida dela. E se não poupasse? E se a matasse mesmo assim? Eu precisava pensar em uma forma de protegê-la mesmo depois que estivesse morto. Seria capaz de qualquer coisa por aquela menina, a não ser desistir da minha partida. Por mais que eu viesse adiando aquilo, sabia que o momento chegaria. Antes eu estava totalmente preparado, agora precisava me preparar para deixá-la, o que parecia ainda mais doloroso que a própria morte. Sem mais conseguir pegar no sono, por causa dos pensamentos que me fervilhavam a mente, levantei-me. Fui até a geladeira da cozinha, enchi o copo com uísque e voltei ao quarto, sentando-me na frente do computador. Enquanto o aparelho iniciava, observei Dakota, mais uma vez, hipnotizado. Ela era a primeira mulher a ocupar aquela cama desde que eu adquirira o apartamento de volta e definitivamente era a visão mais encantadora e tentadora que um homem podia ter. Estava completamente nua, deitada de lado, quase de bruços, com uma perna encolhida para cima, a outra esticada, sua intimidade irresistível deliciosamente exposta, o que me deixava de pau duro de novo. Mas ela estava inchada ali, devido ao nosso excesso de sexo. Eu precisava ir mais devagar com ela, pois não estava acostumada a transar, tivera um namorado apenas após ser violentada pelo padrasto durante anos. Era muito apertada, mesmo quando estava completamente lubrificada. Seus densos cabelos ruivos estavam espalhados selvagemmente sobre o travesseiro, emprestandolhe um ar meio angelical. Sua pele não tinha nenhuma imperfeição, era totalmente lisa, tão translúcida que eu quase podia enxergar suas veias. Era impossível que um homem olhasse para aquela pele e não desejasse tocá-la. O computador iniciou e fui direto para um site de notícias. Como eu já esperava estava lá, não apenas uma foto minha beijando Dakota, mas um vídeo expondo todo o ocorrido. Começaram a gravar ainda quando aquele moleque tentara beijá-la à força e continuaram até que deixamos o local apressados. O texto, com doses de drama, ressaltava que ela era minha nova conquista, a primeira depois de anos de solidão. Como não podia deixar de ser os repórteres sugeriam que ela podia ser minha próxima esposa a ser morta. A notícia estava disseminada nos sites mais conhecidos, no dia seguinte todo o país estaria falando sobre o assunto e o assassino saberia sobre ela. Malditos repórteres destruidores de vidas! E pensar que Dakota estava estudando tanto para se tornar um deles. Desliguei o computador e bebi um grande gole de uísque, meu corpo trêmulo pelo pavor de que Dakota perdesse sua vida por minha causa, porque não consegui manter meu pau dentro das calças, porque a desejara loucamente no instante em que a vira pela primeira vez. Contudo, eu não permitiria que ela fosse atingida, tiraria minha vida antes disso. Se eu era o motivo que levava o assassino a matar as pessoas de quem eu gostava, o deixaria sem esse motivo. Relembrei suas palavras quando ela dissera que me amava. Eu acreditava nela e lamentava pelo seu erro em amar um homem que não sabia lidar com suas próprias dores, seus fantasmas do passado e que por causa deles em breve tiraria a própria vida, deixando-a sozinha. Eu precisava contar a verdade a ela, revelar-lhe o que pretendia fazer comigo, para que não se iludisse com a ideia de que ficaríamos juntos para sempre, como em um conto de fadas. Nossas vidas estavam longe de ser um conto de fadas. Éramos duas almas sofridas que se esbarraram por acaso na estrada da vida. Ela ainda era jovem, tinha chance de se reconstruir, eu não. Minha única saída era o salto pela sacada. Olhei seu rosto adormecido, tão lindo e sereno. Sabia o quanto ela sofreria quando eu partisse, mas sabia também que ela era forte o bastante para se recuperar, como se refizera do abuso que

sofrera durante a infância. Eu não devia ter entrado em sua vida. A estava destruindo. Todavia, ficar longe me foi impossível, o que eu sentia por aquela garota estava acima da minha compreensão e além do que eu pudesse controlar. Se resumia a uma necessidade urgente de estar com ela as vinte e quatro horas do dia e saber que esse tempo ainda era pouco. Se isso era amor, eu estava amando pela primeira vez na vida e ainda assim precisava deixá-la, para salvar a sua vida e fugir dos meus malditos fantasmas. Tentar deter o assassino estava fora de cogitação, eu tinha tentado antes e essa decisão apenas custara mais vidas. Amaldiçoando a minha própria existência, deixei o quarto e fui procurar o abrigo da varanda, apreciar a vista dos prédios toscos que vinham sendo minha única companhia antes de Dakota entrar na minha vida. Ali, sozinho, mergulhei nas lembranças dolorosas do passado, a amargura chegando como nuvens escuras em um dia ensolarado. Ingeri todo o restante do uísque com um só gole, quando ouvi os passos sorrateiros atrás de mim, para logo suas mãos delicadas tocarem-me as costas, seu corpo quente se colando ao meu e retornei das trevas para encontrá-la. — Aquela cama fica muito grande sem você. — Sua voz era doce como ela. Respirei fundo, relaxando meu corpo tenso e virei de frente, encontrando seus imensos olhos azuis me fitando com toda aquela adoração que ela me dedicava, e me senti o último dos homens por ser capaz de magoá-la tanto a deixando sozinha, trocando-a pela morte. Ela parecia um anjo com o cobertor acima dos seus ombros, cobrindo-lhe o corpo. Se eu soubesse que havia uma minúscula chance de pegar aquele maldito assassino antes que ele a pegasse, lutaria para viver ao lado dela pelo resto dos meus dias, mas não adiantava tentar, isso era o mesmo que assinar sua sentença de morte, pois eu tentara muitas vezes antes, acreditara que alguém seria capaz de achá-lo e mais vidas foram perdidas por essa decisão. Não arriscaria a de Dakota. Recostei-me na mureta baixa, circulei meus braços em torno da cintura dela e puxei-a para mim, afundando meu nariz nos seus cabelos emaranhados, inalando seu cheiro delicioso. Era o melhor cheiro que eu já experimentara. — Está tentando me seduzir Srta. Thompson? — Brinquei, seu afeto me proporcionando a única felicidade que tinha em anos. — Sim, Sr. Parker. Como estou me saindo? — Me chame de Richard. — Vi a surpresa se estampar em seu olhar. Eu devia ter pedido isso a ela muito antes. Ela afastou-se o suficiente para percorrer a ponta do seu dedo indicador da minha boca até meu umbigo, tão eroticamente que meu pau passou de semiereto a completamente duro. — Então, Richard, vai continuar me deixando sozinha naquela cama? — Dakota, não me provoque, você está machucada aí embaixo. — Eu não me importo. Podemos fazer devagar. Porra! Como alguém podia ser tão sedutora com tão pouca experiência sexual? Não resisti, o fogo da luxúria se intensificou dentro de mim, incendiando-me por dentro, tirandome minha capacidade de raciocinar com coerência. Então, escorreguei o cobertor pelos seus ombros, deixando-o cair aos seus pés e contemplei, mais uma vez, sua magnífica nudez, maravilhado. As curvas do seu corpo eram perfeitas, cada uma no lugar certo, seus seios eram pequenos e firmes, o

abdômen achatado e a bocetinha pequena e depilada me deixavam louco apenas ao olhar. Que homem resistiria? Descontrolado pelo tesão tomei-lhe os lábios, inserindo minha língua na sua boca, enquanto levava minha mão ao seu sexo, acariciando-o, constatando o quanto ela estava molhada, preparada e isso me deixava fora de mim, como um animal irracional. Massageei seu clitóris inchado, deslumbrado com sua reação, em como minha boca abafava seus gemidos. Precisava possuí-la, agora, com urgência. Então, ergui-a em meus braços e a carreguei até o sofá da sala, deitando-a de lado. Fui até o quarto em busca de um preservativo e o coloquei muito depressa, ansioso. Deitei-me ao seu lado no estofado, também de lado, de frente para ela, nossos corpos colados de cima a baixo, pele com pele, sua delicadeza contra minha aspereza. Joguei sua perna sobre meu quadril, me aconcheguei ao seu corpo e a penetrei, tentando me mover o mais devagar possível, para não machucá-la mais do que já estava. Sua vagina apertada e quente palpitava em volta do meu pau e isso me deixava louco. Perdendo o controle, tomei seus lábios no mais faminto dos beijos e estoquei forte dentro dela, indo fundo, me acabando de tanto prazer. Não foram necessárias muitas estocadas, logo estávamos gozando juntos, seus gemidos ecoando pela sala, as lágrimas brotando dos seus olhos lindos, escorrendo pelo seu rosto, sem que eu conseguisse para de fitá-la, extasiado com a visão mais magnífica que já tivera. Ficamos ali imóveis na mesma posição, esperando nossos corações se acalmarem. Levei minha boca até sua face e beijei cada centímetro dela, meus lábios absorvendo suas lágrimas salgadas, resultado do prazer que eu lhe proporcionava. Afastei-me para tirar o preservativo cheio e voltei a me aconchegar junto dela, inebriado, impossibilitado de me afastar. Acariciei seus cabelos emaranhados, concluindo, mais uma vez, que estar com aquela menina era o ápice da minha felicidade, nunca tinha vivido algo tão intenso e maravilhoso antes, nem mesmo com Elizabeth, a quem acreditava ter amado. Porém, apenas agora percebia que não tinha conhecido o amor antes de Dakota entrar na minha vida. Queria muito dizer isso a ela, mas não sabia como pronunciar as palavras. — Quem precisa de uma cama quando se tem um sofá como esse? — Ela sorriu, lindamente e aconchegou mais a mim, jogando um braço sobre meu corpo. — Obrigado. — A palavra me escapou antes que eu pudesse evitar. — Pelo quê? — Por trazer felicidade à minha triste vida. Ela sorriu mais largamente. — Você também trouxe para minha. — Ela ficou séria, seu olhar entristecendo. — Antes de te conhecer eu era atormentada pelo abuso que sofri durante minha adolescência, mas isso está se apagando da minha memória. Pela primeira vez desde que fui violentada e desde que perdi minha filha eu consigo sorrir de verdade. Quem devia estar agradecendo era eu. — Me fala mais sobre esse assunto. Ela hesitou, fitou-me em silêncio por um longo momento, então começou a falar, como se pela primeira vez na vida abrisse seu coração, expondo sua dor e senti que isso podia lhe fazer bem, dividir com alguém aquela angústia que vinha carregando sozinha há tantos anos. Quando Dakota adormeceu, carreguei-a para a cama e deitei-a confortavelmente, cobrindo-a com

outro cobertor, antes de voltar à sala. Estava decidido a fazer algo por ela antes de morrer. Eu encontraria sua filha e a traria de volta, não importava o quanto isso me custasse. Além disso, mudaria meu testamento, deixando metade dos meus bens para ela, para que tivesse uma vida sossegada ao lado da sua pequena. A outra metade ficaria com minha filha, embora ela não merecesse, pois jamais esteve ao meu lado. Deixar uma herança para Dakota era o mínimo que eu podia fazer por um anjo que trouxera felicidade aos meus últimos dias de vida. Olhei no visor do celular e constatei que era quatro horas da madrugada, um horário inapropriado para acordar James, mas eu tinha pressa. — Cara quem foi que morreu para você me acordar a essa hora?! — Ele atendeu depois de muitos toques, seu comentário bizarro irritando-me. — Preciso que você encontre a filha de Dakota Thompson, a garota que você investigou para mim há alguns dias. — Você tem mais alguma informação além do que eu te passei? — Não, só sei o que você me falou. — Isso pode demorar alguns dias. Casos de adoção são sigilosos, principalmente ocorridos em um reformatório. Te ligo quando tiver alguma coisa. — Ok, cara. Só não demora muito. — “Porque eu preciso me matar e não tenho tempo para esperar”. — Vou fazer o possível. Até depois. — Até. Sem mais, encerramos a ligação. Ótimo, eu arranjara mais um motivo para adiar minha partida. Durante os próximos dias, precisava proteger a vida de Dakota, mais que qualquer coisa. A segurança dela estava acima de tudo. Para começar, não iríamos à empresa hoje, passaríamos o dia no apartamento, onde ela estaria completamente segura. Para amanhã, eu pensaria em outra estratégia. Mais jamais a deixaria desprotegida. Com tal decisão, desliguei meu despertador e o dela, antes de deitar-me ao seu lado na cama, inebriado com seu cheiro gostoso, os pensamentos me atormentando por muito tempo ainda, até que finalmente consegui pegar no sono.

CAPÍTULO XVI Ouvi o toque estridente de uma campainha muito distante, mas me recusava a abrir meus olhos, pois devia ser muito cedo ainda já que meu despertador não tocara, sem mencionar que estava muito gostoso ali, aconchegada no corpo grande de Richard, aspirando seu cheiro inebriante. Definitivamente eu não queria me levantar agora. Todavia, o toque se tornava insistente, até que perdi a paciência e levantei-me, levando um susto ao constatar, no relógio de cabeceira, que já era nove horas da manhã. Puta merda! Chegaríamos muito atrasados na Thrive! O que acontecera com meu despertador? E por que Richard ainda estava dormindo? O toque da campainha continuava ressoando insistentemente. Talvez se tratasse do meu futuro assassino, já que a essa altura chegara ao conhecimento de todo o país que eu e Richard estávamos juntos e ele viera checar pessoalmente. Ótimo, seria uma excelente oportunidade de conhecer a pessoa que em breve tentaria tirar minha vida, embora eu duvidasse que conseguisse. Se eu sobrevivi ao meu padrasto, sobreviveria a qualquer um. Apressando-me para chegar à porta antes que o som estridente despertasse Richard, cobri meu corpo com um roupão atoalhado que havia ali e tentei sair, mas era tarde, Richard acordara e, se movendo com agilidade, tomava-me a frente. — Fica aqui. Vou ver quem é. — Seu tom de voz, assim como a expressão dos seus olhos, estavam repletos de alarme. Certamente ele tinha pensado o mesmo que eu. Ele vestiu uma bermuda e saiu. Mas ia abrir a porta só de bermuda? E se fosse Lindsay ou outra mulher qualquer? Quando a campainha silenciou, ouvi as vozes partindo da sala, como eu imaginara era realmente uma mulher e fiquei furiosa, certa de que ela o devorava com o olhar, como qualquer uma devoraria. Tentei permanecer no quarto, ciente que era loucura sentir tanto ciúme, mas não consegui me segurar, meu sangue estava quente nas veias. Então, fui para a sala onde me espantei ao ver a criatura excêntrica com quem ele conversava. Definitivamente ela não tinha o perfil de uma assassina, ou de alguém com quem ele já dormira, pois era muito jovem. Tinha cerca de quinze anos de idade, com uma baixa estatura, usava um batom preto horrível, piercing no nariz e mascava chiclete. Seus cabelos eram negros, lisos, com uma mecha grande branca de cada lado. As roupas que usava não ficavam atrás no quesito excentricidade. A saia curta e rodada e a jaqueta preta eram de couro, a blusa por baixo cor na vinho trazia a imagem de uma caveira expelindo fogo pelos olhos e pela boca. O traje era complementado por meia-calça preta arrastão e botas de cano alto. Ambos silenciaram-se, a garota concentrando sua atenção em mim, examinando-me dos pés à cabeça, da mesma forma que eu fazia com ela. — Dakota, essa é minha filha Hillary. Hillary, essa é Dakota Thompson. Puta merda! A filha dele?! Eu esperava que a herdeira única de Richard Parker fosse uma patricinha que usava roupas cor de rosa, bolsa cara e tinha os cabelos tingidos de loiro, não uma gótica excêntrica.

— Olá Hillary. — Esbocei um sorriso simpático e estendi-lhe a mão em cumprimento. Ele ignorou minha mão, observando-me com evidente hostilidade. — Você já sabe que está em todos os sites e jornais do país com meu pai? — Seu tom era áspero, tinha a quem puxar. — Eu imaginava. — Ocorreu-me que ela morava em Galveston, com a família de Richard, em uma casa perto da praia. Se viera hoje para Houston, tinha saído de lá muito cedo e certamente estava com fome. — Você quer comer alguma coisa? — Não. Só vim falar com meu pai. — O olhar que ela me lançou era quase mortal. Desconfiada, comecei a fazer as contas mentalmente baseada nas informações que Richard me dera sobre sua vida, e concluí que ela tinha oito anos de idade quando a segunda esposa dele, a modelo, fora assassinada. Uma menina de oito anos não teria capacidade mental de elaborar uma trama de assassinato, mesmo que dispusesse de dinheiro suficiente para contratar o melhor matador. Ou teria? Não era possível, eu estava ficando paranoica. Sem desviar minha atenção da conversa deles, atravessei o balcão que dividia a sala da cozinha, em busca de algo para preparar para o café da manhã. As opções eram poucas, claro, Richard não comia aqui, porém tinha um pouco de farinha então a aproveitei para fazer algumas panquecas enquanto os ouvia. Eles discutiam feio, como duas feras se confrontando. Aquela garota tinha herdado o gênio terrível do pai, sem falar que se mostrava corajosa ao enfrentá-lo no mesmo tom. Eu pelo menos não tinha aquela capacidade. Ela queria duzentos mil dólares e Richard achava que era dinheiro demais para uma garota a quem ele dava de tudo. Reclamava ainda que ela o procurava apenas quando queria pedir dinheiro, sem se importar em passar algum tempo com ele e eu concordava com ele em ambos os argumentos. Por fim, talvez com o objetivo de encerrar a discussão, ele preencheu o cheque e entregou a ela, para que no instante seguinte ela fosse embora, tempestuosamente, batendo a porta com força ao sair. Foi impossível não passar pela minha cabeça paranoica que ela usaria aquele dinheiro para pagar pelo meu assassinato. Talvez ela não suportasse ver o pai com outra mulher que não fosse sua mãe, ou o culpava pela morte de Elizabeth como os demais membros da família e como não queria tirar a vida de alguém de quem tinha o sangue nas veias, se vingava de outra forma, sem ter que matá-lo. Ou talvez ainda, eu estivesse viajando na maionese. Richard estava em pé no meio da sala, não sabia se era impressão minha ou se seu corpo estava trêmulo de raiva. Respirou fundo várias vezes, para em seguida caminhar na minha direção, apoiando-se no balcão que nos separava, sua fisionomia ainda contraída. — Que fera. — Gesticulei com a cabeça para a porta, sem me descuidar da panqueca na frigideira. — Aff! Nem me fale. Mas ela tem a quem puxar. — Ainda bem que você reconhece. — Organizei as panquecas quentes em uma travessa e a depositei sobre o balcão, junto com uma jarra de café. Era tudo o que tinha para comer. Richard se serviu distraído e eu o acompanhei. — Para que ela queria o dinheiro? — Não me falou. — Você não devia ter dado a ela. — Eu sei. Mas não suportava mais os gritos no meu ouvido.

Huumm, agora eu sabia como conseguir alguma coisa dele, por outro lado, tinha minhas próprias táticas. — Mas mudando de assunto, meu despertador não funcionou hoje. Você tem alguma coisa a ver com isso? — Sim. Eu desliguei o seu e o meu. — Posso saber o motivo? — Queria passar o dia em casa com você. — Não minta Richard. Você achou que estava me protegendo, mas devo te informar que não vou viver como uma prisioneira só porque algum mal-amado possivelmente vai tentar me matar. Eu sou crescida e sei me defender. — Eu não tinha a intenção de te fazer de prisioneira. Ficaremos em casa apenas hoje. Amanhã retornaremos ao trabalho, porém, terei que te proteger e usarei meus meios. — E quais são os seus meios? — Você nunca, jamais, em qualquer circunstância, poderá sair deste apartamento ou da empresa sozinha. Contratarei um segurança para te acompanhar quando eu não puder ir. Fitei-o perplexa. — Você tá doido! Eu não vou sair por aí com um segurança atrás de mim. — Vai sim e esse assunto está encerrado! Ele foi tão incisivo em sua afirmação que decidi não mais contestar, eu não tinha tanta disposição quanto Hillary para confrontar o poderoso Richard Parker logo pela manhã e mais uma vez ele conseguia o que queria. Ao terminarmos a refeição, juntei a louça suja sobre a pia, decidindo que a lavaria mais tarde, pois precisava ir buscar minhas roupas no apartamento onde morava. Como eu não sabia por quanto tempo ficaria ali e para que ele não pensasse que eu esperava morar na sua casa para sempre, não traria todas as minhas coisas, mas apenas algumas peças de roupas. — Preciso ir ao subúrbio pegar minhas coisas. — Claro. Eu te levo. Tomamos banho juntos, nos entregando ao desejo selvagem que nos dominava sob os jatos de água do chuveiro antes de partimos na sua BMW rumo ao subúrbio de Houston. Subimos o elevador de mãos dadas e usei minha chave para abrir a porta do apartamento. Surpreendi-me ao ver minhas coisas no chão da sala, algumas em malas, outras em sacolas velhas. Tom estava no sofá lixando as unhas. — O que significa isso? Por que minhas coisas estão jogadas assim? — Eu não sei de nada. Pergunta a Trinity. Nesse instante Trinity surgiu da porta do seu quarto, fuzilando-me com olhos mortais. — Como você foi capaz de fazer isso comigo, sua vagabunda?! Fitei-a atônita, confusa, sem ter ideia do que ela estava falando. — Mas o que foi que eu fiz? — Não se faça de sonsa, sua vadia! — Ela avançou na minha direção, quando então Tom se levantou e a segurou no lugar. — Do que ela está falando, Tom? — O Noah me contou tudo, ou você pensou que ele me esconderia isso? — Ela não esperou Tom responder. — Ele me disse sobre seu planinho sórdido para ficar com esse aí. — Ela gesticulou com

o queixo para Richard. — Que plano? Eu não sei do que você tá falando. — Depois que todos vimos o vídeo na internet, você sabe de qual vídeo estou falando né? O Noah disse a ela que você sabia que Parker estava do lado de fora do estádio e o chamou até lá para fazer ciúmes. Depois fingiu que ele estava te beijado à força. — Tom explicou e encarei Trinity estupefata pelo fato de ela acreditar nisso. Eu ainda não tinha assistido aquele maldito vídeo, mas se continha as imagens do que realmente acontecera aquela tarde, estava claro como a luz do dia que Noah me beijara à força. — Como você pode acreditar numa mentira dessas, Trinity? Eu achei que fossemos amigas. — Eu que achei que você era minha amiga, mas estava de olho no meu namorado todo esse tempo. — Ela só podia ser louca. Como nunca tinha percebido a forma como ele mudava com ela quando eu me aproximava? — Quero que você vá embora daqui e nunca mais apareça. Evite cruzar o meu caminho por aí. Indignada, ergui meu queixo antes de falar. — Quer saber de uma coisa? Você merece o namorado que tem e eu mereço uma amiga melhor. E quanto a você Tom, acreditou nas mentiras dele também? — Eu hein, me deixa fora disso. — Então é assim? Tudo bem. Eu só tinha vindo buscar minhas coisas mesmo. Só que você não se esqueça de uma coisa, “amiga”! Cada um colhe aquilo que planta. Sem mais, peguei a mala maior, quando então Richard a tirou das minhas mãos. — A Dakota não sabia que eu estava lá, Trinity. O Cara realmente agarrou ela à força, eu vi tudo. E pela forma como você está agindo, acredite: você merece o namorado que tem. Ele foi tão grosso e ríspido que a deixou sem palavras. Esse era meu Richard! Tom a soltou para vir abraçar-me em despedida, antes que deixássemos o local, eu carregando algumas sacolas leves, Richard levando as malas e algumas bolsas pesadas. Eu acreditava que tudo o que eu tinha estava ali naquela singela bagagem. Apesar de me sentir totalmente injustiçada pela atitude de Trinity, eu morria um pouco por dentro, por perder minha amiga de tantos anos. Durante muito tempo ela fora a única pessoa que eu tinha. Depois veio Tom e por fim Richard. Eu esperava que um dia ela enxergasse a verdade e reconhecesse o quanto errava comigo. — Ei, não fica assim. Um dia ela vai se arrepender e te pedirá perdão. — Richard tentou me animar enquanto dirigia de volta para River Oask, mas nada do que ele dissesse ou fizesse, seria capaz de espantar aquela tristeza que inundava minha alma. Durante o trajeto, paramos em supermercado para reabastecer a cozinha, pois eu não estava com ânimo para comer em um restaurante lotado, preferia cozinhar para nós dois. De volta ao apartamento, preparei espaguete com almôndegas e almoçamos no balcão da cozinha, saboreando o delicioso vinho que ele tinha guardado. Aos poucos, meu astral foi melhorando, afinal era impossível ficar muito tempo de baixo astral perto de um homem como aquele. Ele sabia ser insuportável quando queria, todavia, era mestre na arte da sedução e logo me irradiou com seu carisma irresistível, me fazendo sentir especial por estar ao seu lado. Após a refeição, decidimos assistir um filme no DVD da sala. Ele espichou-se preguiçosamente no sofá e parti para a pilha enorme de filmes na estante a procura de uma comedia romântica, porém, descobri que todos eles eram pornôs.

— Só tem filme pornô aqui? — Eu estava meio enojada. — Você não gosta? — Não. — Por quê? São apenas pessoas fazendo sexo. — Eu já assisti filme pornô antes, mas tive vontade de chorar. Os lábios dele se curvaram num sorriso de molhar a calcinha. — Não é exatamente essa a reação normal quando se vê um pornô. — Me ocorreu que aquela mulher estava transando por dinheiro, talvez por necessidade. Então isso ficou na minha cabeça e comecei a pensar que ela podia estar detestando aquilo, estar rezando por dentro para que terminasse logo. Então cheguei à conclusão de que ela podia estar sofrendo um estupro, com a diferença de que não podia se defender e ainda precisava sorrir e fingir estar gostando. Richard me observava boquiaberto. — Eu acho que você pensa demais. — Levantou-se e enfiou a mão em uma das portas do móvel, tirando outra pilha de DVDs. — Esses são os filmes não pornôs. Pode escolher qualquer um e não me julgue por ver pornô, eu era um homem muito solitário antes de te conhecer. Fiquei emocionada pela sua declaração de que fui responsável por libertá-lo da sua solidão, todavia, nada deixei transparecer. Não queria parecer boba como parecera quando dissera que o amava. Havia mais filmes de ação que outra coisa na pilha. Sem opção, escolhi assistir “Carga Explosiva”, já tinha visto antes, mas aparentemente era o único ali que tinha um pouco de romance. Enfiei o disco no aparelho e deitei-me ao lado de Richard no sofá aconchegando-me a ele, meus olhos grudados no monitor de plasma. O protagonista tinha acabado de ditar sua segunda regra ao cliente, quando perdi a concentração, o calor gostoso que partia de Richard despertando o instinto animal que havia em mim, todavia, antes que passássemos dos amassos, meu celular tocou. Olhei na tela do aparelho e vi o nome de Anthony, ciente que Richard também estava vendo. — Você não vai atender? — Apesar do seu tom casual, havia uma ruga profunda na sua testa. Cogitei não atender, mas a curiosidade falou mais alto. — Oi professor. — Dakota, não sei se você perdeu essa parte da explicação, mas preciso de informações periódicas sobre o desenvolvimento do trabalho de vocês. Até agora você não me deu nada. — Sua voz estava desprovida de qualquer emoção. — Na verdade está quase tudo digitado. Falta colher apenas poucas informações, terminarei em alguns dias. Houve um longo momento de silêncio do outro lado da linha. — Mas por mais inteligente que você seja, não tem como fazer um trabalho sem a orientação de um professor. Você pode vir falar comigo pessoalmente? Constatei que Richard estava ouvindo-o também, pois nesse momento, pulou do sofá e começou a gesticular negativamente para mim, sua fisionomia contraída de horror. Eu sabia o que se passava na cabeça dele e a suposição de que podia estar certo fez meu sangue gelar em minhas veias, um bolo se formando em meu estômago. Era muita coincidência o professor me telefonar justamente no dia em que minha relação com Richard estava em todos os jornais. Talvez estivesse me chamando para a morte, afinal, de acordo com tudo o que Richard me revelara sobre sua vida, Anthony era um forte

suspeito de assassinar aquelas mulheres e podia facilmente tentar tirar a minha vida também. Por outro lado, era a chance perfeita de apanhá-lo. — Posso sim. Quando? Richard pareceu surtar quando pronunciei as palavras. — Terei um tempo vago amanhã no final da tarde. Pode ser? — Claro. Estarei lá. — Até amanhã. — Até. E encerramos a ligação. — Você não está pensando em ir encontrar esse cara não, né? — Seu olhar expressava um misto de choque e aflição. — Vou sim. Eu preciso concluir o meu curso. Você sabia que se ele me reprovar eu não me formo? — E você sabia que apesar de nenhum dos investigadores terem encontrado evidencias contra ele, ele é meu suspeito número um? — Ele é meu suspeito também, mas podemos aproveitar essa oportunidade para apanhá-lo. — De jeito nenhum. Isso Está fora de cogitação. Não vou permitir que você coloque sua vida em perigo. Você não vai ver esse cara e o assunto está encerrado. Ele estava sendo intransigente como sempre, mas desta vez não o deixaria conseguir o que queria, afinal era o meu futuro profissional que estava em jogo. Eu iria encontrar Anthony mesmo que precisasse sair escondida, o que não seria tarefa difícil, já que estaríamos na Thrive amanhã. Todavia, não estava disposta a ficar ali discutindo com ele, seria uma tarefa árdua e fatídica. Deixaria que pensasse que tinha me convencido a desistir. Usei o controle remoto para voltar o filme até o início e nos aconchegamos de volta ao sofá. Desta vez não conseguimos assistir mais que dois minutos, antes de nos entregarmos ao desejo ardente que jamais nos abandonava, se intensificando mais a cada vez que nos tocávamos.

CAPÍTULO XVII

O sexo foi intenso e inesquecível como sempre era entre nós dois, tão prolongado que Richard acabou adormecendo ali mesmo no sofá. Eu também estava exausta, mas precisava arrumar minhas coisas no quarto. O cômodo era pequeno e havia pouquíssimo espaço no guarda-roupa abarrotado de paletós. Precisaria de muito jogo de cintura para organizar meus pertences ali. Não seria fácil. Então, comecei transferindo todas as roupas dele para apenas um lado do móvel, fazendo um verdadeiro amontoado para desocupar o outro lado para mim, onde acomodei meu vestuário colorido. Precisava de uma gaveta para a roupa íntima. Abri a primeira e estava abarrotada de cuecas e meias com um odor agradável de limpeza, parti para a segunda, encontrei-a cheia de papéis amarelados pelo tempo, entre os quais um velho álbum de fotografias atraiu-me a atenção. Curiosa, sentei-me no chão, com as penas cruzadas na frente do corpo e o abri. Continha fotos de Richard e Elizabeth. Eu sabia que era ela porque ele me dera sua descrição física, além do que, se parecia bastante com Anthony. Tinha a mesma pela bronzeada e os olhos azuis claros. Os cabelos eram longos e loiros. Possuía uma beleza rara, que não passaria despercebida aos mais desatentos olhos. Nas fotos, Richard estava muito mais jovem, em vários locais e fases diferentes da sua vida. Começavam no campus universitário, o mesmo que eu estudava, em festas frequentadas por jovens estudantes. Nessas fotos o segundo maior acionista da Thrive, David Smith e uma garota de cabelos pretos, curtos, muito pálida, obviamente sua namorada, apareciam com frequência, como se estivessem sempre juntos com Richard e Elizabeth. Mais adiante, havia fotos de Elizabeth grávida, depois com a pequena Hillary nos braços. Nas últimas, a garota já caminhava. Procurei, em seu belo rosto, qualquer vestígio de uma possível depressão que pudesse tê-la impulsionado a suicidar, mas não havia nada, pelo contrário, em todas as fotografias ela parecia sempre muito feliz, assim como Richard. Ele parecia outra pessoa, não apenas pela juventude, mas pela alegria de viver que gritava em sua fisionomia, a qual já não existia mais e constatar isso me era bastante doloroso. Estava quase fechando o álbum, quando algo nas últimas fotografias me chamou a atenção, o lugar onde foram tiradas, um apartamento, era estranhamente familiar. Voltei às páginas, examinando as fotos com mais atenção e percebi que várias delas foram tiradas neste mesmo apartamento em que nos encontrávamos, parecia mais conservado, mas não tinha dúvidas de que era aqui. Principalmente as fotos em família e de Elizabeth cuidando de Hillary, como se estivessem em seu cotidiano. Refleti por um instante e a verdade foi se descortinando diante dos meus olhos. Então esta era a razão que levara um milionário a viver em um lugar precário, este era o apartamento em que ele morava quando era casado com sua irmã de adoção. Aquela sacada de onde se podia enxergar quase todo o bairro era mesma de onde ela se atirara. Como não percebi isso antes? Richard mencionara em seu relato que morara em River Oask quando começara sua vida com Elizabeth. Mas por que ele ainda morava ali se já tinha condições de

ocupar um lugar bem melhor? Por que não me dissera que este era o mesmo apartamento? Subitamente um calafrio percorreu-me a espinha. Richard não morou sempre nesse apartamento, ele o adquirira de volta e eu precisava saber o porquê. Quase em choque, caminhei até a sala, onde ele dormia profundamente no sofá, completamente nu, numa visão gloriosa, que me fazia salivar, apesar do meu estado. — Acorda Richard! — Alterei tanto o tom da voz que não precisei chamar uma segunda vez. Num sobressalto ele acordou, sentando-se no estofado. — O que foi?! — Seus olhos alarmados cravaram-se em mim. — Não minta para mim, Richard. Esse apartamento é o mesmo onde você e Elizabeth moravam quando ela morreu, não é? Ele desviou seu olhar para o lado, visivelmente consternado, confirmando o que eu já sabia. Vagarosamente, ficou em pé e vestiu seu jeans. — Não precisa pedir para eu não mentir para você, porque eu nunca fiz isso e sim, esse é o apartamento onde morávamos quando Elizabeth morreu. Outro calafrio passou pela minha nuca. — Você poderia morar em uma mansão se quisesse. Por que continua aqui? Você comprou o apartamento de volta? — Eu não comprei ele de volta. Sempre foi meu, mas esteve fechado durante todos esses anos. Eu tenho um motivo para ter voltado a morar aqui e gostaria que você não conhecesse esse motivo. Um frio atravessou meu estômago, minha pele arrepiando como se me anunciasse um mau presságio. Agarrei-me ao meu próprio corpo, como se tentasse me proteger de algo que eu sequer sabia o que era. — Mas acontece que eu quero saber esse motivo. Não como escritora da sua biografia, mas como uma pessoa de quem você faz parte da vida agora. Richard evitava encarar-me no rosto. Dirigiu-se até a cozinha, servindo-se de uma dose de uísque, antes de retornar à sala. — Senta. — Seu tom era angustiado, mas ainda assim autoritário. Sentei-me no sofá maior, enquanto ele ocupava o outro. Finalmente voltou a me fitar, com aquela expressão de dor que eu não compreendia. — Eu não espero que você entenda isso, ninguém entenderia. É uma decisão que tomei há alguns meses, muito antes de te conhecer. — Ele hesitava e minha aflição se intensificava. — Muitas pessoas foram mortas por minha causa, minha filha me odeia, a única família que conheci também, a mulher que passou toda a sua vida me dedicando seu amor, se jogou do vigésimo andar. Eu... Eu não vejo razão para continuar vivendo, colocando vidas em risco, como acabei de colocar a sua. Então vou fazer a coisa certa. O mesmo que Elizabeth fez há quinze anos. Lentamente, processei suas palavras e não pude acreditar no que ouvia. Ele só podia estar brincando. Richard Parker, o único homem que eu tinha sido capaz de amar não pretendia se matar. Era apenas uma brincadeira bizarra. — Você tá brincando, né? — Não estou. Estudei a expressão séria e triste em seus olhos e meu mundo parecia estar desmoronando. Ele não podia fazer aquilo comigo, não podia me conquistar e depois me abandonar. Eu não podia ser tão

insignificante em sua vida, para não encorajá-lo a viver. — Você não pode fazer isso. — Minha voz saiu trêmula, as lágrimas ameaçando aflorar dos meus olhos. — Na verdade eu posso. Já teria feito se Anthony não tivesse me pedido para você escrever minha biografia, eu queria deixar toda a verdade registrada para que um dia as pessoas que me julgam um assassino, que me odeiam, conheçam a verdade e possam me perdoar. — Seus olhos se intensificaram sobre os meus. — Será em poucos dias e depois que acontecer, sua vida não estará mais em perigo, porque a razão que leva aquele louco a matar as pessoas de quem eu gosto, não existirá mais. Escolhi que será aqui porque quero que seja como ela fez. — Então esta era a última revelação que você disse que me faria? — Exatamente. Finalmente, minha mente compreendeu que aquilo era sério, ele realmente pretendia tirar a própria vida. Já não mais consegui segurar as lágrimas e estas começaram a banhar-me o rosto, abundantemente. — E quanto a mim?! — Levantei-me para fitá-lo mais de perto. — E quanto a nós dois?! Será que não significo nada para você?! Meu amor é pouco para você?! — Mas é claro que você significa. Você é muito importante para mim. Ele também se colocou em pé, aproximando-se. Quando tentou abraçar-me, meu estado de choque me impulsionou a afastá-lo. — Não me toque! — Gritei. — Sou importante mais não o suficiente para que você viva por mim! — Ele enfiou as mãos nos bolsos do seu jeans e ficou cabisbaixo. Com todo o meu corpo trêmulo, fui até ele e segurei seu rosto entre minhas mãos, fitando seus olhos de muito perto. Por Deus! Eu o amava tanto! Muito mais do que tinha percebido e perdê-lo significaria a minha completa destruição. — Não faz isso, meu amor. Podemos reconstruir nossa vida juntos. Eu te amo tanto! Também tive perdas no passado, mas você preencheu o vazio que estas perdas deixaram em mim. Me permita fazer o mesmo por você. Não faça o que está dizendo. Ele meneou sua cabeça, negativamente, desviando seu olhar para o chão. — Desculpe. — Sua voz era um sussurro. Então, perdendo completamente o controle sobre minhas emoções, o odiei por ser tão fraco e egoísta, por se deixar abater tão facilmente. Ele não passava de um covarde. — Covarde! — Comecei a esmurrá-lo no peito, fazendo uso de todas as forças do meu corpo, embora ele não movesse um só músculo. — Você não passa de um covarde que prefere fugir a enfrentar os próprios problemas. Vá em frente Richard Parker, se atire daquela maldita sacada. Só não espere que eu esteja aqui para ver. Seguindo aos meus impulsos incontroláveis, corri para a porta e saí ciente de que ele me seguia, e de que me alcançaria se eu não fosse mais rápida. Precisava fugir para o mais longe possível, pois me recusava a olhar em seu rosto novamente, sabendo que em breve ele estaria morto. Consegui pegar o elevador antes que ele me alcançasse, todavia, ainda havia a escada. Sem conseguir refrear o pranto, atravessei saguão correndo e somente ao alcançar a rua percebi que chovia forte. Mesmo estando descalça e usando apenas a camisa de Richard, continuei correndo pela calçada, sem um destino definido, os motoristas dos carros que passavam, buzinando para mim, talvez achando que eu fosse uma louca. Eu não sabia para onde ir, aliás, não tinha nenhum lugar para ir, já que Trinity me expulsara, sabia apenas que precisava fugir, para o mais longe possível.

Corri por muito tempo sob a chuva grossa, encharcada, o tecido da camisa se colando ao meu corpo, expondo minha nudez. Até que o cansaço e a dor nos pés me venceram e sentei-me na calçada de uma lanchonete, com frio, desconsolada, abraçando meus joelhos dobrados na frente do torso. Quis entrar no estabelecimento movimentado para me proteger da baixa temperatura, mas não podia, pois, meu corpo estava completamente à mostra. Instantes depois as mãos dele me tocaram nos cabelos, para em seguida escorregarem para os meus ombros, segurando-os com firmeza, puxando-me para cima. — Você precisa voltar Dakota, antes que essa chuva te adoeça. — Richard ainda estava sem camisa e me segurava diante de si. Uma gargalhada bizarra me escapou, sem que eu pudesse controlar a amargura. — Se você se preocupasse minimamente com minha saúde, não me deixaria sozinha no mundo. Nesse momento uma viatura policial parou no acostamento à nossa frente e um dos policiais saltou para vir falar conosco, usando uma capa de chuva. — Está tudo bem aqui? — Indagou o homem de feições rústicas. — Sim senhor policial. Moramos logo ali. Já estamos indo para casa. O homem deslocou o olhar para mim, desconfiado por causa das minhas lágrimas. — Está tudo bem, moça? — Sim. — Então acho melhor você irem andando. Não podem ficar na rua vestidos assim. — Estamos indo. Vamos Dakota. — Ele segurou-me a mão, puxei-a de volta com toda a força. Hesitei, tentei pensar em um lugar para onde pudesse ir. Não havia. Se ficasse na rua acabaria sendo presa por atentado ao pudor ou contraindo uma pneumonia. Então, derrotada, o segui de volta ao apartamento. Chegando lá, Richard foi até o quarto, retornando com um cobertor, colocando-o sobre meus ombros. Não tive como recusar, pois estava congelando. — Entenda que voltei com você somente porque não tinha para onde ir, mas logo arranjarei um lugar. Enquanto isso ficarei aqui. — Meus dentes batiam de frio. — Enquanto isso, não quero que você volte a me tocar, em hipótese alguma, mesmo que para isso eu precise dormir no sofá. O ódio passeava solto dentro de mim, queimando-me o sangue. Ódio dele por ser capaz de me deixar de uma forma tão cruel, por não me considerar importante o suficiente em sua vida para viver por mim e ódio de mim mesma por amar sem ser correspondida. — Você não precisa se preocupar em arranjar um lugar para morar. Amanhã mudarei meu testamento e deixarei metade de tudo o que tenho para você. Isso inclui vários apartamentos, você pode escolher qualquer um para morar. — Eu não quero a porra do seu dinheiro! Pode enfiar onde achar melhor. Mas o meu trabalho faço questão de terminar, não porque você quer, mas porque ele representa meu futuro profissional. — Então esperarei até que você termine. Volte a trabalhar na Thrive, como antes, não apenas para evitar que as pessoas saibam que está escrevendo sobre mim, mas porque lá você estará segura. Como ele podia ser tão insensível? Afirmar que esperará até que eu termine, para tirar a própria vida, como se isso fosse comum, como ir ao dentista. Aquele homem não tinha coração. Eu devia ter deduzido isso desde o início e não ter me deixado envolver. Merda! Respirei derrotada. Eu não tinha um emprego de verdade, nem onde morar, ou qualquer outra opção que não fazer exatamente o que ele queria. Como sempre, ele conseguia tudo.

— Você vai me pagar pelos dias que eu trabalhar na Thrive? — Mas é claro que vou. — Então está resolvido. Continuarei sendo sua secretária até terminar meu trabalho. — Ótimo. Me ocorreu que podíamos dar continuidade à construção da biografia dele aqui e agora, enquanto estávamos no seu apartamento, todavia, se ele esperaria que eu terminasse, antes de cometer suicídio, eu não precisava e nem queria ter pressa em findá-lo, estenderia aquela missão o máximo que pudesse, pois assim estaria prolongando sua vida. O que era mais um entre tantos erros que eu vinha cometendo desde que o conhecera, já que nada o impediria de fazer o que pretendia e quanto mais dias eu passasse ao lado dele, maior seria minha dor quando ele partisse. Ainda assim, me recusava a apressar aquela biografia, estava disposta a sofrer em dobro, em troca de passar mais alguns dias com ele, embora nada mais aconteceria entre nós, afinal ele não me merecia. Desolada e com a sensação de que me faltavam alguns órgãos internos, fui para o quarto. Ao observar meu reflexo no espelho, constatei o quanto estava horrível, com meus olhos vermelhos, meu rosto inchado pelo pranto. Tentando afastar os pensamentos, tomei um banho quente rápido, vesti um moletom velho e deitei. Ainda era dia, mas eu queria dormir para esquecer aquela dor insuportável que parecia me rasgar de dentro para fora. Todavia, não conseguia relaxar, os pensamentos atribulando-me a mente. Precisava me ocupar com alguma coisa, antes que surtasse de vez. Então, tirei meu notebook da caixa e o liguei, colocando-o sobre minhas pernas cruzadas na cama. Procurei pelos sites de notícias e logo encontrei o maldito vídeo gravado diante do estádio ontem à tarde. Passaram-se apenas vinte e quatro horas, mas parecia ter acontecido há uma eternidade. Assisti todo o vídeo, constatando que as imagens deixavam claro como a luz do dia que Noah me beijara a força, não havia a mínima possibilidade de alguém ter duvidado disso, nem Trinity. Ela obviamente via a verdade, todavia me acusava para me tirar do caminho de Noah. Era impressionante como a gente se enganava com as pessoas. Enviei meu trabalho inacabado para o e-mail do professor Anthony, para que ele tivesse uma ideia do que eu estava fazendo quando conversássemos amanhã e continuei navegando pela internet, visitando as redes sociais, até que houve uma batida na porta e Richard entrou. Ainda usava apenas seu jeans molhado de chuva, o torso atraente à mostra. Todavia, a única coisa que eu sentia ao olhar para ele depois de tudo, era vontade de chorar. — Pedi comida para nós. Vamos jantar? — Não estou com fome. Ele foi até o guarda-roupa, procurando algo para se trocar. — Acontece que você não tem escolha. Eu digo que você vai jantar e você vai. Assunto encerrado. Como ele era arrogante e intransigente! Tudo tinha que ser feito ao seu modo. Sinceramente eu não sabia o que eu tinha visto naquele troglodita, mas descobri quando ele tirou a calça molhada, ficando totalmente nu de costas para mim. Puta merda! Que bunda era aquela! Era perfeita, redonda, firme, parecia com a de um atleta de vinte anos e não de um homem de trinta e sete. Enquanto enfiava uma bermuda pelos pés, ele virou de frente, expondo sua masculinidade, aquela maravilha rodeada pelos púbicos ralos, a trilha de pelos subindo até seu umbigo.

Cafajeste! Estava tentando me provocar! E estava conseguindo, pois o desejo queimava dentro de mim, o formigamento se fazendo na altura do meu ventre. — Considerando que não temos mais nada um com o outro, não acho que seja adequado você trocar de roupas na minha presença. — Não há nada aqui que você ainda não tenha visto. — Ele abotoou a bermuda antes de jogar uma camiseta folgada por cima. — Levanta daí, vamos comer. Não havia como discutir com Richard Parker, seria perda de tempo e de paciência. Derrotada, levantei-me e o segui para a cozinha.

CAPÍTULO XVIII

Havia praticamente um banquete sobre o balcão de mármore. Vários tipos de saladas, frango, carne, purês e frutas para a sobremesa. — Quem vai comer tudo isso? Os soldados do exército? — Ironizei emburrada. — Eu não sabia o que você preferia então pedi um pouco de cada coisa. Podemos guardar o que sobrar. — Então muita coisa vai ser guardada. Eu não sentia fome, porém, para evitar um desgastante conflito com ele, do qual obviamente eu sairia perdendo, sentei-me ao balcão, enquanto ele ocupava o outro lado, deixando apenas alguns poucos centímetros de distância entre nós e servi-me de frango com salada. Evitava olhar para ele, concentrando-me na comida, precisando ingerir grandes goles de água para fazê-la descer através da minha garganta seca. Como se eu estivesse sob algum tipo de feitiço, meus olhos procuraram o rosto dele, todavia, o que vi não foi mais aquele homem poderoso, inabalável, tão amado e sim um covarde doente mental. Continuei observando-o enquanto comia, perguntando-me como uma pessoa podia ser capaz de ponderar tirar a própria vida. Nem na época em que eu era violentada, humilhada e machucada pelo meu padrasto, quando sentia-me o último dos seres humanos, passara pela minha cabeça cometer uma loucura daquelas. — Um dólar pelos seus pensamentos. — Ele ainda brincava. Que triste. — Você é doente. Sua fisionomia se contraiu. — É melhor não falarmos mais sobre isso. Cada um faz o que quer com a própria vida. “Mas você não estará destruindo apenas a sua, seu bastardo egoísta!” A frase ecoou em minha mente, mas me recusei a pronunciá-la. — Quer algumas informações para a sua biografia? Estou completamente desocupado. Ele estava tentando apressar sua partida? Meu coração sangrou. — Estou com dor de cabeça. Amanhã fazemos isso no escritório. Ele abriu a boca, mas desistiu do que pretendia dizer. Ao terminarmos a refeição, ocupei-me em lavar a louça e arrumar a cozinha, para em seguida sentar-me na frente da televisão ligada, sem enxergar o programa que era exibido, minha mente concentrada no fato de que Richard tinha ido para a sacada ao atender seu celular. Será que pretendia se atirar agora? Meu coração estava apertado no peito, mas enquanto estivesse ouvindo a voz dele, falando sobre seus negócios, saberia que ele estava bem. Como se conhecesse minha aflição, Richard retornou à sala no instante em que encerrou a ligação. — Você pode dormir na cama, Dakota. Eu fico com o sofá. Já estou acostumado a dormir aqui. — Ele deixou-se afunda no sofá maior.

— Por mim tudo bem. Só tente não desligar o despertador de novo. — Não vou fazer isso. Levantei-me e fui para o quarto, pisando pesado. Peguei uma coberta e um travesseiro, jogando-os no sofá perto dele e voltei ao aposento, trancado à porta pelo lado de dentro. Era muito cedo para dormir, contudo eu preferia adormecer para esquecer tudo, pelo menos durante as horas de sono não estaria pensando no que aconteceria. Rolava de um lado para o outro da cama, esperando o sono chegar, quando houve uma batida na porta. — O que você quer? — Fiz questão em ser ríspida. — Preciso usar o banheiro. Porra! Eu tinha me esquecido desse detalhe. A verdade era que aquele apartamento se tornara pequeno demais para nós dois. Contrariada, destranquei a porta e voltei para a cama, cobrindo-me até o pescoço com o lençol. Richard pegou a toalha branca, pendurou-a no ombro e foi direto para o banheiro. Meu sangue ferveu de tesão quando ouvi os jatos da água do chuveiro. Era impossível não imaginar aquele corpo delicioso, completamente nu, todo molhado. Caralho, molhada estava ficando minha calcinha. Eu precisava aprender a controlar esse meu lado selvagem que eu desconhecia antes de conhecê-lo. Quando ele deixou o banheiro só de toalha, com os cabelos molhados caindo pela testa, às gotículas de água escorrendo pelo seu tórax e o cheiro do seu sabonete preenchendo o ambiente, quase entrei em combustão, a lasciva percorrendo minhas veias, descontroladamente. Era um absurdo o poder que aquele homem tinha sobre mim, em tantos aspectos diferentes. Era como se eu não tivesse mais vontade própria, ou controle sobre mim mesma quando estava na presença dele. Como fizera antes, ele despiu-se da toalha para vestir uma calça de moletom. Virou-se para mim, me observou em silêncio por um longo momento, seus olhos refletindo uma tristeza tão desoladora que me contagiou e as lágrimas ameaçaram aflorar dos meus olhos. — Boa noite, Dakota. — Sua voz estava carregada daquela amargura que parecia fazer parte dele. Supliquei intimamente que ele tentasse deitar-se ao meu lado, não que eu o aceitaria, seria apenas para que eu soubesse que ele ainda tinha algum interesse por mim, para que aquela sensação desoladora de insignificância me abandonasse. Mas ele não se moveu. — Boa noite, Richard. Sem mais, deixou o quarto. Sozinha, não mais consegui segurar o pranto e deixei que as lágrimas rolassem soltas pelo meu rosto, por muito tempo, até que consegui adormecer finalmente. Despertei com o toque insistente do despertador na manhã seguinte, no horário certo, todavia um sentimento ruim de depressão me impedia de sair da cama. Estava tão bom ali, quentinha, reconfortada. Apenas quando me movi, dei-me conta de que Richard estava deitado ao meu lado, tão perto que o calor gostoso do seu corpo, nu da cintura para cima, me envolvia. Furiosa, deixei a cama num sobressalto, despertando-o. — Quer me dizer o que diabos você está fazendo aqui? — A fúria era perceptível no meu tom de voz. — Eu estava me sentindo meio sozinho lá no sofá. — Ele sentou-se calmamente. — Achei que você podia estar se sentindo do mesmo jeito, então vim me assegurar que você estaria bem. Mas pode ficar sossegada, eu não toquei num fio do seu cabelo.

Puta que pariu! Por que eu não trancara a maldita porta antes de dormir? Como conseguiria me desapegar dele daquele jeito? Como conseguiria aceitar sua perda se ele não me deixava? — Isso não vai dar certo. Tenho que arranjar outro lugar para morar. — Não faça uma tempestade num copo d’água. Não aconteceu nada de mais. Eu apenas dormi aqui. Ele levantou-se, quando então percebi o enorme volume na sua calça folgada. Seu pênis estava muito duro e, por mais que eu lutasse contra, o calor do desejo se fez presente em mim, tão intensamente que minha vagina palpitou sequiosa. — Se você não me tocou como diz, por que raios está assim?! Ele observou a própria ereção, sem sequer se mostrar constrangido. Era muito cara de pau mesmo. — Porque é de manhã. Todo homem fica assim de manhã. Eu devia acreditar nele? Certamente sim, afinal não tinha outra opção. Porém, não me esqueceria de trancar a porta antes de dormir da próxima vez. — Quem usa o banheiro primeiro? — Quis saber. — Pode ir. — Ele voltou a deitar-se. Eu esperava que não estivesse mais ali quando eu saísse do banho, mas foi esperar demais da minha parte. Quando deixei o banheiro, enrolada na toalha, ele continuava no mesmo lugar, observando-me com olhos famintos. — Será que você pode me dar licença? Eu preciso me trocar. — Não há nada aí que eu não tenha visto, beijado ou tocado. — Seu tom era sensual, malicioso e me excitou. Porra! Isso nunca teria fim? Richard espichou-se mais sobre a cama, apoiando a cabeça nas duas mãos, como se preparasse-se para assistir a um espetáculo. Ledo engano! Peguei a primeira roupa que minha mão alcançou e me dirigi para a porta, determinada a trocar-me na sala. Como sempre, ele foi mais rápido e tomou-me o caminho antes que eu saísse, usou seu corpo grande e sólido para empurrar-me até a parede, encurralando-me ali, o calor da sua pele nua em contato direto com a minha, me inundando de luxúria, tão deliciosamente que em poucos segundos eu já não conseguia mais pensar com clareza. — Me solta. — Apeguei-me ao meu último vestígio de sensatez para dizer, minha respiração pesada denunciando minha excitação. Ele segurou meus dois pulsos, aprisionando-os na parede acima da minha cabeça, imobilizandome por completo. Trouxe sua boca até a minha, contornando meus lábios com a ponta da sua língua atrevida, ao mesmo tempo em que pressionava sua ereção de encontro ao meu ventre, seus olhos brilhando de desejo. Caramba! Eu estava incendiando de dentro para fora, me acabando de tesão. Precisava lutar contra esse sentimento, não podia deixar que ele conseguisse o que queria. — Já disse para me soltar. — Tentei ser firme, mas a voz estava ainda mais ofegante. — E se eu não quiser? — Ergueu uma sobrancelha maliciosa. — Eu não quero você. — Isso não me impediria, pois eu posso te pegar à força. — Inclinou sua cabeça até a toalha, usando seus dentes para arrancá-la do meu corpo, deixando-me completamente nua. Senti o contato direto do seu tórax musculoso esmagando meus seios, sua virilidade pressionando meu sexo sensível e me perdi no mar de luxúria que me arrebatava.

Descontrolada, gemi, um gemido de puro tesão. Joguei fora meu último lampejo de razão e umedeci meus lábios, esperando que ele me beijasse e me tomasse, que me fizesse sua da forma que apenas ele sabia, que me levasse ao êxtase. Naquele momento, nada mais me importava que não tê-lo dentro de mim. Porém, ao contrário do que eu esperava, ele simplesmente se afastou, deixando-me ali recostada à parede, nua, ofegante, trêmula de desejo. — Mas como não sou homem de pegar uma mulher à força, vou esperar até que você me peça. — Pegou a outra toalha do cabide, indo para o banheiro. — Se você não queria se trocar na minha frente, pode aproveitar e fazer isso enquanto eu estiver no banho e não precisa ter pressa, pois vou demorar um pouquinho para resolver meu probleminha aqui de baixo. — Com isso, entrou no banheiro, deixando a porta escancarada. Miserável, filho da puta! Ele estava brincando comigo. Como se atrevia?! Já não bastava ter me deixado entrar na sua vida, me permitir me apaixonar, para depois se matar, sem dar a mínima para o que eu sentia, como se eu nem existisse?! Transtornada, dei início a um pranto irrefreável, meu corpo escorregando pela parede até minha bunda encontrar o chão, minhas pernas encolhidas na frente do corpo, os soluços partindo alto da minha garganta, o que talvez tenha atraído a atenção dele, pois logo deixou o banheiro enrolado na toalha, correndo até mim, agachando-se ao meu lado, suas mãos tocando meus cabelos. — Por Deus, Dakota! O que você tem?! — Como ele podia não perceber? Consegui erguer meu rosto para encará-lo. — Você disse que o assassino destruiria a minha vida, mas isso não é verdade, quem está me destruindo é você! — Minha voz saiu mais alta do que pretendia. — Seu miserável! Será que você não percebe o que está fazendo comigo? — Aflito, ele ergue-me em seus braços, sentando-se na cama comigo no colo, ninando-me como se eu fosse um bebê. Afundei meu rosto em seu peito largo e chorei mais, minhas lágrimas se misturando a água do banho em seu corpo. — Eu te amo como nunca tinha amado antes. Não basta você desvanecer o meu amor a ponto de se matar e me deixar sozinha? Ainda tem que brincar desse jeito com meus sentimentos? Como você pode ser tão insensível? Senti seu corpo estremecer de encontro ao meu, ao passo em que seus dedos se enterravam em meus cabelos molhados. — Me perdoa minha menina. Eu sou mesmo um imbecil. Eu não estou acostumado a lidar com meninas da sua idade. Você não é tão forte quanto eu imaginei. — Não culpe a minha idade e nem me culpe pelos seus erros. — Solucei alto. — Eu sei, eu sei. Me desculpa. Ele me apertou com mais força, balançando-me em seu colo, enquanto eu me encolhia mais, apegando-me a ele. Eu queria tanto ser capaz de expulsar aquele amor do meu peito, preencher com ódio o vazio que existia antes dentro de mim. Mas parecia tão difícil. Não suportaria essa situação por muito tempo, precisava dar um jeito nisso, tentar gostar de outro homem talvez fosse à solução. Mas quem? Em quatro anos de convivência com universitários da minha idade, eu não tinha me interessado por ninguém, não seria assim de repente a acontecer. Ali, abraçada ao homem que eu amava perdidamente e que em breve me trocaria pela morte, chorei até que minhas lágrimas pareciam ter se esgotado. Mais tarde, quando deixamos o prédio, para ir à Thrive, na BMW dele, meus olhos ainda estavam muito inchados, apesar de a maquiagem conseguir disfarçar um pouco. Entramos no imponente

edifício da Thrive de mãos dadas, todos os olhares se voltando para nós, nos transformando no centro de todas as atenções. Eu podia apostar como no fundo eles sentiam pena de mim, por me julgar a próxima vítima de um assassino que nem os melhores investigadores do país conseguiram apanhar. Não passava pela cabeça deles que antes disso Richard estaria morto e minha sentença de morte encerrada. Quanto a mim, enfrentaria o Fred Gruguer para não perder o homem que eu amava. Quando o elevador se abriu no último andar, estranhei ao ver o homem em pé na entrada da sala que Lindsay dividia comigo, era afrodescendente, muito alto, usava terno e gravata e óculos escuros. — Dakota, esse é Jordan, seu segurança. — Richard fez as apresentações. — Ele ficará aqui fazendo sua segurança e te acompanhará caso você precise deixar a sala por alguma razão. Fitei-o incrédula. — Como assim caso eu precise deixar a sala? E se eu quiser sair para comer um sanduíche? — Ele irá com você. — Ele caminhou na direção da sua sala, cumprimentando Lindsay com um breve aceno de cabeça. De todos os olhares que tínhamos recebido desde que chegamos, o dela foi o mais mortal. — Eu não vou sair por aí com esse armário atrás de mim, Richard! — Meu tom alterado o deteve a meio caminho da porta da sala. — Isso não está em questão, Dakota. Ele te seguirá para onde você for e me informará todos os seus passos. Isso é para a sua segurança e o assunto está encerrado. — Sem mais, retomou seu percurso e adentrou a sala. Furiosa com aquela mania horrorosa que ele tinha de exigir que tudo acontecesse de acordo com sua vontade, sentei-me atrás da minha mesa, roendo as unhas de nervosismo. — Eu vi vocês no noticiário. Meus pêsames. — O tom irônico com que Lindsay pronunciou as palavras, foi o estopim para que eu explodisse de vez. Tomada pela raiva, avancei para ela, colocando-me diante da sua mesa, inclinando-me para agarrar a gola do seu terninho caro, sufocando-a. — Presta atenção, vagabunda, porque só vou falar uma vez: não se mete na minha vida e nem me jogue piadinhas porque nunca te dei essa liberdade. Eu sei que você é afim dele e tá se roendo porque ele não te quer. Agora vê se me deixa em paz. Olhei dentro dos seus olhos atônitos antes de soltá-la, quando então descobri que ela era burra, por não saber manter a boca fechada. — Afim dele, toda mulher é, agora ficar com ele em público, só as estúpidas ficam. Quase voltei a agredi-la, quando me ocorreu que ela podia saber de algo importante sobre o caso, pela forma como falava. — Por que você diz isso? — Fiz-me de desinformada. — Não se faça de tola. Todo mundo sabe que as mulheres com quem ele se envolve são mortas. Há boatos aqui na empresa que já se foram mais de vinte. Casos que ele teve às escondidas e tenha certeza de que você será a próxima. — É sério? Eu não sabia disso tudo. E quem mata essas mulheres? Os olhos dela se arregalaram sobre os meus, com uma expressão sombria. — Isso você só vai saber quando estiver sendo morta.

CAPÍTULO XIX

Nesse momento, a voz grossa de Richard ecoou pelo interfone, solicitando a presença dela na sua sala. Encarando-me com escárnio, ela se afastou para ir atender à ordem do chefe e não consegui deixar de imaginar o que os dois fariam lá dentro sozinhos, o pensamento me causando um gosto amargo na boca. Ela afirmara que todas as mulheres eram afim dele, então isso a incluía. Como ele não tivera tempo de resolver seu “probleminha” antes de sair de casa, talvez a tenha chamado com este objetivo. Tentando afastar o turbilhão de pensamentos que me inquietava, acomodei-me na minha mesa, abri meu notebook, baixei alguns e-books. Como não tinha mais nada para fazer, me dediquei à leitura de um romance nacional, sem conseguir me concentrar na narrativa romântica, minha mente concentrada no que aqueles dois faziam naquela sala. Demorou quase uma hora até que Lindsay saísse de lá. Eu não sabia se era impressão minha ou se a saia lápis cinza dela estava mais amarrotada que quando entrara. Talvez o ciúme estivesse me fazendo ver coisas que não existiam, ou talvez Richard realmente transou com ela, ali, quase na minha frente. “Como pôde?” Durante todo o dia, aquilo me corroeu por dentro. A incerteza me atormentando, sem mencionar que era uma situação humilhante vê-la olhando-me com superioridade, como se, mentalmente, esfregasse na minha cara que tinha transado e que transaria quantas vezes quisesse, com o homem com quem aos olhos de todos, eu tinha um relacionamento. Quando na verdade era ainda pior que isso: eu estava apaixonada por ele. O dia foi muito movimentado, com pessoas entrando e saindo da sala de Richard o tempo todo, a maioria das quais eu desconhecia. O único rosto familiar que passou por mim foi o de David Smith. Como todos os demais, ele demorou seu olhar sobre mim ao me cumprimentar, examinando-me com atenção. Embora Richard tenha mandando investigá-lo minuciosamente e nada fora encontrado, na minha opinião ele era um dos suspeitos, me examinara com atenção para não se esquecer das minhas feições e ter a capacidade de reconhecer o meu rosto no escuro caso fosse necessário quando tentasse me assassinar. Mas e os outros, porque razão também olharam? Eram todos assassinos? Eu realmente estava ficando paranoica. Sob as ordens da insuportável Lindsay, tirei algumas cópias, digitei e imprimi alguns documentos, satisfeita por ter com o que preencher o meu tempo. Por volta do meio-dia, três refeições foram entregues, uma para cada um de nós. Comi sentindome desolada por Richard não ter me convidado para fazer a refeição ao seu lado. Provavelmente já tinha se cansado da minha companhia. Como dissera antes de sairmos de casa, não estava

acostumado a lidar com meninas da minha idade. Quem sabe essa razão o impulsionara a transar com Lindsay e não comigo naquela manhã. Por mais que tenha tentado repudiá-lo, mostrara-me totalmente entregue quando ele me encurralara na parede do seu quarto, ele não tivera relação comigo porque não quisera. Preferira satisfazer-se com a secretária, uma mulher madura, da sua idade, como ele obviamente gostava. À medida que a tarde avançava, minha tristeza crescia. Sentia falta de Richard, pois estar com ele tinha se tornado muito mais que uma vontade, era uma necessidade. Precisava vê-lo, ou enlouqueceria. Eu não sabia o que seria de mim quando ele deixasse de existir, provavelmente eu morreria por dentro. Aproveitando que Lindsay foi ao banheiro, usei meu celular para ligar para o dele. — Você está muito ocupado? — Minha voz vacilou quando ele atendeu. — Eu estava pensando se podíamos falar um pouco sobre o meu trabalho. — Estou meio enrolado aqui, mas você pode entrar. Me fará bem uma pausa. Considerei mostrar um pouco de educação, dizendo que não queria atrapalhar, mas fui incapaz de arriscar perder a chance de estar com ele. O encontrei atrás da sua mesa, no seu terno impecável, parecendo uma miragem ali sentado com sua postura altiva, imponente, a paisagem urbana de Houston às suas costas emprestando-lhe um ar de poder. Parecia um rei ocupando seu trono e eu era uma de suas súditas. Notei ainda que parecia diferente de quando deixamos o apartamento pela manhã, mais radiante, enérgico, como se aquele agitado mundo dos negócios lhe fizesse bem. Sem tirar o telefone da orelha, ele gesticulou para que eu sentasse. Obedecendo ao comando, acomodei-me em uma das poltronas, com o notebook sobre as penas, sem conseguir desviar meu olhar dele, admirada, impressionada com o quanto me sentia atraída por ele. Quanto mais o observava, mais meu coração apertava no peito, pela certeza de que em breve o perderia. — Quer beber alguma coisa? — Ele desligou o telefone, dirigindo-se ao frigobar. — Não, obrigada. — Por alguma razão desconhecida eu me sentia constrangida, talvez por me encontrar em um ambiente tão sofisticado, onde ele ficava tão à vontade. Serviu-se da sua dose de uísque, antes de ocupar a poltrona à minha frente, afrouxando o nó da gravata, sem desviar seu olhar lindo do meu rosto. — Então, Dakota. O que quer saber hoje? Pigarreie desconcertada. — Vamos falar sobre sua vida íntima. Suas amantes, para ser mais específica. O canto do lábio dele se curvou num meio sorriso diabolicamente sexy e senti minha face queimar enrubescendo. Era patético que depois de termos tanta intimidade eu ainda me constrangesse na sua presença. Talvez fosse efeito do aspecto formal da empresa. — Como te disse antes, depois que minha última namorada foi morta vinha saindo apenas com prostitutas. Sempre uma garota diferente de cada vez. — Com que frequência? — Por que eu tinha perguntado aquilo? Foi uma pergunta totalmente desnecessária para o meu trabalho, porém indispensável para minha curiosidade pessoal. Senti minha face ficar mais vermelha. — Duas ou três vezes por semana. Você sabe quanta energia tenho para o sexo e você não me ajuda muito a conter essa energia quando enrubesce desse jeito na minha frente. Ele ingeriu mais uma dose de uísque, seus olhos brilhantes de luxúria fixo em mim, despertando-

me o calor da lasciva. — E quanto à Lindsay? Vi o espanto surgindo na expressão dos seus olhos e meu coração apertou no peito pela confirmação de que ele tinha algo com ela. — Aconteceu apenas uma vez. Por quê? Ela te contou diferente? Sua mentira servia apenas para me magoar mais. — Ela nunca me contou nada. Eu deduzi sozinha. Sei que vocês transaram nessa sala hoje de manhã. — Minha voz soou mais alta do que eu pretendia. Uma ruga se formou na sua testa. — Isso não é verdade. De onde você tirou essa ideia? — Você a chamou no instante em que chegou. Ficou quase uma hora com ela aqui dentro. Estavam jogando xadrez? — Minha voz continuava alterada, sem que a raiva me permitisse corrigi-la. Ele encarou-me em silêncio por um longo momento, a fisionomia contraída, o olhar duro. — Você não me fez interromper meu trabalho para escrever. Está me exigindo satisfação de algo que eu não fiz? “Não seu imbecil! Eu entrei aqui porque não consigo ficar longe de você. Embora você não mereça um minuto da minha atenção, um dia inteiro é muito tempo sem te ver.” — Não fez? — Ergui uma sobrancelha fingindo uma indiferença inexistente. — Claro que não. Estávamos trabalhando. Eu não vim à empresa ontem, precisava me organizar. Ele parecia impaciente e senti que eu estava sendo inconveniente com minha desconfiança. Era como se ele tentasse me dizer que eu não tinha o direito de cobrar-lhe fidelidade, afinal não tínhamos compromisso algum, ele deixara isso claro no Brasil. Me recebera no seu apartamento apenas para aliviar sua consciência caso algo me acontecesse. As palavras doces que dissera diante do ginásio aquela tarde, obviamente tinham sido falsas, motivadas pelo seu orgulho ferido ao imaginar que eu podia ficar com outro homem depois de ter ficado com ele todos aqueles dias. Esforçando-me para parecer indiferente ao desprezo que ele demonstrava pelos meus sentimentos, mudei de assunto, induzindo-o a falar sobre seus casos secretos com as mulheres assassinadas, os detalhes mereciam ir para a sua biografia. Quando se aproximava do horário em que eu precisava sair para ir à faculdade falar com Anthony, deixei sua sala, sem informar-lhe sobre minha saída. Entretanto, minha tentativa de sair escondia foi em vão, pois no instante em que tentei entrar no elevador, fui barrada pelo segurança com aparência de agente funerário, que se colocou entre mim e a porta. — Quer sair da minha frente? — Me impacientei. Ignorando-me, ele tirou um minúsculo fone de ouvido do paletó, levando-o ao ouvido e comunicou a Richard que eu estava saindo, sem usar um rádio ou celular enquanto falava, como se existisse um transmissor embutido em sua roupa. Abri a boca para discutir com o homem, mas desisti no instante em que vi Richard sair da sua sala, vindo na minha direção com velocidade, sua fisionomia contraída, o maxilar rijo, os olhos brilhando de raiva. Parecia um touro valente correndo na direção do tecido vermelho. Se tivesse para onde, eu teria saído correndo, para não precisar enfrentar sua fúria. — Me diga qualquer coisa, só não me diga que pretendia ir se encontrar com Anthony. — Sua voz alterada ecoou pela sala como uma trovoada num dia de tempestade, tão intimidadoramente que até Lindsay parou o que fazia para observar a cena com olhos arregalados.

Tremi na base, cogitei me esconder atrás do segurança, pois confrontar aquele homem quando ele estava nervoso era tarefa para lutador de MMA. Entretanto, eu sabia que precisava enfrentá-lo, ele não tinha o direito de comandar minha vida do jeito que quisesse. Então, ignorei o tremor que se instalara nas minhas pernas, ergui meu queixo imponentemente e me defendi. — Não estou indo encontrar ninguém porque isso não é um encontro. Estou indo falar com o meu professor sobre um trabalho acadêmico do qual dependo para me formar. Se... — Você não vai e está encerrado! — Ele me interrompeu, bruscamente. Quem ele pensava que era? O dono do mundo? Richard sempre conseguia o que queria com sua intransigência, mas desta vez eu me recusava a ceder, afinal era o meu futuro profissional que estava em jogo. — Mas é claro que eu vou. Você não manda em mim. Ele fitou-me com espanto, não esperava que eu o enfrentasse. — Será que você ficou louca?! Há um assassino solto por aí que pode te matar a qualquer momento, sem falar que Anthony pode ser esse assassino e você está indo direto para toca do leão. — Eu sei me cuidar. Além do mais o segurança estará comigo. Não estarei desprotegida. — Você não vai. Assunto encerrado! Segurou-me pelo braço, puxando-me na direção da sua sala, enquanto eu me debatia na fracassada tentativa de me libertar. — Sr. Parker os argentinos estão subindo para a reunião. — Lindsay declarou, ainda segurando o interfone, seus olhos muito arregalados. — Cancele. — Senhor, eles já subiram. Quando me avisaram já tinham pegado o elevador. — Porra! Dá um jeito nisso. Nesse momento, a porta do elevador se abriu e cerca de meia de dúzia de homens engravatados sugiram do seu interior, de modo que Richard não tinha alternativa que não libertar meu braço da sua mão, para não passar a impressão de que estava me agredindo. Ótimo, era a oportunidade perfeita. Sem olhar para trás, passei pelos executivos e tomei o elevador, o segurança me seguindo. Antes que a porta se fechasse totalmente, ouvi a voz dele ressoar já não tão voraz. — Mantenha contato, Jordan. E no instante seguinte eu estava livre do ditador, embora tal fato não me alegrasse como deveria, pelo contrário, estar sem ele era uma verdadeira agonia. Jordan me conduziu em um Mercedes Classe S Pullman preto novo e confortável até o Campus Universitário. Chegando lá, tentei convencê-lo a me esperar no carro, mas meus argumentos foram em vão, ele me seguiu de perto, com sua aparência de agente fúnebre me fazendo passar vexame ao nos tornar o centro da atenção dos universitários. Cumprimentei alguns ex-colegas, sentindo-me bem naquele ambiente que por quatro anos, frequentara diariamente. Sentia falta de estar ali. Quando chegamos à sala de Anthony, mais uma porta fechada entre muitas no longo corredor, novamente Jordan se recusou a atender meu pedido e continuou atrás de mim mesmo quando Anthony abriu a porta. O professor ficou paralisado, alterando seu olhar de Jordan para mim, de mim para Jordan.

— Desculpe por isso. Richard arranjou esse armário para andar atrás de mim e nada do que eu diga o convence a se afastar. Subitamente os olhos azuis claros dele concentraram-se em meu rosto, espantados, sem que eu compreendesse a razão. — Tudo bem Dakota. Entre. É bom te ver. — Deu-nos passagem, fechando a porta por dentro. Varreu-me de cima abaixo com o olhar. — Você está diferente. E eu estava mesmo. Em vez dos meus habituais jeans desbotados, rasgados nas pernas e das minhas regatas coloridas, eu usava em vestido de linho branco, muito colado ao corpo, com decote comportado quadrado, saia até os joelhos e sandálias de saltos altos. — Ah, sim. Eu vim direto da Thrive. A expressão dos seus olhos se tornou ainda mais surpresa. — Sente-se rapaz. — Disse, desviando o olhar para Jordan. — Estou bem aqui. — A voz do segurança era quase tão tempestuosa quanto à de Richard e foi impossível não me lembrar do meu amor. Jordan permaneceu em pé ao lado da porta e apesar de usar óculos escuros eu sabia que seu olhar vasculhava cada centímetro da sala pequena, com prateleiras de aço abarrotadas de livros cobrindo as paredes de cima abaixo. Livros sobre jornalismo, a maioria dos quais já tinham passado pela minha vasta lista de leitura. Segui o professor até sua mesa nos fundos do cômodo, acomodando-me na cadeira do lado de cá, enquanto ele ocupava seu lugar. — E então, como está o trabalho? — Ele me fuzilava com olhos inquiridores. Recordei-me do episódio acorrido durante a festa de aniversário de Trinity, quando ele destilara seu ódio contra Richard e um sentimento de repulsa me invadiu. — Quase finalizando, como você pode constatar nas páginas que enviei. — Sim. Li tudo, ficou muito bom. Está faltando você escolher um título. — Já escolhi, será Pecados Íntimos. — Parece de acordo com a história. — Se você leu, então já deve ter percebido que Richard é inocente de tudo o que vocês o acusam. O espanto mais uma vez se fez na expressão dos seus olhos. Fitou-me demoradamente em silêncio, antes de indagar: — E nem passou pela sua cabeça que ele pode estar mentindo? Realmente não tinha passado. Richard podia ser um grosso, ditador, mas havia sinceridade em seu olhar. — E nem passou pela sua que ele pode estar falando a verdade? — Rebati. — Dakota, Richard não é quem você pensa. Eu vi as notícias que estão circulando por aí sobre vocês estarem juntos e fiquei preocupado com o risco que você está correndo. — Que risco? — Ele pode ter matado todas as mulheres com quem se envolveu, inclusive minha irmã e você pode ser a próxima. — Se ele assassinou sua irmã, como você afirma, porque a polícia não classificou a morte dela como homicídio e sim como suicídio? — Porque ela estava de bruços quando caiu e as pessoas que são empurradas sempre caem de costas. Essa é a teoria na qual a polícia se baseia. Eles não levam em conta que a vítima pode ter

sido surpreendia por trás pelo assassino. — Desculpe, mas não consigo ver Richard como um assassino. Seus olhos azuis brilharam de fúria. — Isso porque você está apaixonada por ele. Se eu soubesse que aconteceria, jamais teria pedido a ele para te receber. — Ele respirou fundo, como se tivesse acabado de perceber que alterara o tom da voz. — Você não sabe quem ele realmente é, Dakota. — Abriu uma gaveta, de onde tirou uma pasta e pousou-a sobre a mesa. — Eu mandei investigar a origem dele e descobri que é filho de um bandido. A mãe dele tinha apenas quinze anos de idade quando foi violentada por um foragido da cadeia que cumpria pena por assassinato. Por isso ela o abandonou naquela lixeira, de onde ele nunca deveria ter saído. O maldito deve ter herdado o DNA ruim do pai. Minha nossa! Eu não sabia o que era pior, se o ódio contido em suas palavras ou se aquela revelação sobre o homem que eu tanto amava. Será que Richard sabia disso? Obviamente sim, se ele contratara tantos detetives para investigar as mortes das mulheres, contratara um para descobrir sua origem também. Sem mais saber o que pensar, ou em que acreditar, abri a pasta e vi, em alguns pedaços de jornal velho, a notícia sobre o estupro sofrido pela mãe dele, sequestrada diante da escola onde estudava, no interior, por um bandido recém foragido da cadeia, acusado de vários assassinatos, que logo foi preso novamente. Para esconder a gravidez indesejada da população da pequena cidade, ela passara sua gestação na casa de uma tia em Sugar Land, abandonando a criança recém-nascida em uma lixeira, num ato de crueldade tão sórdido quanto aquele do qual fora vítima. Eu também tinha engravidado por meio de um estupro quando tinha quinze anos, entretanto, jamais, nem por um minuto passara pela minha cabeça abandonar minha filha. Eu a amara no instante em que a sentira se mexer dentro de mim e teria amado muito mais se não a tivessem levado embora. Quanto ao fato de o pai de Richard ter sido um assassino, não fazia dele a mesma coisa. A descoberta de Anthony não provava nada que não o fato de que Richard tinha mais razões para ser infeliz do que eu supunha.

CAPÍTULO XX

— Isso não prova nada. — Joguei a pasta de volta na mesa. — Minha mãe era uma vadia viciada em drogas e nem por isso eu me tornei a mesma coisa. — Dakota, querida, você está cega de paixão, por isso não enxerga a verdade. — E você está cego de ódio, assim como todos da sua família. Ele respirou fundo, descansando suas costas no espaldar da cadeira. — Já vi que nunca vou te convencer. É uma pena, pois gosto de você e espero que nada de mal te aconteça. — Richard está planejando cometer suicídio, pulando da mesma sacada que Elizabeth pulou. — Eu não lhe revelei aquilo apenas com o intuito de mostrar-lhe que Richard era inocente, mas para aliviar um pouco o peso em meu coração. — Isso porque se sente responsável pelas mortes, mesmo não as tendo cometido. Não houve qualquer reação por parte de Anthony. — Eu só acredito depois que acontecer. — Aí será tarde demais para que vocês possam ter a consciência pesada por acusá-lo daquilo que ele não fez e perdoá-lo. — Isso nunca será perdoado. Magoada pela frieza em suas palavras, pelo ódio que dirigia ao irmão, pela insensibilidade com que o tratava, não mais consegui ficar ali parada ouvindo-o impotente, sem que nada o que eu dissesse o fizesse mudar de ideia. Como ele podia desprezar tanto uma pessoa com quem crescera? Eu nunca entenderia. — Tenho que ir. Esperarei pelas suas considerações sobre o texto, via e-mail e logo volto a procurá-lo com o trabalho concluído. — Levantei-me decidida a sair. Ele também ficou em pé, colocando minha mão entre as suas, fitando-me de muito perto. — Eu não estou brincando quando digo que gosto de você Dakota. Deixe aquele louco e fique comigo. Eu sei que posso te fazer feliz. Puxei minha mão das suas, magoada com suas palavras. — Uma pessoa que tem o coração cheio de ódio como você, é incapaz de fazer qualquer mulher feliz. E se quer saber a verdade, você não chega aos pés de Richard como homem ou em qualquer outro aspecto. Adeus Anthony. Sem mais, deixei a sala apressada, imaginando que se ele fosse o assassino eu acabara de assinar minha sentença de morte, embora não me arrependesse por colocá-lo em seu devido lugar. Sem que eu pudesse conter meus sentimentos, as lágrimas ameaçavam aflorar dos meus olhos. Sentia muita pena de Richard, por ter sido tão desprezado durante toda a sua vida, primeiro pela sua mãe biológica, depois pela família que o adotara, sem mencionar as perdas que ele sofrera ao longo de sua trajetória. Eu não conseguiria segurar o choro quando o visse e me lembrasse o que fizeram com ele. E já estava cansada daquilo. Estava cansada de chorar, de sofrer. Eu queria a minha vida de

volta. Queria ir para um bar e encher a cara com meus amigos, pessoas da minha idade, sem me preocupar com mais nada que não em me divertir. Embora o amasse loucamente, o mundo triste de Richard estava me fazendo mal. Precisava de um tempo sem toda aquela carga sobre os meus ombros. Mesmo que fossem apenas algumas horas, recordar-me como eu era e verificar se tudo voltaria a ser como antes, após a morte do único homem que eu fui capaz de amar. Talvez à distância me permitisse amá-lo menos e assim não sofreria tanto. Entretanto, para conseguir ter algumas horas de paz, antes de tudo eu precisava me livrar de Jordan. Pensando rápido, parei diante da porta do banheiro feminino, ao longo do corredor. — Posso entrar sozinha, ou você vai entrar atrás de mim aqui também? — Não hesitei em ser rude. — Eu espero aqui fora. “Ótimo”. Eu conhecia aquele campus muito bem, afinal passara quatro anos da minha vida estudando ali. Fugir de Jordan não seria um problema. Então, colocando em prática meu plano rapidamente elaborado, entrei em um dos boxes, subi no vaso sanitário, usei minha bolsa cara para quebrar o vidro da janelinha que dava acesso ao lado de fora e amaldiçoei o fato de estar usando aquele vestido apertado em vez de um jeans. Ainda assim, me recusei a desistir. Depois de várias tentativas, consegui atravessar o espaço limitado da janela, alcançando o pátio onde alguns poucos alunos observavam-me com curiosidade. Meu segurança não contava que a instituição tinha uma saída pelos fundos, para onde segui, pegando um táxi na rua movimentada, embora não soubesse para onde ir. A noite começava a cair, deixando o trânsito mais lento que o normal. As luzes da cidade me lembrando a vista noturna da sacada do apartamento de Richard, o lugar melancólico de onde ele pretendia se atirar. Fechei os olhos e respirei fundo, satisfeita por ter me afastado daquilo. Toda aquela nostalgia não faria bem a nenhum ser humano. Por outro lado, estar longe daquele homem me trazia a sensação de que faltava um pedaço de mim. Ele não era minha vontade e sim minha necessidade, pois o amava perdidamente, um amor que me trazia mais tristeza que alegria, por isso não era saudável. Eu não tinha mais Trinity, com quem costumava sair para as farras, mas ainda me restava Tom, para quem eu liguei, convidando-o para alguns drinks no Moonlight, um bar movimentado que costumávamos frequentar no subúrbio. Nem precisei chamar duas vezes para que ele concordasse em vir me encontrar. Como ainda era cedo da noite o Moonlight estava praticamente vazio quando entrei. Havia apenas alguns homens barbudos jogando sinuca, alguns poucos casais ocupando as mesas, outras pessoas solitárias no bar e absolutamente ninguém na pista de dança. Era estranho ver aquela pista vazia, pois sempre que vínhamos aqui ela estava abarrotada. Sentei-me no bar e pedi uma vodka com gelo. Não estava afim de cerveja, afinal a intenção era fica bêbada. Deixei que meus pensamentos se perdessem no ritmo agitado da música que tocava, até que vi Tom se aproximar, com um estilo único, estava vestindo como sempre sua camiseta de malha preta com o desenho de uma caveira medonha na frente, jeans com correntes penduradas nas laterais e botas. Os cabelos dourados formavam uma crista pontuda no alto da sua cabeça. Saudosa, corri para abraçá-lo, notando o quanto sentira sua falta.

— Caramba! Parece que fazia um ano que eu não te via. — É bom te ver também Dak. Você está fazendo falta naquele apartamento. Afastamo-nos do abraço. — Como estão às coisas por lá? — Eu queria saber como Trinity estava, embora soubesse que ela não merecia um minuto dos meus pensamentos. — Está tudo muito triste sem você. Trinity está deprimida pelo que te fez. Ela sabe a verdade, só ainda não se deu conta disso. E quando se der vai te pedir perdão. Nos sentamos lado a lado no bar. — O que você vai beber? — Não to bebendo esses dias. O Taylor achou que eu tava exagerando e concordo com ele. Então resolvi dar um tempo. — Como estão as coisas entre vocês? — Como sempre. Ele não tem coragem de me assumir e eu vou levando porque sou uma anta apaixonada. E como estão as coisas entre você e Parker? Fitei meus pés, desanimada. Definitivamente não queria que ele tivesse tocado naquele assunto, mas já que tocara, aliviaria um pouco meu coração dividindo minha dor com uma pessoa amiga. — Estou apaixonada por ele. — Como assim apaixonada?! Você acabou de conhecer o cara. Está certo que ele é lindo e gostoso, mas era só para dar umas fodas. – Tom parecia alarmado. — É nisso que dá passar tanto tempo sem homem. — Ele parou para observar meu rosto com atenção. — Se tá apaixonada, porque você parece tão infeliz? Cogitei contar-lhe tudo, mas não podia sair por aí falando a todos que Richard pretendia se matar, isso era um pecado íntimo dele. Já tinha feito muito contando a Anthony. — Porque ele não me faz feliz. — Então dá um pé na bunda e arranja outro que faça. — Não é tão simples. Eu realmente o amo. Tom respirou fundo. — Eu te entendo. É como um vício, você sabe que não vai te fazer bem, mas não consegue largar. Vem, vamos dançar que isso melhora. — Mas não tem ninguém na pista de dança. — Melhor assim, pois teremos mais espaço. Sorri amplamente, constatando o quanto isso estava sendo raro nos últimos dias. Ingeri mais um gole da minha vodka e o segui para a pista, onde passamos a nos movimentar freneticamente ao som de Avicii, quando então toda a angústia que jazia em meu peito foi se amenizando, cedendo lugar à prazerosa sensação de descontração que tanto estava me fazendo falta nos últimos dias. Pouco a pouco a pista foi lotando de pessoas, as músicas cada vez melhores e logo nada mais me importava que não a leveza que a dança, a bebida e a alegria de Tom me proporcionavam. Era disso que eu estava precisando. Um cara alto, moreno, com mais ou menos a minha idade, que dançava próximo a nós, observavame com um olhar “quero te foder”, mas eu não estava ali com a intenção de namorar. E embora soubesse que precisava conhecer alguém capaz de me fazer esquecer meu amor, nenhum outro homem me atraía. Quanto a Tom, não perdeu tempo, logo um cara musculoso que estava enturmado com um grupo de

gays deixou sua turma para vir dançar conosco e Tom começou a dar mais atenção a ele que a mim, deixando-me solitária novamente. Cogitei arranjar uma paquera também, pelo menos para me divertir. O cara que me comia com o olhar desde que eu começara a dançar era atraente, entretanto, eu não via sentido algum em ficar com outro homem que não Richard. Talvez depois da morte dele eu me tornasse uma daquelas mulheres amargas, que envelheciam sozinhas, sem amor. Minhas sandálias estavam começando a me torturar, quando Tom teve a brilhante ideia de nos convidar para sentarmos. Como o bar se encontrava abarrotado, procuramos uma mesa, mas não sem que antes eu pedisse mais uma dose de vodka, pois ainda não estava bêbada como intencionava. Acomodamo-nos a uma mesa no canto, Tom dividindo sua atenção entre mim e seu garoto bombado, para que eu não me sentisse excluída. Logo a garçonete apressada, vestida com vulgaridade, veio me servir a vodka, deixando-a sobre a mesa. Antes que minha mão alcançasse o copo, Tom o pegou. — Que porra é essa que você tá bebendo? — Bebericou do líquido transparente com gelo, fazendo uma careta horrível, para em seguida derramá-lo, vagarosamente, no canto da parede. — Você não vai beber esta merda. Nenhum homem merece uma cirrose, nem mesmo o gostoso do Richard Parker. Agora peça uma cerveja se quiser ficar tonta. — Porra Tom! Eu já tinha pago por essa merda. — Sem problema. Eu te reembolso e ainda faço questão de pagar pela cerveja. Ele se levantou para chamar a garçonete e tudo aconteceu muito rápido. Em um momento Tom estava em pé, para no instante seguinte cair no chão, convulsionando violentamente, sua boca expelindo uma espuma branca viscosa, como se estivesse em meio a uma crise de epilepsia. Aflita, corri em seu socorro, ajoelhando-me ao seu lado, apoiando sua cabeça sobre minhas pernas para evitar que ele se engasgasse com a baba. — Alguém chama uma ambulância. — Gritei, uma pequena multidão de pessoas se formando à nossa volta, o paquera de Tom já com o celular no ouvido. O que me pareceu uma eternidade depois, os profissionais uniformizados que vieram com a ambulância colocaram-no cuidadosamente em uma maca, levando-o para fora, comigo seguindo-os de perto, entrando junto na ambulância. Tom estava desacordado, a pele do seu rosto ficando esverdeada e um suor frio cobrindo seu corpo. Chegando ao hospital consegui segui-los até a entrada da emergência, quando então fui barrada por uma enfermeira. Seguindo as orientações da mesma, me dirigi até a recepção, onde forneci as informações necessárias para o preenchimento da ficha de internação do meu amigo, em seguida me encaminharam para uma sala de espera com paredes brancas, onde havia fileiras de cadeiras presas a barras de ferro, ocupadas por pessoas com o semblante carregado de aflição. Fui orientada a aguardar ali, entretanto, não consegui ficar parada, sem saber como Tom estava ou ao menos o que ele tinha. Então, seguindo a um impulso, voltei pelo longo corredor e invadi a sala para onde ele fora levado, encontrando-o em um leito, ainda desacordado, sem camisa, muito pálido, com um tubo enfiado na boca. Estava rodeado por médicos e enfermeiros uniformizados. — Ei, você não pode ficar aqui. — Uma das profissionais veio em minha direção, parecendo determinada a me expulsar. — Preciso saber o que ele tem. Por favor.

— Ele foi envenenado. É isso o que ele tem. Ingeriu cianeto. Só ainda está vivo porque a quantidade foi pouca. — Era assustadora a frieza com que um dos médicos falava. — Já introduzimos um antídoto e vamos fazer uma lavagem estomacal, mas ainda não temos certeza se ele viverá. Agora saia daqui. — Ele não pode ter sido envenenado. Ele não estava bebendo. Subitamente, recordei-me de que Tom ingerira um gole da minha vodka antes de jogá-la fora e a verdade me atingiu com a força de um furacão que me arrastava, violentamente. Aquele veneno tinha sido colocado para mim, o maldito assassino de mulheres já tinha determinado minha sentença e tentado me matar. Tom ainda estava vivo porque apenas bebericara a vodka, se ele não a tivesse feito aquilo eu teria bebido um gole maior e há essa hora estaria morta. Agarrei-me ao meu próprio corpo, tremendo violentamente, o pavor me invadindo. — Vamos, volte para sala de espera. A polícia já foi avisada. — A enfermeira segurou-me pelo braço, conduzindo-me para fora sem que eu protestasse, o terror e a culpa me paralisando. Caminhei lentamente pelo corredor bem iluminado, o tremor em meu corpo se intensificando. Na sala de espera lotada, temi que o assassino estivesse entre aquelas pessoas, espreitando, esperando o momento certo para me atacar, como fizera no bar. Era um louco, porém um louco que sabia o que estava fazendo, pois eu não dissera a ninguém que ia àquele bar, para ter me encontrado lá obviamente ele estivera me seguindo o tempo todo, desde que eu deixara a empresa, espreitando, esperando a oportunidade certa para atacar, como poderia estar fazendo naquele exato momento. Repassei mentalmente cada instante entre o momento em que eu entrara no bar e o envenenamento de Tom. Não havia sequer um rosto conhecido entre as pessoas naquele lugar, ninguém parecia me olhar diferente, que não o sujeito que me comia com o olhar. Não havia nada de suspeito que eu poderia dizer à polícia para ajudar a apanhar o culpado. Ele agira muito discreta e sabiamente e continuaria agindo até que eu estivesse morta. Aterrorizada, encolhi-me contra a parede a um canto do grande e bem iluminado cômodo, estudando atentamente o rosto de cada um dos presentes, em busca de alguma evidência que me mostrasse quem era ele. Mas era impossível saber. Podia ser qualquer um ali. Eu não sabia o que era pior, se a certeza de que a qualquer momento eu poderia ser assassinada ou ter meu melhor amigo à beira da morte por minha causa. Se Tom não sobrevivesse, eu jamais me perdoaria, pois teria o sangue dele em minhas mãos. Um homem barrigudo caminhou na minha direção e gelei, todavia, ele desviou, seguindo para o bebedouro perto de mim. A sensação que eu tinha era de que finalmente a realidade me atingia. Até então toda aquela série de assassinatos me parecia tão distante e irreal quanto à narrativa de um romance de época. Entretanto, tudo se tornara real, o assassino realmente existia, era sagaz, inteligente, mortalmente perigoso e estava atrás de mim. A qualquer momento eu poderia estar morta. Em pânico, atenta a qualquer um que olhasse em minha direção, encolhi-me mais no canto, quando então o vi entrar na sala e meu coração disparou no peito. Ele estava lindo! Parecendo um rei com sua postura altiva, imponente, usando jeans e camisa de mangas compridas enroladas até o cotovelo. Imediatamente fui tomada pela certeza de que dali em diante eu estaria segura, como se meu herói dos contos de fadas viesse me resgatar do perigo, embora ainda não conseguisse me mover, o choque me imobilizando.

Richard veio até mim, sua presença tão poderosa que atraia a atenção das pessoas a sua volta. Apenas ao aproximar-se constatei o quão angustiada estava a expressão dos seus olhos, seu rosto muito abatido, suas sobrancelhas arqueadas.

CAPÍTULO XXI

— Você tem ideia do inferno que passei até chegar nesse hospital e ser informado de que não era você que estava internada? — Sua voz soou ligeiramente trêmula. — Como você me encontrou aqui? — Jordan não é muito bom com segurança, mas é um excelente investigador. Só então notei que Jordan estava em pé diante da porta, junto com outro segurança vestido formalmente, ambos examinando discretamente o ambiente. — Richard... Alguém tentou me matar. Em desespero, agarrei-me a ele, como se estivesse me afogando e encontrasse uma tábua de salvação. Senti o calor do seu corpo sólido, seus braços poderosos em torno de mim e fui invadida, mais uma vez, pela certeza de que o amava. Eu o amava loucamente. Ali entre seus braços eu me sentia frágil, pequena e acima de tudo, me sentia protegida. — Eu sinto muito minha menina. Por que você se descuidou? Por que fugiu de Jordan? — Eu precisava de um tempo sozinha. — O que foi procurar naquele bar? — Eu não sei. – O corpo dele estremeceu brevemente de encontro ao meu. — Eu já esperava que isso acontecesse. Foi assim das outras vezes, embora nunca tenha sido tão rápido. — Meu corpo estremeceu de encontro ao seu. — Com você eu não permitirei que aconteça. Vou te proteger, eu prometo. — Ele me apertou com mais força, o calor da lasciva me percorrendo. “E quanto às outras, você não as protegeu?” Não me atrevi a pronunciar as palavras. Afundei meu rosto no seu pescoço, inalando seu cheiro delicioso de suor limpo misturado com perfume caro masculino. — Me sinto tão mal. Tom está morrendo e a culpa é minha. — Eu sei exatamente como você está se sentindo. Foi então, que finalmente o compreendi. Por uma fração de segundos eu me coloquei no lugar dele e pela primeira vez dei razão ao seu desejo de se matar. Se a culpa pelo que acontecera a Tom me atingia tão dolorosamente, podia imaginar como me sentiria se tantas pessoas de quem eu gostasse fossem mortas por minha causa. No lugar de Richard, eu também cogitaria o suicídio. — Vamos sair daqui. Vou te levar para casa. — Ele se afastou do abraço, segurando-me a mão. — Não posso deixar Tom aqui sozinho, sem saber o que acontecerá com ele. — Ele não vai ficar sozinho. Jordan fica aqui e nos mantêm informados. — Não posso. — Dakota, você não pode passar a noite aqui nessa espelunca, sem ao menos um lugar descente para sentar. Vamos para casa, amanhã cedo eu te trago de volta. E como sempre, o senhor todo poderoso, conseguiu me convencer. — Precisamos avisar os pais de Tom.

— Você tem o número do telefone deles? — Não. Mas Tom estava com o celular dele no bolso. Deve ter o número gravado. Sem soltar minha mão, Richard nos conduziu até onde Jordan estava, cochichando algo no ouvido dele, para em seguida o segurança avançar pelo corredor que levava à sala de emergência. Menos de cinco minutos depois ele estava de volta, com o celular de Tom nas mãos. — Como ele conseguiu isso? — Eu estava impressionada. — Não sei. Deve ter subornado alguém. — Richard entregou-me o sofisticado aparelho e fiz a ligação, enfrentando a difícil tarefa de contar à mãe de Tom o que acontecera. Em seguida, eu e Richard deixamos o lugar de mãos dadas. Jordan nos conduzindo de volta a River Oask no mesmo Mercedes com o qual me levara ao campus universitário. Chegando ao apartamento, deixei-me afundar no sofá da sala, desalentada, tomada pela exaustão de quem enfrentara uma guerra de nervos, já que todos os meus confrontos foram emocionais. A sensação de medo e de culpa ainda jaziam em mim, recusando-se a me abandonar como se fizessem parte do meu ser. — Bebe isso, você vai precisar. — Richard estendeu-me uma taça de vinho, que aceitei sem hesitar, pois a bebida era relaxante e eu precisava disso. Ingeri um grande gole. Era doce e estava gelada. — Tente não pensar no que aconteceu. Nessas horas a melhor coisa é esquecer, porque isso pode te deixar louca. Ele tinha tanta experiência com isso, passara por tantas tentativas e concretizações do assassinato das mulheres com quem se relacionara que conhecia os efeitos da dor. Sabia exatamente do que estava falando. No seu caso, era ainda pior, pois além da culpa que pesava sobre seus ombros, antes de me conhecer, era obrigado a viver mergulhado na solidão por se recusar a colocar mais vidas em perigo. Mais que nunca, eu compreendia o que o impulsionara a tomar a decisão de tirar sua própria vida. — Como você conseguiu sobreviver a isso tantas vezes? — Me desligando da realidade. Parando de pensar. — Ele deu de ombros. — Eu não sei como fazer isso. Não consigo esquecer. — Eu sei como. — Ele foi até o aparelho de som e logo a voz melodiosa de James Blunt preencheu o ambiente em You’re Beautiful, uma de minhas músicas preferidas. Surpreendendo-me uma segunda vez, ele estendeu-me a mão, convidando. — Dança comigo? Sorri meio sem graça da sua intenção quase infantil de tentar criar um clima de romantismo em meio a tanta tragédia. — Tá falando sério? — Sim. O homem mais sexy, lindo e complicado da face da terra estava com sua mão estendida para mim, ao som de Blunt. Como resistir? Seduzida, dei-lhe a mão, permitindo-lhe me puxar para colar meu corpo no seu, abraçando-me pela cintura, embalando-nos lentamente ao sabor da música romântica. Fechei os olhos e entreguei-me ao momento, ao calor gostoso que partia dele, à sensação de proteção que seus braços em torno do meu corpo me proporcionava e logo os tormentos começaram a desaparecer, meu mundo se resumindo a Richard Parker, como se aquele homem tivesse o poder de me enfeitiçar, mas era um feitiço bom, no qual eu queria me perder. Seu nariz tocou meus cabelos, para logo sua boca escorregar lentamente até meu ouvido.

— Está melhorando? — Sussurrou, seu hálito quente acariciando minha orelha, tão deliciosamente que o calor do desejo brotou no meu interior, alastrando-se rapidamente pelo meu sangue. Ah! Porra! Eu o queria e queria muito. — Ah, sim. — Minha respiração pesada denunciava minha excitação. Perceptivo, Richard me apertou com mais força contra seu corpo forte, seu tórax esmagando meus seios por sob as roupas, sua ereção pressionando meu ventre, despertando-me a luxúria. Continuou escorregando sua boca pela minha face, com suaves carícias dos seus lábios quentes, embora não me beijasse. Quando o desejo se tornou mais intenso do que pudesse controlar, procurei sua boca com a minha, entretanto, ele se esquivou desviando a face para o outro lado, o canto da sua boca se curvando num sorriso cínico. Maldito! Estava brincando comigo como fizera hoje de manhã, quando dissera que voltaria a me tocar apenas quando eu pedisse. Como podia ser insensível a ponto de brincar em uma situação como aquela? Mas eu também sabia jogar e mostraria isso a ele. Levou seus lábios à pele do meu pescoço, enlouquecendo-me com beijos e lambidas eróticas. — Gosta disso, Dakota? — Sua respiração estava ofegante. — Sim, muito. — Quer que toque você mais intimamente? — Sim. — Você me rejeitou Dakota e eu te disse que só voltaria a te tocar quando você pedisse. Me peça Dakota. Respirei fundo, necessitando de um esforço inumado para conter o desejo lascivo que me impulsionava a implorar por suas carícias. Se ele conseguia sentir tudo aquilo e se controlar, eu também conseguiria. — Pensando bem, acho que preciso de um banho. Está muito quente hoje. Surpreendendo-o, me desvencilhei dos seus braços, deixando-o paralisado no centro da sala e fui em direção do quarto. Como eu esperava, ele me seguiu, alcançando-me antes que eu abrisse a porta do aposento. Segurou-me firmemente pela cintura, colocando-me de costas contra a parede, pressionando seu corpo contra o meu, aprisionando meus pulsos acima da minha cabeça, tornando-me escrava das suas vontades. — Está me rejeitando de novo, Dakota Thompson? — E faz diferença? Por acaso você quer me beijar agora? Esfreguei meu corpo contra a sua ereção, contendo um gemido de tesão e umedeci meus lábios com a língua, sensualmente, quando então, para minha satisfação, a boca dele se abriu para puxar o ar pesadamente. — Sim, eu quero. — Então peça. O canto da sua boca voltou a se curvar naquele sorriso cínico, irresistível, ao passo que uma das suas sobrancelhas se erguia. — Está jogando comigo, Dakota? — Você é um bom professor. — Acontece que quando eu quero uma coisa eu não peço, eu tomo.

E no instante seguinte, sua boca estava sobre a minha, beijando-me com tanta urgência que parecia tentar me devorar. Sua língua habilidosa explorava minha boca avidamente, enquanto seu corpo grande pressionava-me com mais força contra a parede, sua ereção firme contra meu ventre intensificando o desejo primitivo que tomava conta de mim, incendiando-me de dentro para fora, minha intimidade umedecendo. Movida pela luxúria, chupei sua língua com força, num pedido silencioso para que ele me fizesse sua, ali, naquele instante. Sem interromper o beijo, Richard libertou meus pulsos das suas mãos, afastando-se o suficiente para rasgar meu vestido de cima abaixo, escorregando-o pelos meus ombros até que o tecido caísse aos meus pés. Tirou meu sutiã com a mesma urgência, uma de suas mãos acariciando meus peitos, alternando entre eles, enquanto a outra mão passeava livremente pelo meu corpo, incendiando-me cada vez mais. Enterrei meus dedos nas suas costas, acariciando seus músculos bem definidos, maravilhada, deliciada com o quanto meu tesão crescia à medida que eu o tocava. Era como se ele fosse feito para o prazer. Tudo nele me excitava, até o mais simples contato. Richard afastou-se um pouco, o suficiente para fitar-me nos olhos, o fogo do desejo refletido em seu olhar. — Eu te quero tanto... – Sussurrou, com dificuldade para puxar o ar, sua voz rouca se misturando à de James Blunt que continuava ecoando pelo apartamento em melodias românticas. — Então faça-me sua. Sem mais esperar, ele tirou minha calcinha pelos pés, observando meu sexo com olhos reluzentes antes de erguer-me em seus braços, carregando-me para a cozinha, estendendo-me sobre o balcão de mármore, completamente nua. Eu arfava sequiosa por tê-lo dentro de mim, estava tão ofegante que podia ver meu peito subindo e descendo com a respiração pesada enquanto ele se despia, deixando à mostra o corpo glorioso, musculoso sem exagero, os ombros largos combinando com os quadris estreitos. Seu pau grande estava duro, esticado até o umbigo, o líquido escorrendo da sua ponta, tão convidativamente que salivei sequiosa por colocá-lo na boca. Mas Richard tinha outros planos. Surpreendeu-me ao tirar a extensão que ligava a geladeira à tomada, usando o fio para amarrar meus pulsos para cima, prendendo a outra ponta na pilastra da parede, de modo que eu não podia mover os meus braços. Eu não tinha ideia do que ele pretendia com aquilo, mas isso não importava, pois tudo o que vinha dele era gostoso e excitante. — Confia em mim? — Sim... — Ótimo. Exibindo sua gloriosa nudez, ele foi até a geladeira, de onde tirou um pote de sorvete. Previ o que aconteceria e meu corpo arquejou, um gemido de tesão partindo dos meus lábios. — Você quer isto tanto quanto eu, minha menina. — Sua voz nunca me pareceu tão máscula e excitante, quanto um convite ao prazer. Como eu esperava, ele espalhou o sorvete sobre o meu corpo, começando pelo colo, fazendo uma trilha que se estendia até meu sexo. A sensação do creme gelado de encontro à minha pele quente era deliciosa, me deixava ainda

mais excitada. — Você me deixou o dia inteiro com fome Dakota, por se negar a mim esta manhã. Agora vou fazer de você a minha refeição. Com tais palavras apossou-se dos meus lábios, lascivamente, introduzindo e tirando sua língua da minha boca, repetidamente, como se me fodesse assim. Em seguida, escorregou sua boca até o sorvete, sugando-o de sobre a minha pele deixando um rastro de fogo por onde passava. Colocou um dos meus peitos na boca, sugando-o demoradamente, tão deliciosamente que lancei a cabeça para trás, ensandecida, os gemidos escapando-me da garganta, descontroladamente. Fez o mesmo com o outro peito, deixando-me cada vez mais doida. Continuou o percurso da sua boca sobre o meu corpo, devorando o sorvete como se fosse o último resquício de alimento da terra. Ao alcançar o meu sexo, dobrou meus joelhos, abrindo-me as pernas, observando minha intimidade com olhos famintos, ao passo em que sua boca se abria para puxar o ar com dificuldade. Então, sua língua gostosa mergulhou entre meus lábios vaginais, penetrando meu canal lambuzado e eu gritei, um grito de puro prazer. Richard lambia a minha boceta deslocando sua língua habilidosa da minha vagina até meu clitóris, indo e voltando, enquanto eu me contorcia de tesão, tentando puxar minhas mãos do fio para tocar-lhe os cabelos. Ah, porra! Como aquilo era bom. Não havia palavras que pudessem descrever o prazer de ter Richard Parker entre minhas pernas, me transformando em um ser de sensações e sentidos. Ele prendeu meu clitóris entre seus lábios e o sugou, levando-me à perdição. Quase desfaleci com o orgasmo no qual mergulhei, os gritos atravessando minha garganta descontroladamente, até que fiquei imóvel, silenciosa, oferecendo meu líquido para que ele se alimentasse do meu prazer. Richard trouxe sua boca de volta à minha e beijou-me gulosamente, chupando minha língua, com uma fome selvagem, para em seguida libertar meus pulsos do fio e me colocar de pé no chão, pousando sua mão sobre minha cabeça, empurrando-me para baixo. — Chupa meu pau cadelinha, quero encher essa boquinha de porra. O erotismo contido em suas palavras, despertou-me uma nova onde tesão, tão intensa que meu corpo estremeceu brevemente. Sem hesitar, agachei-me até que meu rosto estivesse na altura do seu pau, minhas costas apoiadas no balcão. Segurei em sua base, masturbando-o antes de levá-lo à boca. Toquei-o com a ponta da minha língua, contornando a cabecinha, experimentando, deliciada, o líquido salgado, viscoso que expelia. Depois, enterrei-o na boca, levando-o até minha garganta, voltando e indo novamente, repetidamente, quando então fui compensada por um gemido rouco que parecia partir do fundo da sua alma. Puta merda! Como aquilo era bom! Aquele homem conseguia me deixar excitada mesmo quando não estava me tocando. Ele sibilou e usou uma mão para segurar firme em meus cabelos, levando minha cabeça para frente e para trás com mais rapidez, seu pau indo tão fundo em mim que quase me engasgava, enquanto que com a outra mão, segurou-me o queixo para erguer o meu rosto, fitando-me diretamente nos olhos, com aquela expressão de selvageria que me fascinava. — Assim minha putinha, chupa o pau do seu homem, me faz gozar nessa boquinha. Todo o corpo dele se contraiu, para em seguida explodir no gozo, seu pau enterrado na minha boca até a raiz, suas mãos garantindo que eu não me esquivasse. Os jatos de esperma foram lançados quentes em minha garganta, seus espasmos se fazendo dentro de mim, um único gemido partindo da

sua boca, seus olhos fixos nos meus. Satisfeita pelo prazer que proporcionava a ele, engoli até a última gota do seu leite quente, deliciada. Ainda ofegante, ele puxou-me para cima, pelos cabelos e me abraçou, o contato direto das nossas peles nuas, suadas, me excitando mais. — Você me deixa louco, Dakota. — Sua voz era um sussurro rouco. “E eu te amo Richard”. As palavras ecoaram e minha mente, mas não me atrevi a pronunciá-las, pois não queria parecer boba como antes. Permanecemos abraçados por um longo momento em que o silêncio era quebrado apenas pela música de James Blunt. — Você também me enlouquece Richard.

CAPÍTULO XXII

Ele afastou-se, um pouco, segurando meus cabelos atrás da minha cabeça, encarando-me, o canto da sua boca se curvando naquele meio sorriso cínico, embora os olhos não acompanhassem o gesto, em seguida, tomou-me os lábios, num beijo faminto, como se estivesse sequioso por mais daquilo e logo sua ereção se refez de encontro à minha coxa, seu líquido lambuzando minha pele, excitando-me loucamente, como se eu não tivesse acabado de gozar. Arquejei febril, sequiosa por uma carícia mais íntima. Com mãos trêmulas, toquei os músculos do seu peito, acariciando-os com as pontas dos dedos, fascinada com sua perfeição. Richard colocou suas mãos e mim, acariciando minha pele, deliciosamente, até alcançar meu sexo, quando então, passou a massagear meu clitóris, com movimentos vagarosos, circulares. Dominada pela luxúria, abri mais minhas pernas e gemi, um gemido de súplica. Sem deixar de me tocar daquela forma, ele escorregou seus lábios até meu ouvido, sussurrando: — Você é como eu, Dakota. Nunca nos cansamos disso, sempre queremos mais. — Lambeu o lóbulo da minha orelha, mordiscando-o. — Mas antes de te dar mais, preciso saber o que você foi fazer naquele bar. O que estava procurando? O quê?! Por que ele estava tocando naquele assunto agora? — Queria ficar um pouco sozinha. – Eu puxava o ar com dificuldade. Com movimentos admiravelmente ágeis, ele segurou meus dois pulsos, com uma mão, atrás das minhas costas e me pressionou com mais força contra balcão, aprisionando-me com seu corpo grande, deixando-me completamente subjugada, ao passo em que enterrava dois dedos na minha vagina lambuzada, sem desviar seus olhos selvagens dos meus. Gemi ainda mais alto, do mais puro tesão. — Ninguém vai a um bar para ficar sozinha, Dakota. — Ele movia seus dedos para dentro e para fora no meu canal, enviando ondas de prazer que passeavam por todo o meu ser, enlouquecendo-me. — Seja verdadeira comigo, bonequinha. Você queria outro homem para tomar o meu lugar? — Ah... — Lancei minha cabeça para trás, enlouquecida, todo o meu corpo se contraindo, implorando por um alívio, que viria se ele movesse os dedos só um pouco mais depressa. Mas ele não me deixaria gozar. — Não existe um homem capaz de tomar o seu lugar. — Mas você queria que existisse, por isso foi lá. Você queria me dispensar. — Talvez... Seus dedos foram mais fundo em mim, com força, com brutalidade e gritei, um grito descontrolado, movido pelo desejo. — Nunca mais faça isso. – Sua voz era um grunhido. — Você é minha. Nunca mais deixe que passe pela sua cabeça que outro homem pode te tocar, porque isso não vai acontecer. Entendeu, Dakota? Meneei a cabeça positivamente, já que o tesão me roubara a voz. — Diga Dakota!

— Sim... — Sim o quê? — Sim... Richard... Eu sou sua... Com outro gesto muito ágil, ele espalmou suas mãos na minha bunda, erguendo-me até que meus quadris estivessem na altura dos seus e me penetrou, com um golpe violento, forte e brusco, seu pau grande, duro, preenchendo meu canal escorregadio, dilatando-o tão deliciosamente que quase fui ao delírio. Ensandecida, abracei seu pescoço com meus braços e seus quadris com minhas pernas, de modo que ele foi ainda mais fundo em mim, com estocadas violentas, incessantes, enquanto abocanhava um dos meus peitos, mamando o mamilo com força, enlouquecendo-me de tal forma que meus gritos se tornaram ininterruptos, assim como as palavras desconexas que partiam da minha boca. Não demorou muito, logo eu estava perdida no orgasmo que me arrebatava. Gozei demoradamente no pau dele, meus gritos já roucos ressoando pelo apartamento, meu corpo sacudindo descontroladamente, as lágrimas brotando dos meus olhos. Subitamente, perdi todas as forças do meu corpo, fiquei mole, só não caí no chão porque Richard me segurou. — Aguenta bebê. Você precisa ser forte, porque eu ainda não gozei. Retirando-se do meu interior, ele ergueu-me em seus braços, carregando-me para o quarto, deixando a porta aberta para que a música nos alcançasse. Estendeu-me sobre a cama e quase adormeci, tão grande era a exaustão que me tomava. Mas Richard era um homem experiente, sabia como lidar com uma mulher em qualquer situação. Logo ele estava sobre mim na cama, seu corpo colado ao meu de cima abaixo, seu peito musculoso esmagando meus seios, sua língua entrando e saído da minha boca, lascivamente, a luxúria me engolfando, banindo qualquer outra sensação do meu corpo. Louca de tesão, o abracei pelo pescoço, puxando-o mais para mim, suplicando por um contato mais íntimo, minha vagina palpitando. Seu corpo escorregou ligeiramente para o lado, sua mão gostosa passeando pelo meu corpo até alcançar meu sexo, acariciando-o com habilidade, seu dedo tocando minha entrada empapada e gemi em expectativa. — Que delícia você é. Já está prontinha para dar essa boceta de novo, cadelinha. Eu podia te comer três dias sem parar, mas você está tão inchada aqui embaixo que não sei se sou capaz de te machucar. Ele começou a massagear meu clitóris com movimentos circulares, da forma como me enlouquecia. Safado! Estava me induzindo a implorar. E era exatamente o que eu faria, pois precisava dele dentro de mim, ou morreria. — Eu te quero Richard. Te quero agora. Faça-me sua, meu amor. Minhas palavras pareiam excitá-lo ainda mais, pois sua rigidez se tornou mais firme contra minha perna. Sem deixar de me tocar, beijou-me demoradamente na boca, antes de me deixar, indo até uma gaveta do criado mudo, de onde tirou um preservativo. Abriu a embalagem e cobriu seu sexo com o látex, o perfume de morango do objeto preenchendo o quarto. De volta à cama, ficou de joelhos sobre o colchão.

— Fica de quatro. – Sua voz tinha um tom de autoridade que me agradava. Obedeci sem hesitar, colocando-me de quatro à sua frente. Lentamente, ele acariciou minhas costas, fazendo uma leve pressão na altura do meu torso, levando-me para baixo, até que meu rosto encontrasse o lençol, minha bunda empinada, meu sexo totalmente exposto. Com uma mão, ele abriu mais minhas pernas e colocou sua boca em mim. Ah, porra! Como aquilo era bom. Experimentei sua língua quente e úmida se movendo sobre meu ânus, sua ponta tentando abrir passagem no meu canal estreito e arquejei, sibilando de tesão. — Você é a minha perdição, Dakota Thompson, tão linda, tão jovem e já doida para dar esse cuzinho pequeno. – Ele introduziu um dedo ali e miei desejosa, querendo mais. Movi meus quadris na mão dele, mostrando-lhe o quanto queria aquilo e um único gemido selvagem partiu dele, quando então percebi que ele não era tão controlado quanto parecia. Retirou seu dedo do meu interior, para em seguida encaixar seus quadris atrás de mim, seu pau duro tocando a entrada da minha vagina, mas não se demorou ali, logo ele o segurou pela base, levando-o até meu ânus, trazendo de volta, espalhando meus líquidos onde eu precisava de lubrificação, deixando-me mais doida a cada movimento. — Isso vai doer, bebê. Me avise se acontecer, embora eu não possa te garantir que vou parar. Então, ele me penetrou ali atrás, devagar, cada centímetro da sua masculinidade escorregando com lentidão para dentro de mim, até que estava enterrado até a base, seus pelos púbicos acariciando minha bunda. Ah, caralho, isso doía e doía muito, mas era gostoso também, dor e tesão se misturando, sem que eu soubesse distinguir qual era mais intenso. Richard deu a primeira estocada, firme e dura, arrancando-me um grito de dor. — Está doendo? – Sua voz lembrava o grunhido de um animal e isso era loucamente excitante. — Sim. — Pois aguenta, porque eu não pretendo parar. Ele estocou de novo, indo mais fundo desta vez e eu tive a sensação de que estava sendo partida ao meio. Deu uma palmada na minha nádega, antes de estocar novamente e o tesão cresceu tanto em minhas entranhas que se sobressaiu a tudo mais, inclusive à dor. Logo eu estava rebolando minha bunda no pau dele, seu membro todo enterrado em mim tornandose tão necessário que quando ele puxava para estocar mais uma vez eu não conseguia esperar e ia ao seu encontro, nossos corpos se chocando violentamente. Ele continuou desferindo palmadas na minha bunda enquanto me fodia, levando-me a uma doce loucura, da qual me recusava a sair. — Ah Dakota, minha putinha safada, vou gozar nesse cuzinho apertado, vem comigo... Sua voz rouca, selvagem, era o comando do meu corpo e eu não precisava de mais nada para que um novo orgasmo se formasse em minhas entranhas. Logo eu estava gozando, ao mesmo tempo em que seu pau ejaculava no meu espaço pequeno, seus espasmos intensificando meu prazer, suas mãos fortes apertando meus quadris, me segurando firme no lugar, um único gemido escapando da sua garganta. Caímos moles sobre o colchão, nossos corpos suados, nossos corações acelerados, nossas respirações igualmente ofegantes. Como se suas energias jamais se esgotassem, Richard deixou o meu interior, virando-me de frente

para tomar meus lábios no mais apaixonado dos beijos, embora eu me recusasse a me deixar iludir que essa paixão ia além do sexo, por parte dele. Quando ele se deitou de costas, aconchegando-me em seu peito largo, percebi, através das festas na cortina da janela que o dia já nascera, entretanto, eu me recusava a sair dali. Afundei meu rosto no seu peito largo, inebriada de paixão, inalando seu cheiro gostoso, tão amado. Ele estava certo quando dissera que sabia como me fazer esquecer meus tormentos, pois toda a dor desaparecera. O medo e a culpa já não existiam mais, tudo o que eu sentia era o amor infinito que me invadia a alma, embora eu soubesse que não era correspondida. Joguei uma perna sobre ele e plantei beijos carinhosos no seu peito rochoso, delicioso, como se uma força desconhecida me impedisse de desgrudar dele. — Não brinque com força, bebê. Você pode não dar conta depois. Não pude deixar de sorrir do comentário. Será que ele nunca se cansava? Não conseguia ficar assim, agarradinho, apenas namorando sem transar? Teria sido assim com todas as outras mulheres? Eu não queria pensar nisso. Imaginá-lo com outra em seus braços, da forma que estava comigo agora, era tão doloroso que chegava a ser doentio. Desviei meus pensamentos para o início do nosso dia, quando então me recordei da revelação feita por Anthony sobre a amarga origem dele. Precisava ter certeza se ele conhecia os fatos. Estava tão gostoso ficar ali quieta, apenas sentindo-o, ao som da música romântica, que hesitei várias vezes antes de falar. — Anthony me falou algo sobre sua mãe biológica. – Fui cautelosa com as palavras, tomando cuidado para não o magoar. — Eu sei. Ouvi tudo pelas escutas que Jordan carrega nas roupas. Fiquei surpresa. — E você já sabia de tudo? — Sim. Anthony não foi o único a investigar o caso. Eu sou filho de um assassino escroto que estuprou uma menina de quinze anos. Fiz questão de ir assistir à execução dele. — E sua mãe, você já a conheceu? — Sim. Quer dizer, mais ou menos. Eu a vi de longe uma vez. Ela tem um marido e três filhos. Ainda mora em Sugar Land. Perplexa com tais revelações, apoiei minha cabeça no cotovelo para fitá-lo no rosto. — Por que você não foi falar com ela? Ele respirou fundo, consternado. Segurou-me a mão, beijando a ponta de cada um dos meus dedos, suavemente. — Ela me jogou no lixo. Por que ia me querer de volta agora? Eu podia compreendê-lo. Qualquer pessoa que tivesse sofrido rejeição por parte tanto da mãe biológica quanto da família adotiva, desenvolveria um complexo de rejeição, entretanto, isso não era irreparável. Talvez o contato com sua mãe verdadeira lhe fizesse bem. Ela era muito jovem e estava sofrida quando o abandonara, certamente se visse o homem maravilhoso que ele se tornara se arrependeria e lhe daria seu carinho. — Acho que você deveria se apresentar a ela. — Isso está fora de cogitação. — Já faz muito tempo. Ela deve estar arrependida.

— O que ela fez não tem perdão. — Você está falando igual Anthony e seu ódio cruel. Ele ficou em silêncio, fitando o vazio à sua frente, quando então o toque do celular o trouxe de volta. Preguiçosamente, ele levantou para atender, proporcionando-me uma extraordinária visão da sua bunda redonda, empinadinha, tão atraente que me dava água na boca. Puta merda! Que homem gostoso do caralho. Ele atendeu o aparelho, ouviu por um instante e desligou. Virou-se para mim com um sorriso lindo nos lábios. — Seu amigo Tom vai viver. Ele reagiu ao antídoto e já está acordado. Com meu coração disparado de alegria, saltei da cama, correndo para abraçá-lo. — Que coisa boa. Eu nem posso acreditar. – Fui até a toalha, pendurando-a no meu ombro. – Vou tomar um banho. Preciso ir vê-lo. — Eu vou com você. Os pais dele o transferiram para um hospital no centro da cidade. — E você não vai trabalhar? — Hoje não. Não quero te deixar. — Eu não vou mais fugir do segurança. Pode ir trabalhar. Agora eu sei o tamanho do risco que estou correndo. Todo o seu corpo estremeceu e logo ele eliminou a distância entre nós, abraçando-me, transformando-nos em um só ser. — Me perdoa bebê. — Te perdoar pelo quê? — Por colocar sua vida em risco. — Você não fez isso sozinho. Eu sabia onde estava me metendo quando fiquei com você. — Você é só uma criança. — Olha para mim Richard, eu não sou criança. Tenho vinte e dois anos de idade, sou adulta o suficiente para me responsabilizar pelas minhas decisões. Sem se desvencilhar do abraço, ele afastou-se o suficiente para fitar-me no rosto. Seus olhos refletiam uma ternura tão profunda que fiquei comovida e o amei um pouco mais. Foi naquele olhar que percebi o quanto ele também me amava, apenas ainda não se dera conta disso. E esse amor, podia salvar sua vida. A esperança que me invadiu era indescritível, me trazia uma paz inigualável, que me motivava a lutar pela vida de Richard. Era a esperança de que ele desistisse de se matar por amor a mim. — Não vou permitir que nada de mal te aconteça. Eu prometo. Acariciei-lhe a face amada. — Eu também vou te proteger. Entramos juntos no banheiro e apesar do tesão que renasceu em nós dois enquanto Richard me dava banho, carinhosamente, não nos entregamos a ele, pois ver Tom era mais importante para mim agora e ambos sabíamos disso. Richard vestiu jeans, camisa polo preta e tênis. Passou os dedos nos cabelos curtos e estava pronto, tão lindo que ficava difícil parar de olhar para ele. Era o mesmo que olhar para um riacho depois de três dias habitando o deserto. Também optei por jeans e regata, deixando que os cabelos secassem naturalmente. Estávamos

prontos quando a campainha tocou e um frio atravessou meu estômago. — Não se preocupe. Há dois seguranças na entrada do prédio e mais dois no corredor. Ninguém tocaria essa campainha sem a permissão deles. – Ele parecia ter lido meus pensamentos. Fiquei em pé no canto da sala, enquanto ele abria a porta para um homem com cerca de quarenta anos de idade, vestindo um paletó fora de moda. — Olá. Sou o detetive Jonathan Dunkel, responsável pelo caso de tentativa de envenenamento contra o Sr. Tom Wesley. Você é Richard Parker, certo? — Sim, eu mesmo. Pode entrar.

CAPÍTULO XXIII

O homem entrou hesitantemente, seus olhos bem treinados inspecionando o ambiente, antes de detê-los em mim, examinando-me dos pés à cabeça. — E você é Dakota Thompson, eu suponho. — Sou sim. – Dei um passo à frente. — Sente-se detetive. - Richard gesticulou para um sofá, onde o detetive se instalou, enquanto ele ocupava o outro. — Alguma pista sobre quem fez aquilo? — Até agora nada. Mas a Srta. Thompson talvez possa ajudar. Acomodei-me no sofá a lado de Richard. — Eu não vi nada. Sei apenas que o veneno foi colocado para mim, pois Tom não bebeu nada além da minha vodka. — Você tem algum inimigo Srta. Thompson? — Não que eu saiba. Quer dizer, minha ex melhor amiga está puta comigo, mas sei que ela não tem nada a ver com isso. — Vamos falar abertamente Sr. Dunkel. — A voz grossa e máscula de Richard preencheu o ambiente. — Você deve ter sido informado sobre os assassinatos das mulheres com quem me evolvi antes de me procurar, não foi? — Na verdade sim Sr. Parker, mas como achei o caso muito complexo decidi acreditar na hipótese de que a moça tivesse algum inimigo. — Então ignore suas suposições e aposte na verdade. A pessoa que tentou envenená-la é a mesma que tirou a vida de todas as outras garotas com quem já me envolvi. Quer um caso? Investigue isso. O detetive fez uma expressão de insatisfação, pela complexidade do caso que jogaram nas mãos dele. Todos nós sabíamos que seria tempo perdido a investigação dele, pois nenhum outro até hoje, nem mesmo os investigadores particulares, conseguiu chegar perto da verdade. — Bem, considerando que o senhor contratou detetives particulares para investigar esse caso, tem alguma pista que possa me ajudar? — Não. Ninguém descobriu nada a não ser o consenso de que se trata de alguém próximo a mim, portanto, você pode começar investigando os membros da minha família. — Certo, vou fazer isso. – Levantou-se. — Qualquer novidade, por favor, me avise. — Farei isso. — Fico grato. – Ele me examinou mais uma vez ante de deixar o lugar. Eu e Richard deixamos o prédio no Mercedes preto conduzido por Jordan e outro segurança rumo ao centro da cidade. Era mais um dia de calor intenso no Texas, todavia o ar condicionado no interior do veículo nos proporcionava uma temperatura agradável. Entramos no hospital ainda de mãos dadas, seguidos pelos dois seguranças. Na recepção, foi necessário que esperássemos a permissão de Tom para irmos até ele, mas isso foi rápido, logo

estávamos subindo pelo elevador. No quarto indicado, aquele que o segurança de Richard ainda guardava a porta, um cômodo muito mais amplo e bem decorado que o do hospital em que Tom recebera os primeiros atendimentos, o encontramos sentado no leito, usando uma camisola de hospital. À sua volta estavam seus pais, seu irmão e Trinity. Todos, com exceção de Tom, me encaravam com hostilidade. Hesitantemente, cumprimentei a todos com gestos de cabeça, embora não tenha sido retribuída. Aproximei-me do meu amigo e o abracei fortemente. — Me perdoa cara. – Minha voz soou trêmula no ouvido dele. — Faz assim, consegue o número daquele segurança gostoso que passou a noite toda ali na porta que está tudo resolvido. Não pude evitar e sorri do seu comentário, cochichado apenas para mim. — Como você está? – Afastei-me do abraço. — Como quem engoliu um veneno mortífero. — Você salvou a minha vida. Se não tivesse experimentado a bebida eu teria dado um gole maior. — É para isso que servem os amigos. E como amigo eu te peço que se afaste daquele sujeito enquanto pode. — Ele sussurrou a frase, olhando para o Richard que me esperava na porta, ao lado do segurança. — Não posso. Eu o amo tanto, que seria capaz de morrer para ter mais um tempo com ele. Tom suspirou. — Ah, o amor. Quantas loucuras cometemos por ele. — Ainda bem que você sabe. — Faz assim, querida. Me deixe conversar a sós com ele. — E vai falar o quê? — Conversa de homem. Acredite ou não, eu tenho um pinto no meio das pernas. — Tudo bem. – Abracei-o ternamente de novo. — Se cuida. Eu te amo. Sem mais, dei-lhe as costas, aproximando-me de Richard enquanto Tom pedia aos outros que se retirassem. — Ele quer falar em particular com você. — Sem problema. Jordan e os outros seguranças estão no corredor. Fique perto deles. Dei-lhe um selinho e deixei o aposento, junto com os demais, que continuavam me dirigindo olhares hostis, obviamente culpando-me pelo que acontecera a Tom. E quem podia julgá-los? No corredor, afastei-me um pouco, a fim de ignorar os olhares maldosos. Com o segurança na minha cola, passei a observar o centro de Houston através da janela. O dia estava realmente lindo, o céu claro, o sol enviando seus raios escaldantes ao topo dos edifícios, fazendo reflexo nas vidraças das janelas. Me ocorreu, que há poucos dias, a essa hora, eu estava na faculdade, com a única preocupação de terminar o meu curso e me divertir de vez em quando. As coisas tinham mudado radicalmente em pouco tempo. Pouco tempo depois, Richard apareceu e deixamos o prédio. — O que Tom queria falar com você? ​— Já estávamos no carro, indo de volta para River Oask quando perguntei. — Queria dizer que vai me caçar até o inferno se alguma coisa te acontecer. — Típico de Tom, esse instinto de proteção.

— Qualquer pessoa que te conhecer e souber que estamos juntos, terá esse instinto. — Ele fez uma pausa. — Por que você disse a ele que eu não te faço feliz? Como ele podia não saber? Como podia não deduzir que ninguém seria feliz amando alguém que pretendia cometer suicídio? Pensar naquele assunto me dava vontade de chorar. Como ele podia ser tão insensível a ponto de me trocar pela maldita morte, mesmo sabendo que eu o amava loucamente? — Para a merda desse carro, eu quero descer. — Sentia-me sufocada, as lágrimas ameaçando banhar-me o rosto. — Não podemos parar aqui no meio do nada. — Para! Ele gesticulou para o motorista e no instante seguinte estávamos estacionando as margens da rodovia que cortava uma área quase deserta de Houston. Agoniada, com meu coração sufocando no peito, abri a porta e saltei com Richard atrás de mim e logo atrás os dois seguranças. Estávamos diante de um antigo supermercado abandonado, com as paredes em ruínas, cobertas por pichações, assim como era a maioria dos prédios ali. Aspirei fundo o ar quente e seco, procurando forças para segurar o pranto que ameaçava cair. — Qual o problema Dakota? — Como se você se importasse. Ele segurou meu cotovelo, fazendo-me virar para fitar o meu rosto. — Mas é claro que eu me importo bebê. Vamos voltar para o carro. Você precisa ir para casa descansar. — Para de me tratar como se eu fosse uma criança! Mas que inferno! — O que há de errado? — Tudo está errado. Como você espera que eu seja menos infeliz sabendo que o único homem a quem fui capaz de amar pretende se matar?! —Ele percorreu os olhos pelos seguranças e voltou a me encarar, com expressão neutra. — Como você pode ser tão cruel, me trocando pela morte? Eu te amo Richard, sou capaz de tudo por você. Por favor, me diga é capaz pelo menos de viver por mim. Ele me encarou em silêncio por um longo momento, antes de dizer: — Nós já conversamos sobre isso. Então, toda a esperança que me invadira a alma durante aquela manhã, quando eu me deixara enganar ao acreditar que ele sentia algo por mim, esvaiu-se do da minha alma como uma gota de água se evaporava no asfalto quente. Uma única lágrima escorreu pelo meu rosto, levando com ela a felicidade que eu experimentara por tão poucas horas. Se não existisse um assassino me caçado por aí, eu teria saído correndo para qualquer lugar longe dele, para que essa dor insuportável não me afetasse mais. Mas eu não tinha saída alguma. Sem mais conseguir encará-lo, voltei para o carro e reiniciamos o trajeto para River Oask. Trajeto durante o qual o silêncio tomava conta do ambiente, enquanto eu me recusava a olhar pra Richard. Chegando ao apartamento, fui direto para o quarto e atirei-me na cama, fingindo mergulhar em um sono profundo. Ouvi quando ele se despiu e deitou-se ao meu lado, embora não me tocasse, sua proximidade me inquietava. Quando ele adormeceu, levantei. Minha vontade era de ir embora dali, para longe dele e de toda a dor que me causava, entretanto, eu sabia que os seguranças tinham ordens para não me deixarem sair, seria perda de tempo tentar. Então, decidi fazer minhas próprias investigações em busca da identidade daquele maldito

assassino. Peguei o velho álbum de fotografias de Richard na gaveta, meu notebook e acomodei-me no sofá da sala. Meus principais suspeitos eram em primeiro lugar Lindsay, porque queria Richard somente para ela enquanto era rejeitada. A terceira esposa dele já tinha sido assassinada quando ela fora trabalhar na Thrive, todavia, não podia ser descartada a hipótese de que ela era uma perseguidora apaixonada que conseguira o cargo com o objetivo de aproximar-se dele. Em segundo lugar vinha Hillary, a filha gótica. Ela fizera terapia quando criança e podia estar usando o dinheiro que extorquia do pai para pagar um profissional. Estava certo que quando o primeiro assassinato aconteceu ela tinha apenas oito anos, mas existiam crianças psicopatas por aí. Meu terceiro suspeito era David Smith, amigo de faculdade que convivia com Richard há anos e jamais se casara. Talvez ele fosse gay encubado, apaixonado por Richard e muito zangado com as mulheres por quem era trocado. Ou talvez ainda, fosse apaixonado por Elizabeth e se vingava por têla pedido para o amigo. Estava certo que Richard tinha mandando investigá-lo, mas o detetive podia não ter feito seu trabalho corretamente. E por fim, o suspeito número quatro e o mais óbvio, era Anthony, pelo ódio que nutria contra irmão adotivo, por ter-lhes tirado a doce Elizabeth. Com tais pessoas e a ligação delas com Richard em mente, reli toda a biografia que eu escrevera, procurando uma pista nas entrelinhas, algum acontecimento que passara despercebido a todos que poderia apontar o culpado, mas não havia nada. De acordo com a narrativa, ninguém antes demonstrara qualquer comportamento suspeito, com exceção de Anthony e de toda a família, que não faziam questão de esconder o quanto o odiavam. Sentindo-me exausta, comecei a olhar o álbum de fotografias, estudando minuciosamente cada foto, a procura de qualquer coisa diferente. Havia algo nas fotografias mais antigas, mas eu não conseguia distinguir claramente do que se tratava, o cansaço obstruindo-me o raciocínio. Pouco a pouco, fui vencida pela exaustão, até que adormeci ali mesmo no sofá, sobre o computador e as fotografias. Estava na cama quando despertei, usando apenas a calcinha, sentindo-me confortável sob os lençóis. Olhei pela janela do quarto e constatei que apesar da chuva forte que caía obstruir a claridade, ainda era dia. Eu não tinha dormido quase nada. — Acorda Bela Adormecida. Está na hora de trabalhar. Espantei-me quando a voz grossa de Richard partiu de muito perto. Virei para observá-lo, vendoo ajeitar o nó da sua gravata, só então olhei no relógio de cabeceira e descobri que eram oito horas da manhã, eu tinha dormido a noite toda. Relembrei os acontecimentos da tarde anterior, quando mais uma vez implorei que ele vivesse e mais uma vez ele se negara, e o desânimo me assolou assombrosamente, negando-me qualquer desejo de deixar aquela cama. Eu preferia passar o dia inteiro dormindo que conviver com a realidade na qual me encontrava, não apenas a realidade de ter me tornado alvo de um assassino, mas principalmente aquela certeza de que o homem que eu amava em breve deixaria de existir. Eu preferia passar o dia na cama a ter que olhar para ele e pensar no que faria, na sua insensibilidade em deixar-me sozinha, desvanecendo o meu amor. — Não estou a fim de ir trabalhar hoje, quero ficar na cama. — Dei-lhe as costas. — Por quê? Você está doente? — Ele tocou-me a testa com a ponta dos dedos e me esquivei,

fugindo ao seu contato. — Qual é o problema Dakota? Por que ele insistia em perguntar se já conhecia a resposta? — Problema nenhum. Só estou a fim de ficar na cama. Não posso? Ele ficou em silêncio por um longo momento, antes de falar. — Claro que pode. Vou mandar que um dos seguranças traga seu café da manhã e depois seu almoço. Não sinta medo aqui, pois o prédio está seguramente vigiado. Ele quis dizer: “Não tente sair daqui, porque você está sendo vigiada.” Não me dei ao trabalho de responder. Em vez disso, fechei os olhos e fingi adormecer. Ouvi quando ele terminou de se arrumar. Enterrou o rosto em meus cabelos, aspirando meu cheiro e seus passos desapareceram para fora do quarto. Esperei até ter certeza de que ele estava longe, levantei-me, vesti um roupão atoalhado branco e fui para a sala. Puxei o sofá menor até próximo à sacada e sentei-me para observar a chuva lá fora. Não era comum chover em Houston nessa época do ano, portanto eu estava presenciando um fenômeno raro da natureza, esplendoroso, com os relâmpagos clareando a cidade, seguidos das trovoadas. Sem que houvesse o toque da campainha, a porta se abriu e um segurança mal-encarado entrou carregando algumas sacolas, colocando-as sobre o balcão da cozinha, o odor de café e pão fresco causando-me náuseas violentas. — Seu café da manhã, Srta. Thompson. Respondi com um breve aceno de cabeça, vendo-o sair antes de voltar a observar o lado de fora, sentindo saudade da garota despreocupada que gostava de tomar banho de chuva em dias como aquele. Eu ainda estava sentada ali quando o segurança entrou novamente, com mais comida, deixando a sacola sobre a mesa da cozinha ao lado do café da manhã intacto. Avisou que se tratava do meu almoço, antes de sair. O cheiro do frango assado era ainda mais desagradável que o do café. A fim de evitá-lo, fui para o quarto e me deitei. O cheiro gostoso de Richard estava impregnado nos lençóis e no travesseiro. Afundei o meu rosto nele, aspirando o odor delicioso, relembrando os momentos que vivemos ali, entregues ao desejo insano que nos consumia e constatei, com tristeza, o quanto o amava. Eu era louca por aquele homem e mesmo não sendo correspondida perdê-lo parecia pior que a própria morte. Ainda assim, se eu pudesse voltar no tempo, faria tudo de novo, me envolveria com Richard para viver os momentos que passara ao seu lado, mesmo que este amor custasse a minha felicidade, como de fato era o preço que eu estava pagando. Lutando contra o turbilhão de pensamentos que me inquietavam e contra a dor que me invadia a alma, fechei os olhos e me obriguei a adormecer, já que essa era a única forma de fugir dos meus tormentos.

CAPÍTULO XXIV A sala estava abarrotada de pessoas. Era mais uma enfadonha reunião com os líderes dos países da América Latina para tratar sobre a exportação de petróleo, na qual eu não conseguia me concentrar ou participar ativamente. Eles já tinham desistido de falar comigo e David tomara a frente em todas as decisões. Era bom que ele se acostumasse a presidir a empresa, pois se tornaria acionista majoritário depois da minha morte, já que as minhas ações seriam divididas entre Dakota e Hillary. Ali, eu só conseguia pensar em Dakota no estado em que se encontrava. Michael, o segurança que tinha recebido a incumbência de comprar suas refeições, me informara que ela não tinha comido nada. Passara o dia no sofá, observando a cidade através da sacada. Tentei inúmeras vezes ao longo do dia, ligar para o seu celular, mas ela não atendia. Estava depressiva e eu era a razão. Eu e meu egoísmo desenfreado, do qual não conseguia abrir mão. Eu amava Dakota, com todas as forças do meu coração, como jamais antes tinha amado uma mulher, nem mesmo Elizabeth. O que eu um dia sentira pela mãe da minha única filha, não passava perto da imensidão do amor que sentia por Dakota. E só me dera conta disso quando Jordan me informara que ela tinha fugido, colocando sua vida em risco. Eu quase morri quando me disseram, na boate onde ela estivera que alguém tinha sido envenenado e levado ao hospital. Pensei que tinha sido ela e foi naquele instante que percebi o quão grande era o amor que eu sentia por aquela menina. Ela era tudo para mim e ainda assim eu a estava destruindo, com a recusa em desistir da morte para viver ao seu lado. Ela me amava tanto quanto eu a amava e estava morrendo comigo. Eu sabia o quanto estava sendo mesquinho e egoísta, negando-nos a chance de vivermos aquele amor, mas eu não tinha o direito de vivê-lo, não tinha o direito de ser feliz depois de tantas vidas terem se perdido por minha causa, vidas de mulheres que foram mortas pelo simples fato de terem me amado, inclusive a vida de Elizabeth, que dedicou cada um dos seus dias a me amar. Se eu não existisse, ela ainda estaria viva, assim como todas as outras. Como eu podia viver com isso? Como podia construir uma vida de felicidade em cima da destruição de tantas pessoas que me amaram? Eu não podia. Simplesmente era incapaz. Tudo isso sem mencionar que se eu ficasse com Dakota, aquele maldito assassino não descansaria até tirar a vida dela também. Ela não podia viver eternamente trancada em algum lugar sob a proteção de seguranças. A única saída para que vivesse era a minha morte. Com o tempo ela se recuperaria da minha perda, assim como se recuperara de tudo o que lhe acontecera durante a sua infância. Pobre Dakota, tão jovem, tão linda, tão sofrida, não merecia ter se deparado com alguém como eu logo no início da sua vida, o homem que despertara o seu amor para depois destruí-la. A única forma de levar um pouco de felicidade à vida dela agora, resgatando-a do poço de depressão no qual mergulhava, seria encontrando sua filha. James me garantira durante um telefonema esta manhã, que a tinha encontrado, morava em Dallas, com uma família rica. Enviaria as fotos e o endereço dela por e-mail ainda naquela manhã e até agora nada chegara. Ansioso, peguei meu celular e afastei-me da mesa, ligando para ele pela décima vez.

— Cheque seu e-mail, cara. Acabei de enviar o material. — Ecoou a voz dele do outro lado da linha. — Obrigado James. Sem dar satisfação a nenhum dos presentes, fui até o computador na minha mesa e imprimi os anexos enviados por James, entre eles fotos da garota, um relatório completo sobre a vida dela, endereço da sua casa e da escola. Havia inclusive um mapa completo sugerindo quais os locais e horários mais adequados para vê-la, desapercebidamente, caso Dakota quisesse dar uma olhada nela antes de entrar na justiça para reaver sua guarda. Eu contrataria o melhor advogado do país para auxiliá-la e lutaria ao seu lado até que tivesse sua filha de volta. Seria mais um motivo para adiar minha partida, embora eu não estivesse disposto a desistir dela. Olhei a foto da menina de seis anos de idade, era muito parecida com a mãe. Tinha os mesmos cabelos ruivos desalinhados, a pele translúcida desprovida de qualquer imperfeição, os olhos azuis claros hipnóticos. Com o material em mãos, deixei a sala sob o olhar aturdido dos demais executivos. Ao entrar no apartamento em River Oask, espantei-me com o quanto estava frio, por causa do ar condicionado ligado na máxima potência. Ao desligá-lo, percebi que, como o segurança me dissera mais cedo, a comida de Dakota estava intacta sobre o balcão da cozinha. Era três horas da tarde e ela não tinha comido nada. No quarto a encontrei deitada na cama, encolhida sob o edredom, imóvel. Seus olhos fechados, os cabelos rebeldes espalhados sobre o travesseiro. Observei seu rosto lindo, sereno, sua pele translúcida, perfeita como uma porcelana e constatei, mais uma vez, o quanto a amava. Eu era, espantosamente, louco por ela e mesmo assim a estava destruindo. — Dakota. — Chamei. Seus olhos se abriram devagar, demorando-se para focar o meu rosto. Seu olhar estava apagado, desprovido de qualquer brilho, como se ela estivesse morta por dentro. Por Deus! O que eu estava fazendo com aquela menina? Sentei-me na beirada do colchão, acariciando seus cabelos densos, carinhosamente, vendo-a esquivar-se do contato com um movimento languido, como se estivesse muito fraca. — Tenho uma surpresa para você. — Uma surpresa boa ou ruim? — Boa. Você consegue se sentar? Languidamente, ela sentou-se na cabeceira da cama, apoiando suas costas no espaldar. — Há alguns dias mandei que um detetive procurasse sua filha. — Ela fitou-me mais atentamente, seus olhos sofridos, arregalando em expectativa. — Ele a encontrou, em Dallas, vivendo com uma boa família. — Entreguei-lhe a fotografia. Dakota observou a imagem da sua filha com seus olhos carregados de emoção, as lágrimas banhando-lhe o rosto, pouco a pouco. — Ela é tão linda... — Um soluço escapou-lhe e precisei de um esforço inumano para me segurar no lugar e não a tomar em meus braços. — Sim. Ela se parece com você. — Qual o nome dela? — Emilly. Acariciou a fotografia com as pontas dos seus dedos.

— Minha Emilly. Posso vê-la? — Sim. De longe por enquanto. — Por enquanto? — Você precisará entrar na justiça para solicitar a guarda dela. Vou te apoiar até que a tenha de volta. Conheço advogados excelentes. Ela afastou as lágrimas com as mãos, antes de vir até mim. Abraçando-me apertado. — Obrigada Richard. Segurei-a com facilidade, sentando-a no meu colo, com sua cabeça apoiada em meu peito e a ninei como se ela fosse um bebê. Estava mais fragilizada que o normal e a culpa era toda minha. — Dakota, você não parece bem, precisa se alimentar. — Não sinto fome. Quando podemos ir ver Emilly? — Amanhã cedo se você quiser. Ela ergueu sua cabeça para fitar-me no rosto. — Quero te propor um acordo. — Pode falar. — Eu vou ao encontro com Emilly se você for ao encontro da sua mãe. É justo, não é? O que ela pretendia com isso? Seria capaz de abrir mão de conhecer sua filha se eu recusasse procurar minha mãe? — Eu não posso fazer isso, eu...— Eu não tinha um motivo razoável. Dakota afastou-se, voltando a se deitar sob o lençol, de costas para mim. — Será que você pode me deixar sozinha? — Dakota, por favor. Sua filha seria a única pessoa capaz de devolver-lhe a vida depois que eu partisse. Trazê-la de volta diminuiria minha culpa e ela sabia disso. Sabia que eu não abriria mão de amenizar toda a dor que lhe causava. Ao longo da minha vida eu sempre tivera o poder de convencer as pessoas a fazerem exatamente o que eu queria, enquanto permanecia inabalável, insubordinável às vontades alheias, até aquele momento. Derrotado a segurei novamente entre meus braços. — Se isso te faz feliz, eu vou conhecê-la. Sem uma palavra, Dakota afundou seu rosto no meu pescoço, aspirando profundamente meu cheiro. — Você podia me fazer ainda mais feliz se quisesse. Eu não podia permitir que aquele assunto fosse abordado de novo, pois a deixaria ainda mais deprimida. Então, respirei fundo, sufoquei o medo que sentia de ser rejeitado mais uma vez pela mulher que me trouxera ao mundo e declarei: — Podemos ir a Sugar Land agora mesmo. O que você acha? — Acho ótimo. — O canto da sua boca se curvou num sorriso muito suave. Fiquei penalizado, o sentimento de culpa corroendo-me por dentro quando vi o esforço que ela fazia para articular seus movimentos ao levantar-se, demonstrando o quanto estava fraca. Languidamente, trocou o roupão por jeans e regata de malha, prendendo os cabelos num rabo de cavalo. Não precisava de maquiagem para que sua pele estivesse perfeita, seus lábios rosados.

Ficava linda mesmo quando não tentava ser. Quando o investigador encontrara minha mãe, há quase uma década, eu decidira que quando a procurasse não a deixaria saber que eu era rico, para que se demonstrasse algum afeto por mim eu tivesse certeza e que era verdadeiro. Então comprara um jeans surrado e uma camisa tosca, em uma loja de roupas usadas. Depois de anos, finalmente usaria o traje. Dakota observou-me com curiosidade quando tirei a roupa da última gaveta da cômoda. — Que roupa horrorosa é essa? — Roupa de pobre. Se ela tiver que gostar de mim, não será pelo meu dinheiro. Sua boca linda se curvou num sorriso muito suave, me atraindo como água no deserto. “Ah... Minha doce Dakota, não sorria assim para mim, porque eu posso facilmente perder o controle, esquecer que você está doente, te jogar naquela cama e te comer até você ficar inchada”. Após trocar o paletó pelas roupas deploráveis, coloquei-me diante do espelho e descobri que me parecia com um trabalhador braçal. Ótimo, era essa a intenção. Deixamos o prédio de mãos dadas, Dakota caminhando mais lentamente que o normal. Partimos no Mercedes conduzido por Jordan, com Michael ocupando o banco do carona. Ambos estavam armados, com ordens de ficarem atentos a qualquer movimentação estranha à nossa volta. Foi apenas quando estacionamos a alguns metros de distância da casa modesta, de dois andares, a sacada azul clara e um jardim bem cuidado na frente, que me dei conta da importância do passo que estava prestes a dar em minha vida e o fato de que isso me deixava nervoso me irritava, pois não gostava de perder o controle sobre minhas emoções. Ainda cogitei desistir, mas precisava fazer aquilo por Dakota. Sentindo-me irritantemente inseguro, beijei a face muito pálida da mulher que eu amava e saltei, caminhando na direção da velha casa. Me deparei com minha mãe biológica deixando a residência, com uma tesoura de jardinagem nas mãos. Ela era magra, baixinha, tinha cinquenta e dois anos de idade e parecia dona de uma vitalidade invejável. Eu a conhecia das fotografias e já a tinha visto de longe, mas apenas olhando-a de perto consegui distinguir meus traços em seu rosto enrugado. — Posso ajudá-lo meu rapaz? Subitamente, eu não sabia o que dizer. Tudo o que me vinha à mente, me parecia ridículo se pronunciado. — Você é Stefany Craig? — Mas claro que era ela. O que eu estava fazendo? — Sim. Eu mesma. — Ela observava meu rosto com curiosidade crescente. Ficaria menos difícil se ela me convidasse para um chá, no interior da residência, mas eu não podia esperar isso dela, pois era apenas um estranho. — Há trinta e sete anos, a senhora teve um filho e... — Porra, porque essa merda era tão difícil? Subitamente a perplexidade se estampou nos seus olhos castanho claros, à medida que seu queixo caía, a tesoura atingindo o chão. Lentamente, ela aproximou-se, tocando a pele do meu rosto. Foi o toque mais estranho que já senti. — Você é meu filho, não é? — Sua voz estava carregada de emoção, assim como seu olhar. — Sim. Eu sou. O minuto que se seguiu me pareceu uma eternidade, tão imenso era o receio que eu tinha da sua reação, entretanto, o que ela fez, foi diferente de tudo o que eu tinha imaginado.

A velha mulher simplesmente caiu de joelhos diante de mim, seus olhos marejados de lágrimas, seu corpo ligeiramente trêmulo. — Será que existe bondade o suficiente em você para que possa me perdoar pela monstruosidade que eu fiz? Tomado por um turbilhão de emoções jamais antes experimentadas, segurei-a pelos ombros, puxando-a para cima, colocando-a de pé, inclinei minha cabeça para fitar o seu rosto, secando suas lágrimas com uma mão, um afeto incondicional brotando no meu interior, como se o fato de ela ter me abandonado não tivesse mais a menor importância. — Eu já perdoei. Então, ela me abraçou, em prantos, seu corpo pequeno, frágil, trêmulo contra o meu. As emoções que me tomavam eram tão intensas que por pouco não fui às lágrimas também. — Como você se chama? — Ela afastou-se do abraço. — Richard. — Acariciou-me novamente no rosto. — Você é tão bonito. Não houve um só dia em minha vida em que eu não tenha pensado em você. Te deixar foi o maior erro eu já cometi, percebi isso logo em seguida. Mas quando voltei você não estava mais lá. — Abraçou-me novamente. — Me perdoa meu filho. Apertei-a contra meu corpo, emocionado. Ficamos ali abraços por um longo momento, até que ela parecia mais calma e se afastou. — Vamos entrar. Venha conhecer meu marido. Lembrei-me de Dakota fragilizada, me esperando no carro. — Hoje eu estou com pressa, mas prometo que voltarei. E os meus irmãos? — Dois deles estão casados, um mora na Flórida e o outro em Nova Iorque. Samantha, a mais nova, está na faculdade em Boston. Mas todos nos reunimos aqui no natal, quando você poderá conhecê-los. Era realmente uma pena que no natal eu não estaria mais aqui. Percebi, nesse instante, que tinha sido um erro vir até ela, eu apenas estava trazendo sofrimento à vida dessa pobre mulher, que logo perderia o filho que acabara de encontrá-la. — Preciso ir, Stefany, mas prometo que voltarei em breve. — Volte, por favor. Desalentado, deixei-a, caminhando pela rua arborizada, arrependido. Eu não devia tê-la procurado, pois em breve estaria morto. Puta que pariu, porque deixara Dakota me convencer? Sentei-me ao lado dela no assento traseiro do Mercedes, constatando o quanto estava mais pálida, embora sorrisse para mim. Dei a ordem para que Jordan nos levasse de volta para o apartamento. — Como foi lá? — Ela se mostrou arrependida e eu a perdoei. — Eu dei uma espiadela, vi vocês abraçados. — Você não devia ter deixado o carro. Ela ficou séria, uma ruga se formando em sua testa. Ainda assim, recostou sua cabeça em meu ombro e fechou os olhos, sua respiração se tornando mais lenta, como se estivesse adormecida. Dakota dormiu em meu ombro durante todo o trajeto de Sugar Land até River Oask. Ao chegarmos ao prédio, tentei despertá-la e apesar de abrir os olhos, ela me pareceu tão mole que preferi carregála nos braços até o elevador. Cogitei seriamente chamar um médico, mas talvez ela melhorasse se

comesse um pouco. Entretanto, minha tentativa de fazê-la comer foi em vão. Ela rejeitou tudo o que lhe ofereci, queria apenas dormir, me deixando mais desesperado a cada instante. — Por Deus, Dakota! Você precisa comer. Não suporto mais te ver assim. Ela estava deitada sob os lençóis, eu sentado ao seu lado. — Olhe bem Richard, porque o que você está vendo é o que restará de mim depois que você se matar. Com tais palavras, ela fechou seus olhos e mergulhou em um sono tão profundo que não mais consegui acordá-la. O remorso, a culpa, a dor, tudo me corroia por dentro, me fazendo sentir o último dos seres humanos, por estar destruindo a vida da mulher que eu tanto amava e foi naquele instante que enxerguei que era incapaz de deixá-la, sabendo que ela ficaria assim após a minha partida. Eu a amava, loucamente e se sua existência dependia da minha, eu continuaria existindo por ela. Meu amor por Dakota era tão infinito que tudo mais deixava de ter qualquer importância. Ela era a minha vida agora e eu precisava viver para mantê-la viva também. Todavia, antes de mais nada, precisava cuidar dela. Então, a ergui em meus braços e a carreguei para fora, os seguranças nos seguindo. Entramos no carro e partimos rumo a um hospital no centro da cidade. Durante o trajeto, telefonei avisando que estava chegando com uma paciente em estado grave.

CAPÍTULO XXV Sentia-me muito fraca quando acordei, com meu corpo pesado, um gosto amargo na boca. Percorri os olhos em volta, demorando a constatar que estava em um quarto de hospital, de um hospital caro, considerando o luxo em cada detalhe do ambiente. Havia um soro amarelo ligado a meu braço e Richard estava sentado ao lado do meu leito, com a cabeça apoiada no colchão, seu rosto oculto. Ainda usava as roupas de operário que vestira para ir encontrar sua mãe. Movida pela paixão que jazia em meu peito, afundei meus dedos em seus cabelos lisos, perguntando-me por quanto tempo mais poderia tocá-lo. O pensamento inundou meu peito de tristeza e fechei os olhos novamente, tentando adormecer, pois esta era a única forma de esquecer que ele se mataria. — Dakota. — Sua voz grossa, máscula alcançou-me. Precisei de um esforço inumano para abrir os olhos, como se me faltassem forças para um gesto tão simples. — Onde estamos? — Quis saber. — Em um hospital no centro. — Mas eu não me lembro de ter ficado doente. — Teria o assassino atentado contra mim novamente sem que eu me recordasse? — Você teve um distúrbio emocional, meu amor. Mas o médico disse que não é grave. Você vai ficar boa. Precisa apenas conversar com um psicólogo. — Eu não preciso de um psicólogo. Eu preciso de você. — A última palavra saiu trêmula. — E eu estou aqui. — Mas pretende me deixar. Ele segurou minha mão entre as suas, fazendo a minha parecer pequena ali. — Não, Dakota. Não mais. Processei suas palavras e meu coração disparou no peito. Ele estava falando sério? — Eu não entendi. — Isso era tão maravilhoso que ficava difícil acreditar. — Eu decidi deixar de ser um covarde e enfrentar os meus fantasmas, Dakota. Eu te amo como jamais amei outra mulher e quero viver esse amor com você. O passado já não importa mais. Tudo o que eu quero é ser feliz ao seu lado e te fazer feliz também. O turbilhão de emoções que me tomou foi tão violento que as lágrimas brotaram dos meus olhos, sem que eu pudesse controlar. — Você já está me fazendo feliz, Richard, mantendo-se vivo por mim e vou dedicar o resto dos meus dias a retribuir essa felicidade. Ignorando a agulha presa a minha veia, sentei-me para abraçá-lo recebendo seus braços fortes em torno do meu corpo, uma de suas mãos acariciando meus cabelos atrás da cabeça. — Eu te amo tanto, minha menina. Quase enlouqueci quando vi você doente por minha causa. Eu não podia permitir que você sentisse a mesma dor que me invadiu quando pensei que te perderia. Você não merece isso. Você merece o meu amor, o meu cuidado e é isso que vou te dar. Nunca mais

vou permitir que você sofra. Eu te dou minha palavra. — Eu te amo Richard. — Foi tudo o que consegui dizer. Então, impulsionada pelo calor do desejo que o contato com seu corpo me despertava, procurei a boca dele com a minha, sendo recompensada com o mais selvagem dos beijos, a lasciva crua invadindo cada fibra do meu corpo. Guiada pelos meus instintos, segurei a gola da sua camisa e o puxei tanto para mim que o deixei sem opção que não subir no leito, colocando seu corpo sobre o meu. Sua mão habilidosa passeava pelo meu corpo, deixando-me em chamas, quando alguém pigarreou de muito perto, interrompendo-nos. Richard desceu dali muito depressa, embora não parecesse nem um pouco constrangido diante do olhar acusador do médico em pé perto e nós. — Vejo que a paciente já está bem melhor. — O médico falou, fitando-nos com olhar severo. — Sim doutor, bem melhor. — Richard jogava a barra da camisa sobre seu colo, tentando, sem sucesso, esconder sua ereção. A situação estava começando a ficar cômica e não contive o riso. — Como está se sentindo hoje, minha jovem? — O médico quis saber. “Com um puto de um tesão doutor e se você não tivesse entrado, eu estaria transando agora”. — Com fome. — Foi minha resposta. — Ótimo! Isso é sinal de recuperação. — Com seus aparelhos, ele examinou meus olhos, meus ouvidos, meu pulso, auscultou o meu pulmão e por fim declarou: — Você não precisa mais ficar internada. Pode ir para casa. Vou receitar uma vitamina e um encaminhamento para um psiquiatra. — Não preciso de um psiquiatra doutor. A razão do meu distúrbio já não existe mais. O médico alternou seu olhar de mim para Richard, dele para mim. — Ainda assim é bom para uma conversa. Prescreveu uma receita, preencheu meu prontuário, retirou a agulha da minha veia e foi embora. — É, acho que podemos ir. — Richard me fitava com tanta paixão, que eu me sentia incendiando por dentro. — Só vou se você me prometer que vai me levar a um bom restaurante no caminho. Ele sorriu amplamente, um sorriso tão estonteante que quase tive um orgasmo apenas o olhando. Ignorando o fato de que ele usava roupas de operário e eu tinha a cara de uma flagelada que não comia há dias, entramos em um restaurante elegante, bastante movimentado no centro da cidade, com os dois seguranças nos seguindo. Eu começava a temer que fossemos expulsos por causa da nossa aparência, quando o proprietário veio nos receber com um amplo sorriso, demonstrando conhecer Richard, nos encaminhando a uma das mesas. Escolhi comer filé com arroz, pois estava realmente faminta e aquilo parecia o prato mais consistente do cardápio. Richard pediu frango assado com salada. Enquanto comia, eu desconfiei que o antidepressivo que me deram no hospital podia estar me causando um forte efeito colateral, pois minha fome não era apenas de comida, mas também de sexo. Eu olhava para Richard levando as garfadas à boca e só conseguia imaginar aquela boca sobre meu sexo, chupando-me, enlouquecendo-me como ele sabia fazer com perfeição. Estava ficando muito molhada no meio das pernas, quando ergui meu pé por sob a mesa, discretamente, colocando-o sobre seu pau, esfregando-o ali e como eu esperava logo ele estava duro dentro da calça. Richard passou a comer mais devagar, olhou para ambos os lados antes de estreitar seus olhos

sequiosos sobre os meus. — Não brinque com fogo Dakota. Você ainda não está totalmente recuperada. — Acontece que eu to muito a fim de me queimar. Umedeci meus lábios com a língua, antes de ingerir um gole de água da minha taça e o senti ficar mais duro sob o meu pé. Passamos a comer com rapidez, para que terminássemos o quanto antes e fôssemos saciar nossa outra fome. Puta merda! Era hoje que eu ia me acabar nos braços dele. Mas não esta manhã, pois antes de qualquer coisa queria ir a Dallas conhecer minha princesa. Precisávamos passar no apartamento apenas para tomarmos um banho e trocarmos de roupas antes de seguir viagem. De volta ao carro conduzido pelo segurança, enquanto o outro se mantinha imóvel no banco do carona, o tesão louco se recusava a me abandonar. Minha vontade era de abrir o zíper da calça de Richard e chupar seu pau ali mesmo. Faria isso se os dois homens não pudessem nos ver. Por mais que tentasse, não consegui me conter, comecei a cariciar, discretamente, seu pau, por sobre o jeans, deixando-o duro de novo. Desta vez ele retribuiu, enfiando a mão entre minhas pernas para me tocar, acariciando-me por sobre o jeans. Ah! Porra! Assim eu morreria de tesão. Precisava do pau dele dentro de mim, com uma urgência descontrolada. Ao entrarmos no apartamento, ele teve tempo apenas de trancar a porta por dentro, quando se virou eu já tinha começado a me despir e ele fez o mesmo, sem desviar o seu olhar de cada parte do meu corpo que ia desnudando à medida que me livrava das peças de roupas. Estávamos completamente nus quando ele avançou para mim, seus olhos famintos devorando meu corpo, seus movimentos ágeis e precisos como os de um felino que atacava sua presa. Colou seu corpo ao meu, ao mesmo tempo em que segurava meus cabelos atrás da cabeça, erguendo-me o rosto para se apossar dos meus lábios, num beijo urgente, tão erótico que me deixou sem fôlego, ao mesmo tempo em que usava a outra mão para massagear o meu clitóris, deliciosamente, sua boca abafando meus gemidos. — Você me deixa louco com essa bocetinha tão molhadinha, minha cadelinha. — Ele sussurrou de encontro aos meus lábios. Dominada pela luxúria, segurei seu pau, duro como uma pedra, entre meus dedos e o masturbei, enquanto usava a outra mão para percorrer os músculos bem definidos das suas costas. Caralho! Se ele não parasse de me tocar daquela forma eu gozaria na sua mão, estava quase explodindo. Mas ele parou, ele era o macho perfeito, experiente o suficiente para dar a uma mulher exatamente o que ela precisava. Então, puxou-me pela cintura até o sofá, sentando-se, fazendo-me montá-lo, minhas pernas muito abertas sobre seu colo e com um gesto muito rápido dos seus quadris entrou em mim, sua virilidade escorregando pelo meu canal lambuzado, arrancando-me um grito de puro prazer. Ensandecida, apoiei minhas mãos em seus ombros e passei a mover meus quadris freneticamente sobre ele, rebolando, subindo e descendo, seu pau dançando dentro de mim, deliciosamente, enquanto ele chupava meus peitos, alternando sua boca entre ambos, deixando-me mais doida a cada instante. Era tudo mais intenso sem a barreira da camisinha, carne com carne e embora eu soubesse que precisávamos usar a proteção, não consegui nos interromper, eu só conseguia pensar em gozar.

Richard me fodia cada vez mais duro, mais forte, suas mãos fortes segurando meus quadris, uma de cada lado, me movendo sobre ele, indo deliciosamente fundo em mim, até que todo meu corpo se contraiu e o orgasmo veio violento, como se me estilhaçasse em mil pedaços. Gozei repetidamente no seu pau, sua boca deixando meus peitos para encontrar a minha, sufocando meus gritos, seus espasmos se fazendo dentro de mim, seu esperma quente me enchendo. Quando ficamos imóveis, nossos corações estavam tão acelerados que podíamos ouvir suas batidas. Richard continuou me beijando, mansamente, apaixonadamente, sem que conseguíssemos nos desgrudar. Entretanto, precisávamos parar. Por mais que meu corpo clamasse por mais daquilo, com todo o seu desespero, eu precisava ir ver minha filha. — Chega Richard. — Consegui falar, com dificuldade para puxar o ar, tamanha era minha excitação e quando tentei sair do seu colo, ele me impediu, segurando-me firmemente no lugar. — Você começou cadelinha. Não me peça para parar agora, porque não sou tão forte. — Você gozou dentro de mim sem camisinha. Como eu esperava, ele me libertou muito apressadamente, levantando-se, levando uma mão aos cabelos, num gesto de aflição. — Puta merda! Esqueci dessa porra! Tá vendo como você me deixa? — Passeou seu olhar pelo meu corpo nu, suado, ainda trêmulo pelo gozo, sentado sobre o sofá e completou: — Acho que Emilly pode gostar da ideia de ter um irmãozinho, ou uma irmãzinha. Não pude deixar de sorrir, a felicidade inundando-me a alma, maravilhada com a naturalidade com que ele enxergava a situação. Era impossível não amar uma criatura que conseguia ser tão encantadora mesmo quando estava embaraçada. — Eu te amo, Richard Parker. — E eu te amo Dakota Thompson. — Segurou-me pela mão, fazendo-me levantar, conduzindo-me para o quarto. — Agora venha, vou te dar um banho. Precisamos ir a Dallas ver a nossa filha. Tinha como não se apaixonar mais a cada minuto? Fizemos amor mais uma vez sob os jatos da água do chuveiro, mais demoradamente, com uma intensidade capaz de fazer o mundo desaparecer à nossa volta. Aproximava-se do meio-dia quando deixamos o apartamento. Richard usava calça social e camisa polo beterraba, parecia uma miragem linda, esplendorosa. Quanto a mim, optei por um vestido de seda marfim colado até a cintura, de onde partia a saia rodada, longa até os joelhos. Partimos rumo a Dallas no Mercedes, um segurança conduzindo o carro, o outro sentando no banco do carona. O calor intenso parecia deixar Houston mais movimentada. O trânsito estava quase intransponível, as calçadas fervilhando de pedestres. Por alguma razão que eu desconhecia, Richard parecia mais gostoso naquela manhã, seu magnetismo me atraindo tanto que eu não conseguia tirar minhas mãos dele, acariciava seus músculos sólidos, por sob a camisa, enquanto alternava minha boca entre a sua e seu queixo másculo, mordiscando-o deliciada, sendo compensada pelas suas mãos grandes percorrendo meu corpo, sem pressa alguma, já que tínhamos uma vida inteira para vivermos aquela louca paixão. Meu coração estava transbordando de paz, de uma felicidade que até então eu desconhecia, isso graças à decisão dele de viver, de dar uma chance ao amor que sentíamos um pelo outro. Ele decidira viver por mim. Faltava apenas ter minha filha de volta para o que o mundo se tornasse perfeito. E

isso era questão de tempo. Richard tinha muito dinheiro, o que me garantiria os melhores advogados. Estávamos deixando o perímetro urbano de Houston, pela rodovia movimentada, quando o terror nos alcançou. Aconteceu muito rápido e inesperadamente. Uma van preta parou atravessada na rodovia, cantando pneus no asfalto, logo à nossa frente, de modo que o motorista não teve outra opção que não parar. — Dê a ré, Jordan! — Richard gritou alarmado. Mas o motorista não teve tempo de agir, logo, três homens usando máscaras pretas saltaram da van, empunhando mini metralhadoras, vindo em nossa direção, abrindo fogo contra os seguranças. Richard lançou-me no limitado espaço entre os assentos dianteiros e traseiros, atirando-se sobre mim, os estampidos dos tiros ecoando incessantemente, muito perto de nós. Meu coração batia freneticamente no peito, a adrenalina passeando solta pelas minhas veias, o repentino ataque aterrorizando-me. Os estilhaços de vidros caiam sobre nós. Eu sabia que éramos um alvo fácil contra três metralhadoras, mas sabia também que os seguranças de Richard estavam armados e eram muito bem treinados, podiam nos defender. O som ensurdecedor do tiroteio cessou repentinamente e meu coração bateu ainda mais descompassado, pelo medo de como estavam às coisas lá fora. Logo um dos homens mascarados abriu a porta de trás do carro, apontando-nos a metralhadora. Richard jogou-me para trás, colocando-se entre mim e o atirador. — Saia da frente Sr. Parker. Eu quero apenas a garota. A voz do homem armado era grave, aterrorizante, lembrava-me as trombetas do inferno anunciando-me a morte. — Só por cima do meu cadáver. — Richard o enfrentou, corajosamente, mas não tinha chance contra um homem armado. Sem hesitar, o bandido bateu na cabeça dele com o cabo da metralhadora, um golpe único e certeiro, tão violento que Richard caiu no chão, à metade do seu corpo dentro do carro, a outra para fora, um fio de sangue escorrendo da sua testa ferida. Eu quis correr em socorro a ele, mas estava paralisada pelo horror, a certeza de que encontrara meu fim me imobilizando. Olhei para o cano da arma e depois para os olhos negros, desprovidos de qualquer emoção, do meu matador, ciente que nada do que eu fizesse o convenceria a mudar de ideia, nem mesmo implorar pela minha vida o impediria de me matar, pois, pela forma como agia, notava-se que se tratava de um profissional contratado. Para ele minha morte representava apenas alguns dólares a mais na sua conta bancária. Então era só aquilo? Eu passara grande parte da minha vida sendo violentada repetidamente por um bêbado pervertido, outra grande parte me dedicando aos estudos e quando finalmente encontrara a felicidade tudo estava sendo tirado de mim tão repentinamente. Definitivamente o destino não era justo. O homem mirou o cano da metralhadora diretamente para a minha testa. Me recusei a fechar os olhos, pois queria ver o mundo até o fim, entretanto, antes que ele tivesse a chance de atirar, um único estampido partiu das suas costas, um tiro certeiro que o jogou no chão, ao lado de Richard, o sangue jorrando abundantemente do ferimento na altura do seu torso. Meus olhos aflitos buscaram o autor daquele tiro, quando então descobri que minha vida acabara

de ser salva por um jovem policial rodoviário, que ainda empunhava sua arma, sentado em sua motocicleta, seu rosto pálido observando-me. Eu precisava agradecer a ele, mas antes de qualquer coisa precisava socorrer Richard.

CAPÍTULO XXVI

Quando saltei do Mercedes, fiquei chocada com a cena com a qual me deparei. O corpo de Michael, um dos seguranças, estava a alguns metros de distância do veículo, muito ensanguentado, imóvel sobre o asfalto. Próximo a ele, estavam os corpos de dois dos homens que nos atacaram, aparentemente mortos. Jordan continuava sentado ao volante, seu corpo sem vida todo ensanguentado, a pistola ainda presa à sua mão. Sobre o asfalto, havia um rio de sangue. O trânsito estava completamente parado, os motoristas e passageiros escondendo-se atrás dos seus carros. O policial rodoviário que salvara minha vida me ajudou a puxar Richard para fora do carro, estendendo seu corpo ferido no chão. Ajoelhei-me no asfalto ao seu lado, apoiando sua cabeça sobre minhas pernas, tentando acordá-lo. Eu agradecia aos céus, que depois de toda aquela carnificina ele estivesse apenas desmaiado. O jovem policial uniformizado usou seu rádio comunicador para chamar ajuda. Os sons estridentes de sirenes se faziam cada vez mais perto, quando Richard finalmente abriu os olhos, meu peito inundando de alívio e gratidão. Ao focar o meu rosto, ele pareceu ter, só então, se dado conta do ocorrido e sua expressão se tornou aflita. Tentou levantar-se, mas o gesto brusco causou-lhe uma dor que o fez deitar novamente, sua face contraída. — Está tudo bem meu amor. A polícia já está vindo e uma ambulância também. Sua mão tocou-me o rosto, como se ele tentasse se certificar de que eu estava realmente ali. — Dakota... Você está bem? — Sim. Os seguranças conseguiram pegar os atiradores antes de serem baleados. O último foi morto por um policial rodoviário. Ele salvou minha vida. — Eu devia ter te protegido. — Mas você protegeu. Eu estou bem. A pequena multidão de curiosos se formava em torno do rio de sangue que jazia sobre o asfalto, quando duas ambulâncias e várias viaturas policiais chegaram ao local. Os profissionais da ambulância procuravam vida nos corpos ensanguentados no chão, pareciam ter encontrado em um dos atiradores mascarados, pois foi o único a ser colocado na maca e levado. Todos os demais ficaram ali esquecidos à espera do legista, eu supunha. Meu coração sangrando pelos seguranças que morreram para nos proteger. Em seguida, os profissionais colocaram Richard na maca, levando-o para uma das ambulâncias, sem que eu deixasse de segui-los de perto. Um policial me alertou de que eu devia ficar para prestar depoimento, mas nem que ele me amarrasse eu sairia de perto de Richard. Entrei na ambulância atrás dele e partimos em alta velocidade de volta para o centro de Houston. Durante o trajeto, Richard usou seu celular para telefonar a agencia que lhe fornecia os seguranças, comunicando o ocorrido, solicitando que mais homens nos estivessem esperando no

hospital para onde estávamos sendo conduzidos. Fomos levados a um hospital público no centro da cidade. Ao chegarmos, os novos seguranças, vestidos com terno e gravata, já nos aguardavam, quatro deles, os quais apresentaram-se a Richard no instante em que sua maca foi tirada do veículo, quando mais uma vez ele tentou levantar-se e, como antes, seu ferimento na cabeça não permitiu. Ele foi levado apressadamente para a sala de emergência, ordenando aos seguranças que não me deixassem sozinha em hipótese alguma. Como era de praxe, fui barrada na entrada da sala, encaminhada à recepção para preencher a ficha de internação, os quatro homens, com aparência de agentes fúnebres, me seguindo de perto, atraindo a atenção de todos por quem passávamos. Desta vez não precisei esperar muito na precária sala de espera, logo uma enfermeira veio me avisar que Richard estava bem, não ficaria internado, mas apenas em observação durante algumas horas e apesar de ter levado alguns pontos na testa, já podia receber visitas. Tomada por uma profunda gratidão, fui até o meu amor, encontrando-o em uma enfermaria abarrotada de pessoas doentes, seu leito dividido dos demais apenas por cortinas de tecido. Ele tinha um grande curativo na testa. A camisa e a calça manchadas de sangue, o rosto ligeiramente pálido. Os seguranças não se afastaram de mim mesmo quando me aproximei do seu leito. — Oi. Como você está? — Meio zonzo. — Segurou-me a mão, ternamente. — Eu lamento imensamente por isso. Um homem de verdade devia proteger a mulher que ama e não colocar a vida dela em perigo. Talvez fosse melhor... — Para! — O interrompi. — Não venha com essa história de suicídio de novo. Eu sabia como seria quando me envolvi com você e se voltasse no tempo, faria tudo de novo. Você me protegeu, eu estou viva, não estou? Um dos bandidos está vivo. Ele vai dizer quem os contratou e em breve aquele maldito assassino será preso. Richard fez uma careta, como se provasse um gosto amargo. — Ele sabia o meu nome. Afirmou com todas as letras que não queria a mim, mas apenas você. Eu não consigo entender porque uma pessoa, ou pessoas que me odeiam tanto a ponto eliminarem as pessoas que amo não se livram de mim de uma vez. — Eu acho que a pessoa que faz isso não te odeia, pelo contrário, ela te ama e é doente o suficiente para não suportar te ver com outra. Existe uma linha tênue entre o amor e o ódio. Esse psicopata se encontra nessa linha por você. Richard refletiu por um instante, antes de falar. — Eu estava tão certo de que se tratava de alguém da minha família, vingando a morte de Elizabeth, que essa hipótese nunca tinha me passado pela cabeça. Mas agora parece fazer todo o sentido. — E então, alguma ex-namorada ressentida? Seu olhar se perdeu no infinito, como se ele fizesse uma longa incursão mental. — Não que eu me lembre. Depois que Elizabeth morreu, tive algumas namoradas antes de me casar. Mas não foi nada sério. — Só pode ser uma delas. Mande investigar cada uma. — Não conseguiria me lembrar de todas elas. — O canto da sua boca se curvou num meio sorriso cínico e a irritação pipocou em minhas veias, embora mais uma vez, ele conseguisse ser irresistível mesmo quando estava sendo um imbecil.

Neste momento o detetive Dunkel, responsável pelo caso, aproximou-se, acompanhado por um homem afrodescendente alto, muito forte. — Como está Sr. Parker. Srta. Thompson? — Assentimos com gestos de cabeça. — Esse é o detetive Sherman Devan, estamos trabalhando juntos nesse caso. — O cumprimentamos formalmente. — Estamos bem, graças aos seguranças que morreram para nos proteger. — O tom da voz de Richard era áspero. Não que estivesse se mostrando deliberadamente grosseiro com os policiais, aquele era o tom habitual que usava para se dirigir às pessoas. — Alguma ideia de quem possa ter feito isso? — O detetive examinava cada detalhe da enfermaria com seus olhos perspicazes. — O atirador sabia meu nome. Disse que não me queria. Estava atrás de Dakota. Eram profissionais contratados. Algum deles conseguiu sobreviver? — Apenas um. Ele está na cirurgia agora para tirar a bala que o atingiu. O interrogaremos logo que puder falar. Os três eram integrantes de uma quadrilha de traficantes de Pasadena, o líder foi morto pelo policial rodoviário e a van era roubada. Agora precisamos descobrir quem os contratou. O senhor acha que pode ter sido o mesmo assassino que matou as outras mulheres? — Tenho quase certeza. — Alguma namorada ressentida, Sr. Parker? — Foi o outro homem quem perguntou. — Não que eu saiba. Mas se vocês quiserem investigar, tive alguns relacionamentos entre Elizabeth e Dayse. O detive afrodescendente, que parecia mais esperto e experiente que Dunkel, tirou um bloco de anotações e uma caneta do bolso do paletó. — Nomes e endereços, por favor. Eu não gostei da forma embaraçada como Richard encarou-me brevemente, antes de voltar a fitar o detetive. Para que um homem como ele ficasse embaraçado, a coisa era mais séria do que qualquer ser humano pudesse supor. Então, o que se seguiu, foi uma interminável lista de ex-namoradas, com mais de vinte nomes, mencionando apenas aquelas com quem ele ficara entre a morte de Elizabeth e o casamento com Dayse. Em um período de apenas três anos, Richard tinha se relacionado com todas elas, sendo que o motivo do rompimento com todas tinha sido sua recusa em assumir um compromisso sério. No lugar daquelas mulheres eu também estaria puta da vida. Richard demorou mais de uma hora relatando ao policial a identidade de suas ex, necessitando de minutos de reflexão para se recordar do nome e do endereço da maioria delas. E por alguma razão que eu desconhecia, me sentia cada vez menos à vontade perto dele, como se eu fosse apenas mais uma de quem ele não se recordaria o nome algum dia. Tive a impressão de que tanto os seguranças quanto os policiais que nos rodeavam, me observavam penalizados por chegarem à mesma constatação. Deixamos o hospital no final da tarde. De volta ao apartamento, com meia dúzia de seguranças armados nos seguindo e outra meia dúzia vigiando o prédio por dentro e por fora, fiquei contente pela oportunidade de cuidar de Richard, dando-lhe comidinha na boca, por causa da gravidade do seu ferimento na testa. Afinal ele parecia sempre tão forte, poderoso, inatingível, que vê-lo fragilizado era um acontecimento histórico. Entretanto, na hora do banho ele mostrou que nem mesmo um ferimento grave era capaz de diminuir seu apetite sexual e começamos a fazer amor ali mesmo, o que se estendeu por praticamente a noite toda, como se nunca fosse o bastante para que estivéssemos

saciados. Naquela noite, decidi que procuraria minha pequena Emilly apenas depois que o assassino fosse apanhado, para que a vida dela não estivesse em risco também. Estávamos muito perto dele agora. Quando o bandido acordasse saberíamos de quem se tratava. No dia seguinte, descobrimos que o ataque contra nós estava em todos os noticiários, fotos do local onde tudo ocorrera e de nós dois disseminadas pela mídia. Naquele dia, Richard se negou a ir trabalhar e como não tinha se programado para se ausentar de Thrive, seu celular tocava de dois em dois minutos, ao passo em que ele ia resolvendo o que podia por telefone. Aquela manhã, ignorei os protestos dele, que alegava existir profissionais para tal finalidade e dei uma faxina pesada no apartamento, deixando-o impecavelmente limpo e arrumado. Preparei uma macarronada com almôndegas para o nosso almoço e apesar de todo o terror pelo qual passamos, senti-me genuinamente feliz pela oportunidade de cuidar do homem que eu amava e do lugar onde vivíamos, como se fossemos marido e mulher de verdade, afinal não custava nada sonhar. Tinha acabado de almoçar quando o alerta de mensagem do meu celular tocou. Era um torpedo de Trinity, que li atentamente: Oi amiga, não sei se ainda posso te chamar de amiga, mas gostaria muito. Quero te dizer que estou dolorosamente arrependida pelo que fiz e preciso do seu perdão, embora se você me negá-lo eu vou entender. Coloquei o maldito do Noah contra a parede e o fiz confessar aquilo que eu já tinha quase certeza, ele nunca me amou, estava comigo apenas para ficar perto de você. Sofri muito com isso, pois o amava de verdade, no entanto, nada me magoa mais que a ausência da nossa amizade. Espero que você possa me dar uma segunda chance. Vi nos noticiários o que aconteceu e estou muito preocupada com você. Por favor, me diga que está tudo bem.

Terminei de ler, processei cada palavra, me coloquei no lugar dela e a compreendi. O amor realmente era capaz de nos cegar como ela estivera. Eu sabia disso agora que estava apaixonada. Se a situação ocorresse com Richard, certamente eu teria agido da mesma maneira. Então, respondi sua mensagem: Você já está perdoada e sim, pode me chamar de amiga porque é isso que somos. Eu sinto muito pelo que aquele idiota do Noah fez, agora sei o quanto isto pode ser doloroso. Quanto ao ataque, está tudo bem agora, embora ainda esteja trancada na minha gaiola, o que é tolerável apenas porque Richard está aqui.

Depois que enviei, chegou outro torpedo: Quando você se libertar da sua gaiola, vamos marcar uma farra. Estou com saudades dos velhos tempos.

Respondi concordando e suspirei tranquila, feliz por ter minha melhor amiga de volta. À tarde nos dedicamos à continuidade da biografia dele. Ouvi o relato da sua vida durante horas,

sem nunca me cansar, pelo contrário, quanto mais ele falava mais me deixava fascinada com o quanto era forte, determinado e inteligente para tomar todas as decisões que o levaram a se tornar um dos homens mais poderosos do país. Faltava pouco para que o trabalho fosse finalizado. Já tinha setenta e cinco páginas digitadas, sendo que cem era o limite. Eu decidi não escrever sobre nós dois, pois não conseguiria discorrer sobre o assunto sem expor meus sentimentos a respeito dos fatos e um texto jornalístico precisava ser objetivo e não emocional. Por volta das cinco horas da tarde, recebemos uma nova visita dos detetives Dunkel e Devan. Embora Richard já tivesse colocado seus detetives particulares em ação, em torno das novas pistas, não podíamos dispensar a ajuda da polícia na caça àquele maldito, ou maldita. Após os cumprimentos formais, os dois homens acomodaram-se no sofá maior, enquanto eu e Richard ocupávamos o menor. Como de costume, eles vasculhavam o ambiente com olhos perspicazes, embora não fosse possível imaginar o que eles tanto procuravam se afinal nós éramos as vítimas. — O atirador sobrevivente conseguiu falar esta tarde. — Devan fez uma pausa para observar nossa reação. — Foram contratados pela internet, sem que soubessem por quem. “Puta merda! Tínhamos chegado muito perto!” — Mas o contratante se comunicou com o líder deles algumas vezes por telefone e a voz era de uma mulher. Subitamente senti minha face empalidecer. Estávamos mais perto que nunca da assassina. Como tínhamos deduzido, podia ser qualquer uma das ex-namoradas de Richard, como também podia ser Lindsay, a filha dele, ou até mesmo sua mãe adotiva. Por alguma razão, o rosto enfezado de Lindsay era o mais nítido em minha mente. — Sr. Parker, precisamos que seja o mais objetivo possível. Qual entre suas ex-namoradas demonstrou um comportamento, digamos... Anormal diante do rompimento ou mesmo durante a relação? Richard esfregou seus olhos com as palmas das mãos, como se encontrasse dificuldade em recordar. — Eu não sei dizer. Durante o período entre a morte de Elizabeth e meu casamento com Dayse, eu me dedicava mais ao trabalho que à minha vida pessoal. Eu não prestava atenção nas mulheres com quem me relacionava. Suas palavras causaram-me um frio no estômago. Será que em mim ele prestava atenção, ou eu era apenas mais uma na sua longa lista? — Vocês já investigaram a secretária dele, Lindsay O’Brien? — Interferi. — Não. Por quê? — Porque ela é louca pelo Richard. Os detetives entreolharam-se num gesto de cumplicidade. Um deles fez uma anotação no bloco à sua mão. — Alguma outra sugestão, Srta. Thompson? Hesitei em falar sobre Hillary, por temer magoar Richard. Por mais que ele não se desse bem com a filha, a ligação de sangue o unia mais a ela que a qualquer outra pessoa, inclusive a mim. Entretanto, era necessário que todas as possibilidades fossem consideradas. — Investiguem também a filha. Hillary Parker.

Como eu esperava, Richard cravou seu olhar em meu rosto, embora eu não o olhasse diretamente, para estudar sua expressão. Devan fez outra anotação em seu bloco, antes que ambos se levantassem. — Então acho que isso é tudo. Qualquer novidade nos avise. — Por favor, nos mantenha informados também. — Richard deixou o sofá para ir abrir a porta para eles. No instante em que os dois homens saíram, virou-se para mim, fuzilando-me com um olhar tão mortal que recuei um passo. — Por que você disse para eles investigarem Hillary? — Porque ela pode ser a mandante. — Peguei a flanela que tinha deixado esquecida sobre a mesinha de centro mais cedo e fingi estar limpando o móvel, já que não conseguia sustentar o olhar dele. — O que você acha que ela faz com todo aquele dinheiro que te pede? — Por Deus, Dakota! Ela é só uma criança. Imagina como vai se sentir quando tiver que ir à delegacia para ser interrogada. Eu era mesmo meio doente mental, pois fui invadida por um ciúme insano daquela menina. Meu sentimento de posse sobre Richard me impedia de dividir o afeto dele com qualquer outra mulher, mesmo que essa mulher fosse sua filha. Por que ele gostava daquela fedelha se ela o procurava apenas para pedir dinheiro? Ela não tinha o direito de receber o amor dele. Nesse breve instante de insanidade, me senti tão louca que compreendi o que motivava aquela psicopata a matar todas as mulheres a quem Richard atribuía o seu afeto. Não era tarefa fácil dividilo com outra mulher, que dirá perdê-lo definitivamente para outra. A única conclusão a que eu conseguia chegar era a de que o amor que eu sentia por aquele homem não estava me fazendo bem, pois era quase doentio. Deixá-lo seria a coisa certa a fazer depois que a assassina fosse presa. — Eu também era uma criança quando cortei a garganta do meu maldito padrasto e nem por isso fiquei traumatizada ou coisa assim. Joguei a flanela sobre a mesa, bruscamente e corri para o quarto, em busca de um momento de solidão que me permitisse refletir sobre a minha loucura. Todavia, ele me alcançou antes que eu conseguisse trancar a porta por dentro. Atirei-me sobre a cama, dando-lhe as costas. — Será que você pode me deixar sozinha um instante? Mas eu estava falando com Richard Parker, o homem que fazia apenas o que queria. Sem a minha permissão, ele deitou ao meu lado, apoiando a cabeça no cotovelo, enquanto acariciava minha nuca e meus cabelos com a outra mão, o contato tão simples me deixando excitada. — O que há minha menina? O fato de eu amar minha filha, não significa que eu ame menos você. Virei de lado, ficando frente a frente com ele, nossos rostos a poucos centímetros de distância. Olhando diretamente em seus olhos castanhos, cálidos, constatei que meu amor crescia a cada dia, o que me parecia assustador. — Eu tenho medo do tamanho do amor que sinto por você. Fico imaginando que você pode se cansar de mim e me trocar por outra, ou que eu enlouqueça de ciúmes cada vez que outra mulher olhar para você. Isso é doentio. Ele enterrou quatro dedos em meus cabelos, enquanto acariciava minha face com seu polegar, tão gostosamente que se o tempo parasse ali eu não reclamaria.

— Isso não é doentio, minha pequena. Apenas é novo para você, porque você nunca tinha se apaixonado antes. Com o tempo você vai aprender a lidar com seus sentimentos. Ele falava como se já tivesse vivido tal experiência. — E você, já tinha se apaixonado antes? Ele hesitou, seu dedo paralisando sobre minha pele. Droga! Droga! Droga! Ele já tinha amado antes, mentira quando dissera que não. Eu era mesmo apenas mais uma em sua vida.

CAPÍTULO XXVII

— Dakota, eu nunca tive uma relação na qual não existisse algo intenso. Algumas foram apenas atração física, outras uma paixão carnal, no entanto, eu nunca senti antes o que sinto por você. Nem mesmo por Elizabeth, a quem eu acreditava ter amado, antes de te conhecer. Então não, meu amor, eu nunca tinha me apaixonado de verdade antes. E da mesma forma como você se sente insegura, eu também me sinto. Fico relutante em dividir o seu afeto com seu amigo Tom, em breve com Emilly e fico muito puto quando você menciona o nome de Anthony. Foi por essa razão que perdi o controle quando vi aquele bastardo te beijando a força na frente do estádio. Mas somos adultos e precisamos aprender a controlar isso. Processei suas palavras e comecei a me sentir imatura e infantil, como ele insinuava, indiretamente, que eu era. Mas como eu podia ser emocionalmente madura se não tivera as experiências certas ou as necessárias? Richard estava certo, eu não estava conseguindo lidar corretamente com meus sentimentos e isso se devia ao fato de que ele era minha primeira experiência, por isso toda aquela insegurança me tomava. Eu precisava apenas aprender a lidar com isso. Foi então que todos os meus receios se dissiparam do meu peito. Percebi que eu precisava amadurecer até me tornar capaz de controlar sentimentos tão novos e intensos. — Eu te amo Richard. — Minha voz saiu trêmula, sem que eu pudesse controlar. — Eu também te amo, bebê. No instante seguinte, a boca dele estava de encontro à minha, num beijo selvagem, que me deixava sem fôlego. Aproximei meu corpo do seu, colando-me a ele, enfiando minhas mãos ambiciosas sob o tecido da sua camiseta, tocando seus músculos perfeitos, enquanto sua ereção se fazia contra mim. Inebriada, empurrei-o com meu corpo e o montei, cavalgando-o, esfregando meu sexo sobre a protuberância que se fazia na sua calça, por sob as roupas. Era impressionante a intensidade com que eu o queria, necessitava tê-lo dentro de mim, senti-lo mais meu que de qualquer outra, saciá-lo e ser saciada. Meu sangue fluía mais quente em minhas veias, minha vagina palpitava. “Ah, Richard, como eu te quero!” Invadida pela luxúria, puxei a barra da sua camiseta, desnudando-o da cintura para cima, inclinando-me para lamber e mordiscar os seus músculos, me fartando com a sua masculinidade, enquanto as mãos dele percorriam todo o meu corpo, se infiltrando sobre minhas roupas. Escorreguei minha boca através da sua pele gostosa, meio áspera e perfumada, saboreando-o com a ponta da minha língua, até alcançar o cós da sua calça, quando então abri o zíper apressadamente, puxando a peça até tirá-la pelos seus pés, levando a cueca junto. Ah, delícia! Como ele estava duro! Deliciosamente duro. Suas veias protuberantes salientando da pele sensível, o líquido transparente escorrendo da sua ponta, como um convite à tentação.

Experimentei-o entre meus dedos, fascinada, excitada, antes de levá-lo à boca, provando do seu líquido saboroso, para em seguida sugar a cabecinha, tão gulosamente que ele gemeu, um único gemido, rouco, meio selvagem que me deixou doida de tesão. “Ah meu amor... Geme para mim... Eu adoro te saborear”. Levei-o fundo em minha boca, seu tamanho alcançando minha garganta, mas Richard era ambicioso, segurou firme em meus cabelos, atrás da cabeça e me empurrou um pouco mais para baixo, seu pau indo ainda mais fundo em minha garganta, depressa, engasgando-me, excitando-me loucamente, minha vagina suplicando pela sua virilidade, meu clitóris exigindo uma carícia. “Assim, meu bem... Fode a minha boca... Me deixa te satisfazer.” Então, ele alcançou o clímax. Seu corpo grande se contraindo para logo explodir no gozo, seu pau enterrado em mim até a raiz, seus espasmos se fazendo enquanto o esperma jorrava quente em minha garganta, para que eu engolisse até a última gota, com uma ânsia descabida. Sem soltar os meus cabelos, Richard puxou-me para cima, colocando-me sobre ele, nivelando nossos rostos, introduzindo sua língua na minha boca, deixando-me sugá-la com toda aquela ânsia que se recusava a me abandonar. — Ah, minha cadelinha, assim você me deixa doido. — Ele chupou meu lábio inferior, depois o superior, com tanta força que tive certeza de que ficara inchada ali. Em seguida, ergueu-me o torso para rasgar meu vestido de cima abaixo, atirando o tecido florido no chão, arrancando minha calcinha com um safanão. Devorou minha nudez com olhos sequiosos, para depois, com a facilidade de quem manuseava uma boneca de pano, segurar em meus quadris, puxando-me mais para cima, montando-me sobre seu rosto, minhas mãos apoiadas na cabeceira da cama, meu sexo tão próximo à sua face que eu podia sentir o calor da sua respiração. — Ah! — Gemi em antecipação. No instante seguinte, a boca dele estava na minha boceta, sua língua se infiltrando no meu canal muito lambuzado, quando então lancei a cabeça para trás e gritei, um grito descontrolado, movido pelo prazer. Movi brevemente meus quadris para frente e para trás, sua língua quente, úmida e habilidosa passeou na minha intimidade, indo da minha vagina até meu clitóris, refazendo o enlouquecedor percurso. Ah! Porra! Isso ia ser muito rápido, eu estava excitada demais. Richard fodeu minha vagina com sua língua até que a ânsia pelo alívio se tornou insuportável em mim e ele prendeu meu clitóris entre seus lábios, precisando de uma sugada apenas para que eu explodisse no gozo, meu corpo se contorcendo, meus gritos ecoando pelo quarto. Meus espasmos se prolongaram e ele esperou, sugando os resquícios do meu prazer até que eu estivesse completamente imóvel. Então, com suas mãos fortes, conduziu-me novamente para baixo, colocando meu corpo sobre o seu, nivelando nossos rostos. Colou seus lábios nos meus, exigentemente, sugando minha língua com ansiedade. — Tesão... Não existe nada mais gostoso que o sabor da sua bocetinha. Bastaram suas palavras, proferidas num tom rouco, meio selvagem para que eu estivesse em chamas de novo, incendiando de dentro para fora, do mais lascivo desejo, como se não tivesse acabado de gozar. Puta merda! Como isso era bom! Será que sempre seria assim? As mãos dele passearam pela minha nudez, acariciando-me os peitos, seus dedos afundando entre

minhas nádegas para tocar minha intimidade completamente encharcada, penetrando ambos os meus orifícios, a expectativa enlouquecendo-me. — Vem cá cadelinha, senta no meu pau... — Soltando um grunhido, ele segurou meus quadris com uma mão de cada lado, firmemente, erguendo-me para montar sua virilidade, penetrando-me com um golpe muito rápido, brusco, indo fundo em mim, me preenchendo por completo, tão deliciosamente que lancei minha cabeça para trás e o grito me escapou alto, um grito do mais magnífico prazer. Tomada pela lasciva, apoiei minhas mãos em seu peito forte a comecei a mover meus quadris, freneticamente, em círculos, para cima e para baixo, seu pau girando dentro de mim, indo e vindo, me proporcionando tanto prazer que nada mais parecia me faltar na vida. Eu movia-me cada vez mais depressa sobre ele, o tesão agindo por mim, enquanto os gritos escapavam-me da garganta, as lágrimas brotavam dos meus olhos. Logo ele ficou mais duro no meu interior e todo o meu corpo se contraiu, anunciando o êxtase, sucumbindo ao clímax que chegava. Richard segurou-me pelos cabelos, puxando meu corpo para baixo, tomando-me os lábios de maneira selvagem e assim fomos arrebatados pelo orgasmo, nossos corpos ondulando juntos, como se fizessem parte de um só ser, até que ficamos imóveis, moles sobre o colchão, grudados, pele com pele, o som das nossas respirações pesadas preenchendo o ambiente. Naquele momento, nos afastarmos parecia impossível, uma ideia tortuosa. Depois de um longo momento de silêncio, Richard fez uso da sua magnífica agilidade para inverter nossas posições, colocando-se sobre mim, cobrindo-me inteira com seu corpo grande, me fazendo parecer pequena sob si. Voltou a beijar-me nos lábios, vagarosamente desta vez, como o acalmar das ondas do mar depois de uma tormenta, ao mesmo tempo em que arremetia seus quadris contra mim, seu membro escorregando com facilidade no meu canal empapado e embora não estivesse totalmente ereto, enviava ondas de prazer que se alastravam por todo o meu corpo, deliciosamente. Inebriada, percorri a ponta dos meus dedos pelas suas costas, levando-os até suas nádegas, apalpando-as maravilhada com sua perfeição. — Ah, minha cadelinha, sua bocetinha é tão apertada e quente que minha vontade é de nunca mais tirar meu pau daqui. — Então não tira meu amor... Fica aí para a vida toda... Porque não existe nada no mundo que possa ser tão bom quanto te sentir dentro de mim... Subitamente ele ficou mais duro, ao passo em que passou a se mover com mais rapidez, o beijo se tornando mais selvagem, as labaredas do tesão crescendo no meu interior, incendiando-me descontroladamente, até que eu estivesse perdida, meu mundo se resumindo à Richard Parker. — Eu sou mesmo um sujeito de muita sorte por ter essa sua bocetinha doce tão minha. — Ah... Sim... Toda sua... Come minha boceta com esse pau gostoso... Ahh... Então, ele ficou completamente duro, sua rigidez dilatando as paredes do meu canal, preenchendome, levando-me à deliciosa loucura, da qual eu jamais queria sair. Richard ergueu o seu torso, pendurando minhas pernas em seus ombros, estocando muito forte em mim, com brutalidade, do jeito que me enlouquecia. Mantinha seu olhar hipnótico preso ao meu, enquanto metia em mim cada vez mais fundo, mais forte, mais depressa, enlouquecendo-me, meus gemidos partindo dos meus lábios, as lágrimas brotando dos meus olhos, a boca linda dele aberta para puxar o ar, o som dos nossos corpos se chocando ecoando pelo quarto.

Descontrolada, levei minhas mãos ao seu peito e enterrei minhas unhas crescidas na sua carne, sentido a pele dele se rasgar sob meu toque. Richard gemeu alto, um gemido meio animalesco que me deixou ainda mais doida, fora de mim. Não demorou muito para que um novo orgasmo se formasse em minhas entranhas e, como não podia deixar de ser, ele acelerou as estocadas, até que juntos mergulhamos no êxtase, sem desviarmos os olhos um do outro. O magnífico espetáculo que era seu rosto se contraindo pelo gozo intensificando o prazer que parecia partir do fundo do meu âmago. Mais uma vez, caímos moles sobre o colchão, ao som das nossas respirações muito ofegantes, nosso coração tão acelerado que podíamos sentir as batidas um do outro. Ficamos assim, imóveis, por um longo momento. Eu estava acabada, a exaustão tomando conta de mim, ainda assim relutava em me afastar do seu corpo, o que não foi necessário, pois Richard saiu de mim muito devagar, escorregando para o lado sem desfazer o contato, puxando-me para me aninhar em seu peito largo, onde descansei maravilhada com aquela aura de paz, de tranquilidade que nos envolvia, como se nada mais existisse além do mundinho dentro da nossa redoma. Vi os ferimentos deixados por minhas unhas em seu peito, eram mais profundos do que eu tinha imaginado. Carinhosamente, plantei beijos sobre eles, antes de me aconchegar novamente. E foi assim que adormecemos, sem que palavras fossem necessárias para que tivéssemos a certeza de que pertencíamos um ao outro e sempre pertenceríamos. Em meu pesadelo, me deparei com um par te olhos negros, frios, inexpressivos, presos a um rosto mascarado, fitando-me de cima. O cano da metralhadora também estava lá, pronto para cuspir o estilhaço de bala que tiraria minha vida. Subitamente, alguém surgiu de trás do atirador, tirando-o do caminhão com um gesto de mão apenas. Era uma mulher. Uma desconhecida, embora seu rosto me parecesse estranhamente familiar. Tinha a pele clara, os cabelos curtos eram escuros. Ela estendeu-me a mão, gentilmente, como se pretendesse me ajudar, entretanto, em vez disso, me empurrou do alto de uma ponte que eu não sabia de onde tinha saído. Durante um longo momento de terror, eu caí, mas não encontrei o chão. No instante que se seguiu, eu estava sentada no chão da sala, olhando o álbum de fotografias antigo de Richard. Foi então que acordei, um grito surdo partindo-me da garganta. O pesadelo tinha sido tão real que eu ainda estava tomada pela sensação de que caía em direção à morte. Meu corpo estava trêmulo, minha pele banhada por um suor frio. — Calma bebê. Foi apenas um sonho ruim. — A voz amada de Richard, assim como suas mãos acariciando meus cabelos, me puxaram de volta para a realidade. Agradecida por estar perto dele, abracei-o com força, me encolhendo mais junto ao seu corpo grande, voltando a me sentir segura e protegida. — Foi tão real. — Minha voz era um balbucio. — Xiii, isso já vai passar. — Ele começou a espalhar beijos em meu rosto, nos meus cabelos, na minha orelha, suave e carinhosamente, como não era muito típico dele. — Isso aconteceu porque você dormiu sem jantar. Vou te preparar um sanduíche. Ele fez menção de se levantar, mas o impedi, agarrando-me mais a ele. — Não me deixa sozinha. Ele voltou a acariciar meus cabelos, protetoramente. — Vem comigo. Você só precisa se acalmar.

Contornou seus braços fortes em torno do meu corpo, embalando-me como se eu fosse uma criança pequena, até que o medo se esvaiu do meu íntimo, como água evaporando no deserto. Mais calma, refleti sobre o sonho, repassando-o mentalmente e a lembrança do velho álbum veio nítida como a cena de um filme que eu assistira. Havia algo naquele álbum, algo que eu vira antes que podia ser a resposta para aquele mistério, mas não conseguira distinguir do que se tratava. Eu precisava olhar com mais atenção. — Richard, onde você guardou seu álbum de fotografias? — Sentei-me. — Na mesma gaveta de antes. Por quê? — Tem algo lá que eu preciso ver. Sob o olhar confuso dele, levantei-me ocultando minha nudez com o roupão e acendi a luz principal. Fui até a gaveta, peguei o velho álbum e voltei a sentar-me na cama, com as pernas encolhidas diante do corpo.

CAPÍTULO XXVIII

Passei as páginas muito lentamente, estudando com atenção cada fotografia. Cheguei ao final e não encontrei nada, mas não desistiria facilmente. Voltei ao início, reexaminei cada foto, até que por fim encontrei o que eu procurava. Nas fotografias mais antigas, aquelas tiradas quando Richard ainda fazia faculdade, das quais David Smith e sua namorada Olívia faziam parte. O rosto de Olívia era o mesmo rosto da garçonete que me servira à vodka envenenada no bar. Estava mais velha no bar, com os cabelos longos e loiros, mas eu tinha certeza de que era ela. — Olha. — Apontei a foto para Richard. — Essa é a mulher que me serviu a vodka envenenada no bar. Os olhos de Richard se arregalaram de perplexidade. — Olívia!? — Ela mesma. — Você tem certeza que não está enganada? — Sua expressão passara de perplexa para incrédula. — Certeza absoluta. Ela é a assassina, agora resta a você explicar o porquê. Ainda atônito, boquiaberto, ele refletiu por um longo momento, como se mais uma vez vasculhasse o passado. — Eu não tenho ideia. Ela era minha amiga. Namorava David durante a faculdade. — Você nunca teve nada com ela? — Claro que não. — Ele hesitou entes de continuar. — Quer dizer, nós transamos uma vez, mas estávamos muito bêbados. Foi coisa de momento. Levantei-me injuriada. Puta que pariu, será que existia uma mulher na face da terra com quem ele nunca tinha transado? — E como isso aconteceu? O que ela disse? — Foi quando Elizabeth estava de resguardo de Hillary. Ela e David ainda namoravam e os dois me convidaram para uma festa de aniversário surpresa na casa de um amigo deles. Todo mundo ficou bêbado aquela noite, David foi um dos primeiros e acabou dormindo ali mesmo no sofá da sala. Eu subi para ir ao banheiro e ela me seguiu. Eu estava com o pau na mão quando ela entrou e começou a me masturbar. Porra! Eu sou homem! Seu pretexto escroto serviu apenas para me irritar mais. — E o que aconteceu depois? — Abrimos uma das portas do corredor e transamos a noite toda. Quando acordei estava sozinho no quarto. Era dia, não havia mais ninguém na casa. Então me vesti e fui embora. Nunca tocamos nesse assunto e nunca mais aconteceu. Pouco tempo depois ela e David terminaram, mas eu não sei se essa foi à razão. Eu só tinha cabeça para os negócios. Não prestava muita atenção na minha vida pessoal. — O que ela disse quando vocês transaram? — Coisas normais que as pessoas dizem quando transaram. — Ele se deteve, como se algo

importante lhe ocorresse. — Ela disse que sempre foi apaixonada por mim, que odiava Elizabeth por estar ocupando um lugar na minha vida que podia ser dela e que só namorava David para fazer parte da minha vida. Mas eu achei que fosse papo de bêbado. — Seu olhar atônito encontrou o meu e vi a dor se refletir, lentamente, na sua expressão. — Por Deus! Ela matou Elizabeth! — Constatou, finalmente. Apesar da raiva que me tomava, por ele não ter a capacidade manter seu pau dentro das calças nem mesmo com a namorada do seu melhor amigo, me compadeci da sua dor. Fui até ele. Estava sentado na beirada do colchão, ainda nu. Coloquei-me diante dele, abraçando-o, confortando sua cabeça em meu peito, enquanto afundava meus dedos e meu rosto em seus cabelos macios. — É, pelo visto ela matou sim. Ele me abraçou de volta, contornando minha cintura com braços poderosos, apertando-me com força. — E a culpa foi minha. — Havia dor na sua voz. — Se eu tivesse prestado mais atenção nas pessoas a minha volta, em vez de me dedicar somente ao trabalho, talvez tivesse evitado isso, ou pelo menos as mortes que vieram depois. — Não se culpe por algo que você não fez. Ninguém tem culpa da loucura alheia. Essa mulher deve ser muito perturbada. — Precisamos avisar à polícia. Desvencilhando-se do abraço, ele se levantou, vestiu uma calça velha de moletom, foi até seu celular sobre o criado mudo e discou os números. Explicou toda a situação ao detetive Devan, contando-lhe como eu reconhecera o rosto de Olívia nas fotografias, constatando que se tratava da mesma mulher que tentara me envenenar. Em seguida, ligou para o seu detetive particular e repetiu a descoberta, exigindo que este tomasse providencias imediatas, já que talvez a polícia não considerasse o horário apropriado para realizar a prisão de um suspeito. Ao encerrar os telefonemas, respirou fundo, desconsolado e voltou a se sentar na beirada do colchão, encarando o vazio à sua frente, com uma expressão chocada. Mas que sujeito sem sorte. Ele passara grande parte da sua vida se culpando pela morte de Elizabeth sem razão alguma, agora então, se culparia com mais veemência. Olhei no relógio de cabeceira, era quase meia-noite. — Acho que vou aceitar aquele sanduíche agora. Como eu pretendia, minha voz o trouxe de volta ao presente. — Claro. Vamos lá. — Veio até mim e fomos abraçados para a cozinha. — Pode deixar que eu preparo. Você não vai acreditar no que sei fazer com pouca coisa. — Ele não estava me ouvindo. Ainda parecia perdido em seus pensamentos quando se sentou ao balcão da cozinha. — Richard, enfia na sua cabeça de uma vez que nada disso foi culpa sua. Podia ter acontecido com qualquer pessoa. — “Pelo menos com qualquer pessoa com um tesão desenfreado”. — Há tanta coisa que eu não consigo entender. David sabe que ela é louca? Peguei o pão e tudo que encontrei na geladeira que podia caber em um sanduíche, coloquei sobre a pia e comecei a preparar. — Isso você só vai saber quando perguntar a ele. Mas de uma coisa já podemos ter certeza: ele sabe o que aconteceu entre vocês dois, por isso a namoro deles acabou. — Por que ele nunca me falou nada?

— Para não perder o amigo ou a chance de subir na vida na sua aba. — Acho a segunda opção mais provável. — Depois que eles terminaram você ainda viu Olívia? — Sim. Muitas vezes. Ela vinha sempre aqui para ver Elizabeth. Eram muito amigas. — E depois que Elizabeth morreu? — Continuou vindo, com o pretexto de ver como Hillary estava, mas na verdade mal olhava para a garota. Depois que Hillary foi levada, ela continuou vindo por mais um tempo, depois desapareceu. — Ela percebeu que não tomaria o lugar de Elizabeth como pretendia quando a matou. — Dei uma grande mordida no sanduíche antes de ficar pronto. Toda aquela descoberta estava abrindo meu apetite, pois era totalmente emocionante, não apenas pelo fato de que chegamos à Olívia através dos meus instintos, mas principalmente porque logo ela estaria presa e eu finalmente estaria livre da sua perseguição. — Você está certa. Quando ela desapareceu eu estava de casamento marcado com Dayse. — Bingo! — Coloquei um sanduíche de queijo com presunto e salada no balcão diante dele, junto com um copo de leite e fui recompensada pelo seu estonteante sorriso molha calcinha. Por pouco não o saí puxando de volta para o quarto, deixando sua calça e meu roupão pelo caminho. Puta merda! Eu estava fodidamente perdida por aquele homem. — E todas essas brilhantes constatações, saídas da mente da minha futura brilhante jornalista. — Ele mordeu um pedaço do sanduíche, enquanto me encarava com aquele olhar “quero te foder” que me deixava sem chão. “Não me olha assim, Richard Parker, porque eu posso facilmente perder o controle e te fazer interromper nossa refeição”. — E não me diga que depois da morte de Dayse, você recebeu uma inesperada visita dela. — Sim. Isso aconteceu. Eu sou mesmo um imbecil por nunca ter percebido nada. — Quando se está envolvido na situação, não se consegue enxergá-la claramente, como quem está de fora. Terminei de fazer os sanduíches e juntei-me a ele no balcão, o mármore de meio metro de largura entre nós. — Onde você aprendeu a ser tão esperta, minha pequena? — Na faculdade. Para se tornar uma boa jornalista, precisa-se ser muito perspicaz. — Como ninguém nunca chegou a ela, nem a polícia, nem os detetives particulares? Estava tudo tão obvio. — É como diz o ditado: de tanto olhar para longe, não se vê o que passa perto. Sem mencionar que não estaria tão obvio assim se você não tivesse revelado que teve relações com ela. Se nem mesmo você percebeu, quem dirá os detetives. — Ela deve ser muito louca mesmo. Terminamos a refeição e voltamos para o nosso ninho no quarto. Richard parecia tão chocado que não conseguia relaxar, sequer se deitou. Permanecia sentado, com as costas apoiadas no espaldar da cama, o celular na mão, a ansiedade evidente na sua fisionomia. Eu não conseguiria dormir, deixando-o sozinho naquele estado. Então me sentei ao seu lado, apoiando minha cabeça no seu ombro, reconfortando-me, apaixonando-me mais a cada segundo, como se provasse de um cálice viciante, do qual sempre queria mais um gole. Algumas horas depois o celular finalmente tocou, Richard atendendo de imediato.

Como se tratava de um aparelho de última geração, com o áudio mais bem definido que os demais e minha cabeça continuava apoiada em seu ombro, consegui ouvir cada palavra do seu detetive particular, James. — É o seguinte, cara. Fui junto com a polícia ao apartamento de Olívia, mas como ninguém atendeu a campainha, os tiras foram embora, em busca de um mandato de invasão. Depois que eles saíram, arrombei a fechadura da porta e entrei. Ela realmente não estava lá, o lugar estava vazio e pelo estado parecia desabitado há meses. — O detetive fez uma pausa para respirar. — Você ficaria impressionado com o que encontrei lá. Havia compartimentos secretos no guardaroupa dela e dentro deles recortes de jornais com as notícias sobre as mortes das mulheres com quem você já se relacionou. E não era só isso. Havia muitas fotos suas com essas mulheres, em lugares públicos e até dentro da Thrive. Só não encontrei fotos da Srta. Thompson. — Você já sabe dizer se ela agia sozinha? — Aparentemente sim. Na pasta secreta dela havia o telefone e o endereço do escritório de Joshua Campbell, um dos maiores detetives particulares de Houston. Certamente ele investigava a rotina das vítimas para que ela pudesse agir. Vou fazer esse safado perder a licença dele. Havia também números de telefones com o nome de traficantes perigosos e outras evidências como perucas e roupas masculinas. A mulher é uma psicopata. — Você tem ideia de onde ela possa estar agora? — Não. Mas ela não vai muito longe. Já contatei um amigo meu do FBI, ele está checando se o nome dela consta nos voos dos últimos três meses. Logo a polícia resolve se mexer também e ela será presa. — Obrigada James. Continue investigando e mantenha-me informado. — Manterei. Até mais. E encerraram a ligação. — Por que não tinha fotos minhas lá? — Não sei. Talvez ela tenha outro endereço agora. — Ele afundou o rosto em meus cabelos, inspirando fundo. — Vamos dormir. Precisamos ir trabalhar amanhã. Então, aconchegados um no outro, nos espichamos sobre o colchão, os pensamentos retardando nosso sono, até que por fim ele chegou. Richard já estava terminando de arrumar o nó da sua gravata quando despertei. Estava lindo em pé ao lado cama, olhando-me de cima, em seu terno impecável grafite feito sob medida. Tinha os cabelos ainda molhados, a braba bem-feita e um delicioso aroma de loção pós barba partia dele. Acordar com aquela visão todas as manhãs definitivamente supria os mais secretos desejos de felicidade de qualquer mulher com sangue nas veias. — Então, vai trabalhar ou pretende passar o dia inteiro na cama? — Seu tom era áspero, como eu bem conhecia, uma aspereza inerente à sua personalidade forte. Por outro lado, ele parecia mais animado, revigorado do choque que sofrera durante a noite. — Vou trabalhar. Cansei de ficar trancada. — Estiquei-me preguiçosamente antes de levantar. — Então se apresse. Estamos em cima da hora. Tomei um banho revigorante, lavando os cabelos, vesti um dos vestidos sofisticados que Tom me comprara, era um modelo na cor de prata acetinado, colado ao corpo, com a saia se estendendo até os joelhos e um decote quadrado generoso, embora eu não tivesse muito o que mostrar ali. Deixei que os cabelos rebeldes secassem naturalmente e passei um pouco de rímel e gloss labial.

Ao deixar o quarto, senti o aroma agradável de café fresco que partia da cozinha, para onde me dirigi. Uau! Além de lindo, bom de cama, o meu amor ainda sabia cozinhar! Eu era mesmo uma mulher de muita sorte. Do lado de lá do balcão, ele estendeu-me uma xícara com o café, enquanto varria meu corpo de cima abaixo com o olhar, seus olhos se estreitando ao encontrar os meus, como se estivessem contra a luz do sol. — Linda! — Sua voz era um sussurro e por alguma razão desconhecida corei. Depois de toda a intimidade que adquirimos, ele ainda tinha o poder de me fazer corar. — Não enrubesça assim na minha frente, bebê, ou serei capaz de perder mais um dia de trabalho. Fingindo uma indiferença que estava longe de existir, tirei a xícara da mão dele, dei-lhe as costas e caminhei para a sala, instintivamente, rebolando minha bunda dentro do vestido apertado. — Não seja ridículo, Richard. Aquela empresa precisa de você. Dois segundos depois, ele estava atrás de mim, seu corpo tocando o meu, sua ereção pressionando minhas nádegas, enquanto suas mãos afastavam meus cabelos molhados para o lado, para que sua boca pudesse passear livremente pelo meu pescoço, despertando-me o fogo insano do desejo. — Não rebola essa bunda na minha frente, porque posso facilmente perder o controle e você já está ficando com poucos vestidos. — Sua voz era sussurrada, excitantemente ameaçadora. Sua boca continuava explorando a região da minha nuca, enquanto ele pressionava seu corpo cada vez mais forte contra o meu, roubando-me o fôlego. — Esta tarde vou procurar uma imobiliária, para que possamos encontrar um apartamento melhor que esse para vivermos. Você merece o melhor cadelinha e é isso que vou te dar. Eu tinha ouvido direito? Ele estava planejando viver comigo, sem antes me consultar? Estava sendo arrogante e prepotente, como sempre, a ponto de decidir minha vida por mim? Inicialmente eu tinha vindo morar com ele em nome da minha segurança e agora que Olívia poderia ser presa a qualquer momento, o perigo não mais existia, eu podia decidir entre viver com ele ou não. Apesar de estar perdidamente apaixonada e de morar com Richard representar praticamente a realização dos meus mais secretos sonhos de vida, ele não podia decidir como as coisas seriam sem antes me consultar, como se tudo tivesse que ser feito da sua maneira, como se ele fosse dono da minha vida e eu não tivesse vontade própria. Ele precisava entender que não era meu dono, que eu era um ser com opiniões e vontades que precisavam ser respeitadas. — Vamos. Estamos na hora. Afastei-me do abraço, indo guardar a xícara de volta na cozinha antes de sair, pisando pesado atrás dele, os saltos das sandálias estalando sobre o piso.

CAPÍTULO XXIX

Partimos no Mercedes conduzido por um segurança, sendo que outro se encontrava no banco do carona e mais meia dúzia deles no Audi logo atrás de nós. Durante todo o percurso entre River Oask e Downtown, as palavras de Richard martelaram-me a mente, incomodando-me. O que deveria ser uma proposta, minimamente romântica, de um relacionamento mais sério, partira dele como uma decisão já tomada e apesar de querer aquilo de verdade, me incomodava o fato de que ele se considerava o dono da vida de todos os que o rodeavam, inclusive da minha. As coisas não funcionavam assim, não ao meu ver, tudo precisava ser conversado e decidido em consenso. Por outro lado, eu não podia me esquecer de que para realizar o sonho de reaver a guarda da minha filha, eu precisaria no mínimo ser uma mulher casada, dona de uma boa situação financeira. Mas não tinha certeza se Richard queria de fato se casar, talvez quisesse apenas dividir comigo seu novo apartamento. Adentramos a imponente e luxuosa sede da Thrive de mãos dadas, com todos aqueles seguranças mal-encarados nos seguindo, tornando-nos o centro de todas as atenções. Obviamente todos ali tinham lido os jornais e sabiam a razão de tanta segurança, ainda assim olhavam de canto de olho, como se vissem uma bizarrice. “Fodam-se todos!” Fomos obrigados a nos separa na sala antes da sua, aquela ocupada pela biscate da Lindsay. Fiz questão de beijá-lo demoradamente na boca antes de deixá-lo entrar, para que ela soubesse a quem ela pertencia realmente. Todavia, minha postura de senhora Parker foi por água abaixo minutos depois, quando a voz grossa de Richard preencheu a sala através do interfone, solicitando a presença dela em sua sala. Merda! Encarando-me com aquele irritante ar de superioridade, ela pegou algumas pastas da sua mesa e adentrou a sala do meu amor, rebolando seu traseiro empinado dentro da saia lápis lilás. Merda! Merda! Merda! Eu não pararia de imaginar o que eles estavam fazendo lá dentro, enquanto ela não saísse. Convencida de que estava ficando neurótica, acomodei-me atrás da minha mesa, abrindo meu notebook, tentando me concentrar em sites de notícias, contudo, meus pensamentos insistiam em me levar ao interior da sala de Richard, onde ele estava sozinho com aquela mulherzinha, que nunca fizera a menor questão de disfarçar o quanto o queria. Eu sabia que precisava confiar no amor que Richard dizia sentir por mim, por outro lado, confiava também nos meus instintos e estes me alertavam para o fato de que Lindsay faria qualquer coisa por ele, assim como qualquer outra mulher que passasse uma noite tórrida em seus braços. Duas longas e intermináveis horas depois, ela saiu, sua boca sem batom curvada naquele meio sorriso que parecia tentar me dizer o que eu mais temia, suas roupas estavam amarrotadas, ou era impressão minha?

Ignorando-me ela tomou seu lugar, altiva, atrás da mesa. — Querida, tire cópias desses documentos para mim. — Ela estendeu-me a pilha de documentos, sem olhar-me no rosto, sua atenção concentrada em algo sobre a mesa. — Acho que não, “querida”, faça isso você mesma e não volte a me incomodar. — Puta merda! Eu estava sendo tão arrogante quanto Richard. E se ela fosse inocente? Olhou-me com espanto antes de pousar os documentos de volta na sua mesa, retomando seu trabalho. Eu precisava me ocupar de alguma forma, então me dediquei a digitar a biografia de Richard, transformando as novas informações em um caprichado texto literário. Por volta do meio-dia, ele me convidou para almoçar ao seu lado ali mesmo na sua sala, embora se mantivesse distante durante todo o tempo. Era como se ali o homem apaixonado que eu tanto queria, deixasse de existir, dando lugar a um frio executivo que pensava apenas nos negócios. Definitivamente eu não gostava de Richard quando estávamos no trabalho. A ideia de dividi-lo com seus negócios me desagradava. Eu supunha que Elizabeth sentisse o mesmo quando eram casados e o cobrava, por isso ele se culpara pelo falso suicídio dela durante tantos anos. No início da tarde, eu estava de volta à construção do meu trabalho de conclusão de curso, quando Richard deixou sua sala, carregando sua valise cara. — Conseguiram prender Olívia. — Declarou. — Vou até a delegacia. Quero olhar dentro dos olhos dela e ouvir da sua boca o que ela fez. — Havia raiva, angústia, mágoa em seu olhar. — Me espere aqui. Não vou demorar. Quando voltar vamos ver os apartamentos. — Sem esperar resposta, plantou um selinho rápido em meus lábios e saiu, deixando para trás os dois seguranças que estiveram ali durante todo o dia, um de cada lado da porta do elevador. Subitamente, fui invadida por uma sensação gostosa de liberdade. Com Olívia atrás das grades eu não precisaria mais me esconder, poderia sair para tomar uma cerveja com meus amigos, ir e vir sozinha onde quisesse, sem o incomodo de um batalhão de brutamontes me seguindo e, principalmente, podia ir conhecer minha filha. Pediria a Richard que passássemos o fim de semana em Dallas, disfarçados de caça talentos em busca de uma garotinha ruiva de seis anos para um comercial. Seria a oportunidade perfeita de vê-la de perto, tocar seu rostinho meigo, sentir seu cheirinho que eu podia apostar que era uma delícia. Espontaneamente, meus lábios esticavam num sorriso, quando ouvi o aviso de mensagem do celular. Tirei o aparelho da bolsa e não pude acreditar no que meus olhos viam. Acabara de chegar um vídeo, no qual eram exibidas as imagens de Lindsay quase deitada nas poltronas da sala de Richard, com a saia enroscada na cintura e nenhuma roupa mais, enquanto ele, completamente nu, estava ajoelhado diante dela, com o rosto enterrado entre suas pernas. Repassei o vídeo, uma, duas, três vezes, o sangue me fugindo da face, o chão se abrindo aos meus pés. Era um vídeo com poucos segundos de duração, as imagens capturadas pelo celular que ela segurava, sem que ele percebesse. Olhei para a saia enroscada na sua cintura, era lilás, a mesma que ela usava naquele exato momento, o que me dava à dolorosa certeza de que o vídeo tinha sido gravado hoje, enquanto ele fingia estar tratando de negócios. Então todas as minhas suspeitas acabavam de se confirmar, todas as manhãs ele realmente a chamava para transar e não trabalhar, como tentava me fazer acreditar. Como fora capaz de fazer isso comigo?

Levantei-me, obrigando minhas pernas dormentes a me levarem para frente, colocando-me diante dela, esforçando-me, inumanamente, para conter a enxurrada de lágrimas que ameaçavam banhar-me o rosto. — O que significa isso!? — Tentei manter a voz firme, quando exibi a tela do celular a ela, mas não funcionou. Encarando-me com cinismo e aquele habitual ar de superioridade ela falou: — Significa que você não é tão dona de Richard Parker quanto pensa. Ele nunca foi e nunca será de uma mulher apenas. Muitas passam por ele e se vão, mas eu estou e estarei sempre aqui. A raiva que tomava conta de mim era imensurável, meu sangue fervia nas veias. — Vadia! — Sim, tanto quanto você ou outra que ele já comeu, mas pelo menos eu sou a vadia que ele sempre terá. Em minha mente, construí claramente a cena em que eu avançava para ela e a enchia de tapas, entretanto, me recusava a descer ao seu nível. Invadida por uma dor insuportável, que parecia dilacerar-me a alma, peguei minha bolsa, o computador com o qual Richard me presenteara, apenas porque nele estava todo o meu trabalho e tentei sair, os seguranças barrando-me a entrada no elevador. — Saiam da minha frente! — Apesar do tom alterado da minha voz, eles não se moveram. — A assassina está presa, não há mais perigo algum, Richard deve ter esquecido de dispensar vocês. Se não me deixarem passar, pulo pela janela. Ambos se entreolharam, antes de cederem-me passagem, embora entrassem atrás de mim no elevador, um deles tirando o celular do bolso do paletó, obviamente com o intuito de avisar Richard sobre minha saída. Bastardos! Ao alcançar o andar térreo, não mais consegui segurar o pranto e as lágrimas escorreram abundantes pela minha face, as malditas imagens daquele vídeo repassando-se em minha mente, repetidamente. Como Richard pôde? Como a própria Lindsay dissera, ele nunca pertenceria a uma mulher apenas, provavelmente tinha traído Elizabeth com Olívia muito mais vezes do que confessara, afinal ninguém se tornaria tão perturbada a ponto de cometer uma série de assassinatos por causa de uma transa apenas. Certamente Lindsay era amante dele desde que começara a trabalhar na Thrive, há cinco anos e como ela mesma afirmara, as outras, como eu, entravam e saíam da vida dele, enquanto ela permanecia. Maldito! Eu o odiava! Como pôde? Como pôde? Quando saí na rua, desnorteada, o Mercedes estacionou diante de mim, os dois seguranças tentando me empurrar para dentro, mas eu precisava me livrar deles, ou em questão de tempo Richard me encontraria e eu me recusava a olhar para ele de novo. Então, agindo por impulso, saí correndo pela calçada, fazendo uso de toda a minha velocidade, atraindo a atenção dos transeuntes que se arriscavam a caminhar sob o sol escaldante. Não consegui ganhar muita distância, os saltos das sandálias e a saia colada do vestido me deixando em desvantagem, logo os dois brutamontes me alcançaram, cada um me segurando de um lado, quando então pensei rápido e decidi fazer uso de um método que nunca falhava. Comecei a gritar e me debater, histericamente, encenando uma tentativa de sequestro, atraindo a atenção das pessoas. Não demorou para que alguns homens nos cercassem ameaçando atacar os seguranças caso eles não me libertassem. Os dois tentaram explicar a verdadeira situação, no entanto, alterei meus

gritos, deliberadamente, impedindo os dois homens de serem ouvidos, deixando-os sem opção que não me soltarem, para que não fossem linchados pela população. Ótimo, eu havia conseguido. Sem perder tempo, parei o primeiro táxi que passava e entrei, sem saber dizer ao motorista para onde devia seguir. Embora estivesse certa de que seria bem recebida por Trinity no apartamento onde morava, eu não podia ir para lá, pois seria o primeiro lugar onde Richard me procuraria, se procurasse, pois talvez ele se sentisse aliviado por se livrar de mim tão facilmente, afinal eu já não precisava da proteção que o motivara a me levar para debaixo do seu teto, ele podia se lambuzar com a vadia da Lindsay sem que eu estivesse no caminho para atrapalhar, apesar de que minha presença não o detivera, mesmo eu estando do outro lado da parede, ele tivera relações com ela. Droga! Mil vezes droga! E pensar que eu chegara a acreditar que ele me amava. “Estúpida! É isso que eu sou!” Mais uma vez eu estava perdida e apenas Tom poderia me ajudar. Então liguei para ele. — Oi amigo, preciso de você. — Meus soluços partiam altos. — O que o gostosão aprontou dessa vez? — Só você vendo para acreditar. O fato é que eu preciso de um lugar para ir e não tenho. — E o nosso apartamento? Seu lugar ainda está lá. — Não. Não quero vê-lo, se ele me procurar. O que eu duvido muito. Ele fez uma pausa, como se ponderasse as possibilidades. — Se hospeda em um hotel e me liga quando chegar lá. Vou levar a Trinity, ela tá morta para te ver. — Leva sim. Também estou com saudades dela. Até daqui a pouco. — Até. Eu estava tão transtornada que não me recordei do nome de nenhum hotel em Houston, então pedi ao motorista que me deixasse diante de qualquer um que fosse limpo e seguro. O homem de origem latina aparentemente me considerara uma pessoa endinheirada, pois parou em frente ao Hilton Américas, um dos mais caros e luxuosos hotéis da cidade, localizado no centro. Um edifício suntuoso, com uma estrutura futurística que ostentava luxo e modernidade em cada detalhe. Embora estivesse ciente de que uma diária ali era equivalente a um mês do meu salário na lanchonete onde trabalhara por quatro anos, me hospedei, afinal Tom pagaria minha estadia e alguns milhares de dólares a menos no cartão de créditos ilimitado que seu pai lhe dera, passariam despercebidos. Ao entrar na luxuosa suíte, com paredes em marfim, uma antessala decorada com móveis luxuosos e um quarto amplo, com cama, poltronas estofadas, frigobar, aparelhos eletrônicos de última geração e um mimoso jogo de mesa com cadeiras. Liguei para Tom avisando onde estava. Enquanto o aguardava, fui ao frigobar e me servi de uma garrafinha em miniatura de vodka, ingerindo o líquido gelado, como se o álcool fosse capaz de amenizar minha dor, embora eu soubesse que nada seria. Esvaziei a garrafinha e peguei outra, estendendo-me sobre a cama confortável, sentindo-me como se estivesse sufocando, me afogando em uma piscina sem fundo, sem que ninguém pudesse me salvar. Richard estava me proporcionando todas as experiências afetivas que eu nunca tivera, em questão de horas me transportara do paraíso ao inferno, da certeza de que me amava de verdade, de que eu era especial em sua vida, para a amarga realidade de que eu não passava de mais uma em sua cama,

como tantas outras. Por isso ele parecia frio e distante quando estava no trabalho, aquele era o verdadeiro Richard, o homem que priorizava o dinheiro em detrimento de tudo o mais. Para ele uma mulher como eu, ou como Lindsay, era apenas um buraco onde ele enfiava seu pau para relaxar de vez em quando. Não havia sentimentos nele. Se houvesse não teria transado com sua secretária quase na minha frente. Obviamente fazia aquilo todos os dias, uma foda de manhã para relaxar antes de pegar no batente. Em um ponto Lindsay estava certa: de todas as mulheres que passaram por ele, ela era a mais próxima, aquela que sempre estaria lá à sua disposição. E apesar de ser mais uma que ele usava para a própria satisfação, todas as outras queriam estar no lugar dela, já que seu cargo lhe garantia a participação diária na rotina dele. Que merda! Por que essa porra doía tanto? Tinha sido apenas uma desilusão amorosa, pela qual toda mulher passava um dia, pela qual Trinity passara com Noah. Essa porra parava de doer um dia? Meu estoque de lágrimas parecia ter se esgotado quando o interfone tocou e a recepcionista a anunciou a chegada de Trinity e Tom. Enquanto eles subiam, corri até o banheiro para limpar minha face das manchas negras deixada pelo meu rímel borrado pelas lágrimas. Tentei me recompor, parecer equilibrada e madura ao lidar com a situação, como deveria, todavia, quando a campainha tocou e vi meus dois melhores amigos, voltei a desabar, reiniciando o pranto ao me atirar nos braços deles. — Oh amiga, eu sinto tanto por tudo isso. — Trinity me apertou com mais força quando Tom se desvencilhou de nós. — Não fica assim, essa dor passa com o tempo. — Tá, agora me conta tudo com detalhes. O que o gostoso aprontou? — Tom deixou-se afundar em uma das poltronas, eu e Trinity unimo-nos a ele, sentando lado a lado na outra. Tirei meu celular da bolsa, dei play no maldito vídeo e entreguei o aparelho a ele. Ao observar as imagens, a expressão do seu rosto foi tão cômica que quase sorri. Ele estava simplesmente de queixo caído, enquanto repassava as imagens, repetidamente. — Uau! Ele parece ser bom no que faz! — Não é hora para brincadeiras, Tom, me dá isso aqui. — Trinity tomou o aparelho das mãos dele e ficou corada ao observar a cena gravada. — Mas quem é essa afinal? — A secretária dele. Todas as manhãs, ao chegar à empresa, ele a chama em sua sala. Passam horas sozinhos lá dentro. Agora eu sei fazendo o quê. Ela me enviou o vídeo hoje depois que ele saiu. — Mas que vaca! — Trinity estava perplexa. — E que cachorro. — Tom completou. — Ele é o mais errado da história. Você nunca tinha desconfiado de nada? — Sim. Mas ele disse que tinha acontecido apenas uma vez e foi antes de me conhecer. — E quem te garante que ela não gravou isso dessa vez? — Ela estava usando a mesma saia hoje. — Na foto que vi de vocês no noticiário, ele estava com um curativo na testa, você verificou se não está lá no vídeo? — Tentei, mas não dá para ver o rosto dele, está enterrado naquela vadia. Tom foi até o frigobar, de onde tirou três miniaturas de garrafas de vodka, uma para cada, fazendome provar a dele antes de beber, quando então não pude deixar de sorrir. —Você não está mais fazendo abstinência de álcool?

— Não. O Taylor não merece um minuto da minha mente sem álcool. — Quis perguntar como estavam as coisas entre eles, mas ele continuou falando. — Eu acho que você está fazendo uma tempestade num corpo d’água. Você devia ter conversado com ele antes de tirar suas conclusões. Esse vídeo pode ter sido gravado há anos, ela pode ter usado a mesma saia propositalmente. Refleti sobre as palavras de Tom e embora estivesse ciente de que havia a possibilidade de ele estar certo, meu coração se recusava a acreditar, aquela maldita dor se negando a me deixar. — Ele está certo, Dak. Você devia conversar com o Richard sobre isso. — Faço isso outro dia. Não é só esse vídeo que está me incomodando, Richard é muito prepotente, se acha o dono do mundo. Vocês acreditam que ele planejou procurar um apartamento maior para nós dois, sem antes me perguntar se eu queria continuar morando com ele? A expressão que surgiu nos olhos de ambos, enquanto me fitavam, era a mesma confusão, como se não compreendessem o sentido da minha mágoa. — Ok! Eu posso estar errada. Mas minha cabeça funciona assim. Eu não sei se estou preparada para ter Richard Parker controlando a minha vida para o resto dos meus dias. — Você não o ama? — A voz de Trinity era um fio. — Mais que tudo na vida. — Então, amiga, o resto são apenas detalhes sem importância. Converse com ele, dê-lhe a chance de provar que esse vídeo não foi gravado hoje, se ele conseguir fazer isso, mergulhe de cabeça nesse amor e o viva, porque a vida pode não te dar uma segunda chance. Trinity estava totalmente certa. De repente eu já não via um sentido em ter fugido do escritório, ou em estar aqui. Eu devia tê-lo esperado para uma conversa. Estúpida! — Mas mudando de assunto, a polícia já tem alguma pista sobre o autor do atentado contra vocês? — Tom pegou mais três garrafinhas de vodka, servindo-nos. — Foi à mesma mulher que matou todas as outras com quem Richard se relacionou, inclusive Elizabeth, a quem todos acreditavam ter suicidado. Ela foi presa esta tarde. Estou livre agora. — Menina, mas que babado! Me conta tudo! Narrei a eles toda a série de assassinatos realizados por Olívia, ignorando o termo de confidencialidade que Richard me fizera assinar quando comecei a escrever sua biografia. A noite caiu e ainda estávamos ali conversando, apenas deixando o tempo passar, como era antigamente. A presença descontraída deles amenizando minha agonia, a agonia de saber que o único homem a quem eu fora capaz de amar transava com sua secretária quase na minha frente, tomava decisões sobre a minha vida sem antes me consultar, todavia, também era o homem que encontrara minha filha e o único que tinha o poder de trazê-la para mim, embora nem isso me fizesse voltar para ele se aquele maldito vídeo realmente tivesse sido gravado esta manhã. Quando a vodka do frigobar acabou e todos concordamos que minha recente liberdade de uma perseguidora perigosa merecia ser comemorada, no melhor estilo, então fomos a uma movimentada danceteria que costumávamos frequentar na época da faculdade.

CAPÍTULO XXX Eu dirigia minha BMW em meio ao caótico trânsito do centro da cidade, em direção à delegacia quando um dos seguranças me ligou para me informar que Dakota fugira mais uma vez, aprontando um escândalo na rua para livrar-se deles. Tudo isso após ter se envolvido em uma rápida discussão com Lindsay, durante a qual meu nome fora pronunciada várias vezes, sem que o segurança tenha compreendido claramente o motivo ou o assunto pertinente à briga. No mínimo Lindsay tinha aprontado algo contra Dakota, por causa do seu ciúme infundado. Apesar de ser uma excelente profissional, com um raciocínio rápido, propício aos negócios, de conhecer a Thrive como poucos, de falar vários idiomas, dispensando a intromissão de tradutores durante reuniões importantes e de trabalhar comigo há mais de cinco anos, eu não hesitaria em demiti-la se tivesse aborrecido Dakota de alguma forma. No fundo eu já esperava por isso, Lindsay possuía uma capacidade de persistência que me impressionava. Desde que nos vimos pela primeira vez, ela fizera questão de deixar claro seu interesse e apesar de ter-me permitido deslizar uma única vez, há alguns anos, em um momento de solidão e de ter deixado claro, na ocasião, que não aconteceria novamente, ela jamais desistira. Acreditava piamente que um dia eu assumiria uma relação com ela, por isso a preservava do sexo casual. Era uma ilusão que ela mesma implantara em sua mente. — Encontre-a. — Minha voz soou grave no interior da BMW, uma fúria cega tomando conta de mim. — Estamos a caminho do apartamento onde ela morava. Se não estiver lá... — Não me importam seus passos! — O interrompi, sem disfarçar minha raiva. — Quero apenas que a encontre o mais depressa possível e me ligue logo que o fizer. Sem mais, encerrei a ligação, ligando para Dakota, seu celular tocando insistentemente, sem que ela atendesse. Merda! O que estava acontecendo? Cogitei desistir de ir à delegacia e me dedicar a procurá-la, mas se os seguranças que foram treinados para isto ainda não conseguiram encontrá-la, não seria eu a conseguir. Além do mais, precisava falar com Olívia. Chegando à delegacia, um prédio modesto, com a pintura descascando, que se destacava pela sua precariedade em meio aos edifícios mais modernos do The Gallery, diante do qual um pequeno e irritante grupo de repórteres se encontrava, dirigindo-me suas câmeras e bombardeando-me com suas perguntas idiotas, sem que obtivessem resposta. Fui encaminhado por um policial uniformizado à sala do chefe da divisão de homicídios Neil Stuart, um homem parrudo, cuja barba cobria-lhe praticamente todo o rosto. Era um velho conhecido, um homem difícil de lidar, pelo menos por mim, já que durante muito tempo me considerara o principal suspeito pelos assassinatos das mulheres com quem me relacionei. Após os formais cumprimentos, ele gesticulou para a cadeira diante da sua mesa, sugerindo que

me sentasse. Impaciente, irritado com a demora daqueles incompetentes em encontrar Dakota, sentei-me. — Finalmente conseguimos resolver esse caso tão complexo que o envolvia, Sr. Parker. “Fizeram o trabalho de vocês finalmente e graças à perspicácia de uma menina de vinte e dois anos de idade.” — Olívia confessou? — Limitei-me a indagar. — Ela ainda não foi interrogada. Não houve tempo, acabamos de apanhá-la. Mas não foi necessário uma confissão para que soubéssemos que foi ela. Havia muitas provas no lugar. — Que lugar? — Ela foi encontrada em uma casa próximo ao lago Nacogdoches, que pertencia aos seus pais. O senhor sabia que ela era filha única e herdou uma fortuna depois que os pais morreram em um acidente de carro? — Eu não sabia. Foi acidente ou assassinato? — Isso ainda vamos investigar, embora meu faro esteja me avisando de que não foi um simples acidente. E quanto ao senhor, devia prestar mais atenção nas pessoas com quem convive. Ele não precisava dizer aquilo, eu já estava me torturando o suficiente pela minha parcela de culpa. — Ela matou Elizabeth, não foi? — Ao que tudo indica, sim. Uma náusea atravessou meu estômago. — Preciso falar com ela. — Isso não será possível. Ela acabou de chegar, ainda nem foi interrogada. Nesse país, existiam poucos homens que não se deixavam comprar, e Neil Stuart definitivamente não se enquadrava nessa categoria, o que era um fator positivo, considerando que o suborno era a forma mais rápida e eficiente para que homens como eu conseguíssemos o que queríamos. Então, lentamente, puxei meu talão de cheques do bolso do paletó, junto com uma caneta. — Quanto? Ele olhou para os dois lados, como se inspecionasse se alguém nos observava, embora estivesse ciente de que havia apenas nós dois na sala precária, sem ar condicionado. Fingiu um breve desconforto, antes de declarar: — Sr. Parker, o dinheiro não compra tudo. — Eu sei disso. Mas considerando que você poderá estar pilotando uma lancha nova amanhã mesmo, em Galveston, se assim desejar, eu acho que posso falar com Olívia. Ele encenou um novo desconforto, mexeu no nó da sua gravata, pigarreou, então concordou. — Acho que posso te ceder uns vinte minutos com ela, mas não mais que isso. Seu olhar curioso se esgueirou até a folha de cheques enquanto eu a preenchia, uma expressão de contentamento se refletindo ali, quando segurou o pedaço de papel entre seus dedos, observando a quantia. — Vamos, eu o levo pessoalmente até a cela dela. — Enfiou o cheque no bolso do seu paletó desbotado, antes de se levantar, conduzindo-me para o andar térreo, para os fundos, onde havia um longo e mal iluminado corredor, ao longo do qual se estendia várias celas, abarrotadas de prisioneiros. Paramos diante da última delas, onde Olívia se encontrava sozinha, de costas para nós, fumando

um cigarro. Virou-se ao ouvir o cadeado sendo destrancado. Seus olhos escuros, desprovidos de qualquer emoção, encontrando os meus. Ela tinha mudado pouco desde a última vez que eu a vira, há cerca de cinco anos. Ainda usava os cabelos num corte curto e discreto e a pele estava bem cuidada, como sempre. Vestia um conjunto de blusa e saia longa cinza. Não era uma mulher sofisticada, tampouco elegante. Tinha a aparência de uma dona de casa suburbana que vestia uma roupa melhor para ir ao supermercado, nada além disso. Além do seu olhar frio, não havia nenhum outro vestígio da assassina perigosa que era. — Volto em vinte minutos. — Stuart trancou novamente a cela, depois da minha entrada. — Cuidado para não matá-la, ela ainda precisa ser interrogada. — E ele se afastou. — Ora, ora, ora, um dia o grande Richard Parker viria até mim por livre e espontânea vontade. — Sua voz era mansa, sem emoção alguma. — Por que, Olívia? — Toda a minha angústia, minha agonia, a dor que me acompanhava constantemente, há tanto tempo, por tantas perdas, pareciam expostas em minha voz. Sem deixar de me encarar, ela deu uma grande tragada no cigarro, preenchendo o pequeno espaço com a fumaça. — Tem certeza que você não sabe? — Foi por causa do que você me disse naquela noite, no aniversário do amigo de vocês? — Exatamente, Richard. — Ela falava com a naturalidade de quem recitava a receita de um bolo para uma amiga. Ela acabava de confessar que assassinara todas as mulheres de quem gostei, sem mover sequer um músculo da sua face. Lembrei-me de Elizabeth, do quanto confiava naquela maldita, acreditando que era sua melhor amiga e meu coração sangrou, as lágrimas quase me alcançaram os olhos. — Elizabeth era sua amiga. Como pôde? — Não jogue toda a culpa em cima de mim. Você foi avisado. Naquela noite eu te disse o quanto te amava, que estava com David apenas para ficar perto de você e você não fez nada. Simplesmente ignorou meus sentimentos. Continuou com aquela vadia. Minha vontade era de agarrar no pescoço dela e apertar até que estivessem sem vida. — E todas as outras? Ela tragou novamente o cigarro, demonstrando irritação, sua primeira emoção, desde que eu chegara. — O motivo foi o mesmo. Você tinha que ficar comigo e não com elas. Nenhuma delas te amava como eu. — Você devia ter acabado comigo, não com elas, porque eu nunca quis você. Aquela noite só transamos porque eu estava bêbado. Jamais teria feito aquilo de caso pensado. — Como eu poderia fazer mal a você, se eu te amo? — Ela parecia não ter me ouvido. — Eu te amo loucamente, Richard, sempre amei desde que vi você pela primeira vez, na faculdade. Eu teria feito você feliz, como nenhuma daquelas vadias conseguiu fazer. Eu era a mulher certa para você, você só precisava enxergar isso. Ela não falava coisa com coisa, parecia uma louca. — Você teve algum cúmplice? Levou o cigarro à boca novamente, desta vez sua mão estava trêmula.

— Está vendo? Você está fazendo de novo. Eu acabei de abrir meu coração, dizendo o quanto te amo e você não liga, não faz nada a respeito. — Mesmo que você fosse à última mulher da face da terra, eu não te queria perto de mim. — Um ódio mortal se expressou em seus olhos escuros arregalados que me fuzilavam. Passou a levar o cigarro à boca com mais frequência, tragando cada vez mais profundo, até que a brasa alcançasse seus dedos, sem que ela demonstrasse sentir a dor da queimadura. — Vou perguntar mais uma vez: você tem um cúmplice? — Não. Fiz tudo sozinha. Eu devia acreditar? — Como? — Quando se tem dinheiro, pode se conseguir muitas coisas, como você bem sabe. Eu gostaria de continuar aquela conversa, mudando meu comportamento, fingindo corresponder aos seus sentimentos, talvez, para que ela me falasse toda a verdade e eu sossegasse com a certeza de que Dakota estava totalmente segura agora, entretanto, Stewart apareceu para exigir minha saída. Deixei a cela sem protestar, sentindo-me meio desnorteado. Antes que me afastasse um metro, Olívia caminhou até as grades e me chamou. — Richard. — Virei para encará-la. — Não pense que porque estou aqui estarei inativa. A sua “cadelinha” vai morrer. O quê?! Como ela sabia que eu chamava Dakota assim em nossos momentos de intimidade?! Uma fúria descontrolada tomou conta de mim. Antes que eu pudesse evitar, meu corpo estava pressionado de encontro às grades da cela, com minhas mãos em torno da garganta dela, decidido a soltá-la somente quando ela não estivesse mais respirando, todavia, Stewart correu ao seu socorro, puxando-me para trás. Conseguiu impedir-me apenas porque um policial uniformizado viu de longe o que se passava e veio correndo ajudá-lo. — Maldita! Você vai ser condenada à morte e farei questão de ir assistir sua execução. — Eu estava fora de mim. — Mas se alguma coisa acontecer à Dakota, mesmo que seja um leve arranhão, você não viverá até lá, como você mesma disse, quando se tem dinheiro pode se conseguir muitas coisas. Sem mais, virei e caminhei o mais depressa que consegui até o lado de fora, Stewart me seguindo de perto. Na rua, inspirei profundamente o ar quente e seco, como se tentasse me desintoxicar do veneno daquela maldita assassina. — Eu vou fingir que não ouvi o que o senhor disse por último e pedirei ao guarda para fazer o mesmo, apenas para o caso de acontecer algo com ela o senhor não se tornar o primeiro suspeito da lisa. Fitei-o com espanto. O estado puniria alguém que fizesse a gentileza de matá-la? — Você ouviu o que ela disse: Dakota ainda está em perigo. Concentre-se nisso e descubra quem trabalha com ela. — Não leve muito em conta a ameaça dela. A mulher é desequilibrada e obcecada por você, diria qualquer coisa para ter sua atenção de volta. Logo ela receberá atendimento psiquiátrico e o profissional a fará falar tudo o que quisermos. Suas palavras me traziam um pouco de conforto. — Assim espero. Adeus. Atravessei a rua movimentada, entrando no meu carro estacionado no acostamento, inserindo-me

no trânsito infernal. Tentei ligar novamente para Dakota, quando então descobri que ela desligara seu telefone. Algo sério estava acontecendo e eu precisava descobrir o que era. Liguei para os seguranças, em busca de informações sobre o paradeiro dela, sendo informado apenas de que não se encontrava no seu antigo apartamento, assim como nenhum dos seus amigos. Estavam juntos em algum lugar. Os seguranças tinham deduzido o mesmo e vasculhavam bares e danceterias para jovens. Todavia, era sexta-feira, todas as casas noturnas de Houston estariam lotadas em questão de horas, dificultando sua localização. Cogitei voltar à Thrive e fazer Lindsay falar o que tinha acontecido, entretanto, no estado de fúria em que me encontrava, eu não responderia pelos meus atos se ela afirmasse ter ferido Dakota de alguma forma, sem mencionar que eu preferia ouvir primeiro a versão da minha menina, sobre o corrido, pois esta seria a verdadeira. Enquanto os malditos seguranças a procuravam, liguei para James solicitando que fosse ao meu apartamento fazer uma busca por escutas, pois obviamente foi assim que Olívia descobrira como eu chamava Dakota em nossos momentos de intimidade. Talvez as implantara no apartamento quando ainda o frequentava, há anos. Como eu esperava, James encontrou quatro escutas, uma em cada cômodo, tão discretamente escondidas que passaria despercebidas a qualquer um que não fosse um perito. Eram aparelhos modernos, novos, portanto foram colocadas ali há pouco tempo, certamente alguém invadira o lugar quando eu não estava. Tentando não enlouquecer com a demora dos homens em encontrar Dakota, ordenei que James se juntasse a eles a sua procura. Tentei ficar ali esperando, mas não consegui. Então voltei ao meu carro e passei a percorrer as casas noturnas da cidade, com a esperança de encontrá-la. Ligava de dois em dois minutos para os seguranças, sem que estes tivessem uma informação para me dar. A noite caiu, as horas passaram e nada acontecia. Eu tinha percorrido grande parte do subúrbio, quando um dos homens me ligou, me informando que a encontrara. Como eu imaginara, estava em uma danceteria, com os amigos. Dirigi em alta velocidade até o endereço fornecido pelo segurança. Tratava-se de uma daquelas danceterias diante das quais se formava uma fila de pessoas tentando entrar. Mais uma vez, meu dinheiro garantiu a minha passagem. Do lado de dentro, o lugar estava abarrotado de pessoas, jovens, em sua grande maioria; havia garotas seminuas dançando dentro de gaiolas aos cantos; a música era agitada, ensurdecedora; as garotas se vestiam com vulgaridade; casais se atracavam contra as paredes escuras; jogos de luzes coloridas brincavam sobre a pista de dança lotada; o ambiente era mal iluminado; o cheiro de álcool e cigarros estava impregnado no ar. Explorei o lugar vagarosamente, até que por fim a avistei, todavia, não me atrevi a me aproximar, em vez disso, sentei-me a uma mesa, de onde podia observá-la sem que minha presença fosse notada. Ela estava em pé diante do bar, ao lado de Tom e Trinity. Tom mantinha um baço em torno da cintura dela e se ele não fosse gay eu teria perdido o controle naquele momento. Dakota ainda usava o vestido colado com o qual estivera no escritório, estava sorridente como eu nunca a tinha visto, soltando gargalhadas com os amigos, enquanto ingeria sua bebida do copo com um canudinho. Não havia um só homem que passasse por ela que não jogava olhares maliciosos, embora ela parecesse alheia a todos eles. Ali, em meio às pessoas da sua idade e a toda aquela agitação, ela parecia realmente feliz, como

não era ao meu lado e foi isso que me desencorajou a chegar perto. Eu tinha a impressão de que minha presença poderia estragar sua diversão. Talvez eu estivesse errado em planejar uma vida ao lado dela, talvez no fundo ela não me amasse como acreditava e seu lugar não fosse ao meu lado, mas ali, em meio aos jovens despreocupados. O que eu era para ela? Um velho de trinta e sete anos de idade tentando dividir sua gigantesca bagagem de vida com uma menina de vinte e dois. Não seria justo com ela arrancá-la do seu mundo e prendê-la ao meu. Era ali, naquele mundinho agitado que ela parecia verdadeiramente feliz. E tinha tentado me dizer isso antes, quando fugira de Jordan na universidade para encontrar seu amigo em um bar, na ocasião em que ele fora envenenado. Ela estava apenas fazendo de novo. Agora que a assassina estava presa, ela se sentira livre para voar de volta para o seu mundo. Talvez não existisse discussão alguma com Lindsay, ela apenas tinha saído para se divertir em meio a pessoas da sua idade, entre as quais eu não me encaixava. O que eu estava fazendo ali mesmo? Tentando me intrometer na vida de uma garota que parecia mais feliz sem mim? Senti meu peito sangrar, como há muito não sentia, a depressão me tomou. Era mais uma despedida que eu precisava enfrentar, pelo menos desta vez eu não estaria perdendo para a morte, pelo contrário, a estava devolvendo à felicidade da qual tinha lhe tirado. Eu só precisava me levantar e sair. Por que isso era tão difícil? Por que me doía tanto a simples ideia de ficar sem ela? Porque eu a amava, como nunca tinha amado antes. Um amor que não seria vivido como eu acreditara quando desistira da minha partida. Ela não me convencera a ficar porque me queria, estava apenas cumprindo a heróica função de salvar uma vida. Agora me restava decidir se continuaria com essa vida ou não. Sem ela seria difícil seguir em frente, já que perdê-la era o mesmo que perder o motivo que vinha me mantendo vivo. Os três foram para a pista de dança. Precisei trocar de mesa para continuar observando-a. Estava tão linda, suas curvas perfeitas acentuadas pelo vestido colado enquanto movimentava-se ao sabor da música agitada. Ela dançava sorrindo, se movendo com leveza, jogando os cabelos emaranhados com tanta sensualidade que era difícil não ficar de pau duro apenas olhando. Eu tinha certeza que havia outros pervertidos ali, como eu, de pau duro olhando minha menina dançando. Eu estava hipnotizado, sem conseguir desviar meus olhos dela. Raiva, tristeza, amor, desejo, tudo se misturando dentro de mim, me tomando ao mesmo tempo, um confuso turbilhão que obstruía meu raciocínio a ponto de não me deixar fazer a coisa certa, que seria ir embora. Um garoto da idade dela aproximou-se, dançando à sua frente, quase roçando seu corpo no dela, a cena fazendo a raiva sobressair-se a tudo mais dentro de mim. Eu estava quase perdendo o controle. Mas Dakota se esquivou, evitando-o, virando-se para dançar na frente de Tom. Ótimo. Essa era a minha garota. Contudo, o garoto era insistente, colocou-se entre ela e Tom, quase se esfregando nela novamente. Filho da puta! Dakota tentou se esquivar, ele não deixou, se colocava na frente dela para onde quer que ela virasse. Merda! Por que ela não saía dali? Talvez não quisesse, talvez o jogo fosse uma diversão, coisa de jovens. De súbito a música agitada foi substituída por uma melodia romântica e o garoto a segurou pela cintura, prendendo-a contra seu corpo. Ela não queria e isso ficou claro como a luz do dia. Por que ninguém fazia nada? Por que Tom não interferia? Eu estava quase perdendo o controle e indo lá, mas me ocorreu que eu podia atrapalhar o que não

passava de diversão para ambos. Então, ele tentou beijá-la na boca, desta vez ela foi enfática ao se negar, começou a se debater, tentando se libertar, mas não era forte o suficiente. E no instante em que ele conseguiu apossar-se, forçadamente, dos lábios dela, eu explodi, exteriorizando o animal de havia em mim. Cego pelo ciúme, pela revolta, pelo sentimento de posse que aquela menina me despertava, caminhei na direção deles, sem me importar com as pessoas nas quais esbarrava pelo caminho. “Foda-se a minha idade, foda-se o fato de que ela prefere estar em um bar que no aconchego de um apartamento, foda-se o fato de ela não me amar. Foda-se tudo!” Violentamente, agarrei o cretino por trás, pelos ombros, arrancando suas patas imundas de Dakota, arremessando-o para longe, com tanta força que ele foi cair a mais de dois metros de distância, os casais de dançarinos se detendo para observar a cena. Voltei-me para a mulher que eu amava, ofegante pelo esforço, deparando-me com seus grandes olhos azuis atônitos, faiscando de raiva, o que me levou a crer que, como eu suspeitara, ela estava gostando do assédio daquele moleque, sua recusa fazia parte de um jogo de sedução que eu acabara de interromper. Minha vontade era de jogá-la no ombro e levá-la de volta para o meu apartamento. Mas eu não podia fazer isso, podia? — O que você tá fazendo aqui? — Seu tom, assim como seu olhar estavam carregados de ódio, além de denunciar o fato de que ela estava completamente bêbada. — Eu não sei. Estou me perguntando à mesma coisa desde que cheguei. Não satisfeito, o garoto esmurrou-me as costas com punhos cerrados, quando então levei toda a minha energia no meu gancho de direita, energia esta intensificada pela raiva, pelo ciúme, por todas as constatações que fizera há pouco e precisei desferir-lhe um soco apenas para que ele ficasse no chão desacordado. Ao virar-me novamente para Dakota, Trinity e Tom haviam se colocado um de cada lado dela, como se fizessem sua segurança. Por que a estavam tentando proteger de mim? Não fora eu que a assediara. — Vá embora daqui. Dakota nunca vai te perdoar! — Foi Trinity quem esbravejou. — Me perdoar? Mas o que eu fiz? — Não tem mais como esconder, grandão, a Lindsay enviou o vídeo para o celular dela. — Tom esclareceu. Então Lindsay realmente aprontara como eu suspeitara inicialmente. Ainda assim Dakota estava errada, por não me esperar para conversarmos. — Dakota, precisamos conversar. — Tentei. — Ah, agora você quer conversar? — Sua voz estava pastosa por causa da embriaguez. — Pensei que preferisse fazer sexo oral na sua secretária. Mas que porra! Eu não estava com paciência para enigmas depois do dia infernal que tivera. Então, agindo como homem das cavernas, pendurei-a em meu ombro e tentei sair. Tom tomou-me o caminho. — Nem tente Tom, ou vai ficar igual ao cara caído no chão e eu detestaria ter que fazer isso com você. — Foi o suficiente para que ele se afastasse. Dakota se debatia sobre o meu ombro, tentando escapar, enquanto eu a carregava para a saída, entretanto, antes de alcançá-la, quatro homens parrudos, que pareciam fazer a segurança da casa,

tomaram-me a frente, encarando-me com ameaça. Eu não conseguiria bater nos quatro. — Coloca a garota no chão, cara. — Olha para mim irmão, eu sou Richard Parker e essa é Dakota Thompson. Vocês viram as notícias, tirem suas conclusões. Eles se entreolharam, discutiram entre si e por fim abriram passagem. Ótimo. Carreguei Dakota até a BMW estacionada do outro lado da rua. No instante em que a acomodei no banco do carona, ela inclinou-se para vomitar no carpete do carro, lambuzando tudo por ali. Não tinha problema algum, afinal era apenas um carro. Fiz a volta e tomei o volante, dando a partida, satisfeito por estar levando-a comigo. Se a tivesse deixado para trás, como cogitara por um breve momento, eu não estaria saindo dali completo. — Você me traiu Richard, como pôde? — Com essas palavras, ela pegou no sono. Estava bêbada, mas pelo menos estava segura. Segurei o volante com uma mão apenas, usando a outra para invadir sua pequena bolsa preta, tirando seu celular. Tom mencionara um vídeo, então procurei por ele e lá estava, enviado pelo número do celular de Lindsay a gravação da ocasião em que transamos, há anos. Maldita, filha da mãe! Eu a faria pagar tão caro por isto, que ela se arrependeria até por ter nascido. Apesar de a raiva correr solta em minhas veias, pouco a pouco a tranquilidade foi me invadindo, como um edredom macio me cobrindo durante uma noite fria, enquanto eu dirigia de volta para River Oask. A certeza de que minha pequena não fugira de mim deliberadamente e sim de algo que acreditava que eu tinha feito, afastando a insuportável dor que o receio de perdê-la tinha me causado.

CAPÍTULO XXXI Despertei com uma dor aguda, insuportável na cabeça. Tentei abrir os meus olhos, as luzes do sol entrando pela janela me ofuscaram, quase me cegando. Tentei com mais veemência até que reconheci o quarto de Richard. Merda! Mais uma vez ele tinha ignorado minha decisão e me trouxera de volta sem a minha permissão. Varri o lugar com os olhos à sua procura, estava sentado em uma poltrona, usando apenas uma bermuda, o corpo lindo à mostra, me fazendo salivar e subitamente tomei consciência de que usava apenas minha calcinha. Mas que inferno! Nem mesmo o odiando eu conseguia parar de desejá-lo. Ele colocou-se em pé, foi até o criado mudo, onde havia um copo d’água, pegou-o e me ofereceu junto com um comprimido. — Bebe isso, vai ajudar com a dor na sua cabeça. Olhei dentro dos seus olhos, relembrando das imagens daquele maldito vídeo, a dor em minha cabeça tornando-se insignificante diante daquela que me invadia a alma. — Não quero nada de você, a não ser distância. — Tentei me levantar, uma fisgada aguda na cabeça me impediu. — Mas que droga, Dakota, será que dá para parar de agir como criança?! — Por que ele estava irritado, se fui eu a ser traída? Fiz uma segunda tentativa de deixar a cama, desta vez ele usou suas mãos para ajudar-me a sentar, apoiando minhas costas na cabeceira da cama, sentando-se diante de mim com a intenção de obstruir minha passagem com seu corpo grande. — A porra daquele vídeo não foi gravado ontem como você pensa, mas há três anos, quando estava deprimido de tanta culpa e solidão. — Nossa! Eu vi o quanto você estava deprimido com sua cara enfiada na vagina daquela vaca. — Engole o comprimido, Dakota. — Ele suspirava impaciente, o tom da voz tão autoritário que me vi recebendo o comprimido da sua mão e o engolindo com a água. Foi até a poltrona onde estivera sentado, voltando com um computador ligado, colocando-o sobre minhas pernas. No monitor do moderno aparelho, estavam sendo exibidas imagens da sala dele na Thrive, Lindsay estava sentada do lado de cá da sua mesa, fazendo anotações, enquanto ele ocupava o seu lugar. Não pude deixar de notar que ela usava o mesmo conjunto lilás com o qual estava vestida ontem. Outra evidência de que se trava de um vídeo recente, era o curativo na testa dele. — O que significa isso? — Eu estava confusa. — Há câmeras em todas as dependências da Thrive, o que inclui minha sala. Como você pode ver na data exibida no canto esquerdo inferior do vídeo, essa é a gravação de ontem de manhã, assista e me diga se vê algo semelhante ao vídeo que ela te enviou pelo celular. — Observei as imagens enquanto os minutos se arrastavam. Não havia nada ali, apenas a vadia e Richard trabalhando. — Se você clicar no botão que tem uma seta para a frente, o vídeo vai avançar mais depressa, embora todas as imagens continuarão sendo exibidas. E se quiser ver os dias anteriores, ou esse exato

momento, basta usar o teclado. Cliquei no botão que ele me mostrou e as imagens passaram mais depressa. Em cerca de meia hora, vi todo o dia de ontem na sala dele. O momento em que Lindsay entrou e saiu, quando almoçamos juntos e por fim quando ele deixou o recinto com sua valise na mão para ir à delegacia. Não havia como duvidar, o vídeo que Lindsay me enviara não tinha sido gravado ontem, entretanto, tinha sido real. — Não aconteceu ontem, mas não significa que não tenha acontecido. — Aconteceu, há três anos e eu nunca escondi isso de você. — E como vou ter certeza que isso foi gravado há três anos e não recentemente? Ele levantou-se, percorrendo os dedos pelos cabelos, irritado, antes de voltar a me fitar, quando vi a mágoa refletida em seu olhar. — Se você me ama como diz, precisa aprender a acreditar em mim. Eu estou dizendo que tive relações com Lindsay apenas uma vez, há três longos anos e não estou mentindo. No fundo ele estava certo, eu precisava confiar nele, afinal nunca me dera motivos para duvidar da sua palavra. Lindsay tinha armado aquilo para nos separar e eu estava permitindo que ela alcançasse seu objetivo. — Está certo, eu admito que errei em acreditar naquela escrota. — Admiti. — Mas aquelas imagens vão demorar muito tempo para saírem da minha cabeça. — E isso significa exatamente o quê? — Eu não faço à mínima ideia. — Você vai desistir de nós dois por causa disso? — Ele parecia inseguro. Era estranho vê-lo assim, um homem poderoso, que se considerava o dono da verdade. — Não. Mas não continuaremos de onde paramos. Há coisas que precisam ser conversadas. — Ah! Agora você acha que precisamos conversar. Devia ter pensado nisso antes de sair por aí enchendo a cara com seus amigos. — O Richard arrogante que eu conhecia estava de volta. — Você não errou apenas em acreditar nas mentiras daquela mulher, mas também em não ter me esperado chegar para ouvir o que eu tinha a dizer a respeito. Foi correndo para farra. — Ele parecia furioso e eu tinha que concordar com ele. Porra! — Não me culpe por tudo Richard, você também foi errado em decidir que alugaria um apartamento maior para nós dois sem antes me consultar. Ele fitou-me com espanto. — E qual o problema? Você não quer mais viver comigo? — Mas é claro que eu quero. O fato é que você tinha que ter me consultado antes. Foi arrogância da sua parte. Você desvaneceu minha opinião, como se minha vontade própria não importasse. — Acontece que eu sou arrogante por natureza e se você realmente quer ficar comigo, precisará aprender a me aceitar como sou. — Ele fez uma pausa, como se escolhesse cada palavra. — Você precisa decidir o que quer fazer da sua vida, Dakota. Você me parecia feliz como nunca a vi antes naquela danceteria, junto com as pessoas da sua idade. Não estou dizendo que você precisa parar de sair com seus amigos se vier morar comigo, ou que escolha entre eu e eles, estou dizendo que você precisa ter certeza de que realmente quer fazer parte da minha vida, mesmo sabendo que eu não me encaixo na situação em que você estava ontem. Fitei-o sem saber exatamente o que dizer, meu coração apertando no peito, como se tentasse me sufocar. Como ele podia acreditar, pelo menos por um segundo, que eu o deixaria porque não tem a

minha idade e não gostava as mesmas coisas que eu? Como pôde passar por sua cabeça que eu estava feliz ali, sem ele, acreditando que tinha sido traída? — Eu não estava feliz, Richard. Eu estava bêbada. — Vi a confusão na sua expressão. — Nunca passaria pela minha cabeça te deixar apenas porque não curtimos as mesmas coisas. — Pensa bem Dakota. Se você decidir ficar comigo, será para sempre em definitivo. Você precisará parar de fugir sem que eu saiba para onde foi. Meu coração saltou dentro do peito, minhas mãos transpiraram. Ele me queria para sempre e em definitivo ao seu lado. Quem precisava de uma conversa sobre apartamentos quando tinha ouvido uma coisa daquelas? Ao seu modo, grosseiro e arrogante, Richard conseguia ser romântico e me fazer suspirar de paixão. Eu teria pulado no pescoço dele naquele instante, se as malditas imagens daquele vídeo não estivessem pressas em minha mente, recusando-se a me deixar, como uma barreira intransponível que se erguera entre mim e meu amor. Eu não conseguiria deixá-lo me beijar, enquanto me recordasse do que vi naquelas imagens. — Eu quero ficar com você para sempre e definitivo. — Vi o brilho surgir em seu olhar, o canto da sua boca se curvar num sorriso mais que sedutor, entretanto, quando ele se curvou para tomar-me os lábios, me esquivei. — Mas preciso de um tempo para esquecer o que vi. — Completei. Ele afastou-se espantado, refletiu por um instante, com seus olhos presos aos meus, antes de concordar. — Eu te dou o tempo que você precisar. Só espero que não seja muito longo. — Foi até o cabide, pendurando a toalha no ombro antes de seguir para o banheiro. — Agora vamos trabalhar. Não vejo a hora de expulsar aquela vagabunda da minha empresa. Tirando a parte em que ele queria ficar comigo para sempre e em definitivo, essa foi à melhor coisa que ouvi aquela manhã. Esperei que ele tomasse o seu banho e apresei-me em entrar no banheiro antes que o visse se livrar da sua toalha bem ali na minha frente, pois ficar na presença daquele homem enquanto estava nu, sem atirar-me em seus braços, era uma experiência que já tinha vivido antes e não dera muito certo. Pelo menos desta vez ele respeitou minha decisão de darmos um tempo e vestiu-se antes que eu saísse do banheiro. Enquanto descíamos o elevador, retornei as dezenas de ligações não atendidas e Trinity e Tom, garantindo-lhes que estava tudo bem. Ao deixarmos o prédio, estranhei que o Mercedes estivesse nos esperando, ainda com um segurança armado dirigindo e outro ocupando o assento do carona. — Por que os seguranças, Olívia já não está presa? — Nos acomodamos nos assentos traseiros, para que logo o motorista nos inserisse no trânsito movimentado, em mais um dia de sol escaldante. — Precaução nunca é demais. — Ele não me fitou diretamente ao falar, estava escondendo-me algo e eu queria saber do que se tratava. — Seja sincero Richard. O que há de errado ainda? O que ela disse quando vocês conversaram ontem? Ele fez um longo momento de silêncio antes de prosseguir. — Acho que ela pode ter um cúmplice. — Ela disse isso? — Não diretamente.

Então, ele revelou-me detalhadamente a conversa que tivera com a assassina. Ao final da sua narrativa eu estava quase chocada com a frieza como ela agia, tirando a vida da melhor amiga, sacrificando tantas outras por causa de uma loucura. Concordei com o chefe de polícia, sobre o fato de ela ter feito uma última ameaça apenas para atrair a atenção de Richard, afinal se ela tivesse um cúmplice não teria ido pessoalmente ao bar quando tentou me envenenar, a não ser que este cúmplice fosse alguém que eu conhecesse e eu não conhecia ninguém que tivesse razões para ajudá-la, pois Anthony era irmão de Elizabeth, não contribuiria com a morte dela. Entretanto, uma reles mortal como eu, não convenceria Richard a se livrar dos seguranças. Seria perda de tempo tentar. Na Thrive, ao deixarmos a elevador no andar em que ficava sua sala, Richard avançou tão ferozmente para Lindsay que eu quase senti pena dela. — Você está despedida, Lindsay. Junte suas coisas e vá embora da minha empresa agora mesmo. — A voz dele era estrondosa como uma trovoada violenta. — Eu vou ser generoso com você e te dar uma boa carta de recomendação, não que você mereça. No entanto, se algum dia, você aparecer na minha frente de novo, ou na de Dakota, eu esquecerei toda a minha bondade e então você estará acabada. Será que fui claro? Ela o fitava com olhos arregalados, apavorados, como se jamais tivesse passado pela sua cabeça que seu plano ridículo para nos separar pudesse ser descoberto. Ela não era apenas louca, era muito burra também. — Sr. Parker... Richard... E-eu... — Ela parecia tentar se justificar, mas a voz não saía. — Nem uma palavra. Caia fora daqui agora! Com isto, o homem que eu amava, segurou-me a mão, conduzindo-me para a sua sala, onde permaneci durante longas e fatídicas horas, observando-o trabalhar, tornando-se o homem de negócios frio e distante que era quando estava ali. Com a ausência de Lindsay, suas tarefas se tornaram em excesso, conseguiu resolver tudo sozinho apenas porque era sábado, quando poucas coisas funcionavam pelo mundo. Perto do meio-dia David finalmente chegou da sua casa de praia em Galveston, onde se encontrava quando Richard ligou exigindo sua presença na empresa imediatamente, para falar sobre o envolvimento dele com Olívia. David tinha a mesma idade que Richard, embora não possuísse metade da sua vitalidade e tampouco era tão conservado. Tinha cabelos loiros dourados, olhos azuis claros escondidos atrás das lentes grossas dos óculos, o físico raquítico e a pele, excessivamente clara, estava queimada pelo sol. Cumprimentou-me com polidez antes de sentar à mesa diante de Richard. — Fiquei sabendo que Olívia foi presa. Eu realmente sinto muito que seja ela a autora de toda essa loucura. — David verdadeiramente parecia sentir. Apesar do seu jeito tímido, era expressivo ao ponto de deixar transparecer suas emoções. Estava evidente em sua fisionomia o quanto lamentava. — Você ficou sabendo o que aconteceu entre mim e ela quando vocês ainda namoravam? ​— Richard foi direto ao ponto. — Sim. Ela confessou tudo, alguns dias depois. Por isso rompemos. — E porque você nunca veio falar comigo sobre isso? Não achou que eu merecia ser repreendido por ter traído nossa amizade? Onde ele queria chegar com aquilo? Estaria cogitando que David era o tal cúmplice?

— Não fui porque ela foi sincera comigo. Me disse que te seguiu até o banheiro, que você estava bêbado, que não teve culpa de nada. Richard mantinha o queixo apoiado nas duas mãos e roçou os lábios com os polegares enquanto parecia refletir. — Você nunca desconfiou que ela era a assassina? — Não. Fiquei chocado quando vi no noticiário. — Ela me deu a entender que tem um cúmplice. Você pode imaginar quem seja? — Eu não sou a pessoa mais indicada para falar sobre Olívia, pois depois que terminamos seguimos caminhos diferentes. Quase não a vi mais. Os olhos de Richard buscaram os meus, como se ele precisasse de uma segunda opinião sobre aquilo. O que eu podia pensar? O cara parecia inocente, não havia o menor sinal de culpa nele, pelo contrário, se tivesse algo contra Richard teria deixado transparecer na época em que ele traía sua confiança transando com Olívia. No fundo eu já estava cansada daquela história, daquela tensão constante que nos impedia de vivermos o que tínhamos de melhor, que era a mãe dele e a minha filha. Mais tarde, quando David deixou a sala, continuávamos navegando pelo mesmo mar de incertezas e suspeitas de antes, sem sabermos se Olívia realmente tinha um cúmplice e quem era esse cúmplice. Ao meio-dia, Richard encerrou o expediente e levou-me para almoçar em um sofisticado restaurante na Orange Street, quando então tocou no assunto pelo qual eu tanto ansiava. Tínhamos acabado de fazer nosso pedido. Ele comeria pato ao molho e eu uma salada de frutos do mar que me lembraria os momentos que vivera ao seu lado no Brasil. Os melhores da minha existência. — O que acha de irmos passar o fim de semana em Dallas, para que você possa conhecer sua princesa? Meu coração deu um salto no peito. Era muita felicidade para um coração apenas. — Acho maravilhoso. — Meus lábios se esticavam num sorriso. — Mas amanhã é domingo, ela não irá à escola. Como faremos para vê-la? — A gente dá um jeito. Podemos estender a estadia até segunda-feira, se necessário. — Não vai te prejudicar se ausentar da Thrive mais um dia? — Nem tanto. Qualquer coisa vale à pena para te ver com esse sorriso lindo. Sua voz soou tão rouca e sensual que um formigamento se manifestou na altura do meu ventre. Era muito esperar que eu me mantivesse indiferente à masculinidade de Richard. Eu não conseguiria passar nem dois dias sem fazer amor com ele. Seria facilmente derrotada pelo desejo selvagem que cada detalhe dele me despertava. — Nós podíamos nos passar por produtores de televisão em busca de uma garota como ela para um comercial e a vermos pessoalmente na escola. O que acha? — Acho que você tem uma mente muito criativa e isso pode fazer de você muito mais que uma simples jornalista, uma escritora de sucesso, talvez. Por outro lado, precisamos averiguar se as notícias sobre o ataque que sofremos não chegaram até lá antes de nos disfarçarmos de qualquer coisa. Observei o curativo em sua testa, as cenas daquele terrível momento voltando-me à mente, nítidos como flashes de um filme recente. Pude visualizar claramente o rio de sangue derramado sobre o asfalto, com os corpos espalhados por todos os lados e estremeci violentamente.

— Vou falar com um advogado ainda hoje para que possamos nos informar sobre suas chances de reaver a guarda dela. — Ele desviou do assunto, como se fosse capaz de ler minha mente. Após o almoço fomos direto para escritório de Aidan Gabor, localizado em um imponente edifício em Downtown. Ele era um dos mais brilhantes advogados de causas cíveis do Texas, tão bem-conceituado que, constantemente, era requisitado para ministrar palestras sobre seu trabalho em universidades de todo o país. Tom surtaria quando soubesse que eu o conheceria pessoalmente. Como ele era advogado de Richard há anos, fomos recebidos imediatamente, sem que houvesse a necessidade de marcar uma hora na sua agenda obviamente lotada. De acordo com Gabor, não seria um processo tão complicado reaver a guarda da minha filha, pois a devolução de crianças adotadas aos pais biológicos era uma prática que vinha se tornando cada vez mais comum em todo o mundo e apesar de a família biológica ter a preferência, de acordo com a Constituição dos Estados Unidos, ambos os lados precisariam ser obrigatoriamente avaliados, sendo que a criança ficaria com quem fosse considerado o melhor para ela. Entretanto, para que eu fosse julgada apta a receber a guarda de uma criança, mesmo sendo minha filha de sangue, eu precisaria ser uma pessoa bem estabelecida, com uma condição financeira apropriada, uma boa mordia e, de preferência, com um bom marido. Evitei olhar para Richard quando o advogado fez tal declaração, pois no fundo temi que ele me propusesse casamento não por me desejar na sua vida realmente, como sua esposa, mas apenas para me ajudar a ter minha filha de volta, como vinha de fato ajudando. Concomitantemente, tive medo de que ele não propusesse. O advogado deixou claro, ainda, que minhas chances eram maiores considerando o fato de que minha pequena tinha sido tirada de mim sem o meu consentimento e imediatamente Richard o incumbiu de dar início ao processo.

CAPÍTULO XXXII Quando deixamos o escritório daquele advogado, meu peito estava inundado de esperança, uma felicidade genuína, jamais antes experimentada, me enchia a alma. Eu tinha a impressão de que em breve iniciaria uma nova etapa da minha existência, a melhor etapa de todas e tudo aquilo graças a Richard, o homem que eu amava mais a cada instante. Tínhamos planejado ir olhar alguns apartamentos no centro antes de pegarmos a estrada para Dallas, todavia, eu queria compartilhar com ele do júbilo glorioso que transbordava dentro de mim, então o convenci a irmos visitar sua mãe biológica. Não foi tarefa fácil convencê-lo, mas eu sabia que valeria à pena, pois vira a forma como aquela mulher o olhara, o abraçara. Apesar do que fizera no passado, ela era capaz e amá-lo e Richard precisava daquele amor mais do que imaginava, para que este repasse as consequências que a sua ausência acarretara em sua vida, como tê-lo tornado o homem duro que se mostrava. Ao chegarmos à modesta residência dela em Sugar Land, saltamos do Mercedes conduzido pelos seguranças e percorremos o quarteirão restante à pés, para que tanto ela quanto sua família não se assustassem com a presença dos seguranças armados. Stefany se mostrou emocionada ao nos receber, seus olhos castanhos, iguais aos de Richard, se enchendo de lágrimas. Ao sermos apresentadas por ele, senti um afeto instantâneo por aquela mulher, não apenas pelo fato de ela possuir os traços fortes do meu amor em sua fisionomia e até no seu jeito de falar e se mover, mas por termos sido vítimas da mesma violência quando éramos crianças, embora essa violência tivesse nos dado bons frutos. Como era tarde de sábado, ela e o marido faziam um churrasco com o casal vizinho no pequeno quintal nos fundos, do qual nos convenceu a participar. Nos entrosamos rapidamente com todos os presentes, pessoas simples, amistosas, que conheciam a história de Stefany e compartilhavam da sua felicidade em ter o filho abandonado de volta, o que todos consideravam sua grande chance de se redimir de um erro que cometera no passado. Seu marido a apoiava totalmente, inclusive dedicou boa parte da sua tarde a conectar Richard com seus irmãos mais novos via internet, quando então os conhecemos por meio da web cam. O restante da tarde, Richard passou ao lado da mãe, conhecendo-a, deixando-se conhecer, numa ânsia controlada por tal proximidade, como se tentassem recuperar o tempo perdido. As horas foram tão agradáveis que não as vimos passar. Ali, naquela modesta casa de dois andares, com um jardim na frente e um quintal nos fundos, ocupada por pessoas simples, me senti como se estivesse em um lar de verdade, um lar como jamais tive. Sentira-me assim algumas vezes antes, nas ocasiões em que passava as férias de verão na casa dos pais de Trinity. Naquele lugar eu tinha a sensação de que estava em casa, de que queria viver em um lugar como aquele pelo resto da minha vida, com Richard e minha princesa. Esperava não estar querendo demais, pois tudo parecia muito para quem nunca tivera nada. Era noite quando deixamos a residência, com a promessa de que voltaríamos em breve.

Ficou tarde demais para irmos à Dallas, então decidimos que partiríamos apenas na manhã seguinte. De volta ao velho apartamento, Richard e eu nos dedicamos à construção da sua biografia, quando ouvi as últimas revelações sobre sua trajetória de vida, até o momento presente. Digitaria as últimas informações antes do fim de semana e entregaria o trabalho finalizado a Anthony. Da mesma forma como agira durante a manhã, Richard continuou respeitando minha decisão de não nos tocarmos por um tempo. Nem por um instante tentou me seduzir, mesmo sabendo que se tentasse, eu cederia facilmente, pois era completamente louca por ele. Sem protestar, ele dormiu no sofá da sala, deixando-me ficar com a cama, onde dormi um sono profundo, apesar do vazio que a ausência dele deixava no leito. Deixamos Houston pela manhã, no Mercedes conduzido pelo segurança, enquanto outro se mantinha no assento do carona. Seguimos pela Via I-45 N, o trajeto mais curto, através do qual, em cerca de três horas estaríamos em Dallas. Quando deixamos o perímetro urbano de Houston, fiquei extasiada com a paisagem do deserto em meio ao qual se estendia a estrada de asfalto. Eu era fascinada pelo deserto texano, pois este passara a representar a minha liberdade desde que eu descobrira, ainda durante a minha infância, que para fugir do inferno em que eu vivia, eu precisava apenas atravessá-lo, embora jamais tivesse encontrado coragem de deixar minha mãe, tendo partido apenas quando me levaram para a casa de reabilitação, onde logo recebera a notícia de que ela tinha morrido de overdose de heroína. Com o passar das horas, meu eu já não suportava a ausência de Richard e descansei minha cabeça no seu ombro largo, reconfortadoramente, sentindo-me amada, protegida, quando ele enfiou o nariz em meus cabelos para inspirar meu cheiro antes de contornar meu torso com seu braço forte, puxando-me mais para si. Era o primeiro contato depois de horas e só então me dei conta do quanto sentira falta daquilo, como se dependesse da sua proximidade para me sentir viva. Em Dallas, nos hospedamos na suíte principal do luxuoso hotel The Ritz-Carlton, em Uptown, próximo a casa onde minha princesinha morava. Nosso plano inicial era ficarmos de tocaia diante da residência dela, uma imponente mansão com a fachada branca, esperando que, eventualmente, a família, constituída pelos pais e o irmão, também adotivo, Jeremy, de oito anos, saísse para um passeio no shopping ou a outro lugar, como toda família costumava fazer aos domingos. Meu primeiro problema foi encontrar a roupa adequada para usar, pois em breve o advogado entraria com o processo, quando Emilly ficaria sabendo que eu era sua mãe e entre as roupas caras que Tom me comprara, eu não sabia o que me deixaria mais parecida com uma mãe. Optei pelo conselho de Richard em me vestir como eu realmente gostava, para que ela me visse como eu verdadeiramente era e escolhi jeans, regata e tênis. O desafio seguinte foi convencê-lo a se livrar dos seguranças para não passarmos uma impressão negativa à minha pequenina. Então, partimos no Mercedes, apenas nós dois, para o lugar onde ficava a residência, uma rua tranquila, arborizada, onde as imponentes construções ocupavam um grande espaço cada uma. Estacionamos em um local discreto e permanecemos no carro, minha ansiedade quase palpável. Depois de longas horas de espera, finalmente os imensos portões da mansão se abriram e um Jeep Cherokee, de última geração, deixou o seu interior. Como os vidros eram escuros, não conseguimos ver quem estava dentro do veículo, contudo, pelo seu tamanho, era possível deduzir que carregava todos os membros da família. Esperamos que este pegasse uma direção da rua e o seguimos de longe,

para que nossa presença não fosse notada. Sem que o perdêssemos de vista, eles atravessaram todo o centro da cidade, adentrando o Katy Trail Park, um lugar ideal para atividade ao ar livre, devido à presença da natureza. Estacionaram próximos a um grande campo arborizado e saíram. Quando a vi, meu coração saltou como louco no peito, as lágrimas marejando-me os olhos. Precisei de um esforço quase inumano para conter o impulso de saltar do Mercedes e correr ao seu encontro, tomá-la em braços, tocar sua pele delicada, dizer-lhe quem eu realmente era. Todavia, eu precisava ser prudente e cautelosa, pois não queria causar uma reação negativa nela em relação a mim. Ela era linda como na fotografia, tinha os cabelos ruivos tão desalinhados quanto os meus, sua pele era rosada, desprovida de imperfeições. Carregava um ursinho de pelúcia entre seus bracinhos pequenos, vestia um macacão jeans sobre a camiseta branca. — Estou vendo que ela teve a quem puxar no gosto para se vestir. — Richard estava sendo brincalhão. Esperamos no carro enquanto toda a família caminhava em direção ao grande campo coberto pela grama, sombreado pelas árvores, onde outras famílias se encontravam. A mulher loira esguia, obviamente a mãe, estendeu uma toalha quadriculada sobre a grama, sob a sombra de uma árvore gigantesca, onde o pai, o cara moreno de cabelos grisalhos que parecia velho demais para ter filhos daquela idade, pousou a cesta de piquenique. O casal se sentou sobre a toalha, ele com um braço em torno dos ombros dela, enquanto o menino se dedicava a brincar com uma bola de futebol e minha princesa parecia explorar o ambiente, procurando as flores nas proximidades. Só podia ser minha filha mesmo, inteligente a ponto de trocar a brincadeira para procurar o conhecimento naquilo que jazia à sua volta. — Vamos lá Richard. Fingimos ser produtores de televisão em busca de uma menina como ela para um comercial. — Minha ansiedade era crescente, quase descontrolada. — Considerando que amanhã Gordon os informará sobre o processo de devolução, você não acha melhor nos apresentarmos sendo quem realmente somos? — E se ela se assustar? E se eles fugirem do país? — Eu estava quase desesperada, tomada por um turbilhão de emoções que se conflitavam em meu interior. Medo, euforia, ansiedade, jaziam dentro de mim. — Você precisa relaxar Dakota. Talvez eles sejam pessoas boas e não te impedirão de ficar com sua filha. — E se não forem? — Vamos lá descobrir isso agora mesmo. Sem que eu estivesse emocionalmente preparada, Richard saltou do carro, fazendo a volta para abrir a porta do meu lado, segurando-me a mão para garantir que eu o seguiria. Caminhamos de mãos dadas na direção da família, o receio crescendo dentro de mim a ponto de me fazer tremer. Minha pequena Emilly deixou as flores de lado para correr atrás de uma borboleta e acabou deparando-se conosco antes que alcançássemos os demais, esbarrando justamente em minhas pernas. Teria sido o destino? Sem que nada tivesse me preparado para aquele encontro, ajoelhei-me diante dela, emocionada, com meu coração disparado no peito, as lágrimas marejando-me os olhos. De perto ela era ainda

mais linda, tinha os olhos azuis claros como os meus, apesar de faltar-lhe um dentinho na frente, seu sorriso era o mais encantador entre todos os sorrisos. — Oi. — Minha voz soou trêmula, mas consegui atrair sua atenção da borboleta para mim, seu sorriso se alargando ao observar o meu rosto. — Tudo bem? Ela estendeu-me a flor que trazia em sua mão, enquanto segurava seu urso com a outra. — Pode ficar com ela, para você não ficar triste. — Disse. Meu Deus! Sua voz era linda! Como melodia que soava em meus ouvidos. Recebi a flor da sua mãozinha, o primeiro presente que recebia da minha filha. — Eu não estou triste, pelo contrário, estou muito feliz. — Então porque você tá chorando? — Porque às vezes nós adultos choramos de felicidade. — Meus olhos buscaram o rosto de Richard, que nos observava de muito perto, o canto da sua boca curvado num meio sorriso, seu olhar carregado de emoção. Olhei novamente para minha filha, constatando que com eles dois ao meu lado meu mundo estaria perfeito. — Posso te dar um abraço? A pequena hesitou. — Não posso falar com um estranho e você é uma estranha. Acho que não posso abraçar você também. — Você está certa. Mesmo assim eu gostaria muito de te dar um abraço, posso? Ela hesitou novamente, então abriu seus bracinhos e eu a abracei, erguendo-a em meus braços, rodando com ela no ar, todo o meu ser transformando-se em um afeto genuíno, amor incondicional. Era uma parte de mim que eu abraçava e podia sentir isso no calor do seu corpinho frágil, na forma como ela me apertava de volta. Eu sabia que também havia nela uma parte daquele demônio, mas toda a afeição que me tomava tornava aquilo um detalhe insignificante, praticamente inexistente. Ao observar-nos, o casal levantou-se alarmado, vindo apressadamente em nossa direção. Precisei conter o impulso de sair correndo para longe com minha filha nos braços, para impedi-los de tomá-la de mim, entretanto, Richard foi ao encontro deles, detendo-os a meio caminho de nós e pela reação que eles demonstraram depois de alguns minutos de conversa com ele, eu soube que a verdade lhes tinha sido revelada. Carreguei Emilly para a sombra de uma árvore um pouco mais afastada, à distância me garantiria alguns instantes a mais com ela. Coloquei-a no chão, sentando-me ao seu lado sobre a grama, ela me imitando. — O que você mais gosta de fazer, Emilly? — Eu estava simplesmente encantada, de uma hora para outra, meu sonho de ser mãe daquela garotinha linda, roubada quando eu tinha dezesseis anos, me era devolvido e eu não sabia exatamente como agir, apenas seguia os meus instintos. — Como você sabe o meu nome? — Ela sorriu novamente, exibindo a fenda entre seus dentes. — Eu te conheço, há muito tempo. De quando você era pequena demais para se lembrar de mim. — Qual o seu nome? — Dakota. — Eu gosto do seu cabelo Dakota. — Eu também gosto muito do seu. — Aquele homem é seu marido? — Ela gesticulou na direção de Richard que ainda conversava com o casal. — Não. Ele é meu namorado.

Ela sorriu gargalhadamente, cobrindo seu rostinho com o urso de pelúcia, como se estivesse constrangida. — Ele é muito bonito. Qual o nome dele? — É Richard. — A Princesa de fogo também tem um namorado. O nome dele é Finn. — Quem é a princesa de fogo? — Do desenho. Olha. Ela tirou um tablet cor de rosa do bolso frontal do seu macacão, mas antes que tivesse tempo de ligá-lo, o casal que a adotara aproximou-se, junto com Richard, a mulher pegando-a no colo, fuzilando-me com olhos chocados e ao mesmo tempo raivosos. — Sai de perto da minha filha. — Esbravejou. — Ela é minha e ninguém vai tirá-la de mim. Sem esperar resposta, virou-se, caminhando apressadamente em direção à toalha onde estiveram sentados, Emilly agitando sua mãozinha no ar em despedida, meu coração sangrando no peito. A sensação que eu tinha era de que aquela mulher estava levando embora um pedaço de mim sem que eu pudesse fazer nada para impedi-la. Aflita, vi quando eles recolheram a cesta de piquenique junto com a toalha do chão, se dirigiram para o Jeep e partiram. — E se eles saírem do país? — Eu estava agoniada. — Eles não vão fazer isso. — A voz de Richard me transmitia segurança. — Como você pode ter tanta certeza? — Primeiro porque ele é presidente de uma das maiores companhias de tecnologia do Texas, não poderia se ausentar mesmo que quisesse e segundo porque com apenas um telefonema eu terei pessoas vigiando cada passo deles. — E você pretende dar esse telefonema? Ele me fitou em silêncio por um instante antes de responder. — Eu não acho que isso seja necessário, pois a partir de amanhã, depois que o processo for iniciado, eles serão legalmente proibidos de deixarem o estado, porém, para ver esse seu rostinho lindo relaxado, eu vou fazer. Meus lábios esticaram num sorriso que ele retribuiu com outro irresistivelmente sedutor, quando então tive certeza de que estava preparada para ser sua novamente. Mais que preparada, eu queria que acontecesse. Ainda ali, sob a sombra daquela árvore, ele usou seu celular para telefonar para alguém que lhe indicou uma agência de investigadores particulares de confiança em Dallas e com outro telefonema garantiu que os passos da família adotiva da minha filha fossem secretamente vigiados e nos informados. — Tudo resolvido, boneca. — A forma como ele pronunciou a frase me excitou. Subitamente, notei o quanto ele estava especialmente bonito naquela manhã, usando jeans e camiseta de malha, como o vira usar em poucas ocasiões. O vento emaranhava seus cabelos curtos, desorganizando-os um pouco mais, deixando-o ainda mais charmoso. Seus olhos estreitos contra a luz do sol também contribuíam para que ele parecesse irresistível como água no deserto. — Nunca vou conseguir te agradecer suficiente por tudo. — A frase me escapou sem que eu tivesse planejado. — Você me devolveu a vida. O mínimo que posso fazer é dedicar-me a te fazer feliz.

Seus olhos lindos prenderam os meus por um longo momento de silêncio, até que a distância entre nós se tornou um fardo pesado demais para que pudesse carregar e a eliminei com dois passos, atirando-me em seus braços tão amados, onde era verdadeiramente o meu lugar e de onde eu nunca mais queria sair. — Eu te amo Richard. — Eu também te amo. — Ele me fitou com adoração antes de inclinar-se para tomar-me os lábios, beijando-me vagarosamente, como não era típico da sua insaciável fome pelo sexo oposto. Sugou primeiro meu lábio inferior, depois o superior, para só então introduzir a língua na minha boca, explorando-a com sofreguidão. Entretanto, ele tinha me ensinado a querer mais e eu tinha aprendido bem a lição. Excitada, ansiando por senti-lo mais meu, suguei sua língua com força, esfregando meu corpo no seu, a lasciva crescendo dentro de mim, sua ereção se fazendo de encontro ao meu ventre. Pressionei sua nuca com minhas mãos, empurrando-o mais para mim, ao mesmo tempo em que me pressionava mais contra a sua ereção, eroticamente, um gemido abafado partindo dos seus lábios, antes de eles escorregarem para o meu pescoço, beijando-me ali, intensificando o desejo que se alastrava depressa pelo meu sangue. — Você não imagina o quanto senti falta disso, cadelinha. — Sua voz era um gemido abafado pela pele do meu pescoço. — Mas estamos em um lugar inapropriado, sem falar que precisamos almoçar. — Eu não estou com fome. — Afastei-me o suficiente para fitá-lo nos olhos. — Pelo menos não estou com fome de comida. Vamos para o hotel. Faça amor comigo. Lentamente, o canto de sua boca se curvou naquele sorriso cínico, uma de suas sobrancelhas se erguendo com malícia. Foi o suficiente para que eu compreendesse que não o teria tão facilmente, ele queria jogar, obviamente para me punir por tê-lo deixado sem sexo durante três dias. Entretanto, eu tinha aprendido a jogar também.

CAPÍTULO XXXIII

Como eu esperava, Richard afastou-se, desvencilhando-se dos meus braços, jogando a bainha da camiseta sobre seu colo para esconder sua ereção. — Vamos procurar um bom restaurante. Estou com muito apetite. “Eu também estou.” Voltamos em silêncio para o Mercedes, acomodando-nos em nossos lugares, antes que ele desse a partida, nos levando de volta para o centro da cidade. Observei com melancolia a grande metrópole à nossa volta, com seus arranha céus gigantesco, sua exorbitante movimentação. Embora Dallas fosse menor que Houston em território, era mais populosa e movimentada. Prova disso era o trânsito infernal no qual nos encontrávamos. Tudo aquilo me fez relembrar o sossego que era o Brasil. Uma terra que eu gostaria de visitar novamente, reviver os momentos mágicos, inesquecíveis que passara ao lado do meu amor nas praias maravilhosas da Bahia. Se Richard queria jogar, então eu jogaria. Sem que ele esperasse, me inclinei na sua direção, beijando-lhe o pescoço e a face, enquanto ele dirigia. Mas não parei ali, eu não pararia. Em busca do meu objetivo, enfiei minha mão sob sua camiseta, meus dedos percorrendo o contorno dos seus músculos bem definidos, ao mesmo tempo em que, com a outra mão, apalpava sua coxa firme, por sobre o jeans, minha boca trabalhando na pele do seu pescoço. — Esquece, Dakota. Nós vamos almoçar. — Quanto mais ele se fazia de difícil, mais eu o queria. Enquanto mordiscava o lóbulo da sua orelha, esfreguei minha mão sobre seu colo, com veemência e logo ele ficou duro, deliciosamente duro, sob o tecido do seu Jeans. Porra! Aquilo me deixava loucamente excitada. Minha vagina estava molhada, suas paredes palpitavam. Eu o queria dentro de mim, isso não era mais um jogo. Extasiada apertei o contorno do seu membro entre meus dedos, para em seguida, abrir o zíper do seu jeans, ansiosamente. — Você vai me fazer bater o carro, cadelinha. — Ele reclamou, embora não fizesse nada para me deter. Tirei seu membro de dentro da cueca, extasiada com o quanto estava duro, babando, suas veias salientes me parecendo um convite irrecusável ao despudor, ao prazer. Masturbei-o vagarosamente, salivando, sequiosa, até que não mais resisti e busquei espaço entre Richard e o volante, onde introduzi minha cabeça, enchendo minha boca com aquela maravilha, todo o meu corpo vibrando da mais pura lasciva, como se eu fosse um animal no cio. — Ah... — O gemido parecia partir do fundo do seu âmago, me recompensando, me excitando um pouco mais. Logo sua mão estava atrás da minha cabeça, me empurrando para baixo, enterrando-se mais em mim, quase me impedindo de respirar. — Porra cadelinha, assim você me deixa doido. Arrebatada pela luxúria, eu o mamei, mamei forte, depois devagar, passei a língua em volta, chupei a cabecinha, com uma fome violenta que se recusava a me abandonar.

Richard tirou a mão da minha cabeça para segurar o volante com as duas, o carro fazendo várias curvas na estrada, ziguezagueando, até que estávamos em uma área coberta, a obstrução dos raios do sol me evidenciando isso. E ele parou, sem que eu soubesse onde estávamos. Com as duas mãos livres, empurrou seu assento para trás, desceu um pouco seu jeans e voltou a empurrar minha cabeça, me fazendo trabalhar mais rapidamente, indo fundo na minha garganta, seus quadris se movendo brevemente para foder minha boca, até que um único gemido partiu da sua garganta e ele gozou, gozou demoradamente, enterrado em mim até a raiz, seus espasmos se fazendo, seu esperma jorrando abundante, tão deliciosamente que quase fui ao clímax também. Quando não restava mais nenhum resquício do seu gozo, ele puxou minha cabeça para cima, pelos cabelos, levando minha boca até a sua. — Você é uma putinha. ― Sussurrou. Sem soltar meus cabelos, capturou minha língua com sua boca sequiosa, sugando-a ferozmente, como se tentasse me devorar, ao mesmo tempo em que sua mão começou a explorar o meu corpo, apalpando minhas intimidades por sobre as roupas. Introduziu sua mão sob minha regata, apossandose de um dos meus seios, massageando meu mamilo entre seus dedos, arrancando-me um gemido abafado, do mais puro prazer. Sem mais esperar, afastou-se para abrir o fecho do meu jeans, quando então percebi que estávamos na garagem semiescura, abarrotada de carros de um edifício, embora eu não soubesse qual. Com mãos urgentes, ele me fez deitar sobre o assento, minha cabeça espremida contra a porta e puxou meu jeans colado, arrancando-o pelos pés, levando junto a calcinha. Contemplou meu sexo com olhos brilhantes de luxúria, antes de voltar a usar as duas mãos, desta vez para erguer meus quadris, levando minha intimidade lubrificada até sua boca gostosa, sua língua mergulhando entre meus lábios vaginais, me experimentando. Ah! Porra! Como aquilo era bom, indescritivelmente bom. Sua língua entrou na minha vagina lambuzada, girou lá dentro, acariciando minhas paredes e eu gemi alto, um gemido de prazer, um prazer inigualável que apenas aquele homem podia me proporcionar. Eu estava encolhida entre a porta e Richard, nua da cintura para baixo, ensandecida de tesão, prestes a explodir. A língua dele escorregou para o meu clitóris, lambendo-o vagarosamente, seus olhos se prendendo aos meus, de cima, expressando a luxúria da qual compartilhávamos. Passou a me lamber cada vez mais depressa, meus gemidos se tornando incessantes, o fogo do desejo incendiando-me inteira, consumindo-me de dentro para fora, até que tudo se tornou mais intenso do que eu pudesse controlar e explodi, gozando na boca gostosa dele, meu corpo em convulsão, se contorcendo, sem que em nenhum momento nossos olhos se desviassem. No instante em que amoleci, ele me manuseou sobre o assento, com agilidade, com a facilidade de quem manuseava uma boneca de pano, puxando-me inteira para si, me colocando no espaço alargado entre seu corpo e o volante, me fazendo montar em seu colo, uma perna de cada lado, meus joelhos apoiados no estofado, nossos sexos se tocando embora ele não me penetrasse. — Você não deveria provocar desse jeito um homem que está há três dias sem sexo. Ele moveu meus quadris com suas duas mãos, esfregando minha intimidade empapada no comprimento do seu pênis que se exprimia entre meu sexo e o corpo dele, passando, imediatamente de semiereto para completamente duro, despertando-me uma nova onda de excitação que se alastrou

por todo o meu corpo, rapidamente. — Onde estamos? — Eu quis saber. — Na garagem de um edifício qualquer. Não tenho certeza, mas acho que é de um shopping. — Ele continuava movendo meus quadris para frente e para trás, esfregando meu clitóris inchado no seu pau duro como pedra, excitando-me, excitando-se. — E se for, tipo, o prédio de uma delegacia, ou de um tribunal? — Aí seremos presos por atentado ao pudor e a culpa será toda sua. Pensando no escândalo que aconteceria se fossemos apanhados, quis sair de cima dele, me recompor, porém, quando ele ergueu minha regata até altura da minha clavícula, junto com o sutiã, abocanhou um dos meus peitos, mamando com sofreguidão, tudo se perdeu na imensidão do desejo que me engolfou. Arrebatada, lancei minha cabeça para trás e gemi alto, esfregando meu sexo no dele, como ele fazia antes. Puta merda! Eu estava pegando fogo, incendiando de tesão, necessitando tê-lo dentro de mim com uma urgência desesperada e embora soubesse o quanto ele queria o mesmo, Richard não parecia ter pressa, continuava se fartando com meus seios, chupando-os hora devagar, hora com força, brincando com meus mamilos sob sua língua experiente. Até que por fim pareceu se compadecer de mim e usou as duas mãos para erguer meus quadris, encaixando-me sobre seu pau, penetrando-me com um movimento único, feroz, infalível, escorregando para o meu interior. — Ahhh... — Gritei, enlouquecida, enterrando meus dedos nos seus cabelos curtos, puxando-os, descontroladamente. Richard continuava chupando meus peitos enquanto eu o cavalgava, movendo meus quadris freneticamente sobre ele, experimentando, extasiada, cada centímetro da sua virilidade incomparável, que me preenchia com uma perfeição impressionante, como se tivesse sido feita para encaixar-se em mim, levando-me a uma doce loucura da qual eu jamais queria sair. Porra! Porra! Porra! Como aquilo era bom! Eu queria que nunca acabasse. — Gosta do meu pau na sua bocetinha? — Sua voz era sussurrada, ofegante, lembrava o grunhido de um animal selvagem. — Ah... Sim... Eu gosto... — Então me pede para te foder. — Ah... Me fode meu amor... Dá esse pau todo pra mim... Ahhhh Então, ele segurou meus quadris, uma mão de cada lado e me moveu de acordo com seus movimentos, estocando mais forte, mais duro, mais feroz dentro de mim, indo tão fundo que pude senti-lo me empurrando lá dentro e logo meu mundo se perdeu no novo orgasmo que se formou em minhas entranhas, fazendo todo o meu corpo se contrair para depois explodir no êxtase, os gritos pulando da minha garganta, as lágrimas brotando dos meus olhos. Richard segurou meus cabelos atrás da minha cabeça e levou minha boca até a sua, beijando-me avidamente, quando então, com um único gemido, atingiu o clímax, seu gozo se esvaindo dentro de mim, seus espasmos tão intensos que alcancei um terceiro orgasmo, me acabando de prazer em cima dele. Quando ficamos tão moles que não conseguimos nos sustentar sentados, nos deixamos cair sobre os assentos, ele em cima de mim, ainda no meu interior, seu corpo grande cobrindo o meu de cima abaixo, me fazendo parecer pequena sob si.

Nossas bocas voltaram a se encontrar, num beijo preguiçoso, lento, apaixonado, ao passo em que ele movia seus quadris, arremetendo-se contra mim devagar, seu pau semiereto deslizando no meu canal encharcado. Ambos sabíamos que precisávamos parar, contudo, nos desgrudar parecia a tarefa mais árdua e dolorosa do universo. Então, o destino decidiu por nós, por meio do som estridente de uma buzina que partiu de muito perto, tornando-nos conscientes do mundo que girava à nossa volta. Richard sentou-se depressa de volta em seu lugar, percorrendo os olhos ao redor, enquanto eu fazia o mesmo, constando que a buzina partira de um Audi branco que tinha em seu caminho uma mulher idosa carregando algumas sacolas de compras. Ótimo, estávamos mesmo na garagem de algum prédio comercial, seguros e protegidos da atenção alheia. — Acho que devíamos ir almoçar. — Richard puxou seu jeans de volta para o lugar, fechando o zíper, parecendo à miragem de um deus grego com sua face ruborizada pelo sexo, os cabelos totalmente desalinhados, os olhos brilhantes de júbilo. Minha vontade era de pular em cima dele e continuar de onde paramos, mas eu sabia que precisava me conter. — Também acho. — Tive que concordar e de súbito, o interior do Mercedes me pareceu reduzido enquanto me esforçava para vestir meu jeans colado e ajeitar o sutiã e a regata de volta no lugar. A calcinha tinha ficado perdida embaixo dos assentos. Quando estava pronta, Richard deu a partida, nos guiando para fora da garagem, onde vi várias câmeras de segurança, embora nenhuma pudesse ter registrado nosso despudor, já que o carro tinha vidros escuros dos dois lados e o para-brisa estava em frente a uma parede. — Alguma preferência de restaurante, bebê? — Estávamos de volta ao trânsito movimentado, Richard me olhava com aquela fome meio animalesca no olhar, numa promessa silenciosa de como seria nossa tarde. — Não conheço nada aqui. — Mas eu conheço e vou te levar lugar num lugar incrível. E o lugar onde ele me levou era realmente incrível. Localizado no centro de Dallas, era um restaurante country, com uma decoração maravilhosa para quem gostava de antiguidades. Não era nada sofisticado como os restaurantes em que ele costumava me levar em Houston, mas realmente me conquistou. Havia uma lojinha nos fundos, country, com comidas típicas para se levar para casa, como doces, geleias, decorações, roupas de adultos e crianças, CDs de músicas country e brinquedos. A comida era uma delícia. Ambos saboreamos o típico chili texano, um guisado com carne, chili, feijão e milho. Emilly foi nosso assunto durante toda a refeição, eu não me cansava de falar sobre ela, repetir seu nome doce, relembrar o quanto era linda, esperta, sensível. Eu estava simplesmente transbordando de amor, um amor genuíno, incondicional. Richard admitiu o quanto gostou dela também, porém, sua maior satisfação, segundo ele próprio, era me ver tão feliz, uma felicidade que ele mesmo me proporcionara, encontrando minha filha, lutando para que eu a tivesse de volta. Sem ele, meu único e verdadeiro amor, nada daquilo seria possível. Antes de deixarmos o lugar, comprei uma capa para tablet com o desenho de um chapéu de vaqueiro cor de rosa, para a minha pequenina. Eu tinha certeza de que ela ia gostar.

Durante o trajeto de volta para o hotel, Richard e eu cogitamos aproveitar o restante do domingo para explorar os pontos turísticos de Dallas, todavia, o desejo falou mais alto dentro de nós e passamos toda a tarde trancados no quarto do hotel, entregues a esse sentimento insaciável que parecia crescer cada vez que nos tocávamos. Deixamos o aposento apenas para um rápido jantar ali mesmo no restaurante sofisticado do hotel e voltamos para os braços um do outro, nos amando até a completa exaustão, quando então adormecemos agarradinhos. Acordamos tarde na manhã seguinte, uma ensolarada segunda-feira. Estávamos prontos para retornar à Houston, de onde daríamos continuidade ao processo de reaquisição da guarda de Emilly, quando o interfone tocou com uma chamada da recepcionista anunciando que Rachel Meyers, a mãe adotiva de Emilly, estava lá embaixo, junto com minha filha, querendo falar conosco, mas não pretendia subir, preferindo que descêssemos. Então, exultante e ao mesmo tempo temerosa, pendurei minha bolsa no ombro desci com Richard para a recepção do hotel. Ao chegarmos ao amplo e bem decorado saguão, as encontramos sentadas em estofados próximos a outras pessoas. Rachel parecia ansiosa, apertando a bolsa de couro preta contra seu corpo. Quando nos viram, ambas se levantaram, Emilly correndo para me encontrar. Parou diante de mim, abrindo seu sorriso lindo, com uma fenda entre os dentes. Emocionada, ajoelhei-me diante dela, nivelando nossos rostos, enquanto Richard ia falar com Rachel. — Oi Emilly. — Minha voz soou embargada de emoção. — Eu trouxe a princesa de fogo para você. Ela estendeu-me uma boneca de pano com roupas laranja e o cabelo vermelho em forma de uma labareda de fogo. — Ela é linda. — Seu sorriso lindo se alargou. — Também tenho uma coisa para você. — Tirei a capa para tablet da minha bolsa, entregando-lhe. — É para o seu tablet. — Tem um chapéu cor de rosa. — Para minha satisfação, ela parecia admirada. — Posso te abraçar de novo? Sem deixar de sorrir, ela abriu seus bracinhos amplamente. Então, segurei-a em meus braços, apertando-a contra meu corpo, experimentando seu calor tão amado, apesar de tão recente, inspirando seu cheirinho gostoso, embriagando-me do mais genuíno amor. Levantei-me com ela em meus braços, meu corpo trêmulo de emoção. — Ela passou o dia inteiro falando em você. — Rachel aproximou-se, cruzando os braços na frente do corpo. Ela era uma bela mulher, tinha cerca de trinta anos de idade, cabelos loiros ondulados, olhos verdes claros, o corpo esguio sustentando bem as roupas elegantes. Havia bondade em seu rosto, como também uma tristeza pungente. — Podemos conversar a sós? — Podemos — Concordei. Richard, que até então se mantinha ao lado, ouvindo-nos em silêncio, estendeu seus braços para Emilly, convidando: — Vamos conhecer o hotel, Emilly? Ela fitou-o no rosto, fazendo uma carranca, seu lábio inferior esticando para frente, tão lindamente cômico que não contive o riso. — Mostra seu presente para ele Emilly. — Coloquei-a no chão, vendo-a aproximar-se dele,

hesitantemente. — Quer se sentar? — Perguntei, virando-me de volta para Rachel. — Não. Assim está bom. — Rachel parecia resignada. — Olha, eu não vou impedir você de ficar com sua filha, principalmente porque a amo muito e sei que isso é o melhor para ela. Quando a adotei eu não sabia porque uma criança tão perfeita estaria disponível para adoção, logo imaginei o pior. Mas esta manhã entrei em contato com a assistente social que conduziu o caso e ela me contou sua história. Confesso que fiquei comovida e acho que você merece ter sua filha de volta. — Os olhos dela se enchiam de lágrimas. — Mas, em nome do amor que meu marido e eu sentimos por ela, eu queria te pedir que nos deixe fazer parte da vida dela. Não a tire completamente de nós. Meu coração batia acelerado no peito enquanto eu processava cada palavra. As emoções que me tomavam eram intensas, indefiníveis. Eu estava diante da certeza de que teria minha filha de volta e não sabia se sorria ou se chorava. Tentei falar, agradecer, mas as palavras subitamente me faltaram. Então a abracei, estreitando em meus braços a mulher que cuidara tão bem da minha princesa, para depois abrir mão dela por amor, por bondade. — Obrigada por cuidar da minha filha e sim, você e seu marido sempre farão parte da vida dela. Afastamo-nos do abraço, ambas emocionadas, com lágrimas nos olhos. — Preciso que você nos dê um temo para nos despedirmos e organizamos as coisas por aqui. Enquanto isso você pode ir procurando uma boa escola para ela em Houston, arrumando o quarto que ela vai ocupar, comprando coisas de crianças. Subitamente, me ocorreu que eu não tinha pensado em nada daquilo. Sequer perguntara a Richard se haveria espaço para nós duas na sua vida, se ele estava preparado para se tornar responsável por uma criança. Eu acreditava que sim, entretanto, se não estivesse, eu daria meu jeito, afinal ainda podia voltar a morar com Trinity e Tom. — Claro. Quanto tempo você precisar. — Pelo menos até o início do semestre, quando ela poderá ingressar em uma nova escola. — Acho que é tempo suficiente para eu me organizar. — A mulher me encarou em silêncio por um longo momento, um misto de tristeza e bondade evidente em seu olhar. — Parabéns pela sua filha, ela é maravilhosa. — Obrigada mais uma vez. Voltei meu olhar para minha pequena e a vi sentada ao lado de Richard, segurando seu tablet cor de rosa, já dentro da capa que eu lhe dera, enquanto ele mantinha seus olhos fixos na tela. Podia apostar que estava entediado com o conteúdo que era exibido, todavia fingia interesse para não desapontá-la. Era hilário vê-los assim, o grande Richard Parker abrindo mão da sua vontade própria por causa de uma garota e ela se rendendo aos encantos dele tão rapidamente. — Acho que vamos indo. — Rachel entregou-me um cartão. — Aqui tem o número do telefone da minha casa. Ligue quando quiser. — Ligarei. — Recebi o cartão da mão dela antes de voltar para a minha princesa, pegando-a no colo novamente, todo o meu ser transbordando de amor. Abracei-a apertado, dei beijos estalados nas suas bochechas rosadas, apaixonada. — Você vai embora, Dakota? — Havia nostalgia na sua fisionomia infantil. — Sim, mas é só por enquanto. Logo nós voltaremos a nos ver. Ela sorriu e meu coração vibrou.

— Cuida bem da princesa de fogo. — Eu vou cuidar, meu amor. — E não deixa o Richard cuidar dela, se não o Finn fica com ciúmes. — Não vou deixar. Ela me deu um beijo estalado e a abracei mais uma vez antes de colocá-la no chão. Rachel despediu-se de nós dois com amistosidade, segurando a mão de Emilly para se dirigir à saída. Vi Richard indo para a recepção, certamente encerrar a conta e decidi acompanhá-las até o Chamonix conversível branco que as aguardava do outro lado da rua, no qual ambas partiram, enquanto eu permanecia no acostamento, observando até que o carro fosse tragado pelo trânsito movimentado. O que aconteceu em seguida foi tão rápido quanto inesperado. Eu dei o primeiro passo para atravessar a rua de volta ao hotel, quando pneus cantaram sobre o asfalto, para no instante seguinte um carro vermelho, que pareia ter surgido do nada, vir na minha direção, tão depressa, tão certeiro, que não tive tempo de fazer nada antes que ele me alcançasse, atropelando-me violentamente, meu corpo voando com o choque antes de cair no chão e tudo se perder na escuridão e no silêncio que vieram em seguida. Em alguma parte obscura da minha mente, eu processava o que acontecia, procurava dor e meu corpo, tentando identificar onde eu tinha sido quebrada pelo choque, mas não senti nada que não o medo aterrador que me tomava ao qual tudo mais sucumbia. Tinha medo de nunca mais voltar a ver minha pequena, ou Richard. A escuridão parecia me engolir, puxando-me com força para ela, sem que eu tivesse disposição suficiente para lutar contra, o cansaço me invadindo. Quando ouvi a voz do meu amor me chamando, partindo de muito longe, embora de alguma forma eu soubesse que ele estava ali perto, fiz um esforço inumano para abrir os meus olhos e ver o seu rosto, mas não consegui. Minhas pupilas me parecendo pesadas demais. Ele chamou de novo, com tom de súplica e me esforcei com mais veemência para vê-lo, mas o cansaço não me permitiu. Minhas forças exauridas, minha mente exausta implorando que eu me entregasse à escuridão na qual havia a promessa de descanso. Mas eu queria ver o rosto do meu amor, pelo menos mais uma vez, entretanto, meu esforço seguinte foi tão grande que uma única convulsão me fez sacudir, minha boca se enchendo de um líquido quente, com gosto de zinco, que escorreu vagarosamente pelo canto dos meus lábios sem que eu pudesse impedir. Então era aquilo? Eu não veria mais Richard, não teria mais a extraordinária honra de apreciar seu rosto lindo e cobiçar cada parte dele? Eu sabia o risco que corria quando me envolvi com ele, estava apenas recebendo o que me foi destinado no instante em que o amei. Ainda assim, teria feito tudo de novo, do mesmo jeito, pois tudo valia a pena para ter o amor de um homem como ele. Queria que aquela maldita assassina soubesse que mesmo tirando-me a vida, tinha valido a pena viver aquele amor. Mas não era a ela a quem eu queria dirigir meu último pensamento e sim a Richard. Fiz uma última tentativa de abrir meus olhos para vê-lo e o cansaço me golpeou ferozmente. Derrotada, entreguei-me à negra escuridão que me puxava, ao silêncio, onde tudo se perdeu.

CAPÍTULO XXXIV O caos em que as ruas se transformavam nos finais das tardes, devido ao excesso de trânsito por causa do horário de pico podia, ser ouvido à distância, mais especificamente do décimo quinto andar. Havia sons estridentes de sirenes policiais que se misturavam às das ambulâncias; buzinas eram disparadas sem cautela por motoristas estressados depois de um dia fatigante trancado em algum escritório. Era assim em todos os finais de tarde no sudeste de Houston. Eu vinha observando há dia. Há exatamente sete dias, desde Dakota dera entrada no Texas Medical Center o maior centro médico do mundo, localizado naquela parte da cidade, em estado de coma. Um coma causado pelo traumatismo craniano que sofrera quando fora atropelada em Dallas. O choque lhe causara também duas fraturas na perna, uma costela quebrada e uma hemorragia interna milagrosamente controlada. De acordo com os médicos, havia trinta por cento de chance de ela acordar sem nenhuma sequela e era aquela mísera percentagem que me mantinha vivo, ao seu lado, dia após dia, esperando por qualquer sinal de vida de sua parte. Afastei-me da janela do amplo aposento, sentando-me ao lado do seu leito, na poltrona de couro que já ganhara o formato do meu corpo na sua textura, de tanto tempo que eu passava sentado ali, observando-a, esperando que ela abrisse os olhos a qualquer momento. Mas ela não abria. Contemplei, mais uma vez, seu rosto tão amado, a pele muito pálida, as olheiras em torno dos seus olhos fechados, o corpo se tornando mais esguio com o passar dos dias. Sua cabeça tinha sido raspada para a realização da cirurgia e uma parafernália de aparelhos médicos estavam ligados a ela. Apesar de tudo, sua essência estava nela, era a mesma Dakota que eu amava e sempre amaria. E eu não era o único. Desde que dera entrada no centro médico, ela recebia visitas diárias dos seus amigos da faculdade, principalmente de Tom e Trinity. A princípio, eles me desfeririam palavras carregadas de acusações ofensivas, culpando-me pelo que acontecera a ela, sem que eu sequer cogitasse me defender, pois concordava plenamente com eles. Eu era totalmente culpado e morria um pouco a cada dia que ela passava naquela cama, sendo a percentagem a manter meus últimos vestígios de vida. Entretanto, com o passar dos dias, eles se convenceram de que era também a minha vida definhando ali naquele leito e mudaram de atitude. Até tinham tentado me convencer a comer algumas vezes, embora a comida não me descesse. Stefany também viera visitá-la e Emilly vinha de Dallas com a mãe adotiva de dois em dois dias, sempre trazendo um presente de cada vez. Até Anthony viera visitá-la uma vez, trazendo um buquê de flores, como se ela pudesse sentir o seu perfume. No instante em que plantou seus olhos no rosto abatido dela, eu compreendi o quanto ele a amava e o quanto me odiava um pouco mais por estar lhe tirando, mais uma vez, alguém querido. Como era esperado, ele entrara e saíra do aposento sem me dirigir a palavra, ou sequer olhar na minha direção, como se eu não existisse. Quem podia culpá-lo?

Com a confissão de Olívia sobre a série de assassinatos que cometera o FBI finalmente assumiu o caso, cogitando a existência de um cúmplice dela que poderia ter atentado contra Dakota e continuaria atentando enquanto restasse um fio de vida nela. Contudo, o FBI era tão incompetente quanto à polícia. Depois de sete dias de investigação não haviam chegado a nenhum suspeito, como se o maldito fosse uma sombra que se esgueirava pelos becos obscuros da cidade. Descobriram apenas que o carro usado no atropelamento era roubado e não tinha nenhuma digital que não as do seu verdadeiro dono, o que evidenciava que o autor do atropelamento se tratava de um profissional. David foi o primeiro a entrar na lista de suspeitos dos agentes do FBI, por causa do seu envolvimento íntimo com Olívia em um passado distante, mas não encontraram nenhuma prova contra o cara. Investigaram também a família adotiva de Emilly, considerando que a tentativa de assassinato poderia ter partido do desejo deles de ficarem com a garota, mas foi apenas mais uma perda de tempo. Os agentes continuavam trabalhando no caso, agindo como cegos no escuro, já que Olívia além de não falar a verdade, ainda lhes dava informações falsas para afastá-los do foco. Ela era a única que conhecia a verdade e eu o único que podia arrancar essa verdade dela. Então, no oitavo dia, eu decidi que a faria falar, não me importando com o quanto isso me custasse. Naquela manhã, quase não me reconheci ao fitar o meu reflexo no espelho, estava abatido, com olheiras profundas, o rosto pálido, a barba crescida me dando um aspecto meio doentio. A primeira fase do meu plano tinha sido concluída no dia anterior, quando o médico responsável por Dakota, expedira um falso atestado de óbito e a notícia, tão falsa quanto o atestado, de que ela estava morta tinha sido amplamente disseminada pela mídia. Apenas eu, minha mãe e seus dois melhores amigos sabíamos a verdade. Pronto para colocar a segunda parte do plano em prática, tirei finalmente a barba crescida, me vesti de maneira jovial, como era quando cursava a faculdade e deixei o centro médico na minha BMW, partindo para a delegacia em The Gallery, onde aquela maldita se encontrava. Minhas atitudes muito bem planejadas eram cruciais para o sucesso daquele plano, uma armadilha da qual todos participavam, desde o chefe da homicídios, até os agentes do FBI. Se não pegássemos o cúmplice dela desta vez, não pegaríamos mais. Saltei diante da delegacia, com a garrafa de uísque caro nas mãos, necessitando de um esforço quase inumano para manter a cabeça fria. Eu precisava ser frio e calculista como nunca tinha sido. Precisava ter completo domínio sobre minhas emoções, pois se estas se exteriorizassem, eu mataria Olívia no instante em que colocasse meus olhos nela, sem que minha consciência pesasse minimante por isso. Como tinha sido antecipadamente planejado, calculado, me dirigi para sala de Neil Stewart, que encenou seu papel ao mostrar-se surpreso em me ver e relutante em me deixar ver a maldita antes de me encaminhar para uma parte da cadeia que nunca existira antes, uma sala para visitas íntimas, elaborada e construída unicamente para aquele fim. Era uma sala pequena, mal iluminada, mobiliado por mesa, duas cadeiras e uma cama de solteiro, onde eu ficaria sozinho com Olívia, com o objetivo de seduzi-la até arrancar-lhe o nome do seu cúmplice. Não seria fácil, considerando que ela era louca, mas era uma louca inteligente. Eu estava lá sozinho, quando o policial uniformizado a conduziu para dentro, libertando-a das algemas antes de sair. Quando olhei para ela, precisei pedir ajuda divina para me controlar e não

estrangulá-la ali mesmo, com minhas próprias mãos. — O que significa tudo isso? — Ela examinava o ambiente com desconfiança e curiosidade, da forma que observava a garrafa de uísque e os dois copos em minhas mãos. “Significa que seu fim está perto, vagabunda. ” — Significa que me senti meio solitário, por causa de uma amiga do passado e achei que essa amiga poderia pelo menos beber um pouco comigo para remediar a solidão na qual insiste em me deixar. Ela fitou-me desconfiada. — Solitário? E a sua cadelinha? Nesse momento precisei esconder minha mão no bolso da calça para ocultar-lhe o tremor que se instalava nela. Como ela se atrevia a se referir a Dakota com aquela boca suja? — Você não lê os jornais aqui? — Abasteci os dois copos com o uísque. — Ela está morta. Foi atropelada há oito dias em Dallas. Ela encarou-me em silêncio por um longo momento, seus olhos desprovidos de qualquer emoção. — E você não ficou abalado com isso? Entreguei-lhe o copo com a bebida. — E por que eu ficaria? Ela era só mais uma boceta para eu enfiar o meu pau. — A fiz brindar comigo, antes de beber um gole, incentivando-a a fazer o mesmo. — E agora que estou sem boceta alguma para me divertir, achei que você podia me ajudar a resolver esse problema, já que foi você quem o causou. Ela me encarou com aqueles olhos frios pavorosos, por mais um longo momento de silêncio, até que seus lábios se curvaram num sorriso, para que em seguida ela beber um grande gole do uísque. Ótimo! Tinha mordido a isca. “Vadia burra!” Então, sufocando minha ira, minha dolorosa angústia, dei continuidade ao meu joguinho de sedução, claramente assistido e ouvido pelos agentes do FBI que se encontravam logo do outro lado da parede. Talvez aquela tenha sido classificada como uma das coisas mais difíceis que já precisei fazer na vida. Forçando meus lábios a se curvarem num sorriso, comecei a falar sobre o passado, sobre nossas farras na época da faculdade, destacando o quanto tinha sido bom aquela noite que transamos no quarto da casa do amigo dela, o quanto eu queria que se repetisse, ali naquele instante. Ao mesmo tempo em que falava, eu a incentivava a beber e falar, cada vez mais solta, entregue. Ela se mostrava tão interessada em exibir seus dotes físicos, que verdadeiramente se desligou do absurdo que era a situação na qual nos encontrávamos. O primeiro contato físico aconteceu quando a puxei para mim, apertando-a contra o meu corpo, fingindo nos embalar numa dança lenta, quando pude notar que ela estremecia excitada entre meus braços. — Eu não sei onde estava com a cabeça quando deixei passar tanto tempo sem enxergar a mulher que você é. — Mordisquei o lóbulo da sua orelha, enquanto ela arfava. — Você devia ter me procurado, me falado o que sentia. Teríamos construído uma história juntos. — Ah, Richard, você estava sempre cercado por mulheres tão lindas, mais interessantes do que eu.

— Poucas delas foram mais interessantes que você. — E ainda assim você se casou com duas delas. — Um homem na minha posição não pode ficar solteiro, pois a sociedade exige o cumprimento das normas comportamentais como elas foram estipuladas. — E de agora em diante, você vai quebrar as normas ou se casará novamente? — Minha única norma de agora em diante é vir aqui te foder. — Passei minha língua no contorno dos seus lábios finos, tomado pela repulsa e ela arquejou de excitação. — Você é uma mulher brilhante, Olívia, sem mencionar que é gostosa, quente e muito bonita. Tendo você eu não preciso de mais ninguém. — E você não se importa mais com o que eu fiz? — A voz dela estava entrecortada pela respiração pesada. — Não. Como eu já te falei, nenhuma daquelas vadias significou algo para mim. Eram apenas bocetas doces que eu usava para me distrair, assim como vou usar a sua. — Percorri minha mão pelo seu corpo, por sobre as roupas, enquanto ela arfava. — Eu até admiro a perspicácia com que você fez tudo aquilo, como foi inteligente, como lutou bravamente por mim. Nenhuma outra faria isso. Foi tão perfeito que fica difícil acreditar que você esteve sozinha nisso. Ela hesitou brevemente, todavia, antes que tivesse tempo de pensar, eu enterrei minha mão entre suas pernas, acariciando seu sexo por sobre a calça laranja de tecido. Ela gemeu alto, jogando sua cabeça para trás, expondo a pele do seu pescoço, para onde levei minha boca. — Seja sincera comigo Olívia, quem esteve te ajudando esse tempo todo. Eu preciso saber para quem você estava dando essa bocetinha e se esse sujeito não vai vir atrás de mim quando souber que você agora é a minha putinha. Ela sorriu nervosa, como se não tivesse familiaridade com as mãos de um homem em seu corpo. Então, fui ainda mais longe. Virando-a de costas, colei meu corpo no dela, por trás, segurando seus cabelos curtos com uma mão, enquanto introduzia a outra na sua calça com cós de elástico, tocando sua intimidade lubrificada, massageando-a rumo ao ápice do prazer, minha boca trabalhando na sua orelha, eroticamente. — Me diga Olívia. Quem é o cara que está perdendo você para mim. — Não há ninguém... Eu juro... Ahhh — Então quem atropelou a cadelinha? Seu corpo ficou ligeiramente tenso, sua mente em busca da lucidez que precisava para entender que estava sendo enganada e, mais uma vez, eu a impedi de pensar, enterrando dois dedos na sua vagina molhada, com um nojo violento me tomando, como eu jamais imaginei que me sentiria estando com uma mulher excitada em meus braços. — Eu não transei com ele... — Toquei-a com mais interesse, ciente de que mais um pouco e ela gozaria na minha mão. Eu a faria implorar por aquele orgasmo, pois assim falaria o que eu quisesse. — Me diga quem era ele... — Ah... — Agora! — Um matador de aluguel que contratei em um site na internet. Amantes.com. Um site disfarçado de site de relacionamentos. Nunca nos encontramos pessoalmente. Tudo foi combinado via internet. Eu a toquei com mais lentidão, ou ela gozaria e eu perderia aquela chance.

— Me fale mais sobre ele. — Ah Richard, por favor, me deixe gozar... – Ela apertava suas pernas em torno da minha mão. Puxei seus cabelos com força. — Fale! — Ahh... Eu depositei um milhão de dólares na conta dele para que não descansasse enquanto ela estivesse viva. Ela não foi a primeira que ele eliminou. As duas últimas também foram mortas por ele. — Me dê um nome, Olívia. Eu preciso de um nome. — Arnold Rodriguez. — Já chega senhor Parker. Temos a localização do número do IP do site, o nome realmente é Arnold Rodriguez. Os agentes estão a caminho. A voz do agente do FBI ecoou pela sala, através de microfones instalados ali, quando então Olívia afastou-se de mim num sobressalto, ajeitando as roupas de volta no lugar, seus olhos atônitos, percorrendo as paredes, para logo se prenderem aos meus, expressando sua constatação da verdade. — Você me enganou! Toda a minha fúria, minha dor, minha angústia ao relembrar o estado em que Dakota estava naquele leito de hospital, se manifestaram dentro de mim, numa tempestade violenta e silenciosa que acontecia em minhas entranhas. Senti o canto da minha boca se dobrar num meio sorriso, embora não contivesse humor, era um riso de agonia. — Você realmente acreditou que eu desejaria alguém como você?! — Minha voz saiu baixa, tão mortal que a vi recuar um passo. — Você é tão desejável para mim quanto o excremento de um animal. — Impulsivamente, dei um passo na sua direção, enquanto ela recuava outro, meus olhos se prendendo na sua garganta. Bastava um apertão ali e tudo estaria acabado para ela. – Eu tenho nojo de você, como nunca tive nojo de nada antes. Você nunca chegou aos pés de Elizabeth, ou de qualquer outra mulher com quem me envolvi. Te tocar hoje foi a coisa mais odiosa que já fiz, embora meu sacrifício tenha valido à pena, porque consegui a única coisa que eu queria de você. — Você vai me pagar por isso, Richard. — Seu tom era baixo e ameaçador. — Nunca te deixarei ser feliz. Vou acabar com todas as mulheres que você desejar, como acabei com aquela vadiazinha universitária. Suas palavras destruíram o pouco do controle que restava em mim. Tomado pela fúria, avancei para ela, minhas mãos alcançando sua garganta frágil, apertando-a com toda a força que eu possuía. Eu não pararia até que ela estivesse morta, todavia, antes que acontecesse os agentes do FBI invadiram a sala, puxando-me, impedindo-me de me tornar um assassino. Como se subitamente retornasse de uma espécie de transe, vi a assassina tossir incessantemente, lutando para puxar o ar até os seus pulmões através da sua garganta ferida. — Quer saber? Não vale à pena sujar minhas mãos com um lixo como você. Já me satisfaz saber que você vai apodrecer aqui, sozinha como sempre esteve, sem carinho e sem o amor de um homem. — Olhei-a pela última vez, sem conseguir enxergá-la como a mulher frágil que, talvez não deliberadamente, o medo da minha agressão a tornara por aquele breve momento. — Adeus Olívia. Deixei a delegacia sentindo-me sujo por tê-la tocado tão intimamente, porém, por outro lado, me sentia aliviado por termos conseguido colocar um fim naquele pesadelo. Se minha Dakota sobrevivesse, estaria segura para vivermos nosso amor como merecíamos. Diante da delegacia, dezenas de viaturas partiam rapidamente pela rua com as sirenes ligadas,

obviamente em busca do assassino. Antes de voltar ao centro médico, passei em meu apartamento e tomei um banho demorado, como se a água fosse capaz de me limpar de toda a maldade que parecia impregnada e mim. No final daquela tarde um dos agentes do FBI me ligou para me informar que tinham conseguido prender os assassinos. Tratava-se de uma quadrilha que vinha agindo há anos via internet, por meio dos quais, conseguiram chegar a outras quadrilhas e assim sucessivamente. Naquela noite, antes de adormecer na poltrona ao lado do leito da minha amada, sussurrei em seu ouvido o que tinha acontecido. Disse-lhe também que ela já estava segura e podia voltar para mim, pois sem ela eu simplesmente estava deixando de existir. Implorei com veemência que não partisse, afinal se o fizesse, eu não sobreviveria. Ainda naquela noite, durante a madrugada, um gemido muito fraco partiu dela e em seguida, seus olhos lindos se abriram.

CAPÍTULO XXXV Como se emergisse de uma negra e aterradora escuridão, finalmente vi a luz. Imagens confusas, brancas, tão indefiníveis quanto meus pensamentos. Eu me esforçava para me recordar do que tinha acontecido, ou de onde estava, mas tudo parecia confuso, sem sentido. A imagem diante de mim me lembrava um teto de gesso, mas onde entre os lugares em que eu já dormira, havia um teto de gesso? Eu tentava me lembrar. Eu estava viva, constatei invadida por um júbilo infinito, como se viver fosse o milagre do qual eu precisava. — Dakota. — A voz soou trêmula, baixa, inconfundível. Era a voz do meu amor. Ele estava ali. Mas onde? Tentei procurar, a simples tarefa de focar meus olhos em outra direção parecendo árdua demais para ser executada. Eu precisava tentar com mais veemência, pois vê-lo era uma necessidade. Fechei os olhos e abri novamente, procurando, forçando minha visão, até que seu rosto lindo, tão amado, se materializou diante de mim, tão perto que eu pude sentir também o seu cheiro. “Richard...” Tentei falar, mas minha voz ficou presa no nó que havia na minha garganta seca. — O médico já está vindo te ver, meu amor. — Sua voz continuava tão trêmula quanto suas mãos quando envolveram a minha. Ele disse médico, então algo grave realmente tinha acontecido. Eu estava doente, embora não me recordasse do quê. — É maravilhoso ver você acordada. Eu queria dizer a ele o quanto era bom vê-lo também, todavia, o cansaço me impedia de falar, apenas um gemido fraco partindo da minha boca. — Há quanto tempo ela acordou? — Outra voz partiu de perto, uma voz grave, masculina. — Há cinco minutos. — Aquela era a de Richard. — Por que ela não fala? — Porque está cansada Sr. Parker. Ela só precisa de tempo. Richard soltou minha mão, afastando-se para que o outro homem aproximasse seu rosto enrugado, desconhecido, se materializando diante dos meus olhos. — Srta. Thompson, por favor, pisque se puder me ouvir. Mas era claro que eu o ouvia. Com muito esforço, pisquei. — Eu sou Willian Curt, seu médico. — Senti a presença de Richard do outro lado do meu leito. Eu não podia vê-lo, mas seu cheiro era inconfundível. — Pisque novamente se sentir isso. — O médico apertou minha mão, pisquei. Repetiu o procedimento com meus pés, pernas e torso, como se procurasse uma deficiência. —Você sente sua garganta seca? — Pisquei com veemência. Finalmente ele perguntara algo de útil. — Vou te dar um pouco de água, não que você precise realmente, já que soro a mantém bem hidratada, mas porque ficou muito tempo sem falar e seu psíquico está bloqueando sua voz. — Subitamente, a parte superior do leito se ergueu, deixando meu torso quase na vertical, quando então visualizei o amplo aposento repleto de aparelhos médicos no qual me

encontrava. O médico trouxe um copo de plástico aos meus lábios, permitindo-me ingerir a água, que desceu macia pela minha garganta seca. — Richard... — Consegui falar finalmente, minha voz saindo muito fraca. — Estou bem aqui, meu amor. — Senti sua mão grande evolvendo a minha e virei meu rosto na sua direção, o gesto tão simples me cansando como se eu carregasse um fecho de lenha nas costas. — Você vai ficar bem. — O que houve? Os olhos dele buscaram o rosto do médico, como se precisasse de uma permissão para falar. — Srta. Thompson, você foi atropelada, fraturou a perna, uma costela e teve um traumatismo craniano que a deixou em coma por nove dias. — Enquanto o médico falava, o pânico tomava conta de mim. Em coma?! Traumatismo craniano?! — A boa notícia é que você se recuperou rapidamente das fraturas e pelo visto do resto também, apesar do que, precisarei fazer alguns exames para me certificar de que não ficou nenhuma sequela. — Sequela?! — Mas à primeira vista tenho quase certeza de que você está bem. Meus parabéns, você é muito forte, uma verdadeira sobrevivente. — Você ouviu isso, bebê? Você é uma guerreira. Pouco a pouco, os acontecimentos foram voltando à minha mente. Pude visualizar claramente o momento em que deixei o hotel em Dallas para acompanhar Rachel e Emilly até o carro do outro lado da rua, para em seguida um carro vermelho avançar para mim e tudo se apagou. — E Emilly? — Quis saber. — Ela vem aqui a cada três dias ver você. Te trouxe um monte de presentes. — Quero ver. Mais uma vez Richard buscou a permissão do médico. — Vamos devagar Srta. Thompson, você dormiu por muito tempo, precisa reaprender a coordenar seu corpo. Consegue mover os braços? — Sim. — Foi o que eu pensei. Todavia, uma tarefa tão simples como erguer um braço precisava de um esforço tremendo, como se meus ossos pesassem toneladas. Com muita persistência, consegui fazer o simples movimento, levando uma mão à minha cabeça, quando então percebi, alarmada, a ausência dos meus cabelos. — Minha cabeça foi raspada?! — Indaguei aturdida. — Isso foi necessário por causa do procedimento cirúrgico. O médico falava com a naturalidade de quem recitava a receita de um bolo, enquanto eu me afogava na vergonha de estar careca na frente de Richard. — Eu quero ver um espelho. — Pedi. Ambos se entreolharam. O médico assentiu e Richard foi até o que parecia ser um banheiro, retornando com um espelho pequeno nas mãos, entregando-o a mim. Ao fitar o meu reflexo, quase entrei em choque, eu estava irreconhecível, pior que isso, eu parecia um personagem de um filme de terror. Tinha olheiras profundas, negras; minha pele estava tão pálida e seca que adquirira um tom fantasmagórico esverdeado; eu estava horrivelmente careca, com uma fileira de pontos negros partindo do ápice da minha testa, desaparecendo atrás da cabeça. Como eu podia tolerar que Richard olhasse para mim assim? Eu estava simplesmente monstruosa, não podia permitir que ele me visse daquele jeito, pois tinha certeza de que minha aparência lhe despertava repulsa, obviamente estava ali por piedade. — Richard, sai daqui. — Minha voz soou com um indesejável tom de súplica, enquanto as

lágrimas ameaçavam aflorar dos meus olhos. — O quê?! Por que bebê? — Ele parecia espantando, embora eu me recusasse a olhar em seu rosto para verificar. Queria apenas que ele saísse dali. — Eu não quero que você me veja assim. Por favor, vai embora. — Fechei meus olhos, esperando que ele não estivesse mais ali quando voltasse a abri-los. — Eu não vou sair daqui por causa disso. Eu te amo e não me importo que tenham raspado seus cabelos. Apertei meus olhos com força, tentando voltar a adormecer, apenas para fugir daquela situação tão humilhante. — É melhor para a saúde dela que o senhor vá, Sr. Parker, pelo menos até que ela possa superar essa fase de negação que é totalmente normal em pacientes recém acordados de um coma. — O médico recomendou. Richard hesitou, permaneceu em silêncio por um longo momento e embora eu mantivesse meus olhos fechados, sabia que ele me observava, me fazendo sentir ainda mais feia e humilhada. — Eu vou, mas eu volto. Com isto, deixou o aposento, pisando pesado, para no instante seguinte uma enfermeira entrar carregando um carrinho hospitalar de onde partia o cheiro de comida. — Então vamos começar Srta. Thompson. Quero verificar como seu corpo reage a tarefas simples como ingerir os alimentos. Não se preocupe, é só um caldo de legumes bastante saudável. Meu estômago embrulhou, sendo que precisei de muita persistência para não vomitar. Comi um pouco, apenas o suficiente para que ele se certificasse de que eu não estava tão mal. Depois, o médico tirou a parafernália de aparelhos do meu corpo e ajudou a enfermeira a carregar meu leito com rodinhas para fora, seguindo por um longo e bem iluminado corredor que levava a uma sala abarrotada de mais aparelhos hospitalares, onde passei por uma bateria de exames, ao final dos quais eu estava tão esgotada que adormeci profundamente, já sem nenhum aparelho em meu corpo. Era dia quando despertei, eu sabia disso porque os raios escaldantes do sol penetravam o aposento pelas frestas nas cortinas da janela. Desta vez não encontrei nenhuma dificuldade em abrir os olhos, ou focalizar as coisas à minha frente, também já não me sentia tão cansada. Aquele médico era mesmo muito bom. Sentia um pouco de dor na cabeça e na perna fraturada, mas acreditava que isso fosse normal. A fim de testar os limites do meu corpo, vire-me sobre o leito, para um lado, realizando o movimento sem grandes dificuldades, depois virei para o outro lado, quando só então vi Richard sentado em uma poltrona a um canto, muito quieto, observando-me fixamente. Ele tinha raspado sua cabeça e subitamente me senti comovida com o seu gesto, ao mesmo tempo em que a culpa por tê-lo expulsado do quarto antes me invadia, nem de longe ele merecia aquilo. Pelo contrário, era merecedor de todo o meu amor, por várias razões, sendo a principal delas seu rosto abatido evidenciando que estivera ao meu lado durante todos esses dias, sem descansar. Fitei aquele rosto tão lindo, tão másculo e constatei inebriada o quanto o amava. Eu era louca por aquele homem. — Oi. — Tentei esboçar um sorriso, mas a culpa que me corroia não me permitiu. No entanto, o sorriso que se manifestou nos lábios lindos dele, foi tão incrivelmente cativante que me irradiou. — Você ficou doido? Para que foi raspar a cabeça sem necessidade? Ele levantou-se vindo na minha direção e tudo estava lá, meu coração batendo descompassado,

minha pele transpirando. Era a paixão visceral que eu sentia por aquele homem se manifestando no meu organismo. — Raspei para que você soubesse que não tem nada demais em ser careca. Cabelos nascem de novo. — Colocou-se ao lado do leito, segurando minha mão entre as suas, seu calor gostoso me contagiando, me fazendo sentir mais viva que nunca, muito consciente da sua presença. — Me desculpe por ter te expulsado. Eu não sei o que deu em mim. — Não se desculpe. Foi uma reação natural de quem dorme de um jeito e acorda de outro, sem ter presenciado o processo de mudança. — Seus olhos se tornaram mais intensos sobre os meus, aquecendo-me a alma. — Como você está se sentindo hoje? — Bem melhor. Acho que já posso ir para casa. — Infelizmente não é tão simples assim. O médico quer manter você em observação por alguns dias, embora tenha me garantido que você está se recuperando depressa e não ficará com nenhuma sequela. Ele esteve aqui agora a pouco te examinando. — Isso me deixa bastante aliviada. — Tom me ligou hoje. Ele e Trinity vêm ver você daqui a pouco. E Emilly já está a caminho. Não parecia haver maneira melhor de se começar o dia: tendo o amor da sua vida ao seu lado, sua filha e seus amigos a caminho. Sentir-me assim tão amada, fazia tudo o que acontecera parecer insignificante diante da grandeza que era esse amor, e a certeza de que estava tendo uma segunda chance de vivê-lo me dava forças para desejar me recuperar o mais depressa possível. Esperava que Olívia não fizesse uma terceira tentativa, se fora realmente ela a autora daquele atropelamento. — Foi Olívia quem mandou me atropelar? A fisionomia de Richard se contraiu. — Sim. Mas agora você está totalmente segura, pois o FBI conseguiu prender a pessoa que ela tinha contratado e esta manhã ela se enforcou na cadeia. O chefe da divisão de homicídios me ligou para dar a notícia pouco antes de você acordar. Fitei-o chocada. — Não posso nem dizer que lamento por ela. — Eu também não. — Quem era a pessoa que ela contratou? — Um bandido que agia por meio da internet. — Ainda bem que o FBI descobriu. Richard ficou subitamente pálido e no instante em que abri a boca para indagar o porquê, a porta do quarto se abriu e Emilly entrou linda, em uma saia rodada com várias camadas branca, meia calça cor de rosa, botas marrom e suéter de tricô marfim com uma flor de tecido na gola. Os cabelos ruivos estavam naquela bagunça organizada. Parecia uma daquelas crianças perfeitas que participavam de comerciais de cereais na televisão. Rachel a seguia, elegante como da última vez que eu a vira. Minha pequena correu até meu leito, eufórica, detendo-se ao meu lado, abrindo seu sorriso angelical com um dentinho da frente faltando. Era o sorriso mais fascinante da face da terra. — Olá Dakota. — Sua voz parecia melodia aos meus ouvidos. Precisei de um esforço inumano para conter o desejo a levantar-me e a segurar em meus braços, apertar seu corpinho pequeno contra o meu. Então, como se fosse capaz de ler meus pensamentos, Richard a pegou, sentando-a na beirada do meu leito, quando pude tocar a pele delicada do seu rosto, sentir seu cheirinho gostoso.

— Senti sua falta, meu bem. — Disse, emocionada, para em seguida cumprimentar Rachel com polidez. — Eu vim aqui duas vezes, mas você tava dormindo. O Richard disse que me ligava quando você acordasse e ligou mesmo. — O Richard é um homem de muita palavra, por isso eu o amo tanto. — Você não vai mais dormir de novo não, né? — Não princesa. Só como as pessoas normais dormem. O sorriso voltou a se estampar em seu rosto infantil. — Olha eu trouxe uma roupa nova para a princesa de fogo. O Richard me falou que estava cuidando dela enquanto você dormia. — Ela entregou-me um pequeno embrulho. — Não conta ao Finn que o Richard cuidou dela, senão ele fica com ciúmes. Ela sorriu mais amplamente. — Você se lembra do que eu disse. — Não havia como eu me esquecer. — Mas ela e o Finn terminaram. — Seu rostinho ficou sério. — Ele fez a princesa de fogo lutar contra o rei gelado. — Oh! Que maldade. — Eu precisava me lembrar de assistir aquele desenho, que parecia tão importante na vida da minha lindinha. Continuamos ali conversando sobre os personagens que ela amava e seus conflitos sentimentais, enquanto Rachel e Richard se falavam sem deixar de nos observar. As horas foram tão agradáveis que se passaram sem que eu percebesse. Após fazer um lanche, sob recomendação do médico, quando todos me acompanharam, minha pequena votou a sentar-se ao meu lado no leito, quando fiquei impressionada com a ligação que existia entre nós duas, era como se o sangue em nossas veias falasse mais alto que os anos de convivência que ela tivera com Rachel. Era quase meio dia quando a porta se abriu e Tom e Trinity entraram, sem que eu acreditasse no que meus olhos viam: eles também tinham raspado a cabeça. Estavam tão ridículos quanto eu, apesar da animação que demonstravam ao se aproximarem do meu leito, Trinity carregando um grande buque de flores, Tom uma caixa de chocolates em formato de coração. Obviamente Richard tinha falado a eles sobre meu ataque de pelanca ao acordar, por isso tinham raspado a cabeça também. — O que vocês fizeram seus doidos? — Eu os observava aturdida. — Queríamos ficar parecidos com você. Mas aposto que estamos lançando uma nova tendência de moda. — Foi Tom quem falou, inclinando-se para beijar-me a bochecha, estaladamente, entregandome os bombons, para que em seguida Trinity fizesse o mesmo. — Nós só queríamos que você soubesse o quanto te amamos. — Ela falou. — Vocês são dois dementes. — Não consegui conter o riso. — Dementes que amam a amiga que têm. — Tom completou. Quando desviei minha atenção deles, olhando de volta o rostinho de Emilly, notei que ela esticava seu lábio inferior, encarando-me com os olhos cheios de lágrimas. — O que foi meu amor? — Eu sentia meu coração se partindo. — Eu também quero raspar a cabeça para ficar parecida com você, mas a Rachel não ia deixar. — Ela afundou seu rostinho na minha camisola, dando início ao pranto, quando constatei que nada podia ser mais doloroso que vê-la chorando sem que eu soubesse o que fazer nada a respeito.

Meus olhos buscaram o rosto de Rachel, à procura de socorro, todavia ela apenas deu de ombros, esperando que eu resolvesse o problema. Então, seguindo aos meus instintos, abracei minha filha, apertando-a contra mim, invadia pela sensação de impotência que me fez duvidar de que eu estava preparada para me tornar mãe. Eu não podia dizer a ela que raspasse a cabeça, pois isso a tornaria alvo de deboche na escola, podendo acarretar a perca da sua autoestima. — Você não precisa raspar os cabelos para se parecer com Dakota, Emilly. — Foi Richard quem falou, aproximando-se com seu smartphone na mão. — Olha isso. — Ele a fez olhar a tela do aparelho, onde era exibido um vídeo no qual uma garotinha colocava uma careca falsa na cabeça, escondendo os cabelos sob o objeto de látex. — Hoje ainda vou comprar um desses para você. — Você promete? — Ela afastou as lágrimas do seu rostinho com as mãos. — Sim, eu prometo. — Nesse caso eu deixo minha mãe se casar com você. — Ela voltou a deitar-se sobre mim, de lado, como eu marcasse território de uma propriedade que lhe pertencia e foi pouco a pouco que me dei conta de que ela me chamara de mãe, meu coração dando saltos no peito com a constatação. — O que você disse meu amor? — Minha voz saiu trêmula, carregada de emoção, as lágrimas ameaçando aflorar dos meus olhos. — Eu contei tudo a ela há alguns dias. — Foi Rachel quem respondeu e eu sorri. Um riso espontâneo, tão inesperado quanto às lágrimas que escorreram pela minha face. — Não fica triste mamãe, eu prometo ser uma boa filha. — Ela fitava meu rosto aflita. — Oh meu amor, eu estou chorando de tanta felicidade, por ter você como filha, porque eu te amo demais. — Acariciei a pele delicada do seu rosto e ela sorriu, exibindo sua fenda entre os dentinhos. — Eu não sei chorar de felicidade, mas eu te amo também. — Gente! Para tudo! Como assim você tem uma filha?! — Tom, que até então observava tudo em silêncio, indagou seus olhos atônitos, assim como os de Trinity. Se eu não estivesse tão feliz, teria me sentido culpada por esconder deles o meu passado, afinal eram amigos fiéis a ponto de rasparem a cabeça por mim. — Pois é eu tenho. Ela não é linda? — Orgulho, afeto incondicional, júbilo e gratidão se misturavam dentro de mim, impedindo que o sorriso de desfizesse dos meus lábios.

EPÍLOGO I A cada dia que passava eu acreditava mais naquele ditado que dizia que depois da tempestade vinha à bonança, pois depois de quase ter perdido minha vida, as coisas boas começaram a acontecer, coisas inesperadas, surpresas maravilhosas que o destino tinha me reservado. A primeira delas foi o fato de Richard Parker abrir mão da sua arrogante soberania concedendome total liberdade para escolher o lugar onde nós moraríamos. Em vez de escolher um apartamento de luxo, como ele sugerira inicialmente, optei por uma casa grande e confortável em Woodlands, com um jardim florido na frente e um quintal amplo, com um belo pomar, onde Emilly pudesse brincar livremente. Ali eu construiria um verdadeiro lar para minha família, um lar como o de Stefany e dos pais de Trinity, como eu jamais tivera antes, embora sempre desejasse. A surpresa seguinte aconteceu durante um dos fins de semana em que Rachel e seu marido, levaram minha pequenina para passar os dois dias sem aula com eles em Dallas e eu e Richard fomos para a casa dele no lago. Naquele fim de semana ele preparou um jantar romântico para nós dois, sob a claridade da lua cheia, às margens do lago de águas claras e tranquilas, quando então me pediu em casamento, com um discurso romântico, presenteando-me com o maior diamante que eu já tinha visto em um anel e, obviamente eu aceitei seu pedido. Outra surpresa foi à visita que recebemos da mãe adotiva dele, que veio atrás de uma reconciliação e foi recebida de braços abertos pelo amor da minha vida. E embora os demais membros daquela família ainda se mostrassem irredutíveis, eu sabia que um dia todos voltariam a se aproximar de Richard, afinal era impossível não amar um homem como ele. As surpresas partiram também de Trinity e Tom. Quanto a ela, conheceu o cara que denominou como sendo o homem da sua vida enquanto estava na balada usando uma peruca preta sobre a careca e decidiu manter seus cabelos verdadeiros naquela cor quando cresceram. E para a felicidade completa de Tom, Taylor finalmente assumiu sua homossexualidade, assim como o relacionamento de ambos. Devido ao pesadelo pelo qual passei, Anthony estendeu o prazo para entrega do meu trabalho por tempo indeterminado, o que embora acarretasse minha ausência na cerimônia de formatura, garantiria o meu diploma de jornalista devidamente registrado. Três meses após o atropelamento eu estava totalmente recuperada, meu cabelo tinha crescido até a altura da nuca, me permitindo usar o corte da Hazel Grace, de A Culpa é das Estrelas, o que Emilly achou o máximo, já que adorava o filme, embora ainda não tivesse lido o livro. E graças aos céus eu não ficara com nenhuma sequela. Sem pressa, terminei de escrever a biografia completa de Richard, um texto objetivo, totalmente dissertativo e informativo, no qual não mencionei meu envolvimento com ele, para que meu ponto de vista sobre a dissertação não fosse abordado. O enviei para o e-mail de Anthony uma semana antes de ir lhe entregar o produto final, devidamente impresso, encadernado e registrado na biblioteca da universidade, para que ele tivesse tempo não apenas de ler, mas de refletir sobre a verdade em torno da vida de Richard, no quanto ele era inocente, afinal com tantas coisas boas acontecendo, talvez eu

conseguisse aproximar os dois quando encontrasse o professor. Todavia, minha tentativa foi em vão, o sujeito era simplesmente irredutível, cheio de ódio e de rancor, desmerecedor de qualquer consideração por parte de Richard. — Nunca vou perdoá-lo, Dakota, pois apesar de não ter assassinado minha irmã com as próprias mãos, ela morreu por causa dele e não foi à única pessoa que eu amei que ele me tirou. — Foram suas amargas palavras. Naquele instante, decidi mostrar a ele quem era Richard Parker realmente. Voltei para casa com meu trabalho em mãos e refiz grande parte do texto, relatando meu relacionamento com ele, deixando claro o homem maravilhoso que Richard era, o quanto era digno e merecedor de todo o meu amor, como também do amor de Elizabeth. Passei várias noites acordada com o intuito de refazer o texto a tempo, um sacrifício que valeu à pena, pois quando terminei tinha a certeza de que, ao ler, Anthony enxergaria o quanto era pequeno e insignificante se comparado à grandeza, do homem a quem acusava. Eu tinha certeza que depois de ler aquele texto, Anthony constataria que não chegava a ser metade do homem que Richard Parker era, o melhor entre os melhores. Desde que eu tinha sido levada para aquele reformatório, durante minha adolescência, para ser reabilitada por ter cortado a garganta do meu padrasto, quando tive finalmente a oportunidade de engajar nos estudos, sem ter mais nada com o que me ocupar, eu decidira que me tornaria uma grande jornalista e aquele vinha sendo o sonho pelo qual eu lutara persistentemente durante todos aqueles anos, entretanto, quando segurei meu diploma em minhas mãos, vendo as portas de uma grande carreira abertas diante de mim, eu percebi que meus sonhos tinham mudado. Eu não queria mais ser aquela famosa jornalista, pelo menos não por enquanto. Tudo o que eu queria era ficar na minha casa grande e confortável, esperando pelo meu amor a cada final de um dia de trabalho dele, cuidando da minha filha, acompanhando seu crescimento, pois era isso que realmente me fazia feliz, eu não precisava de mais nada. Eu simplesmente adorava acordar cedo e preparar o café da manhã par nós três, fazer a refeição junto com eles, levar Emilly para a escola e esperar que eles voltassem para mim. Adorava ver minha princesa explorando o quintal enorme, repleto de arvores, de nossa casa, descobrindo o mundo enquanto crescia. Observá-la se tornar cada dia mais madura era um espetáculo fascinante, do qual eu não pretendia perder nenhum detalhe. Às vezes me espantava em como encontrara a felicidade na simplicidade de uma realidade da qual muitas mulheres fugiam, optando por construir uma carreira, quando para mim, nada poderia ser mais perfeito do que viver para os dois amores da minha vida. Eu nunca tinha esperado encontrar a felicidade em coisas tão simples como amar e ser amada. Outra boa surpresa aconteceu quando Richard enviou sua biografia, escrita por mim, a algumas editoras, sendo que uma delas concordou em publicá-la em forma de um livro que logo se tornou um grande sucesso, ao passo em que Richard se tornava um dos queridinhos da America, o que acarretou o aumento do assédio por parte das mulheres em relação a ele, embora ele jamais tivesse olhos para outra. Devido ao sucesso deste trabalho, a editora me propôs continuar escrevendo, no entanto, eu preferia ocupar meu tempo me dedicando à minha família amada. Se um dia eu me sentisse entediada, ou me cansasse de ser uma simples dona de casa, o que eu duvidava bastante, escreveria alguma coisa.

Entre todas as surpresas, a mais magnífica aconteceu um ano após estarmos morando juntos, quando um exame de sangue confirmou o que eu suspeitava há dias: eu estava grávida, carregava em meu ventre um filho de Richard, fruto do nosso amor e nada podia ser mais perfeito. Como faltavam poucos dias para o nosso casamento, decidi que daria a notícia a ele apenas depois da cerimônia, para que minha infinita certeza de que ele se unia à mim através dos sagrados laços do matrimônio pelo fato de me desejar para sempre em sua vida, como sua esposa, permanecesse inabalável.

EPÍLOGO II Da pequena sala localizada atrás do altar afastei, mais uma vez, a cortina que nos separava do imenso salão, para observar a igreja abarrotada de pessoas, entre elas alguns funcionários mais antigos da Thrive, minha mãe biológica com seu marido e meus meios irmãos, os amigos de faculdade de Dakota e, milagrosamente, Hillary e meus pais adotivos, embora nenhum outro membro da família, aqueles que durante a infância se denominaram meus irmãos, estivessem presentes. A igreja enorme, localizada no centro da cidade, estava toda enfeitada com arranjos de flores brancas e cor de rosa, ligados entre si por faixas de tecido branco em cetim, numa decoração delicada e ao mesmo tempo sofisticada, cuidadosamente elaborada pela equipe especializada que Dakota contratara. Havia um tapete vermelho que se estendia da porta de entrada até o altar, por onde ela passaria, além de uma orquestra e um coral formado por adolescentes católicos. Era a quarta vez que eu me casava e em nenhuma das outras ocasiões me sentira tão nervoso quando naquela, talvez porque desta vez eu tivesse a certeza de que fazia a coisa certa para a minha a vida. Não havia nada que eu pudesse desejar mais que ter Dakota como minha esposa e nunca tinha sido assim antes. Com Elizabeth eu tivera a sensação de que me casava por obrigação, já que fora o primeiro homem da vida dela, assim como ela a primeira mulher da minha. Os dois casamentos posteriores não passaram de meras formalidades sem relevância. Verifiquei no grande relógio de parede que eram sete e cinco, Dakota estava cinco minutos atrasada e foi o suficiente para que minha ansiedade se tornasse quase palpável, me impulsionando a caminhar de um lado para o outro da minúscula sala. — Ela está atrasada. — O pensamento saiu em voz alta. — Relaxa cara. Noivas sempre se atrasam. Isso é totalmente normal. — Quem falou foi David, a referência mais próxima que eu tinha de um amigo. Ele estava sentado em uma cadeira antiga de madeira, ao lado da minha meia irmã Samantha, segurando-lhe a mão. Os dois se identificaram no instante em que se viram pela primeira vez. Apresentá-los foi como unir geléia de amendoim ao pão, tamanha era a afinidade que encontraram um no outro. Ambos eram meus padrinhos, enquanto que Tom e Trinity apadrinhariam Dakota. Eu continuava caminhando de um lado para o outro, ansioso, suando frio como um adolescente antes do primeiro encontro, quando finalmente a orquestra começou a tocar anunciando sua chegada, meu coração saltando descontroladamente no peito, enquanto tomava meu lugar no altar, diante do padre, junto com meus padrinhos. Não demorou muito para que ela entrasse, linda como uma miragem, no vestido marfim, tomara que caia, que se colava ao seu corpo até a altura dos quadris, de onde partia uma saia não muito larga, toda bordada. Seus cabelos ruivos estavam presos de um lado apenas, os cachos generosos emoldurando lindamente sua face. Uma única flor, branca, delicada, enfeitando o penteado. A pequena Emilly vinha à sua frente, jogando pétalas de rosas no chão por onde ela passaria. Tom a conduzia pelo braço, ambos vindo devagar na minha direção, meu coração trabalhando em um

ritmo mais frenético a cada passo que se aproximavam. Por fim, ela chegou perto o suficiente para que seu cheiro gostoso, amado, familiar, preenchesseme as narinas, seu sorriso lindo despindo-me de qualquer emoção que não a paixão visceral que latejava em minhas entranhas, comunicando a cada fibra do meu corpo o quanto ela me pertencia. Não consegui distinguir exatamente em que momento Tom a deixou para ir ocupar o seu lugar de padrinho ao lado de Trinity, pois não conseguia enxergar nada mais além daquele rosto lindo, amado. — Você está linda, bebê. — Sussurrei, emocionado. Seu sorriso se alargou e precisei me esforçar para não tomá-la em meus braços ali mesmo, diante de todas aquelas pessoas e do padre. — Você também está muito bem. — Sua voz de anjo estava carregada de emoção. Cedendo a um impulso, afundei meu nariz nos seus cabelos macios, fechando os meus olhos, inspirando profundamente seu cheiro amado, como se este fosse o alimento do qual minha alma necessitava para existir. O padre pigarreou discretamente ao nosso lado. — O beijo é para o final, Sr. Parker. — Sussurrou. Quando me afastei da minha menina, o suficiente para nos virarmos de frente para o altar, sem que o sorriso se desfizesse dos lábios cor de rosa dela, todo o nervosismo que me assolara minutos antes, esvaiu-se de mim, dando lugar à paz e à felicidade proporcionadas pela certeza de que pela primeira vez na minha existência eu tomava a decisão certa. A cerimônia seguiu-se como deveria ser, com todo o seu tradicionalismo, todas as palavras esperadas proferidas no tom certo, no momento certo, ates do sim, da troca de alianças e finalmente do beijo. Dali, eu e Dakota partiríamos diretamente para o aeroporto, onde meu avião nos aguardava com todos os preparativos para nos levar ao Brasil, onde Dakota pedira que passássemos nossa lua de mel. Desta vez eu a levaria para conhecer as belas praias do litoral do nordeste do país. Sem a pressa com que estivemos lá da última vez, teríamos tempo de explorar as belezas naturais encontradas no lugar. Eu tinha certeza de que seria uma lua de mel inesquecível. Após a cerimônia, recebemos os cumprimentos de todos os convidados, quando descobri que havia mais gente ali do que eu tinha suposto. Começava a me impacientar, ansioso por ficar sozinho com minha esposa, na limusine que nos levaria ao aeroporto, depois no nosso avião, quando recebemos os últimos abraços. Finalmente! Estávamos a meio caminho da porta de saída, de mãos dadas, sendo aplaudidos pelo que me parecia uma multidão de pessoas, quando a pequena Emilly, que passaria os dias seguintes com seus antigos pais adotivos, em Dallas, recusou-se terminantemente a ficar para trás, não nos deixando opção que não levá-la junto na viagem. Apenas transferimos as malas dela do carro da sua antiga família para o nosso, embora eu soubesse que chegando ao Brasil ela precisaria de um guarda roupas novo, o que seria um problema, pois como Dakota, a garota odiava fazer compras, e partimos rumo ao nosso destino. Enfim, não seria a lua de mel altamente erótica que eu tinha planejado, com sexo selvagem em praias desertas e nas trilhas das florestas brasileiras, contudo, ver minhas duas pequenas juntas e felizes fazia tudo valer à pena. O avião decolou quinze minutos após nossa chegada. Estávamos no ar, quando Dakota

desapareceu para a cabine principal, seguida por Emilly, retornando pouco depois, usando um vestido de seda preto, curto, colado, com renda no decote, que emoldurava seu corpo delicioso, trazendo-me a promessa de uma noite quente, pela qual eu ansiava cada vez que olhava para ela. O passo seguinte foi seguirmos Emily enquanto ela explorava o avião, mostrando-se curiosa com os detalhes e não estupefata como a maioria das pessoas se mostravam ao entraram ali pela primeira vez. Mais tarde, durante jantar, Dakota recusou o vinho tinto que acompanharia o assado de cordeiro, optando por beber apenas água mineral, como vinha fazendo nos últimos dias, sem que eu compreendesse a razão. Fizemos a refeição no compartimento central, sentados nas poltronas de couro, sendo servidos pela comissária na mesinha de vidro, nos interagindo como a família feliz que éramos. Após a refeição permanecemos sentados ali, simplesmente apreciando a companhia um do outro, eu e Dakota nos divertindo com as expectativas de Emilly sobre o Brasil. Curiosa como era, ela faria questão de explorar cada detalhe dos lugares que visitaríamos. Não vimos o tempo passar. Notamos que era tarde apenas quando nossa pequenina adormeceu e a carreguei em meus braços para uma das cabines, deitando-a confortavelmente na cama, para que em seguida Dakota tirasse suas botas e a cobrisse com um cobertor, plantando um beijo carinhoso na sua face rosada. Finalmente estávamos sozinhos e eu teria aquilo que vinha cobiçando desde que minha esposa surgira diante de mim usando aquele vestidinho preto “foda-me, por favor”. Não tínhamos tempo a perder e as palavras eram desnecessárias para que soubéssemos o que queríamos. Começamos a nos beijar no instante em que deixamos a cabine de Emilly, até que entramos na nossa, sem conseguirmos nos desgrudarmos. Afastei-me apenas o suficiente para trancar a porta por dentro e avancei para ela novamente, tomando-lhe os lábios doces, macios, enquanto percorria minha mão através das curvas perfeitas do seu corpo, o tesão me tomando violentamente, se intensificando à medida que seu corpo frágil fremia entre meus braços, provando o quanto ela também estava excitada. Deliciosamente excitada. Entretanto, sem que eu esperasse, ela subitamente se esquivou, desvencilhando-se do meu abraço, interrompendo o beijo. — Preciso te contar uma coisa. — Sua respiração estava pesada, seus olhos azuis reluziam luxúria, seus lábios cor de rosa eram um convite tentador. Precisei me esforçar para conter o impulso de voltar a tomá-la, fazê-la minha imediatamente. — O que? — Ela hesitou, mordeu o lábio para conter o riso que parecia não querer se desfazer, apertou as mãos uma na outra, nervosa e foi suficiente para que eu me colocasse em alerta, apreensivo. — O que houve Dakota? Ela ficou séria. Sabia que a situação se agravava quando eu a chamava pelo seu nome e não de bebê. — Estou grávida. Lentamente, sem desviar meus olhos dos seus, processei suas palavras e duvidei de que tivesse ouvido corretamente, afinal seria felicidade demais par alguém que jamais antes conhecera o significado de tal palavra. Seria magnífico ter mais uma criança linda para complementar nossa família, o fruto do nosso amor, quem sabe um menino, parecido com Dakota, como Emilly e não comigo, como Hillary.

A vida me dava uma maçã e eu já cobiçava o pomar inteiro. — O que você disse? — Eu queria me certificar. — Isso que você ouviu, meu amor. — Seu rosto lindo se iluminou, o sorriso se refazendo em seus lábios. Aproximou-se, segurando-me a mão, conduzindo-a até seu ventre achatado, pousando-a ali. — O nosso príncipe está a caminho. Eu sinto que será um garoto, lindo como você. E se ele herdasse o sangue ruim do avô paterno, como Hillary aparentemente herdara? E se fosse ambicioso como eu, a ponto de não perceber o que acontecia à sua volta, para se dedicar a ganhar cada vez mais dinheiro, como eu fizera quando era mais jovem, quando estivera ocupado demais com meus negócios a ponto de deixar passar despercebido o fato de que havia uma louca matando as pessoas de quem eu gostava, quase diante dos meus olhos? As indagações me assolavam, todavia, logo constatei que eram possibilidades remotas, desmerecedoras de consideração, afinal seria também fruto de Dakota, a melhor pessoa que eu conhecia. Sob o olhar atento da minha esposa, que parecia esperar ansiosamente pela minha reação, afastei todos os pensamentos negativos, chegando à conclusão de que o fruto de um amor tão puro e verdadeiro como o nosso não poderia ser portador de maldade alguma, pelo contrario, seria um bem a mais que complementaria nossa imensurável felicidade. Então, entreguei-me ao turbilhão de emoções que me tomavam. Euforia, afeto, amor incondicional se misturavam dentro de mim, quando me ajoelhei aos pés da mulher que eu amava, extasiado pela extraordinária honra de me tornar pai de um filho dela. Segurei-a pela cintura com minhas duas mãos, trazendo-a para mim, levando meus lábios até seu vente, beijando-a ali, inebriado. Por Deus! Como era magnífico imaginar que havia uma parte de mim ali dentro! — Será uma criança linda como você. — Minha voz soou num balbucio. Dakota afundou seus dedos nos meus cabelos. — Ou como você, a pessoa mais bela que já conheci. Estremeci involuntariamente e ela também se ajoelhou, nivelando nossos rostos. — Obrigada por trazer tanta felicidade, bebê, por me resgatar das trevas quando eu já não mais existia, por me devolver a vida. Seu sorriso lindo se alargou, seus olhos brilhantes de emoção. — Você também me resgatou, meu amor. Você me ensinou a viver quando eu não sabia como dar os passos. — Agora nós estaremos ainda mais completos. E era verdade. A sensação que me tomava era a de que nada mais nos faltava. Dakota franziu a testa, fazendo aquela expressão maquiavélica que sempre surgia em sua fisionomia quando tramava algo mentalmente. — Bem... Considerando que Emilly já está quase uma mocinha e que será saudável para o nosso menino conviver com crianças da sua idade, acho que podemos ter alguns mais. Não contive o riso. O que ela queria? Uma creche? — Acho que posso providenciar isso com facilidade. — Fascinado, puxei-a para mim, segurandoa em meus braços, levantando-me, carregando-a para a cama, onde a deitei confortavelmente, estendendo-me ao seu lado, seu calor gostoso me excitando ferozmente. — Aliás, será um prazer providenciar todos os filhos que você desejar, Sra. Parker. Ela contornou meu pescoço com seus braços macios.

— Não serão tantos assim. Talvez uns três, ou quatro. Se ela dissesse que queria dez eu concordaria, não apenas porque estava disposto a absolutamente tudo para fazê-la feliz, mas porque minha capacidade de raciocinar coerentemente já estava comprometida pelo desejo selvagem que sua proximidade me despertava. — Quantos você quiser, bebê... Com tais palavras, selei-lhe os lábios, tomando-a com toda a sofreguidão que a força do desejo me impulsionava a ter, enlouquecendo de luxuria quando ela correspondeu com a mesma avidez. — Foi aqui meu amor... — Seu sussurro soou quase inaudível, enquanto minha mão procurava a maciez da sua pele por sob o tecido frágil do vestido. — Sim bebê, foi aqui a nossa primeira vez. — Você se lembra. — Ela parecia surpresa. — Como eu poderia me esquecer de algo tão magnífico? E, sem que mais palavras fossem necessárias, pelo menos as palavras conexas, nos entregamos ao desejo louco que nos tomava, insaciavelmente, como se a fome que sentíamos um pelo outro jamais tivesse fim, pelo contrário, ela crescia à medida que nos entregávamos. Como sempre, Dakota estava certa em sua intuição. Quando a gravidez alcançou o tempo necessário para que soubéssemos o sexo do bebê, descobrimos que teríamos um menino, a quem concordamos em chamar de Richard Parker Junior. Nossa vida já era perfeita juntos e com a chegada do nosso menino tudo se tornou ainda melhor, nada mais parecia nos faltar para que nos sentíssemos plenamente felizes, do instante em que acordávamos todas as manhãs, até a hora em que voltávamos a dormir à noite. Às vezes eu me perguntava o que tinha feito de bom para que a vida me retribuísse com tão perfeito júbilo.

FIM
Pecados Intimos - Ariela Pereira

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