Roteiro de Aula - MP e Mag - Direito Penal - Cleber Masson - Aula 5

16 Pages • 4,247 Words • PDF • 322.2 KB
Uploaded at 2021-09-24 06:10

This document was submitted by our user and they confirm that they have the consent to share it. Assuming that you are writer or own the copyright of this document, report to us by using this DMCA report button.


MAGISTRATURA E MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAIS Cleber Masson Direito Penal Aula 05

ROTEIRO DE AULA

TEORIA DO CRIME - INTRODUÇÃO

1. CONCEITO DE CRIME

- O conceito de crime varia em conformidade com o critério que se adota para defini-lo.

1.1. CRITÉRIO MATERIAL OU SUBSTANCIAL

- De acordo com o critério material, crime é a ação ou omissão humana (ou da Pessoa Jurídica, nos crimes ambientais) que lesa, ou expõe a perigo de lesão, um bem jurídico penalmente tutelado. Esse conceito leva em conta a relevância do mal produzido pela conduta.

- No Direito Penal Moderno, tal conceito funciona como um fator de legitimação do Direito Penal, pois complementa o princípio da reserva legal. Assim, não basta que haja a lei prevendo o crime e cominando a respectiva pena, sendo necessário a produção de um mal.

1.2. CRITÉRIO LEGAL

- Para o critério legal, crime é aquele que a lei define como tal. Aqui, o conceito de crime é o fornecido pelo legislador (Art. 1º do Decreto Lei 3.914/1941).

Art. 1º da Lei de Introdução ao Código Penal: “Considera-se crime a infração penal que a lei comina pena de reclusão ou de detenção, quer isoladamente, quer alternativa ou cumulativamente com a pena de multa; contravenção, a infração penal a que a lei comina, isoladamente, pena de prisão simples ou de multa, ou ambas, alternativa ou cumulativamente”. - A infração penal é GÊNERO do qual o crime e a contravenção penal são ESPÉCIES.

- Parte da doutrina chama a contravenção penal de “crime-anão” ou “crime vagabundo”. Outro nome utilizado para se referir à contravenção é o de “crime liliputiano.” Crime liliputiano, vale anotar, é sinônimo de contravenção penal. O termo é retirado da história do gigante Guliver, a qual se passa na terra de lilipute, onde os seus habitantes tem no máximo 15 cm.

LEMBRE-SE: via de regra, as contravenções penais não são julgadas pela Justiça Federal, ainda que estas ofendam interesse da União (Art. 104, IX da CF). Somente serão julgadas pelo juiz federal as contravenções penais cometidas por sujeitos que detém foro por prerrogativa de função na Justiça Federal.

Exemplo.: um juiz federal que pratica uma contravenção será julgado pelo TRF ao qual ele está vinculado.

1.2.1. CRIME E CONTRAVENÇÃO PENAL: SISTEMA DICOTÔMICO (OU DUALISTA) E SISTEMA TRICOTÔMICO

- O Brasil adota o sistema dicotômico, havendo subdivisão do gênero “infração penal” em duas espécies: (i) crime (ou delito) e (ii) contravenção penal.

ATENÇÃO: em algumas situações específicas, o Direito Brasileiro utiliza a palavra delito não como sinônimo de crime, mas como sinônimo de infração penal.

Exemplo¹.: Art. 5º, XI, CF (Inviolabilidade do Domicílio) – Quando o constituinte usa o termo “flagrante delito”, ele está se referindo tanto ao crime quanto à contravenção penal.

Art. 5º, XI, CF - a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial;

(Vide Lei nº 13.105, de 2015) (Vigência)

Exemplo².: Arts. 301-2 do CPP (Espécies de flagrante) – Quando o CPP fala em flagrante, ele também está a se referir tanto ao crime quanto à contravenção penal.

Art. 301, CPP. Qualquer do povo poderá e as autoridades policiais e seus agentes deverão prender quem quer que seja encontrado em flagrante delito.

Art. 302, CPP. Considera-se em flagrante delito quem: I - está cometendo a infração penal; II acaba de cometê-la; III - é perseguido, logo após, pela autoridade, pelo ofendido ou por qualquer pessoa, em situação que faça presumir ser autor da infração; IV - é encontrado, logo depois, com instrumentos, armas, objetos ou papéis que façam presumir ser ele autor da infração.

- Em países como França; Itália e Alemanha adota-se o sistema tricotômico, no qual o gênero “infração penal” é subdividido em crimes (maior gravidade), delitos (gravidade intermediária) e contravenções (pouca gravidade), em ordem decrescente de gravidade.

- Para identificarmos um crime, devemos olhar para o preceito secundário, pois, havendo pena de reclusão ou de detenção, há crime. Por outro lado, tem-se contravenção quando o preceito secundário não fala em reclusão ou detenção. Logo, sendo esta o critério correto, pouco importa o nome dado ao instituto pelo legislador.

- As figuras com pena de prisão simples ou de prisão simples e multa são exemplos de espécies de contravenção.

1.2.2. O ART. 28 DA LEI DE DROGAS

- O Art. 28 da Lei de Drogas é uma exceção à regra anteriormente estudada, sendo entendido como crime mesmo não prevendo pena de reclusão ou detenção.

- Quando a Lei de Drogas entrou em vigor, o Prof. Luis Flavio Gomes defendia que o Art. 28 não configurava uma hipótese de crime, já que não se encaixava no conceito do Art. 1º da Lei de Introdução ao Código Penal. Segundo o doutrinador, trata-se de uma infração penal sui generis. Contrapondo esse entendimento, o STF, já em 2007, em caso de relatoria do Ministro Sepulveda Pertence, determinou que o Art. 28 da Lei de Drogas é sim crime.

Art. 28. Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar será submetido às seguintes penas: I - advertência sobre os efeitos das drogas; II - prestação de serviços à comunidade; III - medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo. - O Art. 1º da Lei de Introdução apresenta um conceito legal aplicável aos crimes em geral. Por outro lado, o Art. 28 da Lei de Drogas traz um conceito específico de crime, aplicável apenas e tão somente às figuras nele contidas.

1.3. CONCEITO FORMAL, ANALÍTICO OU DOGMÁTICO

- O conceito formal é aquele que leva em conta a estrutura do crime, isto é, seus elementos estruturais. Dentro deste conceito, existem algumas posições doutrinárias mais relevantes, que, em dado momento histórico, disputaram o sentido aplicável à palavra crime:

A) QUADRIPARTIDA

- O crime é composto por 4 (quatro) elementos: (i) fato típico; (ii) ilicitude; (iii) culpabilidade e (iv) punibilidade.

- Essa posição era defendida por Giulio Battaglini na Itália e por Basileu Garcia no Brasil.

- Trata-se de posição já superada, pois a punibilidade não pode ser considerada como elemento do crime, já que ela é uma consequência/efeito do crime.

- Somente com a prática do crime é que surge para o Estado o direito concreto de punir quem violou a lei penal.

B) TRIPARTIDA

- O crime possui três elementos: (i) fato típico; (ii) ilicitude e (iii) culpabilidade. Crime, portanto, é fato típico e ilícito praticado por agente culpável.

- Não é o fato que é culpável, mas sim o agente. O fato é apenas típico e ilícito.

- Para os adeptos dessa posição, a culpabilidade é elemento do crime.

- Os que defendem a posição tripartida, tanto podem ser adeptos do Sistema Clássico (Nelson Hungria, Magalhães Noronha, Aníbal Bruno, José Frederico Marques, Fragoso, Costa e Silva, etc...) quanto do Sistema Finalista. Por outro lado, quem é clássico, obrigatoriamente é tripartido.

- Quem é finalista também pode ser tripartido (Welzel, Cesar Roberto Bittencourt, Rogério Greco, Guilherme Nucci, etc...). Isso, porque Welzel criou o finalismo a partir da estrutura tripartida do crime.

C) BIPARTIDO

- O crime possui apenas dois elementos: (i) fato típico e (ii) ilicitude. Para essa corrente, a culpabilidade não seria elemento do crime, mas sim pressuposto de aplicação da pena.

Art. 13, CP. O resultado, de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa. Considera-se causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

Art. 26, CP. É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

- Um dos argumentos a favor dessa posição é o fato de que o Código Penal diferencia crime de imputabilidade

ATENÇÃO: quem adota a posição bipartida é, obrigatoriamente, finalista. Não existe um clássico bipartido, pois se tratam de teorias incompatíveis.

- O finalismo bipartido é uma criação brasileira, intentada a partir da Reforma da Parte Geral do CP (Lei nº 7.209/1984). Foi o Prof. René Ariel Dotti quem lançou as bases da teoria em artigo

científico no qual discorria sobre o fenômeno do incesto. Segundo Dotti, quando o Código Penal Brasileiro trata da culpabilidade enquanto imputabilidade, ele o faz separadamente no Título II, ficando as disposições sobre o crime em si mesmo considerado a cargo do Título I. A partir dessa colocação, essa perspectiva científica se consolidou no Brasil, sendo difundida pelos professores Damásio de Jesus e Júlio Fabrini Mirabetti.

- Com a Reforma da Parte Geral em 1984, o Código Penal Brasileiro passou a ser finalista, não havendo como se afirmar, com segurança, que a lei adotou o critério bipartido ou tripartido.

DICA: não se deve assumir uma posição escancarada sobre o tema em provas de concurso, até porque, no plano prático, o ponto de partida e o de chegada os mesmos. •

E a antijuridicidade?

Para qualquer das posições, a ilicitude é um elemento necessário à estrutura do crime. Note, todavia, que, em nenhum momento, falou-se em antijuridicidade. Há que se observar que, embora muitos autores utilizem a antijuridicidade como sinônimo ou a utilizem no lugar da ilicitude, é recomendável a sua não utilização. Da mesma forma, a legislação brasileira não utiliza a palavra antijuridicidade em razão de sua incorreção do ponto de vista teórico. Vale lembrar que no estudo da Teoria do Fato Jurídico, o crime, em sua essência, é considerado um fato jurídico. Por esta razão, é preferível falar em ilicitude, entendida esta como a contrariedade mantida entre o fato típico e o Direito.

SISTEMAS PENAIS

1. SISTEMAS PENAIS

- A história dos sistemas penais é a história do desenvolvimento científico do Direito Penal e do crime enquanto instituição jurídica.

- Sempre que estudamos os sistemas penais, notamos que esse estudo leva em conta, principalmente, a Teoria da Conduta e a Teoria da Culpabilidade.

1.1. SISTEMA CLÁSSICO

- O sistema clássico possui três grandes nomes: Von Liszt, Beling e Radbruch. São os “três mosqueteiros” do sistema clássico.

- O sistema clássico nunca se auto intitulou como clássico. O nome “clássico” foi dado a este sistema de pensamento em momento posterior, pelo finalismo penal. Com efeito, o termo “clássico” designa, em geral, algo que é importante, mas que já está ultrapassado quando comparado com aquilo que se tem na contemporaneidade. Por isso, o movimento finalista denominou o sistema anterior de “clássico” no desejo de comunicar a sua superação em termos dogmáticos.

- Quanto à conduta, o sistema clássico adota a Teoria Naturalística, Mecanicista ou Causal. No que se refere à culpabilidade, adota-se a Teoria Psicológica.

- No sistema clássico, a estrutura do crime é a indicada no quadro abaixo:



Teoria Naturalística

CONDUTA é o comportamento humano voluntário que produz um resultado no mundo exterior. Trata-se da “fotografia do crime”, pois, se fosse possível fotografar o cenário do crime, aquilo traduziria a conduta na visão causalista.

Exemplo.: imagine uma pessoa que trabalha em período integral, com o primeiro turno dás 8h ás 12h. Imagine, ainda, que esta pessoa está dirigindo seu carro à 30 km/h em uma via de 50 km/h durante a hora do almoço e, de repente, uma criança que está de mãos dadas com a mãe saindo da escola, solta da mão da mãe, passa pelos carros parados em fila dupla e choca-se com o carro em questão. Neste momento é que vemos a foto do crime: o para-choque amaçado e a criança caída com uma poça de sangue.

CRÍTICA: Segunda Weltez, a causalidade é cega, uma vez que ela não analisa o querer interno do agente.

- Note que a conduta independe de dolo/culpa. •

Teoria Psicológica

- A Teoria Psicológica ganhou esse nome, pois entendia que a CULPABILIDADE era apenas e tão somente o vínculo psicológico representado pelo dolo/culpa que liga um agente imputável ao fato típico e ilícito por ele praticado. •

E o dolo normativo?

O dolo normativo é aquele que traz em seu interior a consciência atual (=real) da ilicitude.

- No mesmo exemplo dado anteriormente, há conduta (pessoa dirigindo o carro); resultado (criança morta), nexo causal (a criança morreu pelo choque com o carro) e tipicidade (matar alguém é fato típico, nos termos da lei). Da mesma forma, a ilicitude, entendida como a relação de contrariedade entre o fato praticado pelo agente e o Direito, também se verifica no exemplo, dado que o agente não está acobertado por nenhuma das causas excludentes. O agente que

dirige o carro também é imputável. Todavia, note que não há dolo/culpa, pois, no exemplo, há um caso claro de culpa exclusiva da vítima. Logo, não há crime em razão da ausência de dolo ou de culpa.

- É por esta razão que quem é clássico tem de ser, obrigatoriamente, tripartido, pois, do contrário, o dolo/culpa, que integram o elemento da culpabilidade, estariam excluídos da análise fático-jurídica que determina se há crime ou não. E, se isso acontecesse, estaria consagrada a responsabilidade objetiva no âmbito penal.

1.2. SISTEMA NEOCLÁSSICO (OU NEOKANTISTA) - O grande nome do sistema neoclássico foi o alemão Reinhart Frank, que formula esse sistema na Alemanha no ano de 1907, a partir da Teoria da Normalidade das Circunstâncias Concomitantes.

- Para o autor, só é culpável quem pratica o fato típico e ilícito em uma situação de normalidade, isto é, quando lhe era exigível uma conduta diversa. Em outras palavras, o agente optou pela prática do crime de uma forma livre, ainda que pudesse assumir outro comportamento.

Exemplo.: “A” deve para “B”. Numa situação de normalidade, “A” busca pagar sua dívida trabalhando mais e economizando. No entanto, se “A” pratica um roubo ao invés de optar pelo comportamento entendido como normal, configurada está a sua culpabilidade.

- Com relação à CONDUTA, o alemão continua seguindo a Teoria Causal, tal como a escola anterior.

- Tanto o fato típico quanto a ilicitude permanecem iguais quando comparados ao Sistema Causalista. Na culpabilidade, mantém-se a imputabilidade e o dolo normativo/culpa, acrescentando-se a exigibilidade de conduta diversa como elemento estrutural do crime.

1.3. SISTEMA FINALISTA

- Em 1930, na Alemanha, Hans Welzel escreve a sua obra prima, intitulada “O novo sistema jurídico-penal”. No livro, o autor defende que o sistema anterior pode ser chamado de clássico em razão do novo sistema por ele elaborado representar uma superação do modelo anterior.

- Na CONDUTA, o sistema finalista adota a Teoria Finalista da Conduta, ao passo que na CULPABILIDADE, Welzel cria a chamada Teoria Normativa Pura. Juntas, Teoria Finalista da Conduta e Teoria Normativa Pura da Culpabilidade formam as bases do finalismo.

- Welzel criou o finalismo penal a partir de uma estrutura tripartida de crime. No finalismo, o DOLO e a CULPA, que eram elementos da culpabilidade, passaram a integrar o elemento típico do crime, sendo examinados no momento em que olhamos para a CONDUTA.

- O dolo normativo é substituído pela noção de dolo natural, pois independe da consciência da ilicitude.

- No finalismo penal, o dolo é natural. Ou seja, diferente dos sistemas clássico e neoclássico onde o dolo era normativo, contendo em seu interior a consciência atual da ilicitude, o dolo natural é aquele desvinculado da consciência da ilicitude, isto é, não depende dela para se concretizar.

- A ilicitude permanece como a contrariedade do fato em relação ao Direito.

- No sistema finalista, a CULPABILIDADE é guiada pela Teoria Normativa Pura, na qual não subsiste mais nenhum elemento psicológico. Todos os elementos psicológicos saem da culpabilidade e vão para a CONDUTA.

- O elemento “CONSCIÊNCIA DA ILICITUDE”, antes integrante do conceito de DOLO NORMATIVO, permanece na CULPABILIDADE, com a diferença de que não se trata mais de uma ATUAL consciência da ilicitude, mas sim de uma POTENCIAL consciência da ilicitude. Não se exige mais o conhecimento efetivo da ilicitude, bastando que exista a possibilidade do agente saber que aquilo é contrário ao Direito.

Exemplo.: “A” está passando a 30 km/h em frente a uma escola quando, de repente, atropela uma criança que se soltou do braço da mãe e se jogou em frente ao veículo. No sistema clássico, onde a conduta era entendida como toda ação/omissão apta a produzir um resultado no mundo exterior, essa conduta seria, sem sombra de dúvidas, uma conduta penalmente relevante. Tal não acontece no finalismo, onde uma situação dessas constitui fato totalmente atípico por ausência de conduta penalmente relevante. Isso, porque o agente não quis o resultado (dolo), não assumiu o risco de produzi-lo (dolo eventual), nem agiu guiado por imprudência, negligência ou imperícia (culpa).

- Para o finalismo, portanto, CONDUTA é a ação ou omissão humana, consciente e voluntária, dirigida a um fim (= busca de um resultado).

Welzel: a causalidade é cega, pois não analisa o querer interno do agente. Diferentemente, o finalismo, por ser guiado pelo dolo e pela culpa, é vidente, pois analisa o querer interno do agente.

- No finalismo, a culpabilidade leva o apelido de “CULPABILIDADE VAZIA” em razão da ausência dos elementos psicológicos que antes lhe eram inerentes.

ATENÇÃO: existem, basicamente, duas teorias acerca da culpabilidade, estudadas enquanto espécies da Teoria Normativa Pura: (i) extremada, extrema ou restrita e (ii) limitada. Estruturalmente, não há mudança quando comparadas as duas espécies, sendo a culpabilidade formada pelos mesmos elementos (imputabilidade; potencial consciência da ilicitude e exigibilidade de conduta diversa). O que muda entre as duas é o tratamento jurídico

das chamadas “descriminantes putativas”, cujo impacto se apresenta de modo mais claro quando do estudo da Teoria do Erro no Direito Penal.

- Quem é finalista, pode ser tanto tripartido quanto bipartido. Neste último caso, a culpabilidade será tratada como pressuposto de aplicação da pena e não como elemento do crime.

- Uma vez que o dolo e a culpa fazem parte do fato típico, é perfeitamente possível que determinada vertente teórica considere a CULPABILIDADE como PRESSUPOSTO DA PENA, por exemplo, e não como ELEMENTO DO CRIME sem que isso implique em reconhecimento de uma suposta responsabilidade penal objetiva.

2. FATO TÍPICO

2.1. CONCEITO: fato típico é o fato humano que se amolda com perfeição aos elementos do tipo penal. Por outro lado, o fato atípico é aquele que não se amolda aos elementos descritos no tipo penal.

2.2. ELEMENTOS

I) Conduta II) Resultado Naturalístico III) Relação de causalidade IV) Tipicidade

- Os quatro elementos do fato típico só estarão todos presentes nos CRIMES MATERIAIS CONSUMADOS. Em todos os demais crimes (crimes materiais tentados; crimes formais e crimes de mera conduta), o fato típico só terá dois elementos: conduta e tipicidade.

2.2.1. CRIMES MATERIAIS, FORMAIS E DE MERA CONDUTA

- O crime material, também conhecido como crime causal ou crime de resultado (STF), é todo e qualquer crime em que o tipo penal que o descreve contém CONDUTA e RESULTADO NATURALÍSTICO, exigindo-se a produção deste último para que se opere a consumação. Exemplo de crime material é o crime de homicídio, no qual é necessário a conduta (matar alguém) e o resultado naturalístico (a morte cerebral).

- Tanto os crimes tentados quanto os crimes formais são chamados de crimes sem resultado.

✓ Crimes formais (consumação antecipada/resultado cortado): é o crime em que o tipo penal contém CONDUTA e RESULTADO NATURALÍSTICO, mas dispensa este último para a consumação. Em outras palavras, o crime se consuma com a prática da conduta. Exemplo de crime formal é a extorsão mediante sequestro (Art. 159, CP), em que o agente priva a vítima de liberdade, exigindo vantagem econômica para a sua liberação. Neste caso, o crime se consuma com a restrição de liberdade da vítima, não importando se houve pagamento do resgate em momento posterior ou não.

Art. 159, CP - Seqüestrar pessoa com o fim de obter, para si ou para outrem, qualquer vantagem, como condição ou preço do resgate: Vide Lei nº 8.072, de 25.7.90 (Vide Lei nº 10.446, de 2002)

Pena - reclusão, de oito a quinze anos. (Redação dada pela Lei nº 8.072, de 25.7.1990)

✓ Crime de mera conduta (crimes de simples atividade): é aquele em que o tipo penal se limita a descrever uma CONDUTA. Em outras palavras, o tipo penal não contém RESULTADO NATURALÍSTICO. Exemplo de crime de mera conduta é o crime de ato obsceno (Art. 233, CP). Nele não há um resultado naturalístico previsto na lei.

Art. 233, CP. Praticar ato obsceno em lugar público, ou aberto ou exposto ao público: Pena detenção, de três meses a um ano, ou multa. •

Qual a diferença dos crimes formais para com os crimes de mera conduta?

Embora ambos tenham a sua consumação verificada com a prática da conduta, nos crimes formais o resultado naturalístico, embora desnecessário para a consumação, pode ocorrer. E, neste caso, estaremos diante do exaurimento do crime (superveniência do resultado naturalístico nos crimes formais). Não por outro motivo, Zafaroni denomina o exaurimento de consumação material de um crime formal. Por outro lado, nos crimes de mera conduta, o resultado naturalístico jamais ocorrerá, uma vez que o tipo penal não o contempla.

CONDUTA

1. CONCEITO NA TEORIA FINALISTA

- CONDUTA é a ação ou omissão humana, consciente e voluntária, dirigida a um fim. Ou seja, o agente faz ou deixa de fazer algo, sabendo o que está fazendo e querendo fazer aquilo porque almeja determinado fim.

CRÍTICA: o finalismo penal falha no campo dos crimes culposos, já que nesta espécie de crime o resultado é involuntário. Não sem razão, o próprio Welzel tentando suprir essa falha, desenvolve a chamada Teoria Cibernética.

2. TEORIA CIBERNÉTICA

- Segundo Welzel, a CONDUTA é a AÇÃO BIOCIBERNETICAMENTE ANTECIPADA. Essa teoria não leva em conta o controle do resultado/finalidade, mas coloca em destaque o controle da vontade, isto é, o comportamento humano, que está presente tanto nos crimes dolosos quanto nos culposos.

- No fim das contas, Welzel acaba desistindo da Teoria Cibernética, insistindo nas bases teóricas finalísticas por crer que seria o melhor.

3. TEORIA SOCIAL

- O alemão Johannes Wessels criou a Teoria Social. No entanto, é Hans Heinrich Jescheck quem dissemina a teoria.

- A Teoria Social acrescenta um aspecto social às bases teóricas do finalismo.

- Para Wessels, CONDUTA é o comportamento humano com TRANSCENDÊNCIA SOCIAL. Essa transcendência/relevância social funciona como um verdadeiro elemento implícito do tipo penal. É notável, portanto, que a Teoria Social apenas aponta para a necessidade de se considerar o efeito social da CONDUTA concebida nos moldes e termos da Teoria Finalista.

- A grande vantagem da Teoria Social é permitir ao Judiciário suprir o vácuo existente entre o texto da lei e a realidade social, já que para se ter CONDUTA é necessário haver um RESULTADO

SOCIALMENTE RELEVANTE. O momento decorrido entre a criação da lei e o momento de sua aplicação cria um vácuo que precisa ser preenchido.

CRÍTICA: a Teoria Social fomenta a criação de um ambiente de profunda insegurança jurídica, ainda mais quando se trata de um país como Brasil, onde existe a tendência de uma jurisprudência lotérica.

4. CARACTERÍSTICAS DA CONDUTA

a) Não há crime sem conduta: a conduta é o primeiro elemento de todo e qualquer fato típico e, portanto, de todo e qualquer crime.

ATENÇÃO: o Direito Penal Moderno não admite aquilo que se convencionou chamar de “crimes de mera suspeita”. Trata-se de expressão criada pelo italiano Vicenzo Manzini, segundo a qual o agente não é punido pelo que ele efetivamente fez ou deixou de fazer (= conduta penalmente relevante), mas sim pela mera suspeita despertada pelo seu estilo de vida.

- Os crimes de mera suspeita caracterizam verdadeiros casos de Direito Penal do Autor.

Exemplo.: Art. 25, LCP (Vadiagem)

Art. 25. Ter alguém em seu poder, depois de condenado, por crime de furto ou roubo, ou enquanto sujeito à liberdade vigiada ou quando conhecido como vadio ou mendigo, gazuas, chaves falsas ou alteradas ou instrumentos empregados usualmente na prática de crime de furto, desde que não prove destinação legítima: Pena – prisão simples, de dois meses a um ano, e multa de duzentos mil réis a dois contos de réis. - O Plenário do STF, no julgamento do RE 583.523 (Informativo nº 722), decidiu que a contravenção penal que versava sobre a vadiagem não foi recepcionada pela Constituição Federal. Segundo o pleno, a contravenção aqui referida constituiria um exemplo claro de Direito Penal do Autor, no qual o sujeito é punido por ser quem ele é e não pelo que ele fez. Daí a sua incompatibilidade com o nosso Direito Penal Democrático.

b) Excetuada a situação da Pessoa Jurídica nos crimes ambientais, somente o ser humano pode praticar um crime

c) Somente a conduta voluntária interessa ao Direito Penal: somente a conduta voluntária interessa ao Direito Penal, não importando os fatos causados por seres irracionais com ausência de intervenção humana ou, ainda, as situações decorrentes de fenômenos da natureza.

d) Somente os atos projetados no mundo exterior ingressam no conceito de conduta: A cogitação, primeira etapa do iter criminis, nunca é punível no Direito Penal. Para explicar tal situação, Nelson Hungria dizia que enquanto a vontade criminosa permanece no claustro psíquico que existe na mente do agente, o Direito Penal não está autorizado a agir. É por isso que a cogitação não é punível. Trata-se do que alguns denominam de “direito à perversão”. Ou seja, todo e qualquer ser humano tem o direito de ser perverso sem que disso decorra uma consequência jurídico-penal.
Roteiro de Aula - MP e Mag - Direito Penal - Cleber Masson - Aula 5

Related documents

7 Pages • 2,251 Words • PDF • 275.9 KB

22 Pages • 1,699 Words • PDF • 268 KB

4 Pages • 616 Words • PDF • 625.8 KB

1 Pages • 203 Words • PDF • 109.6 KB

20 Pages • 2,308 Words • PDF • 2.9 MB

6 Pages • 1,061 Words • PDF • 186.9 KB